quinta-feira, 3 de novembro de 2022

A Alquimia Como Despertar dos Mágicos

Foi em Março de 1953 que encontrei pela primeira vez um alquimista. Isso passou-se no café Procope, que teve, na época, um curto período de vida. Foi um grande poeta que, na altura em que eu escrevia o meu livro sobre Gurdjieff, me preparou esse encontro e, depois disso, eu muitas vezes havia de tornar a ver esse homem singular, sem no entanto desvendar os seus segredos.

Eu tinha, a respeito da alquimia e dos alquimistas, ideias primárias, extraídas da imaginação popular, e estava longe de supor que ainda havia alquimistas. O homem que estava sentado na minha frente, na mesa de Voltaire, era jovem e elegante. Fizera profundos estudos clássicos, seguidos de estudos de química. Actualmente ganhava a vida no comércio e dava-se com muitos artistas, assim como com algumas pessoas da alta sociedade.

Não tenho diário, mas acontece-me, em determinadas ocasiões importantes, anotar as minhas impressões ou os meus sentimentos. Nessa noite, ao regressar a casa, escrevi:

“Que idade terá ele? Diz ter trinta e cinco. Isso espanta-me. A cabeleira branca, ondulada, cortada sobre o crânio como uma peruca. Inúmeras e profundas rugas numa carne rosada, num rosto cheio. Poucos gestos, e lentos, medidos, astutos. Um sorriso calmo e subtil. Olhos risonhos, mas que riem com indiferença. Tudo exprime outra idade. Nas suas frases nem a menor fenda, pausa, ou quebra de presença de espírito. Há qualquer coisa de esfinge atrás daquele rosto amável fora do tempo. Incompreensível. E não sou só eu a sentir isto. A.B., que o vê quase todos os dias há várias semanas, diz-me que jamais, nem por um segundo, o apanhou em falta de “objectividade superior”.


“O que o faz condenar Gurdjieff:

“1.o – Quem sente a necessidade de ensinar não vive inteiramente a sua doutrina e não atingiu o ponto culminante da iniciação.

“2.a – Na escola de Gurdjieff não existe intercessão material entre o aluno a quem se persuadiu da sua inutilidade e a energia que ele deve possuir para passar ao ser real. Essa energia – “essa vontade da vontade”, diz Gurdjieff – deve o aluno encontrá-la em si próprio, apenas em si próprio. Ora tal caminhada é parcialmente falsa e só pode conduzir ao desespero. Essa energia existe fora do homem, e é preciso captá-la. O católico engole a hóstia: captação ritual dessa energia. Mas se não tiverdes fé? Se não tendes fé, arranjai uma fogueira: é o princípio de toda a alquimia. Uma autêntica fogueira. Uma fogueira material. Tudo começa, tudo acontece pelo contacto com a matéria.

“3.o – Gurdjieff não vivia só, mas sempre rodeado, sempre em falanstério. “Há um caminho na solidão, há regatos no deserto”. Não há caminho nem regatos no homem misturado com os outros.

Faço perguntas a respeito da alquimia que devem parecer-lhe de uma assustadora estupidez. Sem o deixar transparecer

responde:

“Nada além da matéria, apenas o contacto com a matéria, o trabalho sobre a matéria, o trabalho com as mãos. Insiste muito neste ponto.

“- Gosta de jardinagem? Eis um belo começo, a alquimia é parecida com a jardinagem.

“- Gosta de pesca? A alquimia tem qualquer coisa de comum com a pesca.

“Trabalho de mulher e brincadeira de criança.

“Não é possível ensinar alquimia. Todas as grandes obras literárias que resistiram aos séculos têm qualquer coisa desse ensinamento. São a obra de homens adultos – verdadeiramente adultos – que falaram para as crianças, mas respeitando as leis do conhecimento adulto. Jamais se apanha uma grande obra em falta a respeito dos “princípios” . Mas o conhecimento desses princípios e o caminho que leva a esse conhecimento devem manter-se secretos. No entanto, há um dever de auxilio mútuo para os investigadores do primeiro grau.

“Cerca da meia-noite interrogo-o sobre Fulcanelli, e dá-me a entender que Fulcanelli não morreu:

“- Pode viver-se, diz-me, infinitamente mais tempo do que o homem não esclarecido o supõe. E pode mudar-se totalmente de aspecto. Eu sei-o. Os meus olhos sabem-no. mas trata-se de outro estado da matéria, diferente daquele que conhecemos. Esse estado permite, como todos os outros estados, mensurações. Os processos de trabalho e de mensuração são simples e não exigem aparelhos complicados: trabalho de mulher e brincadeira de criança…


Acrescenta:

“- Paciência, esperança, trabalho. E, seja qual for o trabalho, nunca se trabalha o bastante.

“Esperança: em alquimia, a esperança baseia-se na certeza de que há um objectivo. Não teria começado, disse ele, se não me tivessem provado claramente que esse objectivo existe e que é possível atingi-lo nesta vida.”

Tal foi o meu primeiro contacto com a alquimia. Se a tivesse abordado por meio da magia, creio que as minhas investigações não teriam ido longe: falta de tempo, falta de gosto pela erudição literária. Falta de vocação também: essa vocação que se apossa do alquimista, quando ele ainda se ignora como tal, no momento em que abre, pela primeira vez, um velho tratado. A minha vocação não é a de executar, mas a de compreender. Não é realizar, mas ver. Creio, como diz o meu velho amigo André Billy, que “compreender é tão belo como cantar,” mesmo se a compreensão for apenas fugitiva 1. Sou um homem apressado, como a maior parte dos meus contemporâneos. Tive o contacto mais moderno possível com a alquimia: uma conversa num botequim de Saint-Germain-des-Prés. Em seguida, quando pretendia dar um sentido mais completo ao que me dissera aquele jovem, encontrei Jacques Bergier, que não saía coberto de pó de um sótão cheio de velhos livros, mas de locais onde a vida do século se concentrou: laboratórios e escritórios de informações. Também Bergier procurava qualquer coisa no caminho da alquimia. Não era para fazer uma peregrinação ao passado. Esse homem extraordinário, completamente ocupado com os segredos da energia atómica, tomara aquele caminho para abreviar. Eu voava, agarrado às abas do seu casaco, por entre os textos veneráveis, concebidos por gente sensata apaixonada

No seu cárcere de Reading, Óscar Wilde descobre que a falta de atenção do espírito é o crime fundamental, que a atenção extrema desvenda o acordo perfeito entre todos os acontecimentos de uma vida, e também, possivelmente, num plano mais vasto, o acordo perfeito entre todos os elementos e todos os movimentos da Criação, a harmonia de todas as coisas. E exclama: “Tudo o que é compreendido está certo”. É a mais bela frase que conheço.

Pela lentidão, inebriada de paciência – eu voava a uma velocidade supersónica. Bergier gozava da confiança de alguns dos homens que, ainda hoje, se dedicam à alquimia, bem como da estima dos sábios modernos. Junto dele, em breve adquiri a certeza de que existem íntimos pontos de contacto entre a alquimia tradicional e a ciência de vanguarda. Vi a ciência lançar uma ponte entre dois mundos. Meti-me por essa ponte e verifiquei que ela se aguentava. Senti uma grande felicidade, uma calma profunda. Há muito refugiado no pensamento antiprogressista hinduísta, gurdjáeffiano, vendo o mundo de hoje como um princípio de Apocalipse, não esperando mais (e com grande desespero) do que um horroroso final dos tempos e não muito seguro no orgulho de estar à parte, eis que me era dado ver o velho passado e o futuro darem-se as mãos. A metafísica da alquimia, várias vezes milenária, escondia uma técnica finalmente compreensível, ou quase, no século xx. As pavorosas técnicas de hoje abriam-se sobre uma metafísica quase semelhante à dos tempos antigos. Que falsa poesia havia no meu refúgio! A imortal alma dos homens luzia com a mesma chama de cada lado da ponte.

Acabei por acreditar que os homens, num passado muito longínquo, tinham descoberto os segredos da energia e da matéria. Não apenas por meio de meditação, mas também de manipulação. Não apenas espiritualmente, mas tecnicamente. O espírito moderno, servindo-se de vias diferentes, pelos caminhos durante muito tempo desagradáveis, a meus olhos, da razão pura, da falta de religião, com processos diferentes e que durante muito tempo me tinham parecido maus, preparava-se por sua vez para descobrir os mesmos segredos. Interrogava-se a esse respeito, entusiasmava-se e inquietava-se simultaneamente. Tropeçava no essencial, exactamente como o espírito de elevada tradição.

Vi então que a oposição entre a “prudência” milenária e a “loucura” contemporânea era uma invenção da inteligência demasiado fraca e demasiado lenta, um produto de compensação para o intelectual incapaz de tanta velocidade quanta a sua época exige.

Há várias maneiras de aceder ao conhecimento essencial. E o nosso tempo tem algumas. As antigas civilizações tiveram as delas. Não falo apenas de conhecimento teórico.

Vi finalmente que, sendo as técnicas actuais mais poderosas, aparentemente, do que as técnicas de outrora, esse conhecimento essencial, que os alquimistas provavelmente já possuíam (e outros sábios antes deles), chegaria até nós com maior força ainda, maior peso, maiores perigos e maior número de exigências. Atingimos o mesmo ponto que os Antigos, mas a uma altura diferente. Em lugar de condenar o espírito moderno em nome da sensatez iniciática dos Antigos, ou em lugar de negar essa sensatez declarando que o conhecimento real começa com a nossa própria civilização, seria conveniente admirar e venerar o poder do espírito que, sob diferentes aspectos, torna a passar pelo mesmo ponto de luz, elevando-se em espiral. Em vez de condenar, repudiar, escolher, seria conveniente amar. O amor é tudo: a um tempo repouso e movimento.

Vamos submeter à vossa apreciação os resultados das nossas investigações sobre alquimia. Trata-se apenas, evidentemente, de esboços. Ser-nos-iam necessários dez ou vinte anos, e talvez faculdades que não possuímos, para dar ao assunto uma contribuição realmente positiva. No entanto, aquilo que fizemos, e a maneira como o fizemos, torna o nosso trabalho muito diferente das obras até aqui consagradas à alquimia. Encontrareis poucos esclarecimentos sobre a história e a filosofia desta ciência tradicional, mas algumas explicações sobre as inesperadas relações entre os sonhos dos velhos “filósofos químicos” e as realidades da física actual. É preferível revelarmos imediatamente as ideias que nos guiaram.

A alquimia, segundo a nossa opinião, poderia ser um dos mais importantes resíduos de uma ciência, de uma técnica e de uma filosofia pertencentes a uma civilização desaparecida. Aquilo que descobrimos na alquimia, à luz do saber contemporâneo, não é de molde a fazer-nos acreditar que uma técnica tão subtil, complicada e precisa possa ter sido o resultado de uma “revelação divina” caída do céu. Não quer dizer que desprezemos toda a ideia de revelação. Mas, ao estudarmos os santos e os grandes místicos, jamais podemos chegar à conclusão de que Deus fala aos homens em linguagem técnica: “Coloca o teu crisol sob a luz polarizada, ó meu Filho! Lava as escórias com água ultradestilada!”

Também não acreditamos que a técnica alquimista se possa ter desenvolvido por meio de tentativas, pequenos passatempos de ignorantes, fantasias de maníacos do crisol, até atingir aquilo a que temos de chamar a desintegração atómica. Antes nos sentiríamos dispostos a acreditar que existem na alquimia restos de uma ciência desaparecida, difíceis de compreender e de utilizar, por faltar o contexto. A partir desses restos há inevitavelmente tentativas, mas em direcção determinada. Há também uma superabundância de interpretações técnicas, morais e religiosas. E há por fim, para os detentores desses restos, a imperiosa necessidade de guardar segredo.

Somos levados a crer que a nossa civilização, ao atingir uma sabedoria que talvez tenha pertencido a uma civilização anterior, em condições diferentes, noutro estado de espírito, talvez tivesse o maior interesse em interrogar com seriedade a antiguidade para tornar mais rápida a sua própria progressão.

Finalmente pensamos o seguinte: o alquimista no fim do seu “trabalho” sobre a matéria assiste, segundo a lenda, a uma espécie de transformação na sua própria pessoa. Aquilo que se passa no seu crisol passa-se igualmente na sua consciência ou na sua alma. Há uma mudança de estado. Todos os textos tradicionais insistem nesse ponto, evocam o momento em que a “Grande Obra” se realiza e em que o alquimista se transforma num “homem desperto”. Parece-nos que esses velhos textos descrevem deste modo o termo de todo o conhecimento real das leis da matéria e da energia, incluindo o conhecimento técnico. É para a possessão de tal conhecimento que se precipita a nossa civilização. Não nos parece absurdo supor que os homens serão chamados, num futuro relativamente próximo, a “mudar de estado”, como o alquimista lendário, a sofrer qualquer transformação. A menos que a nossa civilização desapareça por inteiro um momento antes de ter atingido o fim, como é possível que tenham desaparecido outras civilizações. Também se podia dar o caso de que, no nosso último segundo de lucidez, não desesperássemos, pensando que se a aventura do espírito se repete, é sempre, de cada vez, num grau mais alto da espiral. Remeteríamos a outros milenários o cuidado de conduzir essa aventura até ao ponto final, até ao centro imóvel, e afundar-nos-íamos com esperança.

1 O autor de Le Mystère des Cathèdrales e de Les Demeures philosophales.

Um alquimista no café Procope, em 1953. – Conversa a propósito de Gurdjieff – Um homem que pretende saber que a pedra filosofal é uma realidade. – Bergáer arrasta-me a toda a velocidade para um estranho atalho. Aquilo que vejo liberta-me do imbecil desprezo pelo progresso. – O nosso pensamento secreto a respeito da alquimia: nem revelação, nem tentativa. – Rápida meditação sobre a espiral e a esperança.

Foi em Março de 1953 que encontrei pela primeira vez um alquimista. Isso passou-se no café Procope, que teve, na época, um curto período de vida. Foi um grande poeta que, na altura em que eu escrevia o meu livro sobre Gurdjieff, me preparou esse encontro e, depois disso, eu muitas vezes havia de tornar a ver esse homem singular, sem no entanto desvendar os seus segredos.

Eu tinha, a respeito da alquimia e dos alquimistas, ideias primárias, extraídas da imaginação popular, e estava longe de supor que ainda havia alquimistas. O homem que estava sentado na minha frente, na mesa de Voltaire, era jovem e elegante. Fizera profundos estudos clássicos, seguidos de estudos de química. Actualmente ganhava a vida no comércio e dava-se com muitos artistas, assim como com algumas pessoas da alta sociedade.

Não tenho diário, mas acontece-me, em determinadas ocasiões importantes, anotar as minhas impressões ou os meus sentimentos. Nessa noite, ao regressar a casa, escrevi:

“Que idade terá ele? Diz ter trinta e cinco. Isso espanta-me. A cabeleira branca, ondulada, cortada sobre o crânio como uma peruca. Inúmeras e profundas rugas numa carne rosada, num rosto cheio. Poucos gestos, e lentos, medidos, astutos. Um sorriso calmo e subtil. Olhos risonhos, mas que riem com indiferença. Tudo exprime outra idade. Nas suas frases nem a menor fenda, pausa, ou quebra de presença de espírito. Há qualquer coisa de esfinge atrás daquele rosto amável fora do tempo. Incompreensível. E não sou só eu a sentir isto. A.B., que o vê quase todos os dias há várias semanas, diz-me que jamais, nem por um segundo, o apanhou em falta de “objectividade superior”.

“O que o faz condenar Gurdjieff:

“1.o – Quem sente a necessidade de ensinar não vive inteiramente a sua doutrina e não atingiu o ponto culminante da iniciação.

“2.a – Na escola de Gurdjieff não existe intercessão material entre o aluno a quem se persuadiu da sua inutilidade e a energia que ele deve possuir para passar ao ser real. Essa energia – “essa vontade da vontade”, diz Gurdjieff – deve o aluno encontrá-la em si próprio, apenas em si próprio. Ora tal caminhada é parcialmente falsa e só pode conduzir ao desespero. Essa energia existe fora do homem, e é preciso captá-la. O católico engole a hóstia: captação ritual dessa energia. Mas se não tiverdes fé? Se não tendes fé, arranjai uma fogueira: é o princípio de toda a alquimia. Uma autêntica fogueira. Uma fogueira material. Tudo começa, tudo acontece pelo contacto com a matéria.

“3.o – Gurdjieff não vivia só, mas sempre rodeado, sempre em falanstério. “Há um caminho na solidão, há regatos no deserto”. Não há caminho nem regatos no homem misturado com os outros.

Faço perguntas a respeito da alquimia que devem parecer-lhe de uma assustadora estupidez. Sem o deixar transparecer

responde:

“Nada além da matéria, apenas o contacto com a matéria, o trabalho sobre a matéria, o trabalho com as mãos. Insiste muito neste ponto.

“- Gosta de jardinagem? Eis um belo começo, a alquimia é parecida com a jardinagem.

“- Gosta de pesca? A alquimia tem qualquer coisa de comum com a pesca.

“Trabalho de mulher e brincadeira de criança.

“Não é possível ensinar alquimia. Todas as grandes obras literárias que resistiram aos séculos têm qualquer coisa desse ensinamento. São a obra de homens adultos – verdadeiramente adultos – que falaram para as crianças, mas respeitando as leis do conhecimento adulto. Jamais se apanha uma grande obra em falta a respeito dos “princípios” . Mas o conhecimento desses princípios e o caminho que leva a esse conhecimento devem manter-se secretos. No entanto, há um dever de auxilio mútuo para os investigadores do primeiro grau.

“Cerca da meia-noite interrogo-o sobre Fulcanelli[1], e dá-me a entender que Fulcanelli não morreu:

“- Pode viver-se, diz-me, infinitamente mais tempo do que o homem não esclarecido o supõe. E pode mudar-se totalmente de aspecto. Eu sei-o. Os meus olhos sabem-no. mas trata-se de outro estado da matéria, diferente daquele que conhecemos. Esse estado permite, como todos os outros estados, mensurações. Os processos de trabalho e de mensuração são simples e não exigem aparelhos complicados: trabalho de mulher e brincadeira de criança…

Acrescenta:

“- Paciência, esperança, trabalho. E, seja qual for o trabalho, nunca se trabalha o bastante.

“Esperança: em alquimia, a esperança baseia-se na certeza de que há um objectivo. Não teria começado, disse ele, se não me tivessem provado claramente que esse objectivo existe e que é possível atingi-lo nesta vida.”

Tal foi o meu primeiro contacto com a alquimia. Se a tivesse abordado por meio da magia, creio que as minhas investigações não teriam ido longe: falta de tempo, falta de gosto pela erudição literária. Falta de vocação também: essa vocação que se apossa do alquimista, quando ele ainda se ignora como tal, no momento em que abre, pela primeira vez, um velho tratado. A minha vocação não é a de executar, mas a de compreender. Não é realizar, mas ver. Creio, como diz o meu velho amigo André Billy, que “compreender é tão belo como cantar,” mesmo se a compreensão for apenas fugitiva 1. Sou um homem apressado, como a maior parte dos meus contemporâneos. Tive o contacto mais moderno possível com a alquimia: uma conversa num botequim de Saint-Germain-des-Prés. Em seguida, quando pretendia dar um sentido mais completo ao que me dissera aquele jovem, encontrei Jacques Bergier, que não saía coberto de pó de um sótão cheio de velhos livros, mas de locais onde a vida do século se concentrou: laboratórios e escritórios de informações. Também Bergier procurava qualquer coisa no caminho da alquimia. Não era para fazer uma peregrinação ao passado. Esse homem extraordinário, completamente ocupado com os segredos da energia atómica, tomara aquele caminho para abreviar. Eu voava, agarrado às abas do seu casaco, por entre os textos veneráveis, concebidos por gente sensata apaixonada

No seu cárcere de Reading, Óscar Wilde descobre que a falta de atenção do espírito é o crime fundamental, que a atenção extrema desvenda o acordo perfeito entre todos os acontecimentos de uma vida, e também, possivelmente, num plano mais vasto, o acordo perfeito entre todos os elementos e todos os movimentos da Criação, a harmonia de todas as coisas. E exclama: “Tudo o que é compreendido está certo”. É a mais bela frase que conheço.

Pela lentidão, inebriada de paciência – eu voava a uma velocidade supersónica. Bergier gozava da confiança de alguns dos homens que, ainda hoje, se dedicam à alquimia, bem como da estima dos sábios modernos. Junto dele, em breve adquiri a certeza de que existem íntimos pontos de contacto entre a alquimia tradicional e a ciência de vanguarda. Vi a ciência lançar uma ponte entre dois mundos. Meti-me por essa ponte e verifiquei que ela se aguentava. Senti uma grande felicidade, uma calma profunda. Há muito refugiado no pensamento antiprogressista hinduísta, gurdjáeffiano, vendo o mundo de hoje como um princípio de Apocalipse, não esperando mais (e com grande desespero) do que um horroroso final dos tempos e não muito seguro no orgulho de estar à parte, eis que me era dado ver o velho passado e o futuro darem-se as mãos. A metafísica da alquimia, várias vezes milenária, escondia uma técnica finalmente compreensível, ou quase, no século xx. As pavorosas técnicas de hoje abriam-se sobre uma metafísica quase semelhante à dos tempos antigos. Que falsa poesia havia no meu refúgio! A imortal alma dos homens luzia com a mesma chama de cada lado da ponte.

Acabei por acreditar que os homens, num passado muito longínquo, tinham descoberto os segredos da energia e da matéria. Não apenas por meio de meditação, mas também de manipulação. Não apenas espiritualmente, mas tecnicamente. O espírito moderno, servindo-se de vias diferentes, pelos caminhos durante muito tempo desagradáveis, a meus olhos, da razão pura, da falta de religião, com processos diferentes e que durante muito tempo me tinham parecido maus, preparava-se por sua vez para descobrir os mesmos segredos. Interrogava-se a esse respeito, entusiasmava-se e inquietava-se simultaneamente. Tropeçava no essencial, exactamente como o espírito de elevada tradição.

Vi então que a oposição entre a “prudência” milenária e a “loucura” contemporânea era uma invenção da inteligência demasiado fraca e demasiado lenta, um produto de compensação para o intelectual incapaz de tanta velocidade quanta a sua época exige.

Há várias maneiras de aceder ao conhecimento essencial. E o nosso tempo tem algumas. As antigas civilizações tiveram as delas. Não falo apenas de conhecimento teórico.

Vi finalmente que, sendo as técnicas actuais mais poderosas, aparentemente, do que as técnicas de outrora, esse conhecimento essencial, que os alquimistas provavelmente já possuíam (e outros sábios antes deles), chegaria até nós com maior força ainda, maior peso, maiores perigos e maior número de exigências. Atingimos o mesmo ponto que os Antigos, mas a uma altura diferente. Em lugar de condenar o espírito moderno em nome da sensatez iniciática dos Antigos, ou em lugar de negar essa sensatez declarando que o conhecimento real começa com a nossa própria civilização, seria conveniente admirar e venerar o poder do espírito que, sob diferentes aspectos, torna a passar pelo mesmo ponto de luz, elevando-se em espiral. Em vez de condenar, repudiar, escolher, seria conveniente amar. O amor é tudo: a um tempo repouso e movimento.

Vamos submeter à vossa apreciação os resultados das nossas investigações sobre alquimia. Trata-se apenas, evidentemente, de esboços. Ser-nos-iam necessários dez ou vinte anos, e talvez faculdades que não possuímos, para dar ao assunto uma contribuição realmente positiva. No entanto, aquilo que fizemos, e a maneira como o fizemos, torna o nosso trabalho muito diferente das obras até aqui consagradas à alquimia. Encontrareis poucos esclarecimentos sobre a história e a filosofia desta ciência tradicional, mas algumas explicações sobre as inesperadas relações entre os sonhos dos velhos “filósofos químicos” e as realidades da física actual. É preferível revelarmos imediatamente as ideias que nos guiaram.

A alquimia, segundo a nossa opinião, poderia ser um dos mais importantes resíduos de uma ciência, de uma técnica e de uma filosofia pertencentes a uma civilização desaparecida. Aquilo que descobrimos na alquimia, à luz do saber contemporâneo, não é de molde a fazer-nos acreditar que uma técnica tão subtil, complicada e precisa possa ter sido o resultado de uma “revelação divina” caída do céu. Não quer dizer que desprezemos toda a ideia de revelação. Mas, ao estudarmos os santos e os grandes místicos, jamais podemos chegar à conclusão de que Deus fala aos homens em linguagem técnica: “Coloca o teu crisol sob a luz polarizada, ó meu Filho! Lava as escórias com água ultradestilada!”

Também não acreditamos que a técnica alquimista se possa ter desenvolvido por meio de tentativas, pequenos passatempos de ignorantes, fantasias de maníacos do crisol, até atingir aquilo a que temos de chamar a desintegração atómica. Antes nos sentiríamos dispostos a acreditar que existem na alquimia restos de uma ciência desaparecida, difíceis de compreender e de utilizar, por faltar o contexto. A partir desses restos há inevitavelmente tentativas, mas em direcção determinada. Há também uma superabundância de interpretações técnicas, morais e religiosas. E há por fim, para os detentores desses restos, a imperiosa necessidade de guardar segredo.

Somos levados a crer que a nossa civilização, ao atingir uma sabedoria que talvez tenha pertencido a uma civilização anterior, em condições diferentes, noutro estado de espírito, talvez tivesse o maior interesse em interrogar com seriedade a antiguidade para tornar mais rápida a sua própria progressão.

Finalmente pensamos o seguinte: o alquimista no fim do seu “trabalho” sobre a matéria assiste, segundo a lenda, a uma espécie de transformação na sua própria pessoa. Aquilo que se passa no seu crisol passa-se igualmente na sua consciência ou na sua alma. Há uma mudança de estado. Todos os textos tradicionais insistem nesse ponto, evocam o momento em que a “Grande Obra” se realiza e em que o alquimista se transforma num “homem desperto”. Parece-nos que esses velhos textos descrevem deste modo o termo de todo o conhecimento real das leis da matéria e da energia, incluindo o conhecimento técnico. É para a possessão de tal conhecimento que se precipita a nossa civilização. Não nos parece absurdo supor que os homens serão chamados, num futuro relativamente próximo, a “mudar de estado”, como o alquimista lendário, a sofrer qualquer transformação. A menos que a nossa civilização desapareça por inteiro um momento antes de ter atingido o fim, como é possível que tenham desaparecido outras civilizações. Também se podia dar o caso de que, no nosso último segundo de lucidez, não desesperássemos, pensando que se a aventura do espírito se repete, é sempre, de cada vez, num grau mais alto da espiral. Remeteríamos a outros milenários o cuidado de conduzir essa aventura até ao ponto final, até ao centro imóvel, e afundar-nos-íamos com esperança.

1 O autor de Le Mystère des Cathèdrales e de Les Demeures philosophales.

Conhecem-se mais de cem mil livros ou manuscritos alquímicos. Essa imensa literatura, à qual se consagraram espíritos de categoria, homens importantes e honestos, essa imensa literatura que afirma solenemente a sua adesão a factos, a realidades experimentais, nunca foi explorada cientificamente. O pensamento reinante, católico no passado, racionalista actualmente, manteve em redor desses textos uma conspiração de ignorância e desprezo. Existem cem mil livros que possivelmente contêm alguns dos segredos da energia e da matéria. Se isso não é verdade, eles pelo menos assim o proclamam. Os príncipes, os reis e as repúblicas encorajaram inúmeras expedições a países longínquos, financiaram investigações científicas de todos os géneros. Nunca uma equipa de criptógrafos, historiadores, linguístas e sábios, físicos, químicos, matemáticos e biologistas se reuniu numa biblioteca alquímica completa com a missão de verificar o que há de verdadeiro e de utilizável nesses velhos tratados. Isso é que é inconcebível. Que tais limitações do espírito sejam possíveis e duradoiras, que sociedades humanas muito civilizadas e, como a nossa, aparentemente sem preconceitos de qualquer espécie, possam manter esquecidos nas suas águas-furtadas cem mil livros e manuscritos com a etiqueta de: “Tesouro,” eis o que convencerá os mais cépticos de que vivemos no fantástico.

As raras investigações sobre alquimia são feitas quer por místicos que procuram nos textos uma confirmação das suas atitudes espirituais, quer por historiadores sem o menor contacto com a ciência e as técnicas.

Os alquimistas falam da necessidade de destilar milhares de vezes a água que servirá para a preparação do Elixir. Ouvimos dizer a um historiador especializado que essa operação era demencial. Ignorava tudo a respeito da água pesada e dos métodos que se empregam para enriquecer a água simples em água pesada. Ouvimos um erudito afirmar que a refinação e a purificação indefinidamente repetidas de um metal ou de um metalóide não alteram absolutamente nada as propriedades deste; seria então necessário ver nas recomendações alquímicas uma mística aprendizagem da paciência, um gesto ritual comparável ao desfiar das contas do rosário. E, no entanto, é com essa refinação por meio de uma técnica descrita pelos alquimistas e a que hoje se chama “a fusão de zona” que se prepara o germânio e o silício puros dos transistores. Actualmente sabemos, graças a esses trabalhos sobre os transistores, que, se se purificar profundamente um metal e introduzir em seguida alguns milionésimos de grama de impurezas cuidadosamente escolhidas, concede-se ao corpo tratado novas e revolucionárias propriedades. Não desejamos multiplicar os exemplos, mas gostaríamos de fazer compreender até que ponto seria conveniente um exame verdadeiramente metódico da literatura alquímica. Seria um trabalho imenso, que exigiria dezenas de anos de trabalho e dezenas de investigadores pertencentes a todas as disciplinas. Nem Bergier nem eu pudemos sequer esboçar semelhante trabalho, mas se o nosso volumoso e desajeitado livro pudesse um dia decidir um mecenas a permitir esse trabalho, não teríamos perdido completamente o nosso tempo.

Ao estudarmos um pouco os textos alquímicos, constatámos que estes são geralmente modernos em relação à época em que foram escritos, ao passo que as outras obras de ocultismos estão em atraso. Por outro lado, a alquimia é a única prática pararreligiosa que, de facto, enriqueceu o nosso conhecimento real.


Alberto o Grande (1193-1280) conseguiu preparar a potassa cáustica. Foi o primeiro a descrever a composição química do cinabre, do alvaiade e do mínio.

Raimundo Lull (1235-1315) preparou o bicarbonato de potássio.

Teofrasto Paracelse (1493-1541) foi o primeiro a descrever o zinco, desconhecido até então. Introduziu igualmente na medicina o uso dos compostos químicos.

Giambattista della Porta (1541-1615) preparou o óxido de estanho.

Jean-Baptiste Van Helmont (1577-1644) descobriu a existência dos gases.

Basile Valentin (do qual ninguém jamais soube a verdadeira identidade) descobriu no século xvII o ácido sulfúrico e o ácido clorídrico.

Johann Rudolf Glauber (1604-1668) descobriu o sulfato de sódio.

Brandt (falecido em 1692) descobriu o fósforo.

Johann Friedrich Boetticher (1682-1719) foi o primeiro europeu a fazer a porcelana.

Blaise Vigenère (1523-1596) descobriu o ácido benzóico.


Tais são alguns dos trabalhos alquímicos que enriquecem a humanidade no momento em que a química progride. À medida que se desenvolvem outras ciências, a alquimia parece seguir e muitas vezes preceder o progresso. Le Breton, nas suas Clefs de la Philosophie Spagyrzque, em 1722, fala do magnetismo de maneira mais do que inteligente e frequentemente antecipa a respeito das descobertas modernas. O Padre Castel, em 1728, no momento em que as ideias sobre a gravitação começam a divulgar-se, fala desta e das suas relações com a luz em termos que, dois séculos mais tarde, ecoarão estranhamente ao pensamento de Einstein:

“Eu disse que, se subtraíssemos o peso do Mundo, subtrairíamos simultaneamente a luz. De resto a luz e o som, e todas as outras qualidades sensíveis, são uma consequência e como que um resultado da mecânica, e por consequência do peso dos corpos naturais que são mais ou menos luminosos ou sonoros, conforme têm maior peso e elasticidade.”

Nos tratados alquímicos do nosso século vê-se aparecer frequentemente, mais depressa do que nas produções universitárias, as últimas descobertas da física nuclear, e é provável que os tratados de amanhã mencionem as teorias físicas e matemáticas o mais abstractas possível.

É evidente a distinção entre a alquimia e as falsas ciências como a radiestesia, que introduz ondas ou raios nas suas publicações depois de a ciência oficial as ter descoberto. Tudo nos leva a pensar que a alquimia é susceptível de fornecer uma contribuição importante aos conhecimentos e às técnicas do futuro baseadas na estrutura da matéria.

Constatámos igualmente, na literatura alquímica, a existência de um número impressionante de textos puramente delirantes.

Pretenderam por vezes explicar esse delírio por meio da psicanálise (Jung: Psicologia e Alquimia, ou Herbert Silberer: Problemas do Misticismo). Como a alquimia contém uma doutrina metafísica e supõe uma atitude mística, a maior parte das vezes os historiadores, os curiosos e sobretudo os ocultistas obstinaram-se em interpretar esses conceitos demenciais no sentido de uma revelação supranatural, de uma profecia inspirada. Observando melhor, pareceu-nos prudente tomar, a par dos textos técnicos e dos textos de sabedoria, os textos demenciais por textos demenciais. Pareceu-nos também que essa demência do adepto experimentador podia ter uma explicação material, simples, satisfatória. O mercúrio era frequentemente utilizado pelos alquimistas. O seu valor é tóxico e o envenenamento crónico provoca o delírio. Teoricamente, os recipientes empregados eram absolutamente herméticos, mas o segredo desse encerramento não é divulgado a todos os adeptos, e a loucura pôde apossar-se de mais de um “filósofo químico”.

Por fim, ficámos impressionados com o aspecto criptogâmico da literatura alquímica. Blaise Vigenère, que citámos mais atrás, inventou códigos aperfeiçoadíssimos e métodos de cifragem dos mais engenhosos. As suas invenções nesta matéria ainda hoje são utilizadas. É provável que Blaise Vigenère tenha tomado contacto com essa ciência da cifra ao tentar interpretar os textos alquímicos. Seria conveniente acrescentar às equipas de investigadores que desejamos ver reunidas especialistas do deciframento.

“A fim de dar um exemplo mais evidente, escreve René Alleau, servir-nos-emos do jogo do xadrez, do qual conhecemos a relativa facilidade das regras e dos elementos, assim como a indefinida variedade das combinações. Se supusermos que o conjunto dos tratados acroamáticos da alquimia se nos apresenta como outras tantas partes anotadas numa linguagem convencional, é preciso admitir em primeiro lugar, com a maior honestidade, que ignoramos tanto as regras do jogo como a cifra utilizada. De contrário, afirmamos que a indicação criptográfica é composta por sinais directamente compreensíveis para qualquer indivíduo, o que é precisamente a ilusão imediata que deve provocar um criptograma bem composto. Portanto a prudência aconselha-nos a não nos deixarmos seduzir pela tentação de um sentido claro, e a estudarmos esses textos como se se tratasse de uma linguagem desconhecida.

“Aparentemente, tais mensagens só se dirigem a outros jogadores, a outros alquimistas que somos levados a crer que já possuem, por qualquer processo diferente da tradição escrita, chave necessária para a compreensão exacta dessa linguagem.”

Por muito longe que remontemos na investigação do passado, encontraremos manuscritos alquímicos. Nicolas de Valois, no século xv, deduzia por isso que as alterações, os segredos e as técnicas da libertação da energia foram descobertas pelos homens antes mesmo da escrita. A arquitectura precedeu a escrita. Por isso vemos a alquimia muito intimamente ligada à arquitectura. Um dos textos mais significativos da alquimia, cujo autor é um tal Esprit Gobineau de Montluisant, intitula-se: “Explicações muito curiosas dos enigmas e figuras hieroglíficas que existem no portal de Notre-Dame de Paris”. As obras de Fulcanelli são consagradas ao “Mistério das Catedrais” e às minuciosas descrições das “Moradas Filosofais”. Algumas construções medievais testemunhariam o hábito imemorial de transmitir por meio da arquitectura a mensagem da alquimia, que data de eras infinitamente longínquas da humanidade.

Newton acreditava na existência de uma cadeia de iniciados alastrando no tempo até uma antiguidade muito remota, e que teriam conhecido os segredos das alterações e da desintegração da matéria. O sábio atomista inglês Da Costa Andrade, num discurso pronunciado diante dos seus pares por ocasião do tricentenário de Newton, em Cambridge, em Julho de 1946, não hesitou em dar a entender que o inventor da gravitação talvez fizesse parte de uma cadeia e apenas revelara ao mundo uma pequena parte do seu saber:

“Não posso esperar, disse, convencer os cépticos de que Newton tinha poderes de profecia ou de visão especial que lhe possam ter revelado a energia atómica, mas direi simplesmente que as frases que vou citar ultrapassam em muito, na opinião de Newton ao falar da transmutação alquímica, o receio de um transtorno no comércio mundial depois da síntese do ouro. Eis o que Newton escreveu:

“A forma como o mercúrio pode ser assim impregnado foi mantida em segredo por aqueles que sabiam, e constitui provauelmente um acesso para qualquer coisa de mais nobre do que a fabricação do ouro e que não pode ser comunicada sem que o mundo corra um imeso perigo, caso os escritos de Hermes digam a verdade.”

“E, mais adiante, Newton escreve: “Existem outros grandes mistérios além da transmutação dos metais, se os grandes mestres não se gabam. Só eles conhecem esses segredos”.

“Reflectindo no sentido profundo desta passagem, lembrai-vos de que Newton fala com as mesmas reticências e a mesma prudência anunciadora nas suas próprias descobertas de óptica”.

De que passado viriam esses grandes mestres invocados por Newton, e de que passado teriam eles próprios extraído a sua ciência?

“Se subi tão alto, diz Newton, é porque estava sobre os ombros de gigantes.”

Atterbury, contemporâneo de Newton, escrevia:

“A modéstia ensina-nos a falar com respeito dos Antigos, sobretudo quando não conhecemos profundamente as suas obras. Newton, que quase as sabia de cor, tinha por eles o maior respeito e considerava-os como homens de profundo génio e de um espírito superior, que tinham levado muito mais longe as suas descobertas de todos os géneros do que nos possa parecer actualmente, segundo o que resta dos seus escritos. Há mais obras antigas perdidas do que conservadas e talvez as nossas novas descobertas não valham as perdas antigas.”

Para Fulcanelli, a alquimia seria o elo de ligação com as civilizações desaparecidas desde há milénios e ignoradas pelos arqueólogos. Evidentemente, nenhum arqueólogo considerado honesto e nenhum historiador de igual reputação admitirá a existência no passado de civilizações que tenham possuído uma ciência e técnicas superiores às nossas. Mas uma ciência e técnicas avançadas simplificam ao máximo a aparelhagem, e talvez os vestígios estejam sob os nossos olhos sem que sejamos capazes de os ver como tais. Nenhum arqueólogo e nenhum historiador honesto, que não tenha recebido uma formação científica em alto grau, poderá efectuar pesquisas susceptíveis de nos fornecer a esse respeito qualquer esclarecimento. A separação das disciplinas, que foi uma necessidade do fabuloso progresso contemporâneo, talvez nos dissimule qualquer coisa de fabuloso no passado.

Sabe-se que foi um engenheiro alemão, encarregado da construção dos esgotos de Bagdade, que descobriu na amálgama de objectos do museu local, sob a vaga etiqueta de “objectos de culto”, pilhas eléctricas fabricadas dez séculos antes de Volta, durante a dinastia dos Sassanides.

Enquanto a arqueologia apenas for praticada por arqueólogos, não saberemos se a “noite dos tempos” era obscura ou luminosa.

“Jean-Fredérich Schweitzer, dito Helvétius, violento adversário da alquimia, conta que na manhã de 27 de Dezembro de 1666 se apresentou em sua casa um estrangeiro. Era um homem de aparência honesta e séria, e de expressão autoritária, vestido com um simples capote, como um “mennonita”.

Depois de perguntar a Helvétius se acreditava na pedra filosofal (ao que o famoso médico respondeu negativamente), o estrangeiro abriu uma pequena caixa de marfim “que continha três pedaços de uma substância semelhante ao vidro ou à opala”. O seu proprietário declarou tratar-se da famosa pedra, e que com uma tão mínima quantidade podia produzir vinte toneladas de ouro. Helvétius pegou num dos fragmentos e, depois de agradecer ao visitante a sua amabilidade, pediu-lhe que lhe desse um bocado. O alquimista recusou num tom brusco, acrescentando com mais cortesia que, mesmo a troco de toda a fortuna de Helvétius, não se poderia separar da menor parcela desse mineral, por uma razão que não lhe era permitido divulgar. Instado para que desse uma prova das suas palavras, realizando uma transmutação, o estrangeiro respondeu que voltaria três semanas mais tarde e mostraria a Helvétius uma coisa susceptível de o assombrar. Voltou pontualmente no dia marcado, mas recusou executar a operação, afirmando que lhe era proibido revelar o segredo. Condescendeu no entanto em dar a Helvétius um pequeno fragmento da pedra, “não maior do que um grão de mostarda”. E como o médico emitisse a dúvida de que uma tão ínfima quantidade pudesse produzir o menor efeito, o alquimista partiu o corpúsculo em dois, deitou uma metade fora e entregou-lhe a outra dizendo: “Aqui está justamente aquilo de que precisa”.

“O nosso sábio viu-se então obrigado a confessar que durante a primeira visita do estrangeiro conseguira apoderar-se de algumas partículas da pedra, as quais tinham transformado o chumbo, não em ouro, mas-em vidro. – “Devia ter protegido a pedra com cera amarela, respondeu o alquimista, isso ajudá-la-ia a penetrar o chumbo e a transformá-lo em ouro”. O homem prometeu voltar de novo no dia seguinte de manhã, às nove horas, e realizar o milagre – mas não apareceu, e no dia a seguir também não. Posto isto, a mulher de Helvétius persuadiu-o a tentar ele próprio a transmutação:

“Helvétius procedeu de acordo com as instruções do estrangeiro. Derreteu três dracmas de chumbo, envolveu a pedra em cera, e deixou-a cair no metal líquido. E este transformou-se em ouro! “Levámo-lo imediatamente ao ourives, que declarou tratar-se do ouro mais fino que jamais vira, e propôs pagá-lo a cinquenta florins a onça”. Helvétius, ao concluir a sua narrativa, disse-nos que a barra de ouro continuava na sua mão, prova tangível da transmutação. “Possam os Santos Anjos do Senhor velar por ele (o alquimista anónimo) como sobre um manancial de bênçãos para a cristandade. Tal é a nossa prece constante, por ele e por nós”.

“A novidade espalhou-se como um rastilho de pólvora. Spinoza, que não podemos incluir no número dos ingénuos, quis saber a verdade da história. Fez uma visita ao ourives que avaliara o ouro. O relatório foi mais do que favorável: durante a fusão, a prata incorporada à mistura transformara-se igualmente em ouro. O ourives, Brechtel, era moedeiro do duque de Orange. Sabia sem dúvida do seu ofício. Parece difícil acreditar que ele possa ter sido vítima de um subterfúgio, ou que tenha pretendido enganar Spinoza. Spinoza dirigiu-se então a casa de Helvétius, que lhe mostrou o ouro e o crisol que servia para a operação. Aderiam ainda ao interior do recipiente restos do precioso metal; como os outros, Spinoza ficou convencido de que a transmutação se operara realmente.”

A transmutação, para o alquimista, é um fenómeno secundário, realizado apenas a título de demonstração. É difícil formar uma opinião sobre a realidade dessas transmutações, embora diversas observações, como a de Helvétius ou a de Van Helmont, por exemplo, pareçam surpreendentes. Pode alegar-se que a arte do prestidigitador não tem limites, mas será possível que tenham sido consagrados a uma aldrabice quatro mil anos de pesquisas e cem mil volumes ou manuscritos? Propomos outra coisa, como mais adiante se verá. Propomo-lo timidamente, pois o peso da opinião científica já formada é de temer. Tentaremos descrever o trabalho do alquimista que consegue a fabricação da “pedra” à “pólvora de projecção”, e veremos que a interpretação de certas operações choca o nosso actual saber sobre a estrutura da matéria. Mas não é evidente que o nosso conhecimento dos fenómenos nucleares seja perfeito, definitivo. Em especial a catálise pode intervir nestes fenómenos de uma forma ainda desconhecida para nós”.

Não é impossível que certas misturas naturais produzam, sob o efeito dos raios cósmicos, reacções nucleo-catalípticas em grande escala, susceptíveis de conduzir a uma transmutação compacta dos elementos. Seria necessário ver nisso uma das chaves da alquimia e a razão pela qual o alquimista repete indefinidamente as suas manipulações, até ao momento em que as condições cósmicas se reúnem.

A objecção é a seguinte: se tais transmutações são possíveis, que virá a ser da energia libertada? Muitos dos alquimistas deveriam então ter feito ir pelos ares a cidade que habitavam e algumas dezenas de milhares de quilómetros quadrados da sua pátria nessa mesma ocasião. Ter-se-iam produzido numerosas e imensas catástrofes.

Os alquimistas respondem: é justamente por se terem dado semelhantes catástrofes num passado longínquo que receamos a terrível energia contida na matéria e que mantemos secreta a nossa ciência. Além disso, a “Grande Obra” é atingida por fases progressivas e aquele que, ao fim de dezenas e dezenas de anos de manipulações e de ascese, aprende a desencadear as forças nucleares, aprende igualmente quais as precauções que convém tomar para evitar o perigo.

Argumento válido? Talvez. Os físicos de agora admitem que, em certas condições, a energia de uma transmutação nuclear poderia ser absorvida por partículas especiais a que eles chamam neutrinos e antineutrinos[4]. Parece agora comprovada a existência do neutrino. Talvez haja tipos de transmutação que libertam apenas um pouco de energia, ou nas quais a energia libertada se evola sob a forma de neutrinos. Voltaremos a este assunto.

Eugène Canseliet, discípulo de Fulcanelli e um dos melhores especialistas actuais sobre alquimia, deteve-se sobre uma passagem de um estudo que Jacques Bergier escrevera como prefácio para uma das obras clássicas da Biblioteca Mundial. Tratava-se de uma antologia da poesia do século xvI. Nesse prefácio, Bergier fazia alusão aos alquimistas e ao seu desejo de segredo. Escrevia: “Sobre este ponto especial é difícil não lhes dar razão. Se existe um processo que permite fabricar bombas de hidrogénio num fogão de cozinha, é francamente preferível que esse processo não seja revelado”.

Eugène Canseliet respondeu-nos então: “Acima de tudo seria necessário que não se tomasse isto por um gracejo. Tendes toda a razão, e eu estou em boa posição para afirmar que é possível atingir a desintegração atómica partindo de um mineral relativamente comum e barato, e isto por um processo de operações que apenas exige uma boa chaminé, um forno de fusão de carvão, alguns tubos de combustão Meker e quatro garrafas de gás butano”.

Mesmo na física nuclear, não está excluído que se possam obter resultados importantes por meio de processos simples.

É o futuro de toda a ciência e de toda a técnica.

“Podemos mais do que aquilo que sabemos”, dizia Roger Bacon. Mas acrescentava esta frase que poderia ser um adágio alquímico: “Embora nem tudo seja permitido, tudo é possível”.

Para o alquimista, é preciso recordá-lo constantemente, poder sobre a matéria e a energia não passa de uma realidade acessória. O verdadeiro objectivo das operações alquímicas, que talvez sejam o resíduo de uma ciência muito antiga pertencente a uma civilização desaparecida, é a transformação do próprio alquimista, o seu acesso a um estado de consciência superior. Os resultados materiais são apenas as promessas do resultado final, que é espiritual. Tudo se dirige para a transmutação do próprio homem, para a sua divinização, a sua fusão com a energia divina fixa, da qual irradiam todas as energias da matéria. A alquimia é a ciência “com consciência” de que Rabelais fala. É uma ciência que hominiza, para repetir uma expressão do P.e Teilhard de Chardin, que dizia: “A verdadeira física é a que conseguir integrar o Homem total numa representação coerente do mundo”.

“Sabei, dizia um mestre alquimista, sabei vós todos, os Investigadores dessa Arte, que o Espírito é tudo, e que se nesse Espírito não está encerrado outro Espírito semelhante, esse todo para nada serve.”


1741

La Tourbe des Philosophes, in “Biblioteca dos Filósofos Químicos”,Paris.

1 Aspects de lÁlchimie Traditionnelle, Éditions de Minuit, Paris

2 Newton Tercentenary Celebrations. Universidade de Cambridge, 1947

3 Estão em curso, em vários países, trabalhos sobre a utilização de partículas (produzidas por poderosos aceleradores) para catalisar a fusão do hidrogénio.

4 Não se confunda com o neutrão, elemento do núcleo. (N. da T.)


Era em 1933. O pequeno estudante judeu tinha um nariz pontiagudo, encimado por uns óculos de lentes redondas atrás das quais brilhava um olhar rápido e frio. Sobre o crânio redondo começava a despontar uma cabeleira semelhante a uma penugem de pintainho. Um sotaque pavoroso, agravado por gaguejos, dava às suas frases o tom cómico e a baralhada do grasnar de patos num charco. Depois de o conhecerem um pouco melhor, dava a impressão de que bailava dentro desse homenzinho desgracioso uma inteligência bulímica, atenta, sensível, extraordinariamente rápida, de que estava cheio de malícia e de uma pueril incapacidade para viver, como um enorme balão vermelho preso por um fio ao pulso de uma criança.

“Pretende então tornar-se alquimista?”, perguntou o venerando professor ao estudante Jacques Bergier, que mantinha a cabeça baixa, sentado na beira de um cadeirão, com uma pasta cheia de papelada sobre os joelhos. O venerando era um dos maiores químicos franceses.

“Não o compreendo, senhor”, disse o estudante, vexado.

Tinha uma memória prodigiosa, e recordou-se de ter visto, aos seis anos, uma gravura alemã que representava dois alquimistas a trabalhar, no meio de uma confusão de retortas, de pincas, de crisóis, de foles. Um deles, esfarrapado, vigiava uma fogueira, de boca aberta, e outro, desgrenhado, coçava a cabeça titubeando no meio de toda aquela desordem.


O professor consultou uns documentos:

“Durante os seus dois últimos anos de trabalho interessou-se sobretudo pelo curso livre de física nuclear de Jean Thibaud. Esse curso não conduz a qualquer diploma nem certificado. Exprime o desejo de prosseguir nesse sentido ainda me seria possível compreender essa curiosidade da parte de um físico. Mas o senhor está destinado à química. Tencionará, por acaso. aprender a fabricar ouro?

– Senhor – disse o estudante judeu erguendo as pequenas mãos gordas e mal tratadas -, eu acredito no futuro da química nuclear. Penso que, num futuro próximo, serão realizadas transmutações industriais.

– Isso parece-me delirante.

– Mas, senhor. . . ”

Por vezes detinha-se no início de uma frase e começava a repetir esse início, como um gramofone avariado, não por falta de atenção, mas porque o seu espírito divagava de forma inconfessável pelo reino da poesia. Sabia de cor milhares de versos e todos os poemas de Kipling:

Copiaram tudo o que podiam entender,

Mas não podiam alcançar o meu pensamento;

Por isso deixarei-os para trás, sem fôlego,

E pensando com ano e meio de atraso…

– Mas, mesmo se V. Ex.a não acredita nas transmutações, deveria acreditar na energia nuclear. Os imensos recursos potenciais do núcleo. . .

– Ta ta ta – exclamou o professor. – Isso é primário e infantil. Aquilo a que os físicos chamam energia nuclear é uma constante de integração nas suas equações. A consciência é o principal motor dos homens. Mas não é a consciência que faz andar as locomotivas, não é verdade? Por isso, sonha-se com uma máquina accionada pela energia nuclear… Não, meu rapaz.”

O rapaz engolia a saliva.

– Desça à Terra e pense no seu futuro. O que o incita, de momento, pois não o julgo saído da infância, é um dos mais velhos sonhos do homem: o sonho alquímico. Leia novamente Berthelot. Ele descreve muito bem essa quimera da transmutação da matéria. As suas notas não são lá muito, muito brilhantes. Dou-lhe um conselho: entre o mais depressa possível para a indústria. Faça um estágio numa refinaria de açúcar. Três meses numa fábrica pô-lo-ão de novo em contacto com a realidade. Precisa disso. Falo-lhe como um pai.”

O filho indigno agradeceu gaguejando, e saiu de nariz no ar, a enorme pasta debaixo do braço curto. Era um obstinado: pensou que era necessário tirar partido daquela conversa, mas que o mel era melhor do que o açúcar. Continuaria a estudar os problemas do núcleo atómico. E documentar-se-ia a respeito de alquimia.

Foi assim que o meu amigo Jacques Bergier decidiu prosseguir uns estudos considerados inúteis e completá-los com outros estudos considerados delirantes. As necessidades da vida, a guerra e os campos de concentração afastaram-no um pouco do estudo nuclear. No entanto, enriqueceu-o com algumas contribuições apreciadas pelos especialistas. Durante as suas investigações, os sonhos dos alquimistas e as realidades da física matemática misturaram-se mais de uma vez. Mas no domínio científico operaram-se grandes alterações a partir de 1933, e o meu amigo teve cada vez menos a sensação de navegar contra a corrente.

De 1934 a 1940, Jacques Bergier foi o colaborador de André Helbronner, um dos homens notáveis da nossa época. Helbronner, que foi assassinado pelos nazis em Buchenwald, em Março 1944, fora, em França, o primeiro professor universitário a ensinar a químico-física. Essa ciência, que é uma fronteira entre duas disciplinas, deu origem, mais tarde, a muitas outras ciências: a electrónica, a nucleónica, a estereotrónica[1]. Helbronner viria depois a receber a grande medalha de ouro do Instituto Franklin pelas suas descobertas sobre os metais coloidais. Interessou-se igualmente pela liquefação dos gases, pela aeronáutica e pelos raios ultravioletas.

Em 1934 consagrou-se à física nuclear e montou, com o auxílio de grupos industriais, um laboratório de pesquisas nucleares, no qual, até ao ano de 1940, se obtiveram resultados de interesse considerável. Além disso, Helbronner era árbitro dos tribunais em todas as questões relacionadas com a transmutação dos elementos, e por esse motivo é que Jacques Bergier teve ocasião de conhecer um certo número de falsos alquimistas, escroques ou iluminados, e um verdadeiro alquimista, um autêntico mestre.

O meu amigo nunca soube o verdadeiro nome desse alquimista, e mesmo que o soubesse evitaria dar excessivos esclarecimentos. O homem de quem vamos falar há já muito tempo que desapareceu, sem deixar rastos visíveis. Entrou em clandestinidade e cortou voluntariamente todos os contactos com a sua época. Bergier crê que se tratava simplesmente do homem que, sob o pseudónimo de Fulcanelli, escreveu por volta de 1920 dois livros estranhos e admiráveis: Les Demeures Philosophales e Le Mystère des Cathédrales. Estes livros foram editados sob a vigilância de Eugène Canseliet, que nunca revelou a identidade do autor. Figuram, sem dúvida alguma, entre as obras mais importantes sobre alquimia. Exprimem um conhecimento e uma sabedoria superiores, e conhecemos mais de um espírito notável que venera o nome lendário de Fulcanelli.

“Poderia ele, escreve Eugène Canseliet, uma vez atingido o auge do conhecimento recusar obediência às ordens do Destino? Ninguém é profeta na sua terra. talvez este velho adágio dê a razão oculta da alteração que provoca, na vida solitária e estudiosa do filósofo, a chama da revelação. Sob o efeito dessa chama divina, o homem já velho é inteiramente consumido. Nome, família, pátria, todas as ilusões, todos os erros, todas as vaidades caem como pó. E dessas cinzas, como a fénix dos poetas, uma nova personalidade renasce. Pelo menos, a tradição filosófica assim o diz.

“O meu mestre sabia-o. Desapareceu quando soou a hora fatídica, quando o sinal foi dado. Quem osaria subtrair-se à lei?

“Eu próprio, apesar do sofrimento de uma separação dolorosa mas inevitável, se de mim se apossasse a feliz exaltação que obrigou o meu mestre a fugir das homenagens do mundo, sei que não agiria de outra forma.”

Eugène Canseliet escreveu estas linhas em 1925. O homem que o encarregava de editar as suas obras ia mudar de aspecto e de ambiente. Numa tarde de Junho de 1937, Jacques Bergier julgou ter excelentes motivos para pensar que se encontrava em presença de Fulcanelli.

Foi a pedido de André Helbronner que o meu amigo se encontrou com a misteriosa personagem, no ambiente prosaico de um laboratório de experiências da Sociedade do Gás de Paris. Eis, com exactidão, a conversa que houve:

– André Helbronner, de quem V. Ex.a, segundo creio, é o assistente, anda em busca da energia nuclear. Ele teve a amabilidade de me manter ao corrente de alguns dos resultados obtidos, particularmente da aparição da radioactividade correspondente à do polónio, quando um filamento de bismuto é volatilizado por uma descarga eléctrica no deutério a alta pressão. Estão muito perto do êxito, aliás como outros sábios contemporâneos. Ser-me-á permitido pô-los de sobreaviso? Os trabalhos a que se dedicam, bem como os seus colegas, são terrivelmente perigosos. Não são apenas os senhores que correm perigo. Este é de recear para a humanidade inteira. A libertação da energia nuclear é mais fácil do que pensam. E a radioactividade artificialmente produzida pode envenenar a atmosfera do planeta dentro de poucos anos. Além disso, podem ser fabricádos explosivos atómicos a partir de alguns gramas de metal, e arrasar cidades. Posso dizer-lhe com sinceridade: há muito que os alquimistas o sabem.

Bergier tentou interromper, protestando. Os alquimistas e a física moderna! la lançar-se em sarcasmos, quando o outro o interrompeu:

– Sei o que me vai dizer, mas não interessa. Os alquimistas desconheciam a estrutura do núcleo, desconheciam a electricidade, não possuíam qualquer processo de detecção. Por isso nunca puderam realizar qualquer transmutação, nunca puderam libertar a energia nuclear. Não tentarei provar-lhes o que agora vou declarar, mas peço-lhe que o repita ao Sr. Helbronner: para desencadear as forças atómicas bastam disposições geométricas de materiais extremamente puros, sem que seja necessário utilizar a electricidade ou a técnica do vácuo. Limitar-me-ei em seguida a fazer-lhe uma pequena leitura.

O homem retirou de cima da sua secretária o livro de Frédéric Soddy, L’interprètation du Radium, abriu-o e leu:

“Penso que existiram no passado civilizações que tiveram conhecimento da energia do átomo e que uma má aplicação dessa energia as destruiu totalmente.”


Depois continuou:

– Peço-lhe que acredite que sobreviveram algumas técnicas parciais. Peço-lhe também que medite no facto de que os alquimistas juntavam às suas pesquisas preocupações morais e religiosas, ao passo que a física moderna surgiu no século xvIII como resultado do divertimento de alguns nobres e de alguns ricos libertinos. Ciência sem consciência… Julguei meu dever avisar alguns investigadores, aqui e além, mas não tenho a menor esperança de ver esse aviso produzir efeitos. Aliás, não tenho necessidade de esperar.

Bergier nunca mais esqueceria o som daquela voz precisa, metálica e digna.

Permitiu-se fazer uma pergunta:

– Se V. Ex.a também é alquimista, não posso acreditar que passe o tempo tentando fabricar ouro, como Dunikovski ou o doutor Miethe. Há um ano que tento documentar-me sobre alquimia, e vejo-me rodeado de charlatães ou de interpretações que me parecem fantasistas. Poderá V. Ex.a dizer-me em que consistem as suas investigações?

– Pede-me para resumir, em quatro minutos, quatro mil anos de filosofia e os esforços de toda a minha vida. Pede-me, além disso, para traduzir em linguagem clara conceitos para os quais a linguagem clara não é feita. Apesar de tudo posso dizer-lhe o seguinte: não ignora que, na ciência oficial em progresso, o papel do observador se torna cada vez mais importante. A relatividade, o princípio da incerteza mostram-nos até que ponto o observador de hoje intervém nos fenómenos. O segredo da alquimia é o seguinte: existe uma forma de manipular a matéria e a energia de maneira a produzir aquilo a que os cientistas contemporâneos chamariam um “campo de força”. Esse campo de força age sobre o observador e coloca-o numa situação de privilégio em face do Universo. Desse ponto privilegiado, ele tem acesso a realidades que o espaço e o tempo, a matéria e a energia habitualmente nos dissimulam. É aquilo a que chamamos a Grande Obra.


– Mas a pedra filosofal? A fabricação do ouro?

– São apenas aplicações, casos particulares. O essencial não é a transmutação dos metais, mas a do próprio investigador. É um segredo antigo, que em cada século vários homens voltam a encontrar.

– E o que é então feito deles?

– Talvez eu um dia o venha a saber.


O meu amigo não tornaria a ver esse homem que deixou um rasto indelével sob o nome de Fulcanelli. Tudo o que dele sabemos é que sobreviveu à guerra e desapareceu completamente após a Libertação. Todas as diligências para o reencontrar foram inúteis.

Eis-nos agora numa manhã de Julho de 1945. Ainda que esquelético e triste, Jacques Bergier, com um fato de caqui, prepara-se para cortar um cofre-forte com um maçarico. É mais uma metamorfose. Durante esses últimos anos foi sucessivamente agente secreto, terrorista e deportado político. O cofre-forte está numa bela vivenda, sobre o lago de Constança, que pertenceu ao director de um grande trust alemão. Depois de cortado, o cofre-forte expõe o seu segredo: uma garrafa que contém um pó extremamente pesado. Na etiqueta lê-se: “Urânio, para aplicações atómicas”. É a primeira prova formal da existência na Alemanha de um projecto de bomba atómica suficientemente forte para exigir grandes quantidades de urânio puro. Goebbels não deixava de ter razão quando, desde o seu bunker bombardeado, fazia circular pelas ruas arruinadas de Berlim o boato de que a arma secreta estava prestes a explodir na cara dos invasores”.

Bergier participou a descoberta às autoridades aliadas. Os americanos mostraram-se cépticos e declararam que qualquer investigação sobre a energia nuclear era sem interesse. Era um disfarce. Na realidade, a primeira bomba americana explodira em segredo, em Alamogordo, e, nessa mesma ocasião, encontrava-se na Alemanha uma missão americana dirigida pelo físico Goudsmidth, em busca da pilha atómica que o professor Heisenberg elaborara antes do desmoronamento do Reich.

Em França nada se sabia de positivo, mas havia indícios. Especialmente este, para as pessoas atentas: os americanos compravam a peso de ouro todos os manuscritos e documentos alquímicos.

Bergier apresentou um relatório ao governo provisório sobre a realidade provável das investigações a respeito dos explosivos nucleares tanto na Alemanha como nos Estados Unidos. O relatório foi sem dúvida para o cesto dos papéis, e o meu amigo conservou a sua garrafa, que agitava na cara das pessoas, exclamando: “Vêem isto? Bastaria que um neutrão passasse pelo interior para que Paris fosse pelos ares!” Aquele homenzinho de sotaque cómico gostava decididamente de gracejar e era espantoso que um deportado há pouco saído de Mauthausen tivesse conservado tanto humor. Mas, bruscamente, a brincadeira deixou de ter graça, na manhã de Hiroshima. O telefone do quarto de Bergier começou a tocar sem interrupção. Diversas autoridades competentes pediam cópias do relatório. Os serviços de informação americanos pediam ao possuidor da famosa garrafa para procurar urgentemente um certo major que não queria divulgar a sua identidade. Outras autoridades exigiam o rápido afastamento da garrafa do centro de Paris. Foi em vão que Bergier explicou que essa garrafa com certeza não continha urânio 235 puro e que, mesmo se o contivesse, o urânio estava sem dúvida abaixo da massa perigosa. De contrário, há muito que teria explodido. Confiscaram-lhe o brinquedo, do qual nunca mais ouviu falar. Para o consolar, enviaram-lhe um relatório da Direcção-Geral dos Estudos e Investigações. Era tudo o que aquele organismo, pertencente aos serviços secretos franceses, sabia a respeito da energia nuclear. O relatório trazia três menções carimbadas: “Secreto”, “Confidencial,” “Para não ser divulgado”. Continha, simplesmente, recortes da revista Science et Vie.

Restava-lhe apenas, para satisfazer a sua curiosidade, procurar o famoso major anónimo de quem o professor Goudsmith contou algumas aventuras no seu livro Alsos. Esse misterioso oficial, dotado de humorismo negro, dissimulara os seus serviços atrás de uma organização destinada à busca dos túmulos dos soldados americanos. Estava muito agitado e parecia perseguido por Washington. Em primeiro lugar quis saber tudo o que Bergier conseguira apurar ou adivinhar sobre os projectos nucleares alemães. Mas era principalmente indispensável, para a salvação do mundo, para a causa aliada e para a promoção do maior, que encontrassem com urgência Eric Edward Dutt e o alquimista conhecido sob o nome de Fulcanelli.

Dutt, sobre quem Helbronner fora encarregado de fazer investigações, era um hindu que pretendia ter consultado manuscritos muito antigos. Afirmava que deles extraíra certos processos de transmutação dos metais e que, devido a uma descarga condensada através de um condutor de boreto de tungsténio, obtinha indícios de ouro nos produtos obtidos. Muito mais tarde, os russos viriam a obter resultados análogos, mas utilizando potentes aceleradores de partículas.

Bergier não pôde prestar grandes serviços ao mundo livre, à causa aliada e à promoção do major. Eric Edward Dutt, colaboracionista, fora fuzilado pela contra-espionagem francesa na África do Norte. Quanto a Fulcanelli, desaparecera definitivamente.

No entanto, o major, como agradecimento, mandou entregar a Bergier, antes da publicação, as provas do relatório: Acerca da Utilização Militar da Energia Atómica, pelo professor H. D. Smyth. Era o primeiro documento autêntico sobre o assunto. Ora, nesse texto havia uma estranha confirmação das frases pronunciadas pelo alquimista em Junho de 1937.

A pilha atómica, peça essencial para a fabricação da bomba, era de facto apenas “uma disposição geométrica de substâncias extremamente puras”. Como Fulcanelli o dissera, esse utensílio, no início, não utilizava nem a electricidade, nem a técnica do vácuo. O relatório Smyth fazia igualmente alusão a venenos irradiantes, a gases, a poeiras radioactivas extremamente tóxicas, que era relativamente fácil preparar em grandes quantidades. O alquimista falara de um possível envenenamento de todo o planeta.

De que forma um investigador obscuro, isolado, místico pudera prever, ou ter conhecimento, de tudo aquilo? “De onde te vem isso, alma humana, de onde te vem isso?”

Ao folhear as provas do relatório, o meu amigo recordou também esta passagem do De Alchymia, de Alberto o Grande:

“Se tens a pouca sorte de te aproximares do príncipes e dos reis, eles não cessarão de te perguntar: “Então, Mestre, como vai a Obra? Quando é que finalmente veremos qualquer coisa de positivo?” E, na sua impaciência, chamar-te-ão aldrabão e velhaco e causar-te-ão toda a espécie de aborrecimentos. E, se não obtiveres êxito, sofrerás todo o efeito da sua cólera. Se, pelo contrário, o obtiveres, conservar-te-ão em suas casas em cativeiro perpétuo, com o propósito de te fazerem trabalhar em seu benefício.”

Seria esse o motivo por que Fulcanelli desapareceu e os alquimistas de todos os tempos mantiveram ciosamente o segredo?

O primeiro e o último conselho dado pelo papiro Harris era: “Fechai as bocas! Cerrai as bocas!”

Anos depois de Hiroshima, a 17 de Janeiro de 1955, Oppenheimer viria a declarar: “Num sentido profundo, que nenhum gracejo de mau gosto será susceptível de extinguir, nós, os sábios, tomámos contacto com o pecado”.

E mil anos antes, um alquimista chinês escrevia: “Seria um pecado terrível desvendar aos soldados o segredo da tua arte. Toma cuidado! Que nem um insecto haja na sala em que trabalhas!”


1 A estereotrónica é uma ciência muito recente que estuda a transformação da energia nos sólidos. Uma das suas aplicações é o transistor.

2 Estas duas obras foram reeditadas pela “Omnium Littéraire” 72, Champs-Elysées, Paris. A primeira edição data de 1925. Há muito que estava esgotada e os curiosos compravam os raros exemplares em circulação por dezenas de milhares de francos.

3 A opinião dos mais cultos e dos mais qualificados é que aquele que se escondeu, ou se esconde ainda nos nossos dias, sob o famoso pseudónimo de Fulcanelli, é o mais célebre e, sem dúvida, o único alquimista autêntico (talvez o último) deste século em que o átomo é rei”. Claude d’Ygé, revista Initiation et Science, n.o 44, Paris.


O alquimista moderno é um homem que lê os tratados de física nuclear. Está convencido de que se podem obter transmutações e fenómenos ainda mais extraordinários por meio de manipulações e com um material relativamente simples. É nos alquimistas contemporâneos que se torna a encontrar o espírito do investigador isolado. A conservação de um tal espírito é preciosa para a nossa época. De facto, acabámos por acreditar que o progresso dos conhecimentos já não é possível sem equipas numerosas, sem uma enorme aparelhagem, sem um financiamento considerável. Ora as descobertas fundamentais, como, por exemplo, a radioactividade ou a mecânica ondulatória, foram realizadas por homens isolados. A América, que é o país das grandes equipas e dos grandes processos, espalha actualmente agentes pelo Mundo inteiro em busca de espíritos originais. O director da investigação científica americana, o doutor James Killian, declarou em 1958 que era prejudicial confiar-se apenas no trabalho colectivo e que achava necessário que se fizesse apelo aos homens solitários, portadores de ideias originais.

Rutheford efectuou os seus trabalhos mais importantes sobre a estrutura da matéria com latas de conserva e pedaços de guita. Jean Perrin e Madame Curie, antes da guerra, enviavam os seus colaboradores ao Marché aux Puces, ao domingo, em busca de um pouco de material. Evidentemente, os laboratórios com aparelhagem poderosa são necessários, mas seria importante organizar uma cooperação entre esses laboratórios, essas equipas, e os originais solitários. No entanto, os alquimistas furtam-se ao convite. A sua lei é o segredo. A sua ambição é a ordem espiritual. “Está fora de dúvida, escreve René Alleau, que as manipulações alquímicas servem de suporte a uma ascese interior”. Se a alquimia contém uma ciência, essa ciência é apenas um meio de atingir a consciência. Importa, portanto, que não saia para o exterior, onde se transformaria num fim.

Qual é o material do alquimista? O mesmo do investigador de química mineral de altas temperaturas: fornos, crisóis, balanças, instrumentos de medição, aos quais se vieram juntar os aparelhos modernos acessíveis de controlo das radiações nucleares: contador Geiger, cintilómetro, etc.

Esse material pode parecer irrisório. Um físico ortodoxo não poderia admitir que é possível fabricar um cálculo emitindo neutrões por processos simples e económicos. Se as informações que temos são autênticas, os alquimistas conseguem-no. Na altura em que o electrão era considerado o quarto estado da matéria, inventaram-se dispositivos extremamente onerosos e complicados para produzir correntes electrónicas. Após o que, em 1910, Eister e Gaitel demonstraram que bastava aquecer cal ao rubro no vácuo. Não sabemos tudo a respeito das leis da matéria. Se a alquimia é uma ciência em avanço sobre a nossa, usa processos mais simples do que os nossos.

Conhecemos vários alquimistas em França e dois nos Estados Unidos. Há-os em Inglaterra, na Alemanha e em Itália. E.J. Holmyard diz ter encontrado um em Marrocos. De Praga escreveram-nos três. A imprensa científica soviética, actualmente, parece fazer grande caso da alquimia e realiza investigações históricas.

E agora vamos tentar, pela primeira vez, segundo cremos, descrever com precisão o que faz um alquimista no seu laboratório. Não pretendemos revelar a totalidade do método alquímico, mas julgamos ter, a respeito desse método, alguns conhecimentos de certo interesse. Não esquecemos que a última finalidade da alquimia é a transmutação do próprio alquimista, e que as manipulações não passam de um lento caminhar em direcção à “libertação do espírito”. É sobre essas manipulações que tentamos apresentar novos esclarecimentos.

Em primeiro lugar, durante vários anos, o alquimista decifrou velhos textos onde “o leitor se deve embrenhar desprovido do fio de Ariana, mergulhado num labirinto no qual tudo foi preparado consciente e sistematicamente a fim de lançar o profano numa inextricável confusão mental”. Paciência, humildade e fé elevaram-no a um certo nível de compreensão desses textos. Nesse nível vai poder iniciar realmente a experiência alquímica. Vamos descrever essa experiência, mas falta-nos um elemento. Sabemos o que se passa no laboratório do alquimista. Mas ignoramos o que se passa no próprio alquimista, na sua alma. Pode dar-se o caso de que tudo esteja ligado. Pode ser que a energia espiritual represente um papel nas manipulações físicas e químicas da alquimia. Pode ser que uma certa forma de adquirir, concentrar e orientar a energia espiritual seja indispensável ao êxito do “trabalho” alquímico. Não é certo, mas, em questão tão delicada, não podemos deixar de reservar um lugar para a frase de Dante: “Vejo que acreditas nestas coisas porque sou eu a dizer-tas, mas não sabes porquê, de forma que por serem acreditadas nem por isso estão menos escondidas”.

O nosso alquimista começa por misturar muito bem, num almofariz de ágata, três constituintes. O primeiro, numa percentagem de 95%, é um minério: uma pirite arseniosa, por exemplo, um minério de ferro que contém especialmente, como impurezas, arsénico e antimónio. O segundo é um metal: ferro, chumbo, prata ou mercúrio. O terceiro é um ácido de origem orgânica: ácido tartárico ou cítrico. Vai moê-los e triturá-los com as mãos, depois conserva a mistura durante cinco ou seis meses. Em seguida aquece tudo num crisol. Aumenta progressivamente a temperatura e faz com que a operação dure cerca de dez dias. Deverá tomar certas precauções. Há gases tóxicos que se evolam: o vapor de mercúrio e sobretudo o hidrogénio arsenioso, que matou mais de um alquimista, logo no início dos trabalhos.

Finalmente dissolve o conteúdo do crisol com um ácido. Foi procurando um dissolvente que os alquimistas de outrora descobriram o ácido acético o ácido nítrico e o ácido sulfúrico. Essa dissolução deve efectuar-se sob uma luz polarizada: quer uma réstia de luz solar, reflectida num espelho, quer a luz da Lua. Sabe-se hoje que a luz polarizada vibra numa única direcção, ao passo que a luz normal vibra em todas as direcções em redor de um eixo. Em seguida evapora o líquido e recalcina o sólido. Recomeça essa operação milhares de vezes, durante vários anos.

Porquê? Ignoramo-lo. Talvez na expectativa do momento em que as melhores condições estejam reunidas: raios cósmicos, magnetismo terrestre, etc. Talvez a fim de obter uma “fadiga” da matéria em estruturas profundas que nós ainda ignoramos.

O alquimista fala de “paciência sagrada”, de lenta condensação do “espírito universal”. Há certamente qualquer outra coisa atrás desta linguagem pararreligiosa.

Esta forma de operar repetindo indefinidamente a mesma manipulação pode parecer demencial a um químico moderno. Ensinaram-lhe que há um único método experimental válido: o de Claude Bernard. É um método que age por meio de variações concomitantes. Repete-se milhares de vezes a mesma experiência, mas fazendo variar, de cada vez, um dos factores: proporções de um dos constituintes, temperatura, pressão, catalisador, etc. Anotam-se os resultados obtidos e deduzem-se algumas das leis que regem o fenómeno. É um método que deu as suas provas, mas não é o único. O alquimista repete a sua manipulação sem a menor alteração, até que qualquer coisa de extraordinário se produza.

No fundo, acredita numa lei natural bastante comparável ao “princípio de exclusão” formulado pelo físico Pauli, amigo de Jung. Para Pauli, num dado sistema (o átomo e as suas moléculas), não podem existir duas partículas (electrões, protões, mesões) no mesmo estado. Tudo é único na natureza: “a vossa alma não tem outra semelhante…” É por isso que se passa bruscamente, sem intermediário, do hidrogénio ao hélio, do hélio ao lítio e assim indefinidamente, como o indica, para o físico nuclear, a Tabela Periódica dos Elementos. Quando se junta uma partícula a um sistema, essa partícula não pode tomar nenhum dos estados existentes no interior desse sistema. Toma um novo estado e a combinação com as partículas já existentes cria um sistema novo e único.

Para o alquimista, da mesma forma que não existem duas almas semelhantes, dois seres semelhantes, duas plantas semelhantes (Pauli diria: dois electrões semelhantes), não há duas experiências semelhantes. Se se repetir milhares de vezes uma experiência, qualquer coisa de extraordinário acabará por se produzir. Não somos bastante competentes para lhe dar ou não razão. Contentamo-nos em observar que uma ciência moderna, a ciência dos raios cósmicos, adoptou um método comparável ao do alquimista. Essa ciência estuda os fenómenos causados pelo aparecimento, num aparelho de detecção ou sobre uma chapa, de partículas com energia formidável, vindas de estrelas. Estes fenómenos não podem ser obtidos segundo a nossa vontade. É preciso esperar. Por vezes regista-se um fenómeno extraordinário. Foi assim que no Verão de 1957, no decorrer das

investigações feitas nos Estados Unidos pelo professor Bruno Rossi, uma partícula animada de uma energia formidável, jamais registada até ali, e vinda talvez de outra galáxia sem ser a nossa Via Láctea, impressionou 1500 calculadores ao mesmo tempo num raio de oito quilómetros quadrados, provocando, à sua passagem, um feixe enorme de destroços atómicos. Não é possível imaginar qualquer máquina capaz de produzir tal energia. Nenhum sábio tinha conhecimento de que jamais se tivesse produzido semelhante acontecimento e ignora-se se voltará a repetir-se. É também um acontecimento excepcional, de origem terrestre ou cósmica, e capaz de influenciar o seu crisol, que parece aguardar o nosso alquimista. Talvez ele pudesse abreviar a sua expectativa utilizando processos mais activos do que o fogo, aquecendo por exemplo, o crisol num forno de indução pelo método de levitação, ou ainda juntando isótopos radioactivos à sua mistura. Ele poderia então fazer e refazer a sua manipulação, não várias vezes por semana, mas milhares de vezes por segundo multiplicando desta forma as probabilidades de captar “o acontecimento” necessário ao bom êxito da experiência. Mas o alquimista actual, como o de ontem, trabalha em segredo, pobremente, e considera a expectativa uma virtude.

Prossigamos a nossa descrição: ao fim de vários anos de um trabalho sempre igual, de dia e de noite, o nosso alquimista acaba por deduzir que a primeira fase terminou. Junta então um oxidante à sua mistura: o nitrato de potássio, por exemplo. Há enxofre no crisol, proveniente da pirite, e carvão proveniente do ácido orgânico. Enxofre, carvão e nitrato: foi durante essa manipulação que os antigos alquimistas descobriram a pólvora.

Ele vai recomeçar a dissolver, depois a calcinar, sem descanso, durante meses e anos, na expectativa de um sinal. Sobre a natureza desse sinal, as obras alquímicas diferem, mas é talvez porque há vários fenómenos possíveis. Esse fenómeno produz-se no momento de uma dissolução. Para certos alquimistas, trata-se da formação de cristais em forma de estrelas à superfície do banho. Para outros, uma camada de óxido surge à superfície desse banho, depois abre-se, deixando a descoberto o metal luminoso no qual parecem reflectir-se, em imagem reduzida, ora a Via Láctea, ora as constelações.

Depois de receber este sinal, o alquimista retira a sua mistura do crisol e “deixa-a amadurecer”, ao abrigo do ar e da humidade, até ao primeiro dia da próxima Primavera. Quando retomar as operações, estas visarão aquilo a que se chama, nos velhos textos, “a preparação das trevas”. Recentes investigações sobre a história da química demonstraram que o monge alemão Berthold Le Noir (Berthold Schwarz), a quem vulgarmente se atribui a invenção da pólvora no Ocidente, nunca existiu. É uma figura simbólica desta “preparação das trevas”.

A mistura é colocada num recipiente transparente, em cristal de rocha, fechado de forma especial. Há poucas indicações a respeito dessa fechadura, chamada fechadura de Hermes, ou hermética. Dali em diante o trabalho consiste em aquecer o recipiente doseando, com uma infinita delicadeza, as temperaturas. No recipiente fechado, a mistura contém sempre enxofre, carvão e nitrato. Trata-se de elevar essa mistura a um certo grau de incandescência, evitando no entanto a explosão. São numerosos os casos de alquimistas gravemente queimados ou mortos. As explosões que se produzem são de particular violência e exalam temperaturas para as quais não estávamos logicamente preparados.

O fim em vista é a obtenção, no recipiente, de uma “essência”, de um “fluido”, a que os alquimistas por vezes chamam “a asa de corvo”.

Sejamos mais claros. Esta operação não tem equivalente na física e química modernas. No entanto, não deixa de ter analogias. Quando se dissolve no gás amoníaco líquido um metal como o cobre, obtém-se uma coloração azul-escuro que passa ao negro nas grandes concentrações. Produz-se o mesmo fenómeno se se dissolver no gás amoníaco liquidificado hidrogénio sob pressão ou amidas orgânicas, de forma a obter o composto instável NH4, que tem todas as propriedades de um metal alcalino e que, por esse motivo, foi chamado “amónio”. Há razões para crer que essa coloração azul-negro, que faz pensar na “asa de corvo” do fluido obtido pelos alquimistas, é justamente a cor do gás electrónico. O que é o “gás electrónico”? É para os sábios modernos, o conjunto de electrões livres que constituem um metal e lhe asseguram as propriedades mecânicas, eléctricas e térmicas. Ele corresponde, na terminologia actual, ao que o alquimista chama “a alma” ou ainda “a essência” dos metais. É essa alma ou essa “essência” que se liberta no recipiente hermeticamente fechado e pacientemente aquecido do alquimista.

Ele aquece, deixa arrefecer, aquece de novo, e isto durante meses ou anos, observando através do cristal de rocha a formação daquilo a que também se chama “o ovo alquímico”: a mistura transformada em fluido azul-negro. Abre finalmente o seu recipiente na obscuridade, apenas sob a claridade dessa espécie de líquido fluorescente. Em contacto com o ar, esse líquido fluorescente solidifica-se e separa-se.

Obterá desta forma substâncias completamente novas, desconhecidas na natureza e com todas as propriedades dos elementos químicos puros, quer dizer, inseparáveis pelos processos da química.

Os alquimistas modernos pretendem ter obtido desta forma elementos químicos novos, e isto em quantidades consideráveis. Fulcanelli teria extraído de um quilo de ferro vinte gramas de um corpo completamente novo, cujas propriedades químicas e físicas não correspondem a qualquer elemento químico conhecido. Seria aplicável a mesma operação a todos os elementos, cuja maior parte daria dois elementos novos por cada elemento tratado.


Tal afirmação é de molde a chocar o homem de laboratório. Actualmente, a teoria não permite prever outras separações além das seguintes:


– A molécula de um elemento pode alcançar vários estados: Oto-hidrogénio e para-hidrogénio, por exemplo.

– O núcleo de um elemento pode tomar um certo número de estados isotópicos caracterizados por um número de neutrões diferentes. No lítio 6 o núcleo contém três neutrões e no lítio 7 contém quatro.


Os nossos técnicos, para separar os diversos estados alotrópicos da molécula e os diversos estados isotópicos do núcleo, exigem para isso um enorme material.

Os processos do alquimista são, em comparação, irrisórios, e ele alcançaria, não uma mudança de estado da matéria, mas a criação de uma matéria nova, ou pelo menos uma decomposição e recomposição diferente da matéria. Todo o nosso conhecimento

do átomo e do núcleo se baseia no modelo “saturniano” de Nagasoka e Rutheford: o núcleo e o seu anel de electrões. Não é impossível que, no futuro, outra teoria nos leve a realizar mudanças de estados e separações de elementos químicos por enquanto inconcebíveis.

Portanto, o nosso alquimista abriu o seu recipiente de cristal de rocha e obteve, por meio do arrefecimento do líquido fluorescente em contacto com o ar, um ou vários elementos novos. Restam as escórias. Essas escórias, vai ele lavá-las durante meses em água tridestilada. Depois manterá essa água ao abrigo da luz e das variações de temperatura.

Essa água teria propriedades químicas e medicinais extraordinárias. É o dissolvente universal e o elixir de longa vida tradicional, o elixir de Fausto.

Aqui, a tradição alquímica parece de acordo com a ciência de vanguarda. De facto, para a ciência ultramoderna, a água é uma mistura extremamente complexa e reagente. Os investigadores debruçados sobre a questão dos oligoelementos, especialmente o doutor Jacques Ménétrier, constataram que, praticamente, todos os metais eram solúveis na água em presença de certos catalisadores, como a glucose, e sob determinadas variações de temperatura. Além disso, a água formaria verdadeiros compostos químicos, hidratos, com gases inertes tais como o hélio e o árgon. Se se soubesse qual o constituinte da água responsável pela formação dos hidratos em contacto com um gás inerte, seria possível estimular o poder solvente da água e portanto obter um verdadeiro dissolvente universal. A revista russa Saber e Força, incontestavelmente séria escrevia no seu número 11, de 1957, que talvez um dia se obtivesse esse resultado bombardeando a água com radiações nucleares e que o dissolvente universal dos alquimistas seria uma realidade antes do final do século. E essa revista previa um certo número de aplicações, imaginava a abertura de túneis por meio de um jacto de água activada.

O nosso alquimista, portanto, encontra-se agora de posse de um certo número de corpos simples desconhecidos na natureza e de alguns frascos de uma água alquímica susceptível de lhe prolongar consideravelmente a vida, através do rejuvenescimento dos tecidos.

Agora vai tentar combinar novamente os elementos simples que obteve. Mistura-os no seu almofariz e derrete-os a baixas temperaturas, na presença de catalisadores a respeito dos quais os textos são muito vagos. Quanto mais se avança no estudo das manipulações alquímicas, mais os textos são difíceis de compreender. Aquele trabalho irá ocupá-lo ainda durante alguns anos.

Afirmam que, desta forma, ele obteria substâncias absolutamente semelhantes aos metais conhecidos, e em especial aos metais bons condutores do calor e da electricidade. Seriam estes o cobre alquímico, a prata alquímica, o ouro alquímico. Os testes clássicos e a espectroscopia não permitiriam verificar a novidade dessas substâncias, e no entanto elas possuiriam propriedades novas, diferentes das dos metais conhecidos, e muito surpreendentes.

Se as informações que temos são exactas, o cobre alquímico, aparentemente semelhante ão cobre conhecido e no entanto muito diferente, teria uma resistência eléctrica infinitamente fraca, comparável à dos supercondutores que o físico obtém nas proximidades do zero absoluto. Este cobre, se pudesse ser utilizado, revolucionaria a electroquímica.

Outras substâncias, resultantes da manipulação alquímica, seriam mais surpreendentes ainda. Uma delas seria solúvel no vidro, a baixa temperatura e antes do momento da fusão deste. Essa substância, ao tocar o vidro ligeiramente amolecido, dispersar-se-ia no interior, dando-lhe um colorido vermelho-rubi, com fluorescência lilás na escuridão. É ao pó obtido pela trituração desse vidro, modificado no almofariz de ágata, que os textos alquímicos chamam o “pó de projecção” ou “pedra filosofal”. “Com isso, escreve Bernard, conde da Marche Trévisane, no seu tratado filosófico, se termina a elaboração dessa Pedra superior a todas as pedras preciosas, a qual é um tesouro infinito à glória de Deus que vive e reina eternamente”.

São conhecidas as maravilhosas lendas ligadas a essa pedra “pó de projecção” que seria susceptível de assegurar transmutações de metais em quantidades consideráveis. Transformaria, inclusivamente, certos metais vis em ouro, prata ou platina, mas tratar-se-ia então de um dos aspectos do seu poder. Seria uma espécie de reservatório de energia nuclear em suspensão, facilmente manejável.

Voltaremos em breve aos problemas que as manipulações do alquimista põem ao homem moderno esclarecido, mas detenhamo-nos exactamente onde se detêm os textos alquímicos. Eis a “grande obra” realizada. Produz-se no próprio alquimista uma transformação que esses textos evocam, mas que nós somos incapazes de descrever por não possuirmos a esse respeito mais do que umas poucas noções analógicas. Essa transformação seria como que a promessa, através de um ser privilegiado, daquilo que espera a humanidade inteira no termo do seu contacto inteligente com a Terra e os seus elementos: a sua fusão em Espírito, a sua concentração num ponto espiritual fixo e a sua união com outros centros de consciência através dos espaços cósmicos. Progressivamente, ou num súbito clarão, o alquimista, segundo a tradição, descobre o significado do seu longo trabalho. Os segredos da energia e da matéria são-lhe desvendados, e ao mesmo tempo tornam-se-lhe visíveis as infinitas perspectivas da vida. Ele possui a chave da mecânica do Universo. Ele próprio estabelece novas relações entre o seu espírito, dali em diante animado, e o espírito universal em eterno progresso de concentração. Serão certas radiações do pó de projecção responsáveis de uma transmutação do ser físico?

A manipulação do fogo e de certas substâncias permite, portanto, não só transmutar os elementos, como ainda transformar o próprio investigador. Este, sob a influência das forças emitidas pelo crisol (quer dizer, das radiações emitidas por núcleos a sofrerem modificações de estrutura), entra noutro estado. Nele se operam mutações. A sua vida prolonga-se, a sua inteligência e as suas percepções atingem um nível superior. A existência de tais seres, biológica e psiquicamente novos, é um dos alicerces da tradição Rosa-Cruz. O alquimista passa a outro estado do ser. É elevado a outro grau da consciência. Tem a sensação de que só ele se encontra desperto e que todos os outros homens ainda dormem. Escapa ao vulgar humano e desaparece, como Mallory sobre o Everest, depois de ter tido o seu minuto de verdade.

“A Pedra filosofal representa desta forma o primeiro degrau susceptível de auxiliar o homem a elevar-se em direcção ao Absoluto. Para além começa o mistério. Aquém não há mistério, nem esoterismo, nem outras sombras excepto as que projectam os nossos desejos e sobretudo o nosso orgulho. Mas, como é mais fácil satisfazermo-nos de ideias e de palavras do que fazer qualquer coisa com as próprias mãos, com a nossa dor e a nossa fadiga, no silêncio e na solidão, é mais cómodo procurar um refúgio no pensamento chamado “puro”, do que batermo-nos corpo a corpo contra o peso e as trevas da matéria. A alquimia proíbe qualquer evasão deste género aos seus discípulos. Deixa-os frente a frente com o grande enigma. . . Apenas nos assegura que se lutarmos até ao fim para nos libertarmos da ignorância, a própria verdade lutará por nós e vencerá finalmente todas as coisas. Talvez comece então a VERDADEIRA metafísica.”

1 Este método consiste em suspender a mistura a derreter no vácuo, fora todo o contacto com uma superfície material, por meio de um campo magnético.

2 Funde-se então por meio de uma corrente de alta frequência. O semanário americano Life, em Janeiro de 1958, publicou lindíssimas fotografias de um forno deste género em acção. Jacques Bergier declara ter assistido a esse fenómeno.

3 O professor Ralph Milne Farley, senador dos Estados Unidos e professor de física moderna na Escola Militar de West Point, chamou a atenção para o facto de certos biologistas pensarem que o envelhecimento é devido à acumulação de água pesada no organismo. O elixir de longa vida dos alquimistas seria uma substância eliminando selectivamente a água pesada. Tais substâncias existem no vapor de água. Porque não existirão na água líquida tratada de certa maneira? Mas poderia uma descoberta desta natureza ser divulgada sem perigo? O professor Farley imagina uma sociedade secreta de imortais, ou quase-imortais, existindo desde há séculos e reproduzindo-se por cooptação. Uma sociedade destas, que não se meteria em política e não se imiscuiria de forma alguma nas questões dos homens, teria todas as probabilidades de passar despercebida. 

Lições de Alquimia

A sabedoria só é adquirida através da experiência e da reflexão sobre essa experiência, que tira as lições que ela tem a oferecer. Uma vida não refletida é uma vida vivida na sombra da realidade. Somente parando, olhando para trás, para onde começamos, o que fizemos, onde estamos no presente, e como chegamos aqui, podemos começar a nos chamar de sábios – e Sabedoria é o objetivo do esoterismo genuíno, não poder, fama ou títulos – Sabedoria é o fruto de experiências que são compreendidas.

Praticar a alquimia é bater às portas do Templo de Sofia, da Sabedoria, e rezar para entrar. Percebe-se rapidamente que não importa o quanto se bata, não há ninguém do outro lado para abrir a porta. Somos nós que devemos, individualmente e por nossa livre vontade e acordo, empurrar a porta e abri-la para nós mesmos. Uma vez lá dentro, encontramos alguns amigos peculiares e úteis esperando, mas somente uma vez que assumimos a responsabilidade de abrir a porta para nós mesmos.

Este artigo é um resumo de algumas experiências minhas e de outros alquimistas, que ocorreram durante nossos primeiros doze meses de prática de espagiricas ou alquimia de plantas. Esperamos que eles sejam úteis aos aspirantes a alquimistas e até mesmo aos estudantes de outras artes e ciências ocultas para entender o caminho que escolheram e seu potencial.


Lições Aprendidas


Muitos acharam o estudo da alquimia particularmente gratificante, primeiro por causa do tipo de retorno que se obtém por seu investimento de tempo, e segundo por causa da certeza dos resultados.

Jean Dubuis, o fundador da organização francesa cabalística e alquímica The Philosophers of Nature, afirmou freqüentemente durante seminários que “a alquimia é o único caminho que não mente”. Com isto ele quis dizer que em uma variedade de práticas esotéricas, e as chamadas práticas esotéricas, é fácil desculpar os fracassos ou a falta de resultados. Ouvimos estas desculpas o tempo todo: o incenso errado foi usado, os ciclos da lua estavam fora, o “humor” não estava certo, as associações erradas, planetas, deuses ou Elementos foram invocados. A lista é interminável.

Entretanto, na alquimia – até mesmo na alquimia vegetal, ou espagística como é chamada apropriadamente – tudo é uma experiência de aprendizado que aponta para como devemos abordar não apenas nossas operações alquímicas, mas também a própria vida. Como disse Frater Albertus, “toda manifestação é realizada pela utilização da vontade, que é outro termo para se estar vivo”.

Se temos manifestação, temos demonstrado que estamos verdadeiramente “vivos” em um nível que não só afeta e inclui o material, mas também o precede e o supercede. É o Ouroboros, a serpente que come sua cauda; o Alfa e o Ômega. Alquimia, meu amigo, não mente, e aqui estão algumas de suas lições.

Lição um: Sou responsável pela minha própria Transformação. A alquimia ensina que eu e somente eu somos responsáveis por mim mesmo, minha vida, minha consciência e meu crescimento em sabedoria, ou “Transformação”, como é chamado. Enquanto outros podem tentar me ajudar no caminho, eu tenho que estar receptivo à sua assistência e ouvir a voz da experiência. No final dos tempos, quando estou diante do Eterno, minha resposta à pergunta “Quem é você?” deve ser nas palavras de Victor Hugo, “Eu sou a liberdade”. Livremente entrei no Caminho, livremente assumi seus desafios, e livremente compartilho com os outros o que aprendi.

Lição dois: A natureza não se importa se eu sou estúpido. A natureza me ajudará se eu estiver atento ao que está acontecendo. Eu sou a serva da natureza e a ajudo em seu trabalho, me auxilia em meus empreendimentos – mas somente se eu estiver consciente. A natureza responde tanto às próprias ações quanto às próprias intenções. Ao contrário da magia ritual onde um erro pode ser cometido e a essência interior anula o passo em falso no ritual, um erro pode resultar em arruinar todo o trabalho até hoje. Trabalhar diretamente com elementos materiais significa ser responsável pelas leis materiais, bem como pelas leis psíquicas.

Terceira lição: A energia vai onde sua verdadeira atenção está, não onde você pensa que ela está. Durante a destilação de um pouco de álcool de vinho tinto para uso na fabricação de uma tintura espagírica, um colega alquimista decidiu ir sentar-se do lado de fora e deixar o processo correr. Para passar o tempo, ele decidiu “mandar alguma energia” para uma pequena fábrica perto de onde ele estava sentado. Primeiro um pouco de Terra, sem resposta; depois Água, com apenas uma leve resposta; depois Ar, com melhores resultados; e finalmente Fogo, com grandes resultados (além de ouvir sua destilação explodir, enviando álcool em chamas por todo o seu teto). Um incidente semelhante ocorreu com outro praticante da Arte, com ele encontrando um líquido azul flamejante por todo o ventilador de teto em sua cozinha. Se você estiver trabalhando em um experimento alquímico, concentre-se nele até que ele esteja completo, ou até que essa parte do processo esteja concluída.Os pensamentos são coisas e afetam meu ambiente físico e psíquico. Como tal, eles não se limitam apenas a “eu”, mas também têm impacto sobre aqueles ao meu redor.

Lição Quatro: Aprender a teoria antes da prática. A alquimia trabalha principalmente no elemento Terra, e como tal, não promete nada rapidamente. Na série de falsas promessas oferecidas por uma variedade de autores e sistemas, e até mesmo abusadores auto-intitulados da palavra “alquimia”, a Arte Real se mantém sozinha ao dizer que a Iluminação pode ser feita – mas a um preço. O maior preço é o tempo, pois as habilidades devem ser aprendidas, os preparativos devem ser feitos, as anotações devem ser tomadas e revisadas e as experiências devem ser catalogadas. A preparação é a chave para o sucesso em qualquer coisa, seja material ou psíquica. Um elemento chave disto foi memorizar a Tábua Esmeralda e aceitá-la como um esboço de todo o processo alquímico, independentemente de outros métodos tomados. É um pobre artesão que culpa suas ferramentas.

Lição Cinco: Apresse-se lentamente. Constantemente na literatura alquímica há referências ao trabalho que está sendo feito lentamente e depois, pouco antes de ser concluído, para aumentar o calor sobre um determinado produto, mas fazê-lo com cuidado e diligência, para não queimar a matéria e assim destruir todos os esforços, assim como o sucesso está à vista. Diz-se muitas vezes que em qualquer projeto, oitenta por cento do trabalho ocorre durante as etapas finais, e na alquimia isto é claramente verdade. Devagar, devagar, mais devagar, é o melhor caminho a seguir, com atenção diária ao trabalho.

Lição Seis: Devemos estar preparados antes de iniciar os trabalhos. A preparação é mais do que apenas um processo físico de garantir que o vidro esteja limpo, e que os materiais e equipamentos adequados estejam disponíveis e em ordem de trabalho, é também um processo interno. Para ter sucesso na alquimia – ou em qualquer prática oculta voltada para a manifestação material ou psíquica – os estudantes têm que estar prontos para aceitar e participar do processo. Isto significa fazer de si mesmo um recipiente perfeito, internalizando as etapas do processo. Primeiro intelectualmente através da memorização, e através disso, deixando-os operar internamente em nosso subconsciente para organizar e direcionar suas energias. Uma vez internalizado o trabalho em teoria, podemos começar a utilizá-lo na prática externa. A internalização do processo resulta na externalização do processo através de uma técnica bem sucedida. O diabo está nos detalhes. “Ler, Ler, Ler, Rezar, Trabalhar e Ler de novo”.

Lição Sete: Está Concluído! O axioma hermético da Tábua Esmeralda diz: “Assim acima como abaixo”. A internalização é também a afirmação de Paracelsus de que só transmutamos fora o que primeiro transmutamos dentro. Devemos prestar atenção à ainda pequena voz interior – a voz de Hermes, de nosso Mestre Interior – pois ela responderá ao nosso trabalho e nos ensinará em nossos sonhos e meditações. As informações serão tanto práticas como teóricas ou simbólicas. Não é raro sentir de repente que um processo está completo quando se trabalha com a produção de pedras vegetais. Ou seja, há um conhecimento interior de que é hora de passar ao próximo passo. Às vezes isto acontece até verbalmente. Uma vez durante o processo, ouvi dizer “estou acabado” e soube que esta era minha sintonia com uma pedra de planta em que estava trabalhando para que eu soubesse que o processo estava completo, embora fosse no meio da tarde e eu estivesse preocupado com outra coisa tudo junto. Mesmo aqui, porém, este conhecimento interior foi verificado em relação à realidade. Será que a pedra da planta funcionou? Fez o que a pedra da planta deve fazer? A prova está nos resultados, não nos desejos, desejos ou crenças, mas na fria e dura evidência de uma operação que foi bem sucedida.

(Lição Oito: Você não é um alquimista até que tenha tido pelo menos uma explosão).Nas palavras de Hermes: “O que tenho a dizer sobre a Operação do Sol está concluído”.

domingo, 30 de outubro de 2022

Orígenes del Baphometo

Baphomet, Bafomet, Baphometo o Bafometo es una deidad, representada por una imagen antropomórfica, que contiene dentro de sí elementos heterodoxos asociados al cristianismo de la época medieval.

El término «Baphomet» es poco conocido en sí mismo y si lo es se debe, casi exclusivamente, a la aparición de un término similar en el proceso que sirvió para aniquilar la Orden del Templo o Caballeros Templarios, una antigua Orden militar, en 1307 y para suspenderla sine die por el papa Clemente V en el Concilio de Vienne de 1314. De hecho, este "baphometo" fue uno de los pilares sobre el que los inquisidores del Rey de Francia (Felipe) basaron el grueso de las acusaciones de herejía, junto a otros cargos infundados que presuntamente habían cometido el Gran Maestre, Jacques de Molay, y los Templarios, que incluían, renegar de Jesús, pisar la Cruz de Cristo en sus ritos y practicar la sodomía y el bestialismo. Actualmente la mayoría de los historiadores afirman que el Rey de Francia dio por buenas todas las acusaciones para acabar con la poderosa Orden del Temple y hacerse con sus bienes.

Se cree que este presunto numen era una cabeza barbada y con pequeños cuernos. Esto explicaría por qué razón los templarios fueron acusados de herejes tras haber tomado contacto, en Tierra Santa, con los sarracenos y sus creencias.

Se ha apuntado a que el nombre pudiera ser una variante local del nombre Muhammad. Los templarios acusados de herejes vivían en Occitania, cuya lengua local era el occitano. En las lenguas vecinas se usaron los términos Mahomet (francés). Esta hipótesis se apoya en que en el acta contra los templarios no se dan mayores explicaciones, apuntando a que era un término de uso habitual.

Otras fuentes más aventuradas sostienen que la testa barbuda en cuestión correspondería a Jesucristo. Esto último estaría contradiciendo la creencia en la Resurrección. Destacan que esta cabeza (no ya una mera representación, sino una cabeza humana embalsamada) no era otra que la de Juan el Bautista.


Origen de la palabra

Suele relacionarse también el nombre Baphomet con la fusión de dos términos griegos cuyo significado aproximado es el de bautismo de sabiduría. Otros estudiosos dicen que su nombre puede derivar de una corrupción de Mahoma.


Antecedentes

El ídolo conocido como “bafomet” –aunque se menciona solo como ‘un ídolo’- está incluido ya inicialmente en los pliegos de cargos que los agentes del rey Felipe IV de Francia y de los inquisidores de Francia blandieron para prender, torturar y procesar a los templarios. El análisis bibliográfico relacionado con la desaparición de los templarios así como el referido a los trabajos de la Inquisición sugiere que se trata de una acusación estándar, es decir, un prototipo de acusación que se utilizaba para atacar a personalidades contrarias al o enemigas del rey de Francia.

Siguiendo a Peter Partner5​ aparece un panorama oscuro y gelatinoso –por lo de tembloroso- para todos aquellos que se sitúan en la periferia de la práctica religiosa y que por su trabajo público están en el punto de mira de cortesanos, de la casa real, o de políticos y burgueses. La inseguridad provenía de dos posibles ataques ante los que cabe poca defensa: la acusación de herejía y la de prácticas de sodomía. Para la Iglesia católica cualquiera de ellas era peligrosa, pero la herejía era perseguida con extrema saña y contundencia, pues se trataba de un ataque contra todo el pueblo de Cristo, mientras que las actividades demoníacas eran personales y de un ámbito mucho más reducido dentro de la logia. Esta circunstancia motivó que el papa Gregorio IX creara la Santa Inquisición –Santo Oficio se denominaba comúnmente a la rama española, creada por los Reyes Católicos- como tribunal dedicado a defender a la Iglesia y al pueblo de Cristo de cualquier ataque o implantación hereje. Este tribunal dependía directamente de la Santa Sede e informaba al Papa de sus actividades, y comenzó su andadura a partir del año 1232, vigilando el fin de las herejías albigense y dualista y concentrándose en la aparición de cualquier forma de amenaza contra el dogma ortodoxo de la Iglesia Católica.

En este ambiente de inseguridad y miedo las personalidades relevantes, o que gozan de cierta inmunidad, disponen de un aliado poderosísimo para deshacerse de enemigos y obstáculos. Los dominicos, que dirigen la Inquisición, pronto se sitúan en puestos clave de la jerarquía eclesiástica de Francia y trabajan, cada vez con mayor frecuencia, con propia autonomía, hasta el punto de que el jefe de la Inquisición en Francia, en la época en que se prendieron a los templarios, era confesor personal de Felipe IV y actuó bajo sus deseos.

Aparece en la literatura un amplio banco de informaciones sobre acusaciones de herejía y prácticas demoníacas, concentrándose en mercaderes –una profesión que era considerada por la Iglesia como despreciable, a pesar de indiscutibles avances a principios del siglo XIII-, cargos políticos de la periferia, miembros de la Iglesia y cortesanos. Nadie estaba libre de tales amenazas, hasta el punto de que el propio papa Bonifacio VIII se vio involucrado en ellas por iniciativa del rey de Francia y de su segundo, Guillermo de Nogaret. Así, el sumo pontífice se enfrentó con la realeza por diversas causas, casi todas ellas relacionadas con la preponderancia del poder religioso sobre el civil, de manera que fue acusado por Felipe IV de hechicero, hereje, sodomita y simoníaco, pues se le había encontrado en ocasiones hablando con una estatuilla que hacía las veces de Satanás o de Diablo –mantenía guardada esa imagen en una recámara personal y la consultaba cada vez que tenía que tomar una decisión-.​ A causa del especial encono que tenía Felipe IV hacia Bonifacio, no se sabe si propio o transmitido por Nogaret, se negaron a soltar presa a pesar de los sucesivos pactos que propuso Clemente V, y siguieron instruyendo el expediente judicial, el cual quedó terminado en 1307. Las acusaciones contra Bonifacio y contra los templarios se parecen mucho: herejía, posesión demoníaca, idolatría o apostasía, simonía, etc., aunque eso no tiene especial mérito si se tiene en cuenta que Felipe IV, Nogaret y colaboradores reales y eclesiásticos, estaban detrás de las dos causas.

Existe el episodio de Guichard,7​ también frecuente en la bibliografía, donde este obispo de Troyes y consejero o confesor personal de Blanca de Navarra, en 1308, fue acusado de prácticas mágicas y de hechicería, así como de incitación al asesinato por envenenamiento, en la persona de Juana I de Navarra, esposa de Felipe IV. Parece ser que este cortesano había realizado, o mandado construir, una efigie en cera de la reina y, tras haberla bautizado, le había clavado alfileres para atraer sobre ella la ruina, la enfermedad y la muerte. En su expediente, que se instruyó con el pobre acusado en la cárcel, Nogaret añade acusaciones de sodomía, escupir sobre la cruz, y otros varios, terminando con un cuadro tan sombrío y duro como el de Bonifacio VIII, en el que había mezclado, además, al propio papa Clemente V. Poco antes del Concilio de Vienne, el expediente se diluyó por la desaparición de algunos testigos, con lo que se sobreseyó el caso, dejando en libertad al castigado obispo, que no llegaría a ocupar ninguna diócesis más y moriría unos meses más tarde.

Otro ejemplo, de 1233, cuando Gregorio IX envió cartas a los nobles de Renania para que actuasen contra una herejía que empezaba a propagarse por la región, describiendo la ceremonia de recepción, donde se besaban la boca y las ancas de ranas y sapos y, tras el ágape de celebración, se besan los cuartos traseros de un gato negro puesto del revés, entonando seguidamente una serie de oraciones, apareciendo posteriormente una figura humana entera y muy brillante a la que se le encomendaban los efectos personales de los novicios y los propios novicios.8​ Malcolm Barber menciona más ejemplos de grupos y herejías en los que se practicaba la adoración de un ídolo, de una figura o de un gato, constituyendo un rosario de antecedentes que va desde el siglo XI al XIV, plasmados en parte en la obra anónima Les Grandes Chroniques de France –"Grandes crónicas de Francia", narración de los reinados de los reyes franceses-, de la abadía de Saint-Denis. Acusaciones similares menciona Peter Partner en sus obras. El mismo Nogaret instruiría algunas de ellas. El factor común de todos los ataques descritos –llamados ataques mágicos por Peter Partner-, sobre todo en los que participa Nogaret, es el cuadro de acusaciones: escupir sobre la cruz, la sodomía y la apostasía –mezclando ídolos o no-.

A los antecedentes anteriormente mencionados cabe añadir la imagen de desidia, incluso connivencia, que daba la Orden del Temple con respecto a sus enemigos naturales, los sarracenos. Es significativo que los trovadores previos a la época del proceso –hacia 1265 y poco después- se refirieran a la caída del reino cristiano de Tierra Santa y achacaran tal circunstancia a la pasividad ante los hechos y a la camaradería que mostraban los templarios –especialmente, pues en alguna ocasión nombra a las órdenes militares en general- con los sarracenos.

Más contemporáneas son las palabras de Rostand Berenguier de Marsella, escrito poco después de 1291, pues trata la caída de Acre, donde culpa de la derrota a los templarios gandules, orgullosos y cobardes.10​ Estas obras, de escasa repercusión, no obstante creaban un cierto estado de opinión, en el sentido de que las personas que las leían o las escuchaban en los salones de los castillos, jóvenes que no habían vivido las batallas y hechos gloriosos del Temple, concluían en un cierto resentimiento hacia la Orden.


En la acusación y el proceso contra los Templarios

El rey de Francia envió órdenes selladas con la instrucción de que se abrieran el 13 de octubre de 1307, viernes, para que los senescales, barones, caballeros y tropa en general cumplieran sus órdenes. Estas incluían la detención de todos los templarios de su zona, de cualquier rango, y la puesta a disposición de los delegados reales las propiedades de la Orden. Estas instrucciones iban acompañadas de un manifiesto en el que Felipe IV plasmaba aspavientos y tristeza, explicaba los motivos de su proceder y señalaba los delitos de los que se acusaba a los templarios: “Como bestias de carga privadas de razón, superando de hecho la irracionalidad de las bestias en su bestialidad, han abandonado a Dios su creador y ofrecido sacrificios a los demonios y no a Dios... gente loca entregada a la adoración de ídolos”.

En cuanto a la manera de proceder contra los templarios, Felipe IV ordena se siga un procedimiento: detener a los templarios, ocultarles el motivo, incautación de los bienes, puesta a disposición de los detenidos bajo el comisario de la Inquisición, interrogatorio y aplicar la tortura si no se obtienen resultados. Si se obtienen, se consignará por escrito y se buscarán unos testigos. La información que se les dará en ese interrogatorio es que la que posee el Papa y el rey de Francia proviene de la propia Orden, de toda confianza, que el Papa lo sabe todo, y que se les perdonará si confiesan y se les reintegrará al seno de la Iglesia.

Hacía pocos años que la Iglesia había emitido una bula en la que se señalaba que en casos de conveniencia manifiesta podrían aplicarse métodos de tortura para encontrar la verdad y defender al pueblo de Dios. En procesos personales, la única defensa que le queda a un individuo es escribir un alegato de inocencia y listar en él los nombres de sus enemigos, de manera que si el tribunal o la comisión de la Inquisición comprueba que el delator figura en esa lista, el reo quedaría libre. En el caso de los templarios se presentó una circunstancia especialmente desfavorable para ellos: se les detuvo, se les interrogó y se les torturó individualmente por crímenes como la herejía y la idolatría que se supone que cometió la orden al completo, es decir, se les acusa personalmente por delitos colectivos. O, por decirlo de otro modo, cuando el responsable de una encomienda de provincias era interrogado y torturado en París, o en Lyon: ¿que nombres de enemigos va a reseñar en su alegato de inocencia un sargento templario de una pequeña encomienda perdida en la falda de un monte de Carcassonne, por ejemplo?

Algunos escritores –de hecho, la gran mayoría-, ante el hecho de la uniformidad en las descripciones de la ceremonia de ingreso y de algunas de las herejías descritas, sugieren la aplicación de un cuestionario en los interrogatorios y torturas.​ Esto no es descabellado, pues ya la orden de detención iba acompañada de las acusaciones en que se basaba y sobre las que se debía interrogar a los templarios, pero el manifiesto de procedimiento emitido por la casa real francesa lleva aparejada una lista con acusaciones básicas –entre las que se encuentra la apostasía por adoración de un ídolo​ que hay que confirmar, aun bajo la aplicación de la tortura. Lo único que varía es la descripción del tan nombrado ídolo por parte de los reos –ver el apartado posterior al respecto Nombre)- que nunca llegó a despertar sorpresa ninguna en los inquisidores.

Además, con respecto a las declaraciones obtenidas, es sintomático que en las zonas de Francia –ni que contar fuera de ella- donde no se aplicó la tortura a los templarios, algunos de ellos llegaron a mencionar la renegación de la cruz o de Cristo, pero ninguno nombró al famoso ídolo.​ Jules Michelet señala que las variantes son prueba de culpabilidad pero no llega a analizar las uniformidades ni a justificar la existencia de esas variantes, sobre todo cuando algunos presos templarios habían sido iniciados en ceremonias de ingreso bajo los mismos dignatarios de la Orden, pero con herejías e ídolos completamente diferentes.

Dentro de la lista de cargos reunidos contra los templarios, lista que proporciona la comisión inquisitorial, probablemente a instancias de Felipe IV para su entrevista en Poitiers con Clemente V, aparecen más de cien acusaciones. Las referentes a la idolatría son: adoración de un gato que se les aparecía en las asambleas, que en cada provincia había ídolos, a saber, cabezas, alguna con tres caras, otras con una, y otras era una calavera humana, que adoraban a esos ídolos, o a ese ídolo, y especialmente durante los grandes capítulos y asambleas, que las veneraban, que las veneraban como a Dios, que las veneraban como a El Salvador, que decían que esa cabeza podía salvarlos, que podía hacerlos ricos, que les dio la riqueza de la Orden, que hizo que los árboles florecieran, que hizo que la tierra germinase, que tocaban o rodeaban cada cabeza de los citados ídolos con pequeños cordones, que luego se ceñían alrededor del cuerpo, cerca de la camisa o de la carne, y que actuaban así como veneración a un ídolo. En las zonas de Francia donde no se procede a los interrogatorios con torturas, o no se cobran confesiones, o si se cobran son muy ligeras: renegación de Cristo y la absolución que daba el Maestre a algunos miembros de la Orden.

Cuando se celebraron los concilios provinciales en otros países, el resultado fue claramente a favor del Temple, en el sentido de que no reconocieron su participación en actividades heréticas, mágicas, o demoníacas. Por ejemplo, en un interrogatorio llevado por el Arzobispo de Tarragona sobre 32 templarios, en la casa de los dominicos de Lérida, en 1310, ninguno admitió las acusaciones.​ Los reos de Nápoles, bajo la bota de Carlos II de Nápoles y Sicilia, pariente de Felipe IV, reconocieron haber oído hablar de un gato o de un gato gris.

En los Estados Pontificios no se consiguió ninguna declaración. Sin embargo, cuando se insistió ante Clemente V y acabaron aplicando la tortura, se encontraron confesiones sobre la cruz, los besos obscenos y la adoración de un ídolo.​ En Lombardía y la Toscana se aplicó la tortura por orden de Clemente V. No obstante, aunque no se incluyeron en las actas del proceso en esa zona, se obtuvieron más negativas a las acusaciones que confesiones de culpabilidad.​ En Alemania los 37 templarios protestaron su inocencia y se ofrecieron a pasar la prueba de fuego para demostrarlo, así como un buen número de testigos ajenos al Temple.​ En un lugar más aislado, y con un cierto resentimiento hacia los templarios, por varias décadas de política poco afortunada, como es el caso de Chipre, los testimonios, de dentro y de fuera de la Orden, eran totalmente exculpatorios.

Para terminar esta prolija mención a las declaraciones de inocencia que la Orden mostró por medio de sus miembros interrogados en diversos países, queda reflejar la inocencia que quedó manifestada por los defensores del Temple durante su proceso en Francia. Ante la comisión papal para investigar los cargos e interrogar a los templarios reos y libres, se formó, con el paso del tiempo –proceso que culminó en 1310-, un grupo de más de 600 miembros de la Orden que querían asumir su defensa –lamentablemente, contando con un escaso apoyo de los dirigentes, como es el caso del Maestre Jacques de Molay-, a pesar de que algunos de ellos ya habían sido interrogados y torturados, rebatiendo sus propias declaraciones y cayendo, sabiéndolo o no, en el peligro de ser supliciados por relapsos –retractarse de una confesión previa de culpabilidad-. Este conato de defensa quedó abortado cuando el arzobispo de Sens –jurisdicción de París-, actuando como director de su propia comisión provincial papal, consideró culpables de herejía y relapsos a 54 templarios, los cuales fueron quemados vivos en la hoguera. Ninguno de esos 54 templarios ejecutados sin compasión confesó su participación en actividades heterodoxas en sus ceremonias de ingreso ni, por descontado, confesaron haber tratado con un ídolo.

Un aspecto a añadir para terminar este apartado es la voluntad de la Corona francesa, por medio de sus agentes, senescales y caballeros armados, de encontrar el famoso ídolo templario. Por orden real se peinaron todas las casas, iglesias y encomiendas templarias con el objetivo de llevar a París cualquier imagen, ligeramente apartada de la ortodoxia, que pudiera tomarse por el famoso ídolo. No se encontró más que una imagen en la casa de la Orden en París, el famoso Temple. Se trata de una cabeza de mujer que podría ser un relicario –ver más adelante, en el apartado Descripción-. Un corolario a estas pruebas extraídas de las actas de los procesos contra los templarios es que la aparición en escena de un ídolo llamado Baphomet se ciñe a las proximidades o influencia de la Corte Francesa. En zonas más alejadas, periféricas o ajenas no se encontraron testimonios, pruebas ni indicios de la existencia de un "Baphomet" templario.


Nombre

El nombre ‘baphomet’ proviene de la única mención similar procedente de un testimonio, el de Gaucerand, sargento de Montpezat, cuando a preguntas de sus inquisidores, responde que se “adora un ídolo con la figura de un bafomet” –in figuram baffometi-, barbado y de color dorado.26​ Tal como se ha comentado en las líneas precedentes, era de dominio público que para referirse a ídolos, o a la idolatría, se utilizara el término “bafomets” o “bafomético”, respectivamente. Es decir, este testimonio solo indica que se trataba de una imagen fuera de la ortodoxia de la época. También se apunta por otros que el calificativo bafomético podría mostrar la intención de señalar algo derivado de Mahoma, en lengua de Oc, es decir, de carácter demoníaco.

Lo cierto es que no se dispone, en ninguna de las declaraciones obtenidas, bajo tortura o no, de un nombre que pueda referirse al ídolo usado en capítulos y ceremonias de ingreso, lo cual es, de por sí, bastante significativo, sobre todo cuando se quiere convertir esta acusación como un motivo para eliminar una orden como la del Temple. El único término de que se dispone es ese 'baffometi'. Sobre posibles etimologías respecto a la palabra ‘baphomet’, se puede construir el siguiente resumen:


Baphé-méteous: Una composición griega que vendría a significar “el bautismo de la sabiduría”.

Bios-phos-métis: También del griego, significaría “vida, luz y sabiduría”.

Bfmaat: Que en enochiano se traduce como “el Abridor de la Puerta”, propuesto por la ocultista Madeline Montalban, fundadora de la Orden de la Estrella de la Mañana.

Bapho o Bafo: Nombre que recibe un puerto de la isla de Chipre, en el que antiguamente se adoraba a la diosa Astarté realizando sacrificios de niños.

Ptah-Sekjmet: Contracción que utiliza dos nombres de deidades de la antigua Menfis; una solución propuesta por Jean-Louis Bernard.

Abufihamat: Corrupción de la palabra árabe que alude al “padre de la comprensión”, propuesta original recogida por René Lachaud.

Mahomet: Como alusión al musulmán o al profeta Mahoma, quizás derivación o parentesco del grito con que los castellanos se refieren a Mahoma: Mafómat, según aparece en El Poema de Mío Cid.

Bapheus: Etimología propuesta por Fulcanelli, relacionada con la alquimia, traduciéndolo por “tintorero”, en el sentido de cosechar el licor del fuego espiritual.​

Baphens-mété: Cuya traducción sería “tintorero de la luna” –alquimista-, una solución alquímica propuesta por Gerard de Séde, pues el pintor de la luna es el que tiñe la plata, es decir, el que la convierte en oro.

TEMpli Omnium Hominum Pacis ABbas: leída al revés, es decir, cabalísticamente.​ Proviene de Jean Argentier que afirmaba: "Padre del templo de la paz universal a los hombres", aunque podrían entresacarse otras traducciones igualmente válidas

TEM-OPH-AB: Leído de derecha a izquierda, es decir, cabalísticamente también, que vendría a significar “parte de la serpiente de los orígenes”.

Bap-Homet: Unión de las tres primeras letras de San Juan Bautista (Baptiste) y de las últimas cinco de Mahoma (Mahomet), bien en un intento de mostrar sincretismo entre el cristianismo y el islamismo, o bien como indicación de la intrusión de las creencias musulmanas en el interior del Temple, en una propuesta de John Charpentier.

Mahomet o muhammad: Deformación oral de esta palabra que significa un ídolo de origen musulmán al que adoraban los templarios en sus capítulos, sin caer en la cuenta de que los musulmanes no toleran la idolatría; o como deformación de la palabra bohomerid –aportado por el mismo autor, Sylvestre de Sacy-, que significa mezquita.

Bahumid: Deformación de la pronunciación de esta palabra, cuya traducción sería becerro; una solución propuesta por Hammer-Purgstall.

Oubah-phoumet: cuya traducción sería “la boca del Padre”, solución propuesta por Jacques Breyer.

Maufé: propuesta de Partner, pues maufé suena muy parecido a ‘bafomet’. Maufé se refiere a un demonio citado con frecuencia en el folclore de los países del norte de Europa.

Uba El Fumet: Expresión árabe que querría traducir como “Boca del Padre”, otra propuesta apuntada por Gerard de Séde.

Sophía: En 1983 el investigador Hugh Schonfield, realizó el siguiente ensayo; escribió Baphomet en hebreo, y aplico la clave Atbash, convirtiéndose en Sophía, término griego para designar sabiduría.


Según testimonio arrancado a Radulphe de Gisy, o Raoul de Gisy,​ el 9 de noviembre de 1307, recaudador del Temple para la zona de la Champagne: “...el capud,... tenía los rasgos de un diablillo,... todos lo adoraron”. Dos años después, cuando se le pidió una ratificación de su declaración señaló que no lo había visto más que dos veces, y no visto sino supuesto, pues estaba debajo de una tela, y en esas ocasiones nadie lo había adorado. Otro testimonio, de Taillefer de Gène, describe “...una cabeza de hombre, casi roja...”, aunque posteriormente añadió que no la había visto y ante preguntas insistentes, señaló que estaba demasiado lejos de él. En las confesiones de abril de 1310 Hugues de Buris y Pons Guillard de Lignac la describen como una cabeza humana, colocada sobre un altar o sobre un banco, respectivamente. Hugo de Pairaud también la describe así, pero añade que “...tenía cuatro pies, dos pies delante y otros dos pies detrás”. Más preciso resulta Barthelemy Boucher, cuando la describe como “se parece a una cabeza de templario con un gorro, y tenía una barba larga y blanca”.


El resumen de las apariencias que se asignan a la cabeza, de los capítulos de ingreso de la Orden del Temple sería, según los testimonios sacados durante el proceso:


La cabeza está guardada en un saco, un cofre, un relicario o un armario.

La luz ambiental es mala: producto de una chimenea o la escasa llama de una vela.

Se trata de una representación imaginaria, como un demonio o un diablillo o, más francamente, la de Satanás.

También aparece descrita como un gato o un felino negro, estos últimos de pie o patas arriba, con el rabo enhiesto. También son gatos de varios colores. Además desaparecía inmediatamente que se le había adorado.

Se trata de un ternero que está colocado sobre un altar.

También podría ser la de un carnero, un becerro o de un macho cabrío.

Hay un testimonio que indica que se trata de un cerdo de bronce.

El material es hueso, piel, madera, oro, plata o piel humana momificada y madera policromada

Tiene una, dos, tres​ o cuatro caras, pudiendo llevar distintos colores cada una. Si tiene dos, en el camino de la dualidad, una de ellas será claramente positiva y la otra claramente negativa.

Viene sostenida por una peana, o por cuatro pies, o no tiene soporte.

Cuando es vagamente humana, parece tener mucho pelo, con barbas largas, pudiendo el pelo y la barba ser encrespado y oscuro, o liso y blanco, aunque la barba podría ser roja.

Cuando es vagamente humana parece ser dorada y angelical como la de una Virgen, o la de un anciano con una corona.

Cuando es una cabeza es de madera o de madera cubierta de oro y plata, aunque también puede ser de madera pintada con los colores negro y blanco, o de color blanco en su totalidad.48​ A veces tiene dos cuernos en su parte superior.

En un testimonio aparece una hipótesis: “se trata de la cabeza momificada de Hugues de Payens”.

Sus ojos, o lo que parecería serlo, brillaban en la oscuridad, o bien podría tratarse de piedras preciosas engastadas en su cara.

Suele aparecer sobre la cabeza una pequeña luz difusa, como una nube.

El ídolo se frotaba con grasa de hijos ilegítimos de los templarios para incrementar su poder satánico.

Jean de Taillefer declara que el ídolo es una figura humana que estaba colocada sobre el altar de la capilla de su recepción.

Se trata de un grabado sobre piedra que asemeja a una figura diabólica, sobre la encomienda de Berbezières, en la comarca de Charente. Para no remitir al lector a apartados posteriores, se puede indicar aquí que su función era la de señalar el lugar en el que se encuentra escondido el tesoro de la Orden.

Raymond Ruby declara que se trataba de una figura humana pintada en una de las paredes, en forma de fresco.

Jean de Tour la vio, la figura, pintada sobre una tabla de madera.


Durante el proceso se pidió a los guardianes de los bienes el Temple que trajeran ante la comisión cualquier figura que hubieran encontrado. Lo único que pudieron aportar fue una figura en forma de busto de mujer, de color dorado y hueca, la cual contenía un cráneo envuelto en una tela. Tenía una etiqueta para distinguirla en la que se podía leer: Caput L V III m, es decir, Cabeza 58 m. Solo un testimonio podría acercarse a esta descripción.

Por otro lado, Michel Lamy cita la "Crónica de San Dionisio", donde se menciona un objeto encontrado en el Temple de París, “un viejo trozo de piel, que parecía totalmente embalsamado, como una tela brillante, y que tenía en sus órbitas carbunclos centelleantes como la luz del Paraíso”.

A pesar de las referencias de los acusadores e inquisidores, extraídas, al parecer, de las confesiones arrancadas a los templarios interrogados, sobre el origen sarraceno e infiel del ídolo en cuestión, no parece que ninguna de las descripciones que se dan en las sesiones de tortura, coincidan vagamente con aspectos orientales, moriscos, árabes, etc., propios de un ídolo musulmán.

Fulcanelli sintetiza la descripción con estas palabras: “El bafometo es la imagen sintética en la que los iniciados del Temple habían agrupado todos los elementos de la Alta Ciencia y de la Tradición”,​ aunque sin añadir más sobre su posible apariencia o utilización posterior. Más tarde comentando los artesonados y relieves de la ‘Mansión de la Salamandra’ de Lissieux, Fulcanelli en el VII parágrafo de su estudio alude al significado alquímico de lo que él llama el ‘verdadero Bafomet’: “`un emblema completo de las tradiciones secretas de la orden´ y un `paradigma esotérico´..., constituido por un triángulo isósceles invertido (símbolo del agua), dentro del cual, en el centro, se inscribiría otro con el vértice hacia arriba (símbolo del fuego contenido en el agua). En la base del triángulo invertido se apoyaría un signo semejante a la H, pero con un amplio vástago central en el cual se sitúa un triángulo –símbolo de `el espíritu universal, el espíritu creador, Dios´-. En el interior del gran triángulo, a los lados del pequeño triángulo interior se encontraría un círculo solar y un creciente lunar y, finalmente, soldada a la base del triángulo interior, la cruz rematando un nuevo círculo que completaría el símbolo del azufre (principio activo) asociado al Mercurio alquímico (agente pasivo y disolvente de todos los metales). En la cima del triángulo invertido unos trazos horizontales señalarían la expresión de la radiación de la materia”.

Michelet explica que se trata de una imagen escultural de un arcano, pero sin proporcionar ninguna pista sobre su aspecto, pues señala que puede tener distintas figuras poco variadas entre sí, aunque sugiere que puede tratarse de un pentáculo que aglutine los cuatro animales de los evangelistas, sosteniendo entre ellos el trono del Dios del Apocalipsis.

Los textos alternativos suelen describir al bafomet como una especie de diablo, hermafrodita, con cuernos, barba, y de color oscuro. Los testimonios recogidos durante el proceso tienen poco que ver –aunque alguno concuerde-, y podría estar causado más por la moda ocultista de mediados y finales del siglo XIX que por una verdadera información. Por entonces era fácil encontrar en emblemas y talismanes la figura de un macho cabrío, un buco, con cabeza de cabra, barbado, con alas, emblemas mágicos, brazos que sostienen un báculo, un cetro, una vara, piernas de carnero, o de humano –aunque menos-, que se asientan sobre una esfera que podría representar al mundo. En ese ambiente, se suponía que las brujas que acudían a los aquelarres organizados por el propio Satanás, iban a lomos de estos bucos.

Quizás sea fruto de esa moda, pero es frecuente que algunos escritores asocien el bafomet con un diablo que aparecen en la iglesia de Saint-Merri,59​ próxima a la torre de Saint-Jacques, en el centro de París, o con un diablillo que adorna un capitel de la catedral de Chartres, o en capiteles de Nôtre Dame de París –más moderna-, en la iglesia de Eunate, en Navarra, etc.

La escritora Barbara Frale menciona en su libro: "Los templarios y la Sábana Santa", la posibilidad de que la cabeza barbada venerada por los Templarios, podría ser en realidad la cabeza momificada o incorrupta de Hugo de Payns, fundador de la Orden del Temple.​ Según la autora, los Templarios veneraban a su fundador en ciertas liturgias nocturnas con el culto propio de un santo (a pesar de que Hugo de Payns nunca fue canonizado). Este hecho, pudo incitar a Clemente V amonestarlos para que redujeran el culto a una devoción mucho más sobria y privada. Esto debido a que para la Iglesia católica, Hugo de Payns era simplemente un lego que había escogido el camino de la religión como tantos otros monjes y sacerdotes anónimos.


Funciones

Las funciones que se atribuyen al ídolo templario son tan variadas como sus descripciones, o el origen de su nombre. He aquí algunos ejemplos:


Jean de Cassanhas –a veces Cassagnas- manifestó a su inquisidor que su iniciador en la Orden le dijo: “He aquí un amigo de Dios que habla con Dios cuando así lo quiere. Dadle las gracias de que os haya conducido a esta Orden tal como deseabais”.

Asusta tanto que obliga a los neófitos a postrarse y a rezarle, bien en árabe, o en latín –“¡Deus adjuvame!”-.

Se colocan múltiples cordeles blancos sobre ella y luego se ciñe uno a la cintura del recién ingresado. Los cordeles, o cuerdas, son blancos, o claros, con nudos o sin ellos. Del tamaño apropiado para la cintura o cuelgan un poco.

La figura bafomética habla, incluso cuando se trata de un gato, o se mantiene en un majestuoso silencio. Si habla, nadie recuerda lo que dijo. Parece que se dedicaba a profetizar.

Es una cabeza que tiene la capacidad de hablar, pudiendo responder a cualquier cuestión que se le plantease.

Proporciona riqueza y salud a los que lo veneran, según algunas de las palabras acusatorias de la inquisición y de los agentes de Felipe IV.

Hacía florecer los árboles y crecer las plantas, lo que indicaría que se usaría en encomiendas específicamente agrícolas, pero tampoco se daba ese caso.

Poder oscuro, satánico y negro a sus controladores, según figura en la acusación de la Inquisición contra los templarios.

Se la adora como al Salvador de la humanidad y como al Salvador del Temple: “Adorad esta cabeza, pues es vuestro Dios, es vuestro Mahoma”.

Se trata de una imagen que pretende que el neófito quede “muerto”, produciendo en él un renacimiento, una entrada en una nueva vida donde predomina otra visión espiritual de cada uno y de su entorno.

Otra interpretación más sincrética es la que aporta Fernando Arroyo68​ cuando afirma que el bafomet templario podría ser un símbolo de “la dualidad de Dios... La comprensión dualista del Universo... El Bautismo de Fuego (alquímico) hacia la Iniciación”. En su teoría Arroyo completa su tesis aliándola con una ceremonia bautismal sincrética e integradora que usaría símbolos celtibéricos y de raíz indoeuropea, más que hebrea. No obstante, al final de su artículo, apuesta más por la voluntad de trascendencia de la Orden del Temple, ya sea con el uso de ciertas ceremonias y símbolos o no, que por un símbolo concreto denominado bafomet.

Michelet apunta de manera similar, citando a San Buenaventura, cuando dice que en la estatua había que buscar tres sentidos: el alegórico, el moralista y el anagógico.69​ Aunque se entretuvo, brevemente, en los dos primeros, no llegó a dejarnos una descripción más exhaustiva de la imagen, del símbolo y de su aplicación.

En este sentido, Carlos Raitzin describe un ritual de iniciación al que llama Antiguo Ritual de Iniciación de un Caballero Templario Elegido.70​ No enseña el enmarque actual de esa ceremonia pero guarda similitudes con una ceremonia de concesión de un grado elevado dentro de la rama masónica Ordo Militiae Crucis Templi que deriva del Barón von Hundt y de la Estricta Observancia Templaria. Explica que el baphomet –pues lo llama así-, está constituido por un cuerpo con dos caras horribles con cabellos como serpientes, bocas entreabiertas y miradas de codicia. Una cara llevaba sobre sí una corona real y en su mano llevaba un cetro, mientras que la otra cara, más amenazante, portaba una tiara pontificia y en su mano un crucifijo, aunque temblorosamente. La tensión entre los pesos proporcionaba el rictus horroroso y todo se fundamentaba sobre dos pilones que se apoyaban sobre dos pies de los que manaba tinta roja, semejando sangre, para simbolizar que la muerte de muchos seres nunca iba a detener al monstruo. En las ceremonias de ingreso se usaba también, a veces, a un templario convenientemente disfrazado. La finalidad del ritual –descrito pormenorizadamente-, basado en una leyenda que se le narra al neófito por parte del director de la ceremonia, es mostrar la influencia maléfica de la dualidad. El recipiendario debía avanzar y matar a ese monstruo, pisotear sus dignidades –corona y tiara- y pasar a un templete donde seguía otra parte de la ceremonia de recepción. Este ritual lo data en el siglo XIII y la fuente de donde lo extrae es el libro Les Templiers, de M. J. Brisset, Edt. Ambrois Dupont, 1837, París.


Hipótesis más frecuentes

Sin hacer mención de bibliografía y referencias al respecto se muestra a continuación una pequeña lista de hipótesis lanzadas por diversos autores para explicar la presencia de bafomets en los capítulos secretos de la Orden del Temple:


Es un símbolo iniciático

Es un símbolo satánico

Es un símbolo más dentro de una ceremonia iniciática

Es una imagen del infiel al que hay que perseguir

Es una imagen a la que se le solicita riqueza y fertilidad

Es una escultura a la que se le pide suerte

Es una cabeza momificada de San Juan Bautista

Es una cabeza disecada de Hugues de Payens, el fundador del Temple

Es una representación de Mahoma

Es un ídolo que representa al único Dios, de los cristianos y de los musulmanes

Es una imagen diabólica para prácticas satánicas

Es una representación del Diablo para adorarla

Es una cabeza que representa a Jesucristo

Es un abraxas

Es una representación de un buco, un cabrito lacayo de Satanás

Es una imagen de en lo que se convierte un templario prisionero de los sarracenos

Y unas cuantas ideas más: pinturas, modelos, superstición, parlanchín, etc...


El Bafomet en la Regla del Temple

La Regla del Temple​ no menciona en ninguna ocasión nada semejante a un ídolo, imagen, pintura, o escultura, que se utilizara en las ceremonias de ingreso. Esto es coherente con el hecho de que tampoco describe cómo deberá ser esa ceremonia para el acogimiento de un nuevo templario.

En los Retrais, especie de Estatutos, posteriores a la Regla, pues se supone escritos entre los años 1165 y 1187, se indica en su artículo 231 –uno más de una lista por las que un hermano perdería su hábito y sería expulsado de la Orden-, perteneciente a la sección «Penitencias»: “La octava cosa es la herejía, o quienquiera que vaya contra la Ley de Nuestro Señor”. Dentro de los Retrais, en el apartado de Vida Conventual –de fecha posterior, como un añadido a los Retrais antecedentes-, se describen faltas que ocasionan la pérdida del hábito y la expulsión de la Casa. Uno de ellos, el artículo 422, dice: “La séptima es si se descubre que un hermano es hereje, es decir, si no cree en los artículos de fe en los que la Iglesia de Roma cree y le manda creer”.

Hay un añadido en los Retrais que muestra ejemplos de situaciones o actividades mal hechas para que no quepa ninguna duda sobre la detección de faltas y su castigo. En los artículos 571 y 572 se habla de circunstancias que causan la pérdida del hábito y de la casa: “ser hombre de mala fe”, “no creer en la fe de Jesucristo”, “hacer cualquier cosa contra la ley de Nuestro Señor”. Además, para este último caso, se describe el caso de tres templarios que en el castillo Château Pèlerin realizaron prácticas de sodomía y cómo fueron castigados.

Los artículos de los Retrais que van del 657 al 686 son homogéneos en el sentido de que tratan de un tema común: el ingreso en la Orden de los neófitos. Por ello se suelen agrupar, en la bibliografía, bajo el título: “Acogida en la Orden”. En ellos no se menciona en ninguna ocasión acto que pudiera tacharse de poco ortodoxo siquiera.

Según algunos autores,​ existe una segunda regla, denominada Regla Secreta o Regla del Maestre Roncelin, traducida por Metzdorff de un documento que, según él, había encontrado en los Archivos Vaticanos a mediados del siglo XIX. La controversia es inmediata pues ante la acusación de que el soporte de esa Regla no tiene la antigüedad requerida, y que el lenguaje interno tampoco se corresponde con el que sería en el siglo XIII o XIV, se responde que se trata de copias que han sido necesarias para la conservación del documento. En esa Regla aparecen tres artículos, de los 20 que tiene, que mencionan el bafomet. El XVI hace referencia a la oración del bafomet, como tercera oración de una fase de la ceremonia de ingreso, donde se recita la introducción al Corán y se explica que sólo hay un Dios; el artículo XVII explica que la siguiente fase de la ceremonia consiste en sacar el bafomet de su sagrario, se recitan alabanzas en árabe, se besa la imagen y se toca con los cinturones; y el artículo XVIII explica cómo se lleva al neófito al archivo secreto y se le enseñan los textos esotéricos, alguno de ellos relativo al “verdadero bafomet”, textos que no debe ver nadie de la Orden ni los eclesiásticos admitidos en ella.


Elementos constituyentes de los baphomets

En esta sección se listan los posibles significados de elementos parciales constituyentes de los 'baphomets' como símbolos con entidad propia extraídos de diferentes tradiciones espirituales.

No ha sido posible encontrar el término «baphomet» como entrada de los diversos diccionarios de símbolos que pueden encontrarse en el mercado, es decir, no parece formar un símbolo con entidad suficiente como para considerarlo como tal. Sin embargo, sí existe cierta unanimidad, salvo pequeños matices, en la consideración que merecen algunos símbolos relacionados con el baphomet para estudiosos de la simbología, siempre y cuando se considere que el bafomet templario era una cabeza pseudohumana con pequeñas variantes. Así, por ejemplo:


Barba

Símbolo de virilidad, de longevidad, de coraje y de sabiduría.​ En cuanto a este último aspecto, es de destacar que las figuras relacionadas con la religión y la sabiduría –o el conocimiento- siempre aparecen barbadas.


Cabeza

El Zohar la relaciona con la luz astral, mientras el arte medieval suele relacionarla con la mente y la vida espiritual. Por otro lado, se la considera símbolo del mundo y cima del cuerpo humano, probablemente, como mencionan otros, debido a la conformación geométrica que presenta. Si estuviera relacionada con algún número, como es el caso de un monstruo de tres cabezas, el símbolo asume tantos aspectos a representar como unidades, así como que se apropia, también, de la simbología del propio número. Por último, Cirlot menciona la simbología de una cabeza de monstruo –muy apropiada similitud con el baphomet, según la declaración de algunos de los templarios procesados-, relacionándola con el Principio, en cuanto tal, o agente transformador, es decir, “el aspecto negativo y disolvente de la divinidad”.


También representa el ardor del principio activo, la autoridad. Es el espíritu manifestado respecto al cuerpo, de paralelismo con el universo por su forma esférica –citando a Platón-, símbolo del 1, del sol y de la divinidad. Algunos santos están acompañados de ella, como es el caso de San Fermín, San Laureano y San Nicasio. Suelen llevarlo en su regazo y suele estar acompañada de la facultad de hablar, relacionada, casi siempre, con la continuación de la predicación del santo/mártir asociado. Aparte del martirio y la continuidad, tiene un tinte baphomético: “...constituir un punto de meditación hacia el que se dirige la oración o pensamiento del fiel”. ​Escritores parcialmente alternativos, como Lachaud, explican una simbología varia: proporciona el choque que lanza al iniciado en un nuevo Camino de perfeccionamiento espiritual, cortar la cabeza del adversario proporciona al guerreo su maná –sabiduría, experiencia, etc.-, también cortar la cabeza del contrario significa cortársela al iniciador –por ejemplo, porque lleve una máscara-, pasando su potencia espiritual al novato. Cortarla es el abandono del cuerpo y de la carne en beneficio del espíritu.


Cordón

He separado el cordón de la cuerda en la descripción de este apartado, porque así aparece en algunos libros, y porque se trata de un cordón anudado lo que se ciñe en los neófitos del Temple. En algunos testimonios se habla de una cuerda con nudos. Ante esta dualidad de posibilidades he optado por tratar los dos casos separadamente. Aparece ciñendo la cintura de los frailes franciscanos. En concordancia con la creencia sufí y chamánica, Atienza propone el simbolismo de la ascensión personal, una ligazón entre el individuo y lo sagrado o lo divino, también signo de dominación sobre las fuerzas del universo.


Cuerda

Conviene recordar, tal como se escribe más adelante, que la función básica del baphomet, a tenor de las declaraciones obtenidas en las torturas inquisitoriales del proceso a los templarios, es la de colocar un cordón con nudos sobre él y después ceñírselo a la cintura a los que acababan de ingresar en la Orden, como apartado final de su ceremonia de ingreso. La cuerda es símbolo de ascensión, así como del medio y de la voluntad de ascender. Si está anudada representa una ligadura a un grupo, asociación, misión o idea, así como virtudes secretas y mágicas. En el Corán representa la ascensión al cielo.​ Si tiene nudos se utiliza también en la decoración de templos masónicos, como símbolo de la cadena de unión que existe entre todos los masones.


Cráneo

Es la sede del pensamiento, homólogo de la bóveda celeste –quizás también por su forma-, como un paralelismo entre el microcosmos humano y el macrocosmos de la totalidad. Es el centro espiritual, el cielo del cuerpo humano, también sede de la fuerza vital, espiritual y gnóstica. También es el símbolo de la putrefacción alquímica, señal de perfección espiritual. A veces el cráneo viene representado –o acompañado- por dos tibias cruzadas, conformando una cruz de san Andrés. Para los masones es el ciclo iniciático, en el sentido de la muerte como preludio o hito necesario para un crecimiento superior. ​La cabeza aparece acompañando a algunos santos anacoretas, como San Bruno y San Pedro de Alcántara –frecuentemente sujetándola en su propio regazo-, así como a las representaciones de María Magdalena –también sobre el regazo-. Su significado básico es el de contenedor del cerebro, pero también es la cima del ser humano, lugar sagrado del cuerpo y símbolo del descubrimiento del saber supremo.

La mayoría de los escritores se dejan llevar por el trágico/romántico final de la Orden del Temple y en los últimos capítulos de sus libros concluyen con un veredicto de inocencia para la misma. Para estos, como para los escritores más ortodoxos –escritores que no suelen mencionar las acusaciones nada más que como dato histórico, como Jesús Fuentes Pastor, Ramiro Gil Coma o Règine Pernoud-, las acusaciones que se utilizaron para llevar a cabo el proceso y la extinción del Temple, eran completamente falsas. Como máximo, algunos de ellos llegan a admitir que algún templario pudiera haber cometido la más probable, como es el cargo de sodomía.

Por lo que respecta a la existencia de un ídolo heterodoxo en el seno de la Orden, utilizado en las ceremonias de ingreso o en otras de carácter iniciático, el examen de los documentos y de las actas del proceso no lleva a esa conclusión. Existen varios argumentos que refuerzan esta hipótesis y que se ven apoyados por la documentación existente y las investigaciones que al respecto han llevado a cabo distintos historiadores recientemente. Seguidamente se hace un repaso de estos argumentos y se analizan brevemente.

Si el bafomet existió, se usó en capítulos secretos. Las declaraciones de algunos testigos –por ejemplo, en Inglaterra hay uno que lo señala así-​ marcan ese camino. Es lógico pensar que así se tratase, tanto si se usa para ceremonias iniciáticas como para sesiones de idolatría. Sin embargo, debía de tratarse de un secreto a voces, pues, aunque el número de confesiones obtenidas en ese sentido es bajo, termina siendo un porcentaje significativo respecto al total de las conseguidas. Pero eso sí, solo en Francia, pues las declaraciones ajenas al ámbito de influencia directa de Felipe IV se pueden contar con los dedos de una mano. Además, la ruptura del secreto se abre a personas extrañas a la Orden y a la Iglesia, pues muchas de las declaraciones que van en ese sentido son de testigos ajenos. Por último, y sin que esto sirva como prueba definitiva, lo cierto es que se buscaron figuras, imágenes y cualquier tipo de ídolo en todas y cada una de las posesiones de la Orden, en Francia, en el entorno de la influencia francesa –Navarra, por ejemplo-, y en otros países, aunque con menos ahínco, y jamás apareció nada que se le pareciese en lo más mínimo, salvo la cabeza-relicario señalada más arriba.

La finalidad del bafomet. Para los escritores alternativos o imaginativos más modernos, el uso del bafomet era puramente iniciático. Formaba parte de una ceremonia para transmitir al neófito un conocimiento por medio del simbolismo. Sin embargo, para los templarios de la época, los que hablaban tras un costo importante en dolor, miedo, hambre, humillación y vergüenza, su finalidad era exclusivamente pagana e infiel: la adoración de un animal, de una cara, de un busto, petición de riquezas para la Orden, oraciones inentendibles, superstición –tocando el cordón del cinto para recoger sus cualidades: invulnerabilidad, por ejemplo-, predicciones o profecías, etc. La Regla Secreta va por ese camino intentando utilizar al bafomet como un mecanismo para demostrar a los caballeros que sólo hay un Dios y que Jesús es sólo un profeta más. Sin embargo, esos escritores que se apoyan en ese documento, por ejemplo, inciden en lo iniciático, describiendo ceremonias que no concuerdan con las que menciona la Regla Secreta –suponiendo que sea auténtica-, ni con las descritas por los presentes en esas recepciones esotéricas. Si era iniciático lo sabía mucha gente, y muchas de esas personas, que lo sabían, parecen faltas de cualquier tipo de cualificación iniciática. Por otra parte, solo se practicaban estos ritos de iniciación en Francia cuando sería más eficaz realizar ese tipo de ceremonias en Tierra Santa. Por último, si lo que se pretende es un impacto iniciático, una transmisión eficaz por medio del símbolo, ese bafomet cobraba formas muy diversas, a tenor de los testimonios recogidos. Podría argumentarse que se trata de una desviación sin más, alejándose de la ortodoxia eclesiástica. Para acabar, la finalidad podría ser únicamente supersticiosa, como lo sería si se tratase de la cabeza de Hugues de Payens –como sugieren algunos-, o de la cabeza de Silvestre II, o de una representación de la cabeza de Juan el Bautista, finalidad esta que podría confesarse perfectamente sin caer en delito alguno, si bien la diversidad de formas –ver próximo párrafo- parece descartarlo.

La forma del bafomet. Tropezamos de nuevo con la tortura, pues el tal bafomet, si existió, solo aparece en regiones francesas –excepción hecha, como se decía supra, de aquellas zonas de Francia donde por distintos motivos casi no se aplicó la tortura- y las de su área de influencia. Sin embargo, las confesiones, muchas de ellas arrancadas en el límite de la resistencia, no son unánimes, ni siquiera concordantes. Si dentro de la Orden existe un capítulo interior que intenta la iniciación de los más cualificados no tiene sentido dotar al "baphomet" de distintas apariencias o conformaciones. Es incongruente que una ceremonia capital para la mayoría de los “templarios iniciados”, donde uno de los ejes de la misma es la figura o bafomet, haya calado tan escasamente en la memoria de los confesos. Hay que tener en cuenta que en las ceremonias de carácter iniciático se le da mucha importancia al símbolo –que queda grabado en el recuerdo-, como lanzadera de la comprensión necesaria para el avance espiritual, pero ese símbolo carece de eficacia cuando adquiere diversas morfologías, incompatibles entre sí, aunque puede aceptarse que dé miedo, como se describe al bafomet en alguna ocasión.

La gestión del bafomet, que estará a cargo de un grupo reducido, interior, esotérico –por lo de secreto- y geográfico, es decir, existiendo uno para cada provincia, pues parece poco probable que ese grupo conservador e iniciador viaje de provincia en provincia iniciando caballeros, es complicada, arriesgada y trascendental, sobre todo si la finalidad es iniciática. Probablemente ese grupo interior, esotérico –también por lo de esoterismo- y, forzosamente, reducido y elitista –en el sentido de elegidos-, asumiría directamente tal responsabilidad. Tal grupo, o círculo interior, y aunque el sentido común parece aconsejar su existencia dada la extensión territorial y la amplitud de actividades del Temple, nunca se ha mencionado en ningún documento que haya trascendido,85​ ni relacionado directa ni indirectamente con la Orden, y no comulga con el espíritu de la Regla ni de los Estatutos.86​ Alguien puede pensar que si se trata de un círculo secreto e iniciático, no existirán cartas, informes, o procedimientos escritos, pero la narrativa oral es susceptible de explicarse tras varias sesiones de tortura. No obstante, a partir de todas las declaraciones que mencionan ceremonias de iniciación secretas, parece que ese círculo se puede suponer, incluso vislumbrar, pero, sin embargo, aparece un inconveniente: este círculo es demasiado amplio, pues los maestres, preceptores, senescales y comendadores que aparecen en las diversas ceremonias son tantos y de tal diverso grado, que parece que más que círculo interior existía otra Orden completa dentro del Temple, casi tan amplia como la original.

Su significado o su simbolismo. Está claro que el uso de una figura de estas características debía tener un significado importante. Lamentablemente, tal y como se desarrolló el proceso a los templarios, no se puede asignar un simbolismo o un significado únicos por dos razones: por la amplia variedad de formas que asume el ‘bafomet’ y porque ninguno de los confesos supo aclarar para qué se usaba ese ídolo. No sólo se desconoce la utilidad del ídolo en sí, lo que ayudaría a esclarecer la simbología que debería soportar, sino que se desconoce la finalidad de la ceremonia en cuestión. Algunas versiones, poco usuales, hablan de una ceremonia de re-recepción, es decir, parece que se trata de una ceremonia de recepción repetida para los caballeros que han mostrado un cierto nivel de conocimientos. Otros, basándose en los testimonios del proceso, indican que se trata de una ceremonia de recepción de nuevos caballeros, una ceremonia de ingreso. Son los dos casos básicos de utilización de “ídolos” en el Temple, aunque predomina, con mucha diferencia, la segunda opción. Esta alternativa de ceremonias procede de la declaración de un templario en Inglaterra. El problema radica en la segunda opción –la más frecuente-, porque, al tratarse de una ceremonia de ingreso para neófitos no tiene sentido someterles a un rito cargado de esoterismo y simbolismo, si se supone que no tienen cualificación todavía. Esta es una contradicción que tienen que resolver los escritores alternativos, pues si se trata de una ceremonia de iniciación –como por ejemplo defiende la tan referida Regla Secreta del Temple-, no tendría sentido aplicársela a los caballeros que van a ingresar de novo en el Temple. No obstante, aún suponiendo que se trate de eso precisamente, qué simbología debería aportar el ‘bafomet’ para contribuir eficazmente a tal ceremonia. La respuesta a esa cuestión debería darse en función de los conocimientos que vayan a transmitirse: pueden ser de carácter cristiano ortodoxo –por ejemplo, conceptos y respuestas propias de los Padres de la Iglesia-, heterodoxo –relacionado con Doctores de la Iglesia alternativos: Eckhart, San Alberto Magno, San Agustín, Orígenes-, propios del esoterismo occidental –hermetismo, alquimia-, esoterismo hebreo –kabbalah-, o esoterismo oriental e islámico –sufismo-. Afortunadamente el Esoterismo es común a todas las tradiciones, aunque el punto de vista cambie de una a otra. Sin embargo, a la luz de algunas sugerencias, cabría peguntarse si el esoterismo transmitido sería verdaderamente tradicional o si se desviaría hacia un enfoque más ocultista, si hacemos caso de las declaraciones encaminadas hacia la idolatría. Cuando se trabaja a distancia sobre el espíritu de las personas, se hace necesario un soporte –por ejemplo, un libro- y algunas imágenes elocuentes y simbólicas, pero cuando se trabaja directamente con los propios individuos –y es lo que parece deducirse de las confesiones recogidas-, no parece ser necesario utilizar esculturas, formas extrañas o de difícil comprensión, hipérboles, etc.

Cuando se intenta aplicar a un ‘bafomet’ una investigación sobre los cinco aspectos esenciales: ceremonias secretas, finalidad, forma, gestión y simbolismo, parece que la hipótesis de partida, la de que existieron los bafomets y se utilizaron en tales ceremonias –que probablemente eran iniciáticas-, no resiste el análisis.

Se puede dar por sentada una hipótesis de partida con los datos de que se dispone actualmente en la variada y prolija bibliografía existente sobre la Orden del Temple: los bafomets no han existido más que en la imaginación de carceleros e inquisidores próximos a Felipe IV, pero como imagen sujeto de adoración y prácticas profanas e infieles, o ceremonias de carácter iniciático poco Tradicional. No obstante, eso no significa que no exista un cierto simbolismo relacionado con los templarios y, a su vez, relacionado con las cabezas.


Repercusiones

Esoterismo

Por lo demás, a partir de 1854, con la aparición de Dogma y ritual de la alta magia, obra del célebre ocultista francés Eliphas Lévi, la figura de Baphomet ha sido, en gran medida, tergiversada. Desde entonces, su vinculación con el macho cabrío de los aquelarres, como así también Satanás u otros demonios menores, ha sido inevitable.


En antimasonería y teorías de conspiración de ingeniería social

Serge Abad-Gallardo, miembro dimitido de la Masonería francesa de la obediencia masónica de la Orden Masónica Mixta Internacional Le Droit Humain - El Derecho Humano habiendo alcanzado el 18º grado masónico, cita el 29 grado masónico perteneciente a los altos grados masónicos como colocando al candidato para el grado frente a una efigie de Baphomet y al lado un crucifijo que el candidato debe pisotear. Él mal interpreta esto rito masónico en el sentido de que la glorificación del hombre buscado pasa por el rechazo del Dios de los cristianos. Cyril Dougados, miembro resignado de la Masonería francesa de la obediencia masónica de la Gran Logia Nacional Francesa habiendo alcanzado el 32.º grado masónico, especifica que en los altos grados, supuestamente el ojo de la providencia es reemplazado por un Baphomet. ​El ensayista español Alberto Bárcena Pérez​ publicó el rito masónico arreglado en el cual hicieron que tuviera referencia a Baphomet.​ Del mismo modo, el ensayista español Manuel Guerra Gómez denuncia la procesión de Baphomet, también en el 29º grado masónico del Rito Escocés Antiguo y Aceptado, señalando que la genuflexión en su homenaje se hace doblando la rodilla izquierda en lugar de la rodilla derecha para una genuflexión católica ante la adoración eucarística. ​El Baphomet en la masonería también aparece en el broma de Taxil, también en el 29º grado masónico del Rito Escocés Antiguo y Aceptado, el de "Gran escocés de San Andrés de Escocia" o "Caballero de San Andrés de Escocia "en su obra" Los misterios de la masonería "(1886).