quarta-feira, 14 de fevereiro de 2024

Candomblé

 

Candomblé é uma religião afro-americana que se desenvolveu no Brasil durante o século XIX. Surgiu através de um processo de sincretismo entre várias das religiões tradicionais da África Ocidental, especialmente as de iorubá, banta e bês. Há também alguma influência da forma católica romana de cristianismo. Não existe uma autoridade central no controle do candomblé, que se organiza em torno de terreiros autônomos. As nações mais proeminentes são queto, jeje e banto.

O candomblé se desenvolveu entre as comunidades afro-brasileiras em meio ao comércio atlântico de escravos dos séculos XVI a XIX. Surgiu através da mistura das religiões tradicionais trazidas para o Brasil pelos escravizados africanos ocidentais e centrais, a maioria deles iorubás, fons e bantus, e os ensinamentos católicos romanos dos colonizadores portugueses que então controlavam a área. Ele se formou principalmente na região da Bahia durante o século XIX. Em alguns lugares, fundiu-se com outra religião afro-brasileira, a umbanda. Após a independência do Brasil de Portugal, a constituição de 1891 consagrou a liberdade de religião no país, embora o candomblé permanecesse marginalizado pelo domínio católico romano, que normalmente o associava à criminalidade. No século XX, a crescente emigração baiana difundiu o candomblé no Brasil e no exterior. No final do século XX, surgiram crescentes ligações entre o candomblé e tradições relacionadas na África Ocidental e nas Américas, como a santería cubana e o vodu haitiano. Desde então, alguns praticantes enfatizaram um processo de re-africanização para remover as influências católicas romanas e criar formas de candomblé mais próximas da religião tradicional da África Ocidental.

O candomblé possui aspectos tanto de monoteísmo quanto de politeísmo, envolvendo a veneração de um Deus Supremo (Olorum, Mawu-Lissá, ou Zambi, dependendo da nação) e o culto de seus intermediários, ancestrais divinizados ou forças da natureza personificadas, conhecidos como orixás (nação queto), voduns (nação jeje) ou inquices (nação banto). Derivando seus nomes e atributos de divindades tradicionais da África Ocidental, eles foram por vezes equiparados aos santos católicos romanos em sincretismos. Vários mitos são contados sobre esses orixás, considerados subservientes a uma divindade criadora transcendente. Acredita-se que cada indivíduo tenha um orixá tutelar que está ligado a ele desde antes do nascimento e que informa sua personalidade. Um ritual central envolve praticantes tocando tambores, cantando e dançando para encorajar um orixá a possuir um de seus membros. Eles acreditam que, por meio desse indivíduo possuído, podem se comunicar diretamente com uma divindade. As oferendas aos orixás incluem frutas e animais sacrificados. Oferendas também são dadas a uma variedade de outros espíritos, incluindo boiadero, preto velho, caboclos e os espíritos dos mortos, o egun. Diversas formas de adivinhação são utilizadas para decifrar as mensagens dos orixás. Rituais de cura e preparação de amuletos e remédios e banhos de ervas também desempenham um papel de destaque.

Tradição iniciática, os membros do candomblé costumam se reunir em templos conhecidos como terreiros administrados por sacerdotes chamados babalorixás e sacerdotisas chamadas ialorixás. Cada terreiro é autônomo, embora possa ser dividido em denominações distintas, conhecidas como nações, a partir das quais o sistema de crenças tradicionais da África Ocidental tem sido sua principal influência. Existem cerca de 170 mil praticantes no Brasil, embora existam comunidades menores em outros lugares, especialmente em outras partes da América do Sul. Tanto no Brasil quanto no exterior o candomblé se expandiu para além de suas origens afro-brasileiras e é praticado por indivíduos de várias etnias.

Definição e terminologia

O candomblé é uma religião. Mais especificamente, tem sido descrita como uma "religião afro-americana", uma religião afro-brasileira, uma religião "neo-africana", "uma religião africana de possessão do espírito diaspórico", e "uma das principais expressões religiosas da diáspora africana". O antropólogo Paul Christopher Johnson afirmou que, "em seu nível mais básico", o candomblé pode ser definido como "a prática de troca com os orixás"; a estudiosa Joana Bahia a chamou de "a religião dos orixás". Johnson também o definiu como "uma redação brasileira das religiões da África Ocidental recriada no contexto radicalmente novo de uma colônia de escravos católicos do século XIX". O termo candomblé provavelmente derivou de um kandombele, um termo derivado do bantu para "danças", que também se desenvolveu no termo candombe, usado para descrever um estilo de dança entre comunidades afrodescendentes na Argentina e no Uruguai.

Várias religiões nas Américas surgiram através da mistura das tradições da África Ocidental com o catolicismo romano; devido às suas origens compartilhadas, a santería cubana e o vodu haitiano foram descritos como "religiões irmãs" do candomblé. No Brasil, foi a religião tradicional iorubá que eventualmente se tornou dominante sobre a religião afro-brasileira. O candomblé não é a única religião afro-brasileira, estando intimamente relacionada com outra que também surgiu no século XIX e envolve o culto aos orixás, a umbanda, que geralmente é mais aberta e pública do que o candomblé; enquanto este última emprega canções em línguas africanas, as canções religiosas da umbanda são cantadas em português. Como resultado, o candomblé é muitas vezes considerado "mais africano" do que a umbanda. O termo "umbandomblé" às vezes é aplicado a grupos que mesclam elementos de ambas as tradições, embora seja raramente adotado pelos próprios praticantes. Outra religião afro-brasileira é a quimbanda, que está associada principalmente ao Rio de Janeiro, enquanto o termo macumba tem sido usado principalmente para descrever as tradições afro-brasileiras que lidam com espíritos inferiores, os exus. O candomblé também foi influenciado pelo espiritismo, embora muitos espíritas façam questão de distinguir sua tradição das religiões afro-brasileiras. Os estudiosos geralmente consideram essas diferentes tradições afro-brasileiras como existentes em um continuum, em vez de serem firmemente distintas umas das outras.

O candomblé se divide em diferentes tradições conhecidas como nacões. Os três mais proeminentes são ketu (queto) ou nagô, jeje (gege) ou mina-jeje, e banto; outros incluem o ijexá e o caboclo. Cada um deriva influência particular de um determinado grupo linguístico africano; o queto usa o iorubá, o jeje usa a língua jeje e o bantu se baseia no grupo de línguas bantas. Cada nação tem seu próprio léxico, cantos, divindades, objetos sagrados e conhecimento tradicional, informados por suas origens etnolinguísticas. Apesar de originar-se entre diferenças étnicas, isso tem se desgastado ao longo do tempo, com membros atraídos para diferentes nações por razões diferentes da herança étnica. Em 2012, a nação queto era descrita como a maior. A nação bantu é por vezes caracterizada como sendo a mais sincrética.

O candomblé não é institucionalizado, não havendo uma autoridade central na religião para determinar a doutrina e a ortodoxia. É heterogêneo e não tem nenhum texto ou dogma sagrado central, com variação regional nas crenças e práticas. Cada linhagem ou comunidade de praticantes é autônoma, abordando a religião de maneiras informadas por sua tradição e pelas escolhas de seu líder. Alguns praticantes também se referem a ele como uma forma de ciência.

Praticantes
Os seguidores do candomblé às vezes são chamados de povo de santo, ou candomblecistas. Um indivíduo que deu passos em direção à iniciação, mas ainda não passou por esse processo, é chamado de abiã. Um iniciado mais novo é conhecido como iaô e um iniciado mais antigo é conhecido como ebomi. No candomblé, um sacerdote homem é conhecido como babalorixá, uma sacerdotisa como iyalorixá, ou alternativamente como makota ou nêngua. A escolha do termo usado pode indicar a qual nação uma pessoa pertence.

A maioria dos adeptos do candomblé também pratica o catolicismo romano e alguns sacerdotes e sacerdotisas não iniciam ninguém no candomblé que não seja um católico romano batizado. Alguns frequentam tanto os rituais do candomblé quanto os cultos protestantes evangélicos. O sincretismo pode ser observado de outras maneiras. O antropólogo Jim Wafer observou um praticante brasileiro que incluiu uma estátua da divindade budista maaiana Budai em seu altar, enquanto Arnaud Halloy encontrou um terreiro belga que estava incorporando personagens das mitologias galesa e eslava em sua prática, e a estudiosa Joana Bahia encontrou praticantes na Alemanha que também praticavam o budismo e várias práticas da Nova Era.

Crenças
O conhecimento sobre as crenças e práticas do candomblé é chamado de fundamentos e é guardado pelos praticantes. A terminologia iorubá predomina amplamente, mesmo em terreiros de outras nações 

Olorun e os orixás
No Candomblé, a divindade suprema chama-se Olorun ou Olodumare. Esta entidade é considerada o criador de tudo, mas distante e inacessível. Olorun não é, portanto, especificamente cultuado no candomblé.

Orixás

O candomblé concentra-se na adoração de espíritos denominados orixás ou santos. Os masculinos são denominados aborôs, os femininos iabás. Estes foram concebidos de forma variada como figuras ancestrais ou incorporações de forças da natureza. Cerca de 12 orixás são figuras bem desenvolvidas no panteão do candomblé e reconhecidas pela maioria dos praticantes. Embora geralmente recebam nomes iorubá, na nação jeje eles recebem nomes fon.

Acredita-se que os orixás façam a mediação entre a humanidade e Olorun. Os orixás são entendidos como moralmente ambíguos, cada um com suas virtudes e defeitos; eles às vezes estão em conflito com outros orixás. No candomblé, a relação entre os orixás e a humanidade é vista como de interdependência, com os praticantes buscando construir relações harmoniosas com essas divindades, garantindo assim sua proteção. Cada orixá está associado a cores, alimentos, animais e minerais específicos, favorecendo certas oferendas. Cada orixá está associado a um determinado dia da semana; o sacerdócio também afirma que cada ano é regido por um orixá específico que influenciará os eventos que ocorrem dentro dele. Suas personalidades são informadas por uma oposição conceitual chave no candomblé, a do frio versus o quente.

Oxalá é o orixá chefe, retratado como um velho frágil que anda com um cetro de pachorô como bengala. Os praticantes geralmente acreditam que Olorun o encarregou de criar a humanidade. Em alguns relatos, todos os orixás são filhos de Oxalá e uma de suas duas esposas, Nanã e Iemanjá. Este trio está associado à água; Oxalá com a água doce, Nanã com a chuva e Iemanjá com o mar. Outros relatos apresentam essa cosmogonia de maneira diferente, por exemplo, afirmando que Oxalá foi o pai de todos os outros orixás sozinho, tendo criado o mundo a partir de um pudim de mingau. Uma alegação alternativa entre os praticantes é que Nanã é a avó de Oxalá e mãe de Iemanjá, esta última tornando-se mãe e esposa de Oxalá.

Xangô é o orixá associado ao trovão e ao relâmpago; uma de suas esposas é Obá, uma guerreira que tem apenas uma orelha. Ogum é o orixá da batalha e do ferro, muitas vezes representado com um facão; seu companheiro é Oxóssi, o orixá masculino da caça e da floresta.[86] Obaluaiê ou Omolu é o orixá associado à doença infecciosa e à sua cura, enquanto Ossanhe está associado às folhas, ervas e conhecimentos fitoterápicos. Oiá é o orixá do vento e das tempestades. Oxumaré é considerado como masculino e feminino e é retratado como uma serpente ou um arco-íris. Oxum é a orixá do amor, beleza, riqueza e luxo, associada a água doce, peixes, sereias e borboletas. Ela é casada com Ifá, considerado o orixá da adivinhação. Quitembo é o orixá do tempo; originário da nação bantu, está associado às árvores. Devido à ligação com as árvores, às vezes é equiparado ao orixá queto Loco. O orixá Exu é considerado um malandro caprichoso; como o guardião das entradas, ele facilita o contato entre a humanidade e outro orixá, sendo assim geralmente honrado e alimentado primeiro em qualquer ritual. Sua parafernália ritual é muitas vezes mantida separada da de outros orixás, enquanto as entradas da maioria dos terreiros têm uma cabeça de barro, decorada com búzios ou pregos, que representa Exu e recebe oferendas.

Cada orixá equivale a um santo católico romano. Isso pode ter começado como um subterfúgio para manter a adoração de divindades africanas sob domínio europeu, embora tais sincretismos já pudessem ter ocorrido na África antes do comércio atlântico de escravos. A partir do final do século XX, alguns praticantes tentaram distanciar os orixás dos santos como forma de enfatizar novamente as origens da religião na África Ocidental. Robert A. Voeks observou que era o sacerdócio e os praticantes mais formalmente educados que preferiam distinguir os orixás dos santos, enquanto os adeptos menos formalmente educados tendiam a não fazê-lo. Nos altares do candomblé, os orixás são frequentemente representados com imagens e estátuas de santos católicos romanos. Por exemplo, Oxalá foi confundido com Nosso Senhor do Bonfim, Oxum com Nossa Senhora da Imaculada Conceição e Ogum com Santo Antônio de Pádua. Devido à sua associação com o tempo, Quitembo às vezes é equiparado à ideia cristã do Espírito Santo.

Os orixás são considerados como tendo diferentes aspectos, conhecidos como marcas ("tipos" ou "qualidades"), cada um dos quais pode ter um nome individual. As formas infantis dos orixás são denominadas erês. Eles são considerados os espíritos mais incontroláveis de todos, associados a obscenidades e brincadeiras. As formas infantis dos orixás têm nomes específicos; o erê de Oxalá é, por exemplo, chamado de Ebozingo ("Pequeno Ebô") e Pombinho. A imagem material de um orixá é chamada de igbá.

Relações com o orixá

O candomblé ensina que todos estão ligados a um determinado orixá, cuja identidade pode ser determinada por adivinhação. Este orixá é descrito como sendo dono da cabeça: o "mestre ou senhora da cabeça da pessoa", ou o "dono da cabeça". Acredita-se que eles tenham influência na personalidade e nas interações sociais da pessoa. O gênero deste orixá tutelar não é necessariamente o mesmo de seu humano; a não-heterossexualidade às vezes é vista, de uma forma não negativa, como sendo causada por uma incompatibilidade entre o gênero de um indivíduo e o gênero de seu orixá. Deixar de identificar o próprio orixá às vezes é interpretado como a causa de vários tipos de doenças mentais pelos praticantes. Dependendo do orixá em questão, um iniciado pode optar por evitar ou se envolver em certas atividades, como não comer alimentos específicos ou usar cores específicas. Alguns praticantes também acreditam que existem outros orixás que podem estar ligados a um indivíduo; um segundo é conhecido como juntó, enquanto um terceiro é chamado de adjuntó, tojuntó ou dijuntó. Alguns acreditam que um indivíduo também pode ter um quarto orixá, herdado de um parente falecido.

Exus, caboclos e erês

O candomblé ensina a existência de outros espíritos além dos orixás. Um desses grupos espirituais são os exus, às vezes chamados de exuas quando mulheres, ou exu-mirins quando crianças. Eles são considerados mais próximos da humanidade do que os orixás e, portanto, mais acessíveis. Em contextos rituais, os exus são muitas vezes considerados como os "escravos" dos orixás. Na linguagem comum, eles são frequentemente descritos como "demônios", mas no candomblé não são considerados uma força para o mal absoluto, mas sim considerados capazes de atos bons e maus. Os praticantes acreditam que os exus podem "abrir" ou "fechar" as "estradas" do destino na vida de alguém, trazendo tanto ajuda quanto dano. O candomblé ensina que os exus podem ser induzidos a cumprir as ordens de um praticante, embora precisem ser cuidadosamente controlados.

Também presentes no candomblé estão os caboclos, cujo nome provavelmente deriva do termo tupi kari'boka ("derivado do branco"). Esses espíritos vêm em duas formas principais: boiadeiros ("vaqueiros" ou "sertanejos") e povos indígenas das Américas. Em casos mais raros, os caboclos estão ligados a outros contextos, retratados como sendo do mar ou de países estrangeiros como a Itália ou o Japão. Quase exclusivamente retratados como homens, acredita-se que os caboclos vivam em uma floresta chamada Aruanda, que também é habitada por répteis voadores semelhantes a cobras chamados cainanas. Os caboclos preferem a cerveja, enquanto os exus preferem o vinho e as bebidas destiladas, especialmente a cachaça; os caboclos também são caracterizados como fumantes de charutos. Aqueles praticantes que tentaram "re-africanizar" o candomblé desde o final do século XX tendem a rejeitar os caboclos como sendo de origem não africana.

Nascimento e morte

O candomblé defende uma cosmologia em grande parte emprestada da religião tradicional iorubá. O reino dos espíritos é denominado orun; o mundo material da humanidade é chamado de aiê (ou aiye). Acredita-se que Orun se divide em nove níveis. A morte é personificada na figura de Icu. A cabeça interior de uma pessoa, na qual acredita-se que resida seu orixá tutelar, é chamada de ori.

Os espíritos dos mortos são chamados de eguns. Aqueles que faleceram recentemente são chamados de aparacá, enquanto depois de terem sido "educados" recebendo sacrifícios, eles se tornam babá. Precauções devem ser tomadas em relação a essas entidades, pois elas têm o poder de prejudicar os vivos. Às vezes, eles procuram ajudar um indivíduo vivo, mas inadvertidamente os prejudicam. O contra-egum é uma braçadeira feita de ráfia trançada que às vezes é usada para afastar esses espíritos mortos. Tipicamente desencorajado no candomblé, a possessão por egum é considerada rara, mas acontece. Muitos grupos de canbomblé têm proibições quanto a possessão pelos mortos, por a considerarem uma forma de poluição espiritual, ponto de vista que distingue o candomblé da umbanda. Após a morte, o egun pode entrar no Orun, embora o nível que eles alcancem dependa do crescimento espiritual que eles alcançaram em vida.

Axé
O candomblé ensina a existência de uma força chamada ashe ou axé, um conceito central nas tradições derivadas do iorubá. Walker descreveu o axé como "a força espiritual do universo", Bahia o chamou de "força sagrada", Wafer o chamou de "força vital", enquanto Voeks preferiu o termo "energia vital". Johnson o caracterizou como "uma força espiritual criativa com efeitos materiais reais".

Os praticantes acreditam que o axé pode se mover, mas também pode ser concentrado em objetos específicos, como folhas e raízes, ou em partes específicas do corpo, especialmente sangue, que é considerado conter o axé em sua forma mais concentrada. Os humanos podem acumular axé, mas também podem perdê-lo ou transferi-lo. Acredita-se que rituais e obrigações específicas mantenham e melhorem o axé de uma pessoa, enquanto outros atos rituais são projetados para atrair ou compartilhar essa força.

Moralidade, ética e papéis de gênero

O candomblé geralmente não tem preceitos éticos fixos que espera que os praticantes sigam, embora seus ensinamentos influenciem a vida de seus adeptos. Em vez de enfatizar uma dicotomia entre o bem e o mal, a ênfase é colocada em alcançar o equilíbrio entre forças concorrentes. Os problemas que surgem na vida de uma pessoa são muitas vezes interpretados como resultantes de uma desarmonia no relacionamento de um indivíduo com seu orixá; os relacionamentos estão enraizados em obrigações recíprocas.

A polaridade masculino/feminino é um tema recorrente em todo o candomblé. Muitos papéis dentro do candomblé estão ligados a membros de um gênero específico. Por exemplo, tanto o sacrifício de animais quanto a raspagem da cabeça de um iniciado são geralmente reservados para os praticantes do sexo masculino, enquanto as praticantes do sexo feminino são normalmente responsáveis pelos deveres domésticos na manutenção do espaço ritual. Tais divisões refletem normas de gênero mais amplas na sociedade brasileira. Tabus também são colocados em mulheres durante a menstruação. No entanto, as mulheres ainda podem exercer um poder significativo como chefes dos terreiros, com a maioria dos terreiros na Bahia sendo liderados por mulheres; alguns o chamam de religião dominada por mulheres. O lugar de destaque das sacerdotisas dentro do candomblé levou observadores como a antropóloga Ruth Landes a descrevê-lo como uma religião matriarcal, embora tal caracterização tenha sido contestada.

Há evidências de que o candomblé aceita mais a inconformidade de gênero do que a sociedade brasileira dominante. Embora muitos sacerdotes masculinos na religião tenham sido majoritariamente heterossexuais, existe um estereótipo generalizado de que os praticantes masculinos do candomblé são homossexuais. Os gays descreveram a religião como um ambiente mais acolhedor do que as formas de cristianismo praticadas no Brasil. Eles, por exemplo, citaram histórias de relacionamentos entre orixás masculinos, como Oxóssi e Ossaim, como afirmando a atração masculina pelo mesmo sexo. Alguns praticantes se envolveram em causas políticas, incluindo ambientalismo, direitos indígenas e o movimento Black Power.

Práticas
Johnson observou que o candomblé era uma religião "centrada em rituais", cujos praticantes frequentemente a consideram uma religião "de prática correta em vez de doutrina correta", em que realizar seus rituais corretamente é considerado mais importante do que acreditar nos orixás. Johnson notou que o candomblé dedicava "pouca atenção" à "teologização abstrata". Os rituais geralmente são focados em necessidades pragmáticas em relação a questões como prosperidade, saúde, amor e fecundidade; eles geralmente começam muito depois do horário de início anunciado. Aqueles que se engajam no candomblé incluem iniciados de vários graus e não iniciados que podem comparecer a eventos e abordar os já iniciados em busca de ajuda com vários problemas. Johnson caracterizou o candomblé como uma sociedade secreta, pois faz uso do sigilo. É também organizado hierarquicamente.

Terreiros

O candomblé é praticado em locais chamados terreiros, ilês, ou ilê orixás. Variando em tamanho, de pequenas casas a grandes complexos, alguns são bem conhecidos e ricos, mas a maioria são exemplos menores do que Roger Bastide chamou de "candomblés proletários", que podem ser escondidos, para não atrair a atenção dos adversários. Cada terreiro é independente e opera de forma autônoma, muitas vezes se dissolvendo quando seu sumo sacerdote ou sacerdotisa morre. A importância de um terreiro é geralmente considerada proporcional ao número de iniciados que ele possui.

Os terreiros consistem em uma série de salas, algumas delas fechadas para não iniciados. Eles contêm um altar para as divindades, um espaço para realizar cerimônias e acomodação para os sacerdotes ou sacerdotisas. O chão é considerado sagrado, consagrado ao orixá tutelar da casa. O bakisse é o "quarto dos santos", um depósito que contém tanto a parafernália ritual quanto os assentamentos dos orixás, enquanto o roncó ("quarto de retiro") ou camarinha é usado durante as iniciações.

Uma sala, o barracão, é onde acontecem os rituais públicos, incluindo atos de adivinhação; os terreiros que não têm "barracão" podem usar um terreiro para rituais públicos. Os peji, ou santuários das divindades, costumam estar localizados ao redor do perímetro do barracão. O terreiro muitas vezes terá uma cumeeira, pólo central na estrutura que se acredita ligar o nosso mundo com o outro mundo do orixá. Este fica acima do entoto ("fundação") do terreiro, espaço que é periodicamente "alimentado" com oferendas. O recinto do terreiro pode ter uma árvore dedicada a Quitembo, na qual foram afixadas faixas de pano branco, bem como um local reservado para as almas dos mortos, denominado balé, que geralmente fica no fundo do terreiro. A maioria venera entre doze e vinte orixás.

Sacerdócio e congregação
Uma sacerdotisa que dirige um terreiro é uma mãe de santo, enquanto um sacerdote é um pai de santo. Eles são responsáveis por todas as funções importantes, incluindo educar noviços, julgar disputas e fornecer serviços de cura e adivinhação; são esses últimos serviços que muitos contam como sua renda principal. Não limitados por autoridades religiosas externas, esses "pais de santos" muitas vezes exercem controle considerável sobre seus iniciados, que se espera que se submetam à sua autoridade; conflitos entre esses "pais" e seus iniciados são, no entanto, comuns. O sacerdote e sacerdotisa-chefe é auxiliado por outros, incluindo a "mãezinha", a iaquequerê ou mãe-pequena', e o "paizinho". Outras funções no terreiro incluem o iabassê, que prepara a comida para os orixás, e o alabê (diretor musical). Os iniciados, chamados filhos e filhas de santo, ajudam como cozinheiros, faxineiros e jardineiros. Os ogã são membros masculinos, muitas vezes não iniciados, cujo papel é em grande parte honorífico, consistindo em grande parte em contribuir financeiramente.

Os membros do terreiro são considerados como uma "família" e seus iniciados se consideram 'irmãos' e 'irmãs' no orixá (irmãos de santo). Relações sexuais ou românticas entre os membros do terreiro são geralmente proibidas, embora aconteçam. Ser iniciado liga o indivíduo à linhagem histórica do terreiro; esta linhagem está ligada ao axé do terreiro, axé que pode ser transferido de um terreiro-mãe para um novo que está sendo estabelecido. Os fundadores de um terreiro são chamados de essas.

A comunidade de um terreiro é chamada de egbé. Pode haver inimizade entre terreiros, pois competem entre si por membros, sendo comum a deserção de indivíduos de um para outro. As cerimônias públicas acontecem nos terreiros onde tanto iniciados quanto não iniciados podem comparecer para celebrar os orixás Nelas, a comida é oferecida a orixás específicos e o restante é repartido entre os participantes, com os quais ganham um pouco do axé dos orixás. Esses ritos públicos são precedidos e sucedidos por uma série de atos rituais privados. A maioria dos rituais que acontecem nos terreiros são privados e abertos apenas para iniciados. Walker acreditava que eram eles que representavam "o verdadeiro núcleo da vida religiosa da comunidade do candomblé".

Termos derivados da África são usados em contextos rituais, embora não excedam mil palavras. Em geral, as palavras de origem iorubá predominam nas nações queto, as da língua fom são mais comuns nas nações jeje e as palavras das línguas bantu dominam a nação bantu. O iorubá é usado como uma linguagem ritual, embora poucos praticantes entendam o significado dessas palavras iorubás. Não há textos sagrados específicos. Objetos rituais são considerados como locais e acumuladores de axé, embora esse suprimento precise ser reabastecido em vários intervalos. Cada terreiro também é considerado como tendo seu próprio axé, que é fortalecido pelo número de iniciados que possui e pelo número de rituais que realiza.

Sacerdotes e sacerdotisas são considerados intermediários entre os orixás e a humanidade. Tornar-se iniciado implica uma relação de responsabilidade mútua entre o novo iniciado e os orixás. Algumas evidências sugerem que a proporção de sacerdotisas aumentou ao longo do século XX.

Os orixás estão "sentados" dentro de objetos no terreiro. Estes são então armazenados, todos juntos em uma sala ou, se o espaço permitir, em salas separadas. As mulheres iniciadas que não entram em transe, mas auxiliam as que o fazem, são chamadas de equede; suas contrapartes masculinas são denominadas ogã. Uma prostração diante do sacerdote ou sacerdotisa, ou diante de alguém possuído por um orixá, é chamada de dobalé; prostrar-se diante da mãe ou do pai de santo é chamada de icá.

Santuários e otás

Um altar aos orixás é chamado de peji. Ele contém um conjunto de objetos denominado assentamento ou assento do orixá, considerado como sua casa. Isso geralmente consiste em vários itens colocados dentro de um recipiente esmaltado, de barro ou de madeira, muitas vezes envolto em um pano. A parte principal do assentamento é uma pedra sagrada conhecida como otá, que possui axé e assim requer alimentação. Diferentes orixas estão associados a diferentes tipos de pedra; as do oceano ou dos rios estão, por exemplo, ligadas a Oxum e Iemanjá, enquanto as que se acredita terem caído do céu estão ligadas a Xangô. Espera-se que os praticantes as encontrem, em vez de comprá-las. Elas serão então consagradas ritualmente, sendo lavadas, recebendo oferendas e "sentadas" em um vaso.

Ao lado dos otás, os vasos geralmente contêm ferramentos ou objetos de metal associados a orixás específicos, conchas de búzios, pulseiras chamadas idés, partes de corpos de animais, estátuas dos santos católicos romanos associados e uma mistura de água, mel e preparações à base de ervas. Eles também podem incluir cabelos do iniciado a quem pertencem. O assentamento pode ser guardado em casa, ou dentro da sala de bakisse do terreiro, que só é aberta pela sacerdotisa ou sacerdote responsável. Lá, os assentamentos dos iniciados podem ser organizados em um altar de vários níveis, decorado com fitas, luzes coloridas e flores.

Objetos rituais são santificados com uma infusão de ervas chamada amaci. Os praticantes acreditam que doar sangue para sua parafernália ritual renova o axé desses objetos. No Brasil, várias lojas são especializadas em apetrechos exigidos no camdomblé.

Oferendas e sacrifício de animais

As oferendas são conhecidas como ebós e acredita-se que geram axé que então dá ao orixá o poder de ajudar seus adoradores. O material oferecido aos orixás ou espíritos menores nesses ebós inclui comida, bebida, aves e dinheiro; quando o sacrifício de animais não está envolvido, uma oferta de alimentos é chamada de comida seca. Quando uma cerimônia começa, os praticantes costumam oferecer um padé, ou oferenda propiciatória, ao orixá Exu. A comida é oferecida ao orixá, muitas vezes é colocada em local apropriado na paisagem; oferendas para Oxum são, por exemplo, frequentemente colocadas perto de um córrego de água doce. Alimentos específicos são associados a cada orixá; uma mistura de quiabo com arroz ou farinha de mandioca, conhecida como amalá, é considerada a preferida de Xangô, Obá e Iansã. Quando colocados no terreiro, os alimentos normalmente são deixados no local por um a três dias, tempo suficiente para o orixá consumir a essência dos alimentos. O ritual de pagamento em dinheiro, muitas vezes acompanhando os sacrifícios, é denominado dinheiro do chão. Como parte disso, o dinheiro é colocado no chão e muitas vezes salpicado de sangue, antes de ser dividido entre os participantes do rito.

O candomblé consiste no sacrifício de animais a orixás, exus, caboclos e eguns, o que se chama matanças. O indivíduo que conduz o sacrifício é conhecido como axogum ou às vezes como faca. As espécies normalmente usadas são galinha, galinha-d'angola, pomba branca e cabra. O animal geralmente tem o pescoço cortado com uma faca, ou, no caso das aves, a cabeça decepada. Depois que o animal é morto, seu sangue é derramado no altar; seus órgãos são frequentemente removidos e colocados ao redor do "assento" do orixá  Após o sacrifício, é comum que a adivinhação seja realizada para determinar se o sacrifício foi aceito pelos espíritos. Outras partes do corpo serão então consumidas pelos participantes do rito; a exceção é se o sacrifício for para eguns, quando então são deixados para apodrecer ou colocados em um rio. Parte da comida pode então ser retirada, deixada na floresta, jogada em um corpo d'água ou colocada em uma encruzilhada; isso é referido como "suspender um sacrifício".

Sacrifícios de pássaros às vezes são realizados não como uma oferenda, mas como parte de um ritual de limpeza; ele então terá suas pernas, asas e, finalmente, seu pescoço quebrado. Nesses casos, a ave não é comida. Fora do Brasil, os praticantes têm enfrentado desafios na realização de sacrifícios de animais; na Alemanha, por exemplo, é proibido por lei.

Iniciação
A prática do candomblé requer uma iniciação e a religião é estruturada em torno de um sistema hierárquico de iniciações. Ser iniciado é referido como feito, enquanto o processo de iniciação é denominado fazer a cabeça ou fazer o santo. Os iniciados no candomblé são conhecidos como filhos de santo. Em sua iniciação, eles recebem um novo nome, o nome de santo, que geralmente indica a identidade de seu orixá tutelar. Muitas pessoas chegam ao candomblé por problemas em suas vidas, como doenças. Um sacerdote ou sacerdotisa usará a adivinhação para determinar a causa do problema e seu remédio, às vezes revelando que a iniciação na religião resolverá o problema. Muitos sentem que um orixá exigiu sua iniciação, sendo esta sua obrigação. Se um grupo de indivíduos está sendo iniciado junto, eles são chamados de barco.

A duração do processo iniciático varia entre as casas de candomblé, mas geralmente dura de algumas semanas a alguns meses. O iniciado é primeiro levado ao terreiro, onde é deixado para um período de relaxamento, o descanso, para que se torne 'frio', em vez de 'quente'. Eles estarão vestidos com roupas brancas; um pequeno sino pode ser anexado a eles para alertar os outros se eles saírem do terreiro. Um dos primeiros atos durante o processo iniciático é dar ao iniciado um colar de contas associado ao seu orixá. O colar é colorido de acordo com o orixá tutelar do iniciado; branco para Oxalá, azul escuro para Ogum, ou vermelho e branco para Xangô, por exemplo. Essas contas serão lavadas e aspergidas com o sangue de um animal sacrificado. Essas contas às vezes são vistas como protegendo o usuário de danos.

O iniciado é então recluso em uma sala do terreiro chamada roncô, durante a qual ele é chamado de iaô. No roncô, eles dormem em uma esteira de palha, comendo apenas comida leve; muitas vezes não será permitido falar. Durante este período, eles aprendem os vários detalhes de seu orixá associado, como seus gostos e desgostos e os ritmos de tambor apropriados e danças que invocam essa divindade. O tempo gasto em isolamento varia, embora três semanas seja o típico. Eles serão banhados em água misturada com ervas, especialmente a cabeça, que será então raspada.

O iniciado é então levado para uma sala vizinha, onde os altares foram montados. Um baterista toca enquanto os iniciados preexistentes cantam canções de louvor. Animais são sacrificados, inclusive de um animal de quatro patas e parte do sangue pode ser tocado em partes do corpo do iniciado. A cabeça do iniciado é então raspada e dois cortes são feitos no ápice dela com uma navalha; uma mistura de sangue animal e ervas pode ser adicionada às incisões. Isso é feito para permitir a entrada do orixá na cabeça. Um cone de cera, o adoxu, é então colocado na ferida para estancar o sangramento; a cabeça será então enrolada em um pano. Dependendo do terreiro, também podem ser feitos cortes na ponta da língua do iniciado, nas costas, braços, coxas, nádegas e solas dos pés. Feitas as incisões, o orixá é "assentado" dentro da cabeça do indivíduo durante o ritual de assentar o santo.

Após a iniciação, o novo iniciado pode ser apresentado ao resto da comunidade por meio de uma cerimônia pública de "apresentação", a saída. Junto com suas roupas brancas, seu corpo estará coberto de manchas brancas. Durante isso, pode-se esperar que dêem o nome da marca de seu orixá tutelar, que supostamente descobriram por meio de um sonho. No panã, o iniciado é reensinado simbolicamente em tarefas mundanas, um ritual às vezes seguido por um leilão no qual o iniciado é simbolicamente vendido para seu cônjuge ou um membro de sua família, uma referência à era da escravidão. Na sexta-feira seguinte, eles devem assistir à missa em uma igreja católica romana, conhecida como romaria. Finalmente, um membro sênior do terreiro conduzirá o iniciado, ainda vestido de branco, de volta à sua casa. Ao longo do ano seguinte, o iniciado pode realizar novas "obrigações" para construir seu relacionamento com o orixá.

O candomblé inclui várias iniciações graduais adicionais, que se espera que ocorram um ano, três anos e depois sete anos após a cerimônia de iniciação original. Ao longo disso, espera-se que aprendam a receber todos os seus orixás tutelares. Aqueles que realizaram sete anos de rituais iniciáticos são chamados de ebomi ou ebame. Ao final dos sete anos, eles "recebem o decá" de seu iniciador, recebendo uma bandeja com objetos rituais; isso lhes permite ir e formar seu próprio templo. Na prática, muitos adeptos não podem pagar por essas cerimônias no horário especificado e, em vez disso, ocorrem muitos anos depois.

Possessão

A música e a dança são elementos fundamentais do candomblé. A percussão geralmente ocorre a noite toda. Espera-se que os participantes usem branco, com as mulheres usando saias. São empregados três tipos principais de tambores, sendo o maior o rum, o médio o rumpi e o menor o lé. Esses tambores são entendidos como vivos e precisam ser alimentados. O baterista principal é conhecido como alabê. Muitos terreiros afirmam que as mulheres não devem se envolver nesse ritual de percussão, embora outros rejeitem essa tradição. Em alguns rituais, os praticantes bebem uma mistura contendo jurema-preta, uma planta levemente alucinógena, que às vezes é misturada com o sangue de animais sacrificados.

O estado de vertigem que sinaliza o início do transe é conhecido como barravento. Quando o transe começa, os praticantes geralmente experimentam um espasmo corporal denominado arrepio. Os praticantes acreditam que quando um indivíduo é possuído por um espírito, eles não têm controle sobre as ações deste último. Dentro do candomblé, é considerado um privilégio ser possuído por um orixá. Uma forma baiana comum de se referir à posse é receber. Por implicar ser "montado", ser possuído é considerado um papel simbolicamente feminino. Por esta razão, muitos homens heterossexuais recusam a iniciação no candomblé; alguns acreditam que o envolvimento nesses ritos pode tornar um homem homossexual. Entre os praticantes, às vezes é afirmado que no passado os homens não participavam das danças que conduziam à possessão. Frequentemente, aqueles que se acredita possuídos por um orixá não comem, bebem ou fumam, enfatizando sua disposição aristocrática e também raramente ou nunca falam. Quando dançam, muitas vezes são estilizados e controlados. Muitos terreiros proíbem a fotografia de pessoas em transe de possessão.

Depois que um indivíduo fica possuído, ele pode ser conduzido a uma antessala para ser vestido com roupas associadas ao orixá possuidor; isso geralmente inclui vestidos de cores vivas, independentemente do sexo dos envolvidos. Os possuídos por Ogun, por exemplo, frequentemente receberão um capacete de metal e um machado, enquanto os possuídos por Oxum usam uma multidão e carregam uma espada e o leque de abebé. Os praticantes podem se prostrar completamente diante do possuído. Aqueles possuídos por um orixá podem entregar previsões e profecias. O estilo de fala adotado pelo possuído será influenciado pelo tipo de espírito que se acredita possuí-lo. Aqueles considerados possuídos por caboclos costumam fumar charutos e às vezes colocam pólvora na palma da mão, que então acendem com o charuto para causar uma explosão. Um falso transe é conhecido como equê. Aqueles que não entram em transe são conhecidos como ogãs se forem homens e equedes se forem mulheres.

Festivais públicos

Embora os detalhes do calendário litúrgico variem entre os terreiros, o candomblé apresenta um ciclo anual de festivais ou festas para os orixás. Às vezes são privados e às vezes abertos ao público. Estes são tipicamente realizados no dia do santo católico romano associado a um determinado orixá. A principal temporada festiva começa em setembro, com a Festa de Oxalá, e segue até fevereiro, quando ocorre a Festa de Iemanjá.

Em alguns casos, as festas de candomblé tornaram-se amplamente populares entre o público, especialmente as de Oxalá e Iemanjá. Centenas de milhares de pessoas se reúnem na praia no dia de Iemanjá (2 de fevereiro), onde muitas vezes carregam oferendas para ela em barcos, que então as levam para a água e as jogam ao mar. As festas dos caboclos costumam acontecer no dia 2 de julho, dia que marca a independência da Bahia de Portugal.

Alguns terreiros realizam festas públicas tanto para os orixás quanto para os caboclos, embora alguns as realizem apenas para uma dessas duas categorias de espíritos. As festas públicas para exus são mais raras. O tom do evento difere dependendo de qual categoria de espírito está sendo homenageada; as dos orixás têm estrutura mais fixa e maior formalidade, enquanto as dos caboclos são mais espontâneas e de maior interação entre os espíritos e os participantes humanos. Na nação jeje, o ritual das Águas de Oxalá é realizado no início do ano litúrgico; trata-se de trazer água fresca, às vezes de um poço, para o terreiro para purificar e reabastecer os assamentos.

Adivinhação
Sacerdotes e sacerdotisas se dedicam à adivinhação, o que muitas vezes se mostra uma importante fonte de renda para eles. A forma mais comum de adivinhação no Brasil é o dilogun ou jogo de búzios, praticado tanto por homens quanto por mulheres. Implica jogar búzios no chão e, em seguida, interpretar as respostas dos lados em que caíram. É comum que 16 projéteis sejam lançados e depois mais quatro para confirmar a resposta fornecida pelo primeiro lançamento. Cada configuração de conchas está associada a certos odu, ou histórias mitológicas. O odu específico é então interpretado como tendo pertinência para a situação do cliente.

Outra prática divinatória comum envolve cortar uma cebola em duas e jogar os pedaços no chão tirando conclusões a partir da face em que eles caem; alternativamente, uma noz-de-cola pode ser cortada em quartos e lida da mesma maneira. Ifá é outro sistema divinatório praticado pelo povo iorubá, especificamente por iniciados masculinos chamados babalaôs; no entanto, no início do século XXI foi caracterizada como extinta, ou muito rara no Brasil.

Cura
Rituais de cura formam uma parte importante do candomblé. Quando atuam em uma capacidade de cura, os praticantes são frequentemente chamados de curandeiros. Sacerdotes e sacerdotisas podem oferecer cura para uma ampla gama de condições, desde obesidade e queda de cabelo até pneumonia e câncer.

O candomblé ensina que muitos problemas pessoais são causados por um desequilíbrio com o mundo espiritual. Assim, a manutenção da saúde pode ser assegurada através do equilíbrio com os orixás, evitando os excessos e seguindo os ensinamentos das histórias mitológicas da religião. Uma pessoa doente é considerada como tendo um corpo "aberto" que é vulnerável a influências nocivas e carece de axé. A religião ensina que as doenças podem ser um castigo dos orixás, ou que um espírito do morto pode se apegar a um indivíduo ou até mesmo possuí-lo, causando danos. Acredita-se também que os humanos podem causar danos aos outros por meios sobrenaturais, seja inadvertidamente, através do mau-olhado, ou através de bruxaria e maldição, que os praticantes procuram combater.

As pessoas frequentemente abordam um sacerdote ou sacerdotisa em busca de um remédio para um problema em sua vida, como uma doença. O sacerdote ou sacerdotisa usará a adivinhação para determinar a causa e o remédio. O primeiro passo no processo de cura é a limpeza. Muitas vezes, isso implica oferecer uma oferenda a um orixá específico ou espírito inferior; um sacudimento (batida de folhas), em que certas folhas são esfregadas no corpo do paciente; ou um abô (banho de folhas), durante o qual são lavadas em água infundida com várias ervas e outros ingredientes. A cura do paciente também pode exigir sua iniciação na religião. Outro tipo de cerimônia é conhecida como bori. Isso envolve colocar comida na cabeça do indivíduo para alimentar o orixá que se acredita residir parcialmente dentro do crânio. Isso pode ser feito para fortalecer a saúde e o bem-estar do indivíduo ou para dar-lhe força adicional antes de um empreendimento importante. Outro é o rito de "limpeza do corpo", destinado a remover um egum que está incomodando um indivíduo. No rito da troca da cobeça, a doença é transferida para outro, especialmente um animal que é morto. O curador também pode recomendar que a pessoa doente procure ajuda de um profissional médico como um médico.

Os curandeiros do candomblé geralmente são bem versados em fitoterapia. Considera-se que as ervas contêm axé que precisa ser adequadamente despertado, mas se colhidas incorretamente podem perder a potência. As folhas usadas devem ser frescas, não secas, e frequentemente colhidas tarde da noite ou no início da manhã para garantir sua potência máxima. Eles são frequentemente compradas em uma das casas de folhas nos mercados, mas se retirados da floresta, deve-se pedir permissão ao orixá supervisor e deixar oferendas, como moedas, mel ou tabaco. Estes podem então ser esfregados diretamente na pessoa doente, ou preparados em um chá ou outra mistura medicinal; os praticantes também podem produzir pó, que pode ter uma variedade de usos, desde curar até ferir ou atrair a atenção romântica de alguém. Historicamente, os terreiros poderiam reter as tradições médicas africanas, onde teriam se hibridizado com as tradições nativas americanas e européias. Um indivíduo conhecedor de folhas é chamado de mâo de ofá.

Como muitos outros brasileiros, o candomblé costuma usar amuletos, às vezes escondidos sob a roupa para evitar atenção indesejada. Exemplos comuns são os chifres ou a figa, um punho com o polegar inserido entre o indicador e o dedo médio. Um patuá consiste em uma pequena bolsa de pano contendo vários objetos, partes de plantas e textos. Ramos de arruda ou laranja-da-terra também podem ser carregados no corpo para proteger contra o mau-olhado. Plantas específicas, associadas a um determinado orixá, muitas vezes são mantidas nas portas para impedir a entrada de forças negativas.

Funerais e os mortos
Após a morte de um praticante sênior, seus companheiros de terreiro realizarão o axexê, uma série de rituais que transformam o falecido em um espírito ancestral do próprio panteão do terreiro. Isso garante que eles não se tornem um espírito errante potencialmente perigoso. Uma grande variedade de oferendas, incluindo animais sacrificados, são dadas tanto ao morto quanto aos orixás acompanhantes e outros espíritos durante o axexé. Uma missa católica romana também é realizada.

Demografia
Em 2010, havia um registro de 167.363 praticantes no Brasil. Um relatório do censo de 2010 indicou que cerca de 1,3 por cento da população do Brasil se identificava como seguidores do candomblé. Isso provavelmente reflete apenas o número de iniciados, com um corpo maior de não iniciados às vezes participando de cerimônias ou consultando iniciados para cura e outros serviços. A religião também estabeleceu presença no exterior, inicialmente em outras partes da América do Sul, como Argentina e Uruguai, e a partir da década de 1970 em Portugal. Desde então, o candomblé apareceu em outros lugares da Europa, como Espanha, França, Bélgica, Itália, Alemanha, Áustria e Suíça. No Brasil, o candomblé é um fenômeno predominantemente urbano. É geralmente encontrado entre os pobres, embora existam terreiros cuja composição é em grande parte de classe média ou alta. A adesão à religião é mais diversificada no sul do Brasil, onde há um grande número de seguidores brancos e de classe média. A maioria dos praticantes são mulheres negras e pobres; vários antropólogos observaram um número muito maior de mulheres do que homens nos terreiros que estudaram. As mulheres dominam na nação quetu, embora os homens dominem as nações bantu e jeje. Apesar de suas origens afro-brasileiras, o candomblé atraiu pessoas de outras etnias, como seguidores brancos sem herança brasileira; na década de 1950, passou a ser descrita como uma religião de mulatos e brancos, bem como de negros, enquanto em um país como a Alemanha atrai seguidores brancos sem herança brasileira.

Também foi alegado que o candomblé oferece uma sensação de empoderamento para pessoas que são socialmente marginalizadas; alguns praticantes citaram sua tolerância à homossexualidade como parte de seu apelo, especialmente em contraste com a condenação típica do cristianismo evangélico à atividade sexual entre pessoas do mesmo sexo. Os praticantes do sexo masculino são muitas vezes estereotipados como sendo gays e têm atraído muitos homossexuais masculinos como praticantes; no Rio de Janeiro, por exemplo, a comunidade gay masculina tem laços de longa data com os terreiros, que muitas vezes são vistos como parte de uma rede social gay. Muitos gays que aderiram citaram que isso oferece uma atmosfera mais acolhedora para eles do que outras tradições religiosas ativas no Brasil. Várias lésbicas também foram identificadas como praticantes, embora a antropóloga Andrea Stevenson Allen argumentasse que elas raramente recebiam o mesmo nível de afirmação da religião que seus colegas gays.

Muitos praticantes do candomblé já possuem um vínculo familiar com a tradição, sendo iniciados seus pais ou outros parentes mais velhos. Outros se convertem ao movimento sem ter qualquer ligação familiar; alguns dos que se convertem ao candomblé já exploraram o pentecostalismo, o espiritismo ou a umbanda; alguns umbandistas sentem que podem ir "mais fundo" no candomblé. Muitos descrevem ter estado doentes ou atormentados pelo infortúnio antes de serem iniciados no candomblé, tendo determinado por meio da adivinhação que suas doenças cessariam se o fizessem. Johnson observou que o Candomblé parece atrair aqueles que se identificam fortemente com uma herança africana; alguns negros na Alemanha foram atraídos por ele porque sentem que é uma religião mais autenticamente africana do que as formas de cristianismo e islamismo agora dominantes em toda a África. Alguns gostam de se sentir parte de uma comunidade.

A "área principal de prática" da religião fica na cidade de Salvador e arredores. Um censo de 1997 da Federação Baiana de Religiões Afro-Brasileiras registrou 1.144 terreiros ativos na cidade. No Brasil, a influência do candomblé é mais difundida na Bahia, e os praticantes do Rio de Janeiro e de São Paulo frequentemente consideram os terreiros baianos como sendo mais autênticos, com fundamentos mais profundos. É "mais praticada" na capital baiana, local que os praticantes às vezes consideram uma cidade sagrada. Vários milhares de terreiros existem em Salvador, resultando em ser chamada de "Roma Negra". Na Bahia, é a nação nagô que tem o maior número de casas e praticantes.

Embora as linhagens sejam independentes, os praticantes formaram organizações guarda-chuva, chamadas "federações", na maioria dos estados brasileiros. Estes representam os profissionais em suas relações com o governo e a sociedade em geral. Eles também criaram uma organização nacional, a Conferência da Tradição e Cultura dos Orixás (CONTOC), através da qual representam seus interesses.

História
O candomblé formou-se no início do século XIX. Embora as religiões africanas estivessem presentes no Brasil desde o início do século XVI, Johnson observou que o candomblé, enquanto "liturgia organizada e estruturada e uma comunidade de prática chamada candomblé", só surgiu mais tarde.

Origens

O candomblé se originou entre africanos escravizados transplantados para o Brasil durante o comércio atlântico de escravos. A escravidão era disseminada na África Ocidental; a maioria dos escravos eram prisioneiros de guerra capturados em conflitos com grupos vizinhos, embora alguns fossem criminosos condenados ou endividados. Os escravos africanos chegaram ao Brasil pela primeira vez na década de 1530 e estavam presentes na Bahia na década de 1550. Ao longo do comércio, cerca de quatro milhões de africanos foram transportados para o Brasil, uma área que recebeu mais africanos escravizados do que qualquer outra parte das Américas. Dentro do próprio Brasil, esses africanos estavam mais concentrados na Bahia.

No século XVI, a maioria dos escravizados vinha da costa da Guiné, mas no século XVII as populações de Angola e Congo tornaram-se dominantes. Então, entre 1775 e 1850, a maioria dos escravos eram iorubás e daomeanos, vindos do Golfo de Benim, principalmente no que hoje é Benim e Nigéria. Sacerdotes do Império de Oió provavelmente estavam entre os escravizados quando este último foi atacado pelos grupos fulas e fons. Como a última onda de escravos, esses povos iorubás e daomeanos tornaram-se numericamente dominantes entre os afro-brasileiros, resultando em sua cosmologia tradicional tornando-se ascendente sobre as comunidades estabelecidas há mais tempo. Ao serem trazidos para o Brasil, esses escravos foram divididos em "nações", principalmente em seu porto de embarque, e não em suas identidades etoculturais originais. Este processo significou que os africanos de diferentes origens culturais, regiões e religiões foram reunidos sob um termo unificador como "Nagô", o último usado para aqueles exportados da Baía de Benim.

Os transportes fundiram divindades veneradas em diferentes regiões da África como parte do mesmo panteão. Enquanto na África, as pessoas geralmente veneravam divindades associadas com sua região específica, esses compromissos foram quebrados pela escravidão e transporte. Dos milhares de orixás venerados na África Ocidental, este foi reduzido a um panteão muito menor no Brasil. Quais divindades continuaram a ser veneradas provavelmente dependiam de sua relevância continuada no novo contexto brasileiro. Os orixás associados à agricultura foram abandonados, provavelmente porque os escravos tinham poucos motivos para proteger as colheitas dos senhores de escravos. Por volta do século XVIII, relatos de rituais de origem africana realizados no Brasil eram comuns, momento em que eram referidos genericamente como calundu, um termo de origem bantu. Acredita-se que um ritual dos séculos XVII e XVIII que incorporava percussão e possessão espiritual, conhecido como calundu, seja uma influência dos trabalhos musicais do candomblé.

A natureza católica romana da sociedade colonial brasileira, que permitia o culto aos santos, pode ter permitido uma margem maior para a sobrevivência das religiões africanas tradicionais do que as disponíveis nas áreas de domínio protestante das Américas. Muitos dos escravos aprenderam a classificar seus orixás em relação aos santos católicos romanos e ao calendário dos dias santos. Não há evidências de que os escravos simplesmente usassem o culto aos santos para esconder o culto aos orixás, mas sim que os devotos entendiam os dois panteões como compreendendo figuras semelhantes com habilidades semelhantes para resolver certos problemas. Algumas figuras eclesiásticas da Igreja Católica Romana viram a sincretização como um passo positivo no processo de conversão dos africanos ao cristianismo. O ensino cristão fornecido aos africanos escravizados era muitas vezes rudimentar. Entre os proprietários de escravos, havia também a crença de que permitir que os escravos continuassem com suas religiões tradicionais permitiria que velhas inimizades entre diferentes comunidades africanas persistissem, tornando menos provável que os escravos se unissem e se voltassem contra os proprietários de escravos. Também se pensava que permitir que os escravos participassem de seus costumes tradicionais gastaria energias que, de outra forma, poderiam ser direcionadas para a rebelião. No entanto, como foram tomadas medidas para converter as populações africanas ao cristianismo no Brasil, muitos africanos foram convertidos antes de serem trazidos para as Américas. No Brasil, os africanos escravizados e seus descendentes também foram expostos a práticas de magia cerimonial da Península Ibérica.

Século XIX
Depois que os africanos escravizados lideraram com sucesso a Revolução Haitiana, havia temores crescentes sobre revoltas de escravos semelhantes no Brasil. As décadas de 1820 e 1830 viram o aumento da repressão policial às religiões de origem africana no Brasil. Leis introduzidas em 1822 permitiram que a polícia fechasse os batuques, ou cerimônias musicais entre a população africana. Foi nessa época que foi fundado o terreiro do Engenho Velho; foi desse grupo que descenderam a maioria dos terreiros nagô. Vários registros indicam que crioulos e brancos às vezes também participavam dos ritos que a polícia estava reprimindo.

Em 1822, o Brasil declarou-se independente de Portugal. Sob pressão britânica, o governo brasileiro aprovou a Lei Eusébio de Queirós de 1850 que aboliu o comércio de escravos, embora não abolisse a escravidão em si. Em 1885, todos os escravos com mais de 60 anos foram declarados livres (Lei dos Sexagenários) e em 1888 a escravidão foi totalmente abolida (Lei Áurea). Embora agora livres, a vida dos ex-escravos do Brasil raramente melhorou. Vários iorubás emancipados começaram a negociar entre o Brasil e a África Ocidental e um papel significativo na criação do candomblé foram vários homens livres africanos que eram ricos e enviaram seus filhos para serem educados em Lagos. Os primeiros terreiros se formaram na Bahia do início do século XIX. Um dos terreiros mais antigos foi o Ilê Axé Iyá Nassô Oká em Salvador, fundado por Marcelina da Silva, uma africana liberta; provavelmente estava ativo na década de 1830.

A primeira constituição republicana do Brasil foi produzida em 1891; com base nas constituições da França e dos Estados Unidos, consagrou a liberdade de religião. No entanto, as tradições religiosas afro-brasileiras continuaram a enfrentar questões legais; o Código Penal de 1890 incluía proibições ao espiritismo, à magia, aos talismãs e a muitos fitoterápicos, impactando o candomblé. As autoridades continuaram fechando os terreiros, alegando que eram uma ameaça à saúde pública. No final do século XIX, os primeiros terreiros foram abertos no Rio de Janeiro, uma cidade que experimentava uma rápida expansão de sua população. Neste período, muitos brasileiros brancos de classe alta procurarem o candomblé.

Séculos XX e XXI

O candomblé tornou-se cada vez mais público na década de 1930, em parte porque os brasileiros foram cada vez mais encorajados a se perceberem como parte de uma sociedade multirracial e mista em meio ao projeto do Estado Novo do presidente Getúlio Vargas, aprovou o Decreto-Lei presidencial 1.202, que reconhecia a legitimidade dos terreiros e permitia seu exercício. O Código Penal de 1940 deu proteções adicionais a alguns terreiros.

Em 1940, Johnson argumenta, o candomblé em sua forma contemporânea era discernível. Na década de 1930 houve uma proliferação de estudos acadêmicos sobre o candomblé por estudiosos como Raimundo Nina Rodrigues, Edison Carneiro e Ruth Landes, com estudos do século XX focando principalmente na tradição nagô. A crescente literatura, tanto erudita quanto popular, ajudou a documentar o candomblé, mas também contribuiu para sua maior padronização. A religião se espalhou para novas áreas do Brasil durante o século XX. Em São Paulo, por exemplo, praticamente não havia terreiros de candomblé até a década de 1960, refletindo a pequeníssima população afro-brasileira ali existente, embora esta crescesse rapidamente, a ponto de haver cerca de 2,5 mil terreiros na cidade no final da década de 1980 e mais 4 mil no final da década de 1990. Alguns praticantes tornaram-se cada vez mais conhecidos; a sacerdotisa Mãe Menininha do Gantois era muitas vezes vista como um símbolo do Brasil. Ela havia feito esforços para melhorar a imagem de seu terreiro, estabelecendo uma diretoria administrativa para facilitar as relações públicas em 1926. Ao longo do século XX, diversas organizações surgiram para representar os terreiros, com destaque para a Federação Baiana dos Cultos Afro-brasileiros, o Instituto Nacional e Órgão Supremo Sacerdotal da Cultura e Tradição Afro-brasileira e a Conferência da Tradição e Cultura dos Orixás.

No final do século XX, o candomblé era cada vez mais respeitado no Brasil. Isso foi parcialmente alimentado por afro-brasileiros bem-educados abraçando sua herança cultural anteriormente estigmatizada e pelo número crescente de iniciados intelectuais e brancos. No início do século XXI, a literatura turística cada vez mais retratava o candomblé como parte intrínseca da cultura brasileira, especialmente em Salvador. As referências às crenças da religião tornaram-se mais evidentes na sociedade brasileira; a companhia aérea Varig, por exemplo, usou o slogan "Voe com Axé". Quando a Internet surgiu, vários terreiros criaram seus próprios sites, enquanto as filmagens de seus rituais foram distribuídas através do YouTube.

Nas últimas décadas do século XX, alguns praticantes procuraram remover os aspectos influenciados pelo catolicismo romano da religião para devolvê-la às suas raízes na África Ocidental. Em 1983, a proeminente sacerdotisa Mãe Stella de Oxóssi, por exemplo, pediu aos adeptos que renunciassem a todos os santos católicos romanos e transformassem o candomblé em uma tradição mais puramente africana. Muitos dos que enfatizavam essa perspectiva afrocêntrica eram praticantes brancos de classe média, que reenfatizaram a África como uma nova fonte de autoridade porque tinham pouca posição com o estabelecimento predominantemente afro-brasileiro do candomblé baiano. Muitos terreiros se distinguiram dessa abordagem, argumentando que abandonar os elementos católicos romanos seria abandonar uma parte importante de sua ancestralidade religiosa. Na década de 2000 também houve uma crescente oposição dos protestantes evangélicos, incluindo um aumento de ataques físicos a praticantes e terreiros; Os praticantes do candomblé responderam com marchas contra a intolerância religiosa a partir de 2004, com a primeira marcha nacional ocorrendo em Salvador em 2009. Em 1º de janeiro de 2023, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou uma lei estabelecendo 21 de março como o Dia Nacional das Tradições de Raízes Africanas e Nações do Candomblé. Foi definido para coincidir com o Dia Internacional contra a Discriminação Racial.

Legado

Desde a década de 1960, o candomblé apareceu em vários filmes, como O Pagador de Promessas (1962) e O Amuleto de Ogum (1974), além de documentários como Iaô (1974), de Geraldo Sarno. O romancista brasileiro Jorge Amado faz repetidas referências ao candomblé ao longo de sua obra. Na década de 1980, a escritora estadunidense Toni Morrison visitou o Brasil para conhecer mais sobre o candomblé. Posteriormente, ela combinou ideias do candomblé com as do gnosticismo em sua descrição da religião praticada pelo "Convento", uma comunidade exclusivamente feminina em seu romance de 1991, Paraíso. Temas da religião também foram incluídos na obra do cineasta brasileiro Glauber Rocha. Referências à religião também apareceram na música popular brasileira. Por exemplo, a canção "Oração à Mãe Menininha" de Maria Bethânia e Gal Costa entrou nas paradas do país.

O candomblé tem sido descrito como uma religião muito caluniada. Os praticantes muitas vezes encontraram intolerância e discriminação religiosa; os terreiros às vezes foram atacados fisicamente. Visões hostis mais extremas sobre o candomblé o consideram uma adoração ao diabo, enquanto visões críticas mais brandas o veem como uma superstição que atrai os simplórios e desesperados. Os católicos romanos do Brasil têm opiniões divergentes sobre o candomblé, com alguns expressando tolerância e outros expressando hostilidade à presença de praticantes de candomblé na missa. Grupos evangélicos e pentecostais se apresentam como inimigos declarados do candomblé, considerando-o diabólico e visando-o como parte de sua "guerra espiritual" contra Satanás. Aqueles que denigrem o candomblé frequentemente se referem a ele com o termo "macumba", normalmente usado para feitiçaria prejudicial. Líderes de terreiros são muitas vezes estereotipados como gananciosos e coniventes. Os praticantes do candomblé às vezes abandonam a religião por formas de cristianismo; em certos casos, retornam posteriormente ao candomblé.

Johnson observou que muitos acadêmicos que estudaram o candomblé têm procurado retratá-lo da melhor maneira possível, de modo a combater os estereótipos racistas e primitivistas sobre os afro-brasileiros. Os estudos acadêmicos, por sua vez, influenciaram a maneira como a religião é praticada, ajudando a estabelecer a "prática correta" entre grupos divergentes. Muitos terreiros possuem cópias de estudos acadêmicos de candomblé de estudiosos como Pierre Verger, Roger Bastide e Juana Elbein dos Santos. Vários praticantes possuem livros sobre candomblé e outras religiões afro-americanas, inclusive escritos em línguas que não podem compreender, como forma de apresentar uma imagem de autoridade.

Embora os objetos associados ao candomblé fossem inicialmente encontrados apenas em museus da polícia, ressaltando assim a associação estereotipada entre religião e criminalidade, à medida que ganhou maior aceitação do público, tais objetos acabaram sendo apresentados em museus dedicados ao folclore e à cultura afro-brasileira. A partir da década de 1990, os praticantes começaram a estabelecer suas próprias exposições museológicas em seus terreiros. Por exemplo, o quarto da famosa sacerdotisa Mãe Menininha do Gantois, localizado dentro de seu terreiro na Bahia, foi convertido em memorial em 1992 e então reconhecido formalmente como patrimônio em 2002. Os praticantes do candomblé também pressionaram outros museus para mudar a forma como estes exibem itens associados à religião. Por exemplo, os praticantes convocaram com sucesso o Museu da Cidade em Salvador para remover algumas pedras de otá de exibição pública, argumentando que de acordo com os regulamentos da religião tais itens nunca deveriam ser visíveis ao público.

Umbanda

 

Umbanda é uma religião afro-brasileira que sintetiza o culto aos Orixás e aos demais elementos das religiões africanas, em especial Iorubá, com indígenas e cristãs, porém sem ser definida por eles.

Estruturada como religião no início do século XX em São Gonçalo, Rio de Janeiro, a partir do sincretismo entre candomblé, o catolicismo e o espiritismo que já se vinha operando ao longo do final do século XIX em quase todo o Brasil. É considerada uma "religião brasileira por excelência" caracterizada pela síntese entre a tradição dos orixás africanos, os santos católicos e os espíritos tradicionais de origem indígena.

O dia 15 de novembro é considerado a data do surgimento da Umbanda como religião organizada, e foi oficializado no Brasil em 18 de maio de 2012 pela Lei 12.644. Em 8 de novembro de 2016, após estudos do Instituto Rio Patrimônio da Humanidade (IRPH), a umbanda foi incluída na lista de patrimônios imateriais do Rio de Janeiro por meio de decreto.

Etimologia
"Umbanda" ou "Embanda" são oriundos da língua quimbunda de Angola, significando "magia", "arte de curar". Há também a suposição de uma origem em um mantra na língua adâmica cujo significado seria "conjunto das leis divinas" ou "deus ao nosso lado".

Também era conhecida a palavra "mbanda" significando “a arte de curar” ou “o culto pelo qual o sacerdote curava”, sendo que "mbanda" quer dizer “o Além, onde moram os espíritos”.

Já as vertentes caracterizadas pela negação de alguns elementos africanos, como a Umbanda Branca, declarou após o I Congresso do Espiritismo de Umbanda de 1941 que "Umbanda" vinha das palavras do sânscrito aum e bhanda, termos que foram traduzidos como "o limite no ilimitado", "Princípio divino, luz radiante, a fonte da vida eterna, evolução constante".

História
Século XVII - Calundu dos escravizados

As primeiras comunidades religiosas afro-brasileiras que se têm documentadas surgiram ainda no século XVII. É provável que a mais antiga documentação de práticas rituais africanas no Brasil seja uma pintura de Zacharias Wagener datada, no mais tardar, de 1641. Praticadas pelos escravos, essas comunidades religiosas e suas práticas de culto ficaram conhecidas como Calundu. Os Calundus surgiram a partir das chamadas rodas de batuques, onde os escravos dançavam, tocavam atabaques em seus momentos de folga ao redor das senzalas. Eram ostensivamente perseguidos pelas autoridades civis e colonizadores portugueses. Existia no Calundu o sincretismo entre as crenças africanas, com Pajelança indígena e Catolicismo.

Um documento da Inquisição Portuguesa de 1646 demonstra a presença de um sacerdote de Angola atuando na Capitania da Bahia de Todos os Santos, chamado Domingos Umbata, e descreve uma Gira de Inquice numa sessão de Calundu: "[...] Com uma tigela grande cheia de água, com muitas folhas e uma cascavel, um dente de onça, viu a testemunha algumas negras que se estavam lavando naquela tigela para abrandar as condições de suas senhoras” e outra noite foi à sua casa, pela meia noite ver “uma grande bula e matinada com muita gente e ele só falava língua que ele (o denunciante) não entende”. Na tigela com água punha também carimã, com a qual fazia uma cruz e círculo à volta, depois botava-lhe uns pós por cima e a mexia com uma faca e ficava fazendo como se estivera ao fogo e inclinando-se sobre a tigela, falava com ela, olhando de revés para as negras presentes em sua língua [...]"

O Calundu vai se dividir em duas vertentes importantes: a Cabula e o Candomblé Bantu ou Angola. A Cabula sincretizava as crenças africanas do Calundu com o catolicismo, pajelança indígena — sincretismo já existente no Calundu — e espiritismo kardecista. Com o crescimento do número de escravos vindos de diversos lugares, o Calundu passa a ser cultuado de forma mais elaborada, dando início ao Candomblé, que manteve o ritualismo Bantu, com uma fraca sincretização com Catolicismo.

Com a chegada dos povos Iorubás, quetos, Oiós, Ijexá, Ijebu Odé, Ibadan, Egbás e Jejes que desejavam preservar com mais intensidade os elementos ritualísticos africanos de seus territórios de origem, — mas sem deixarem de utilizar o sincretismo católico como forma de se livrarem das perseguições feitas pelos colonizadores e pelas elites dominantes, — surgem as demais linhas do candomblé, como o Candomblé-Ketu e o Candomblé-Jeje. às influências jejê-nagô existentes na sua versão fluminense, passam a dar origem aos terreiros de Umbanda Angola e Almas e Umbanda Omolokô.

Século XVII a XIX - A Cabula
Muitos estudiosos remontam as origens da Umbanda, de forma prática, aos rituais dos antigos centros de Cabula, conhecidos popularmente como "Macumba" já existentes desde o século XVIII. Populares no Rio de Janeiro, Minas Gerais, Espírito Santo, São Paulo e Bahia, muitos terreiros de Cabula já sincretizavam rituais africanos com catolicismo e crenças indígenas. Daí, Zélio Fernandino de Morais adapta rituais desses terreiros sob uma roupagem espírita kardecista, dando surgimento a Umbanda como religião organizada, que depois se conhece por Umbanda branca e demanda. Os terreiros das zonas rurais e periferias urbanas conhecidos como Macumba Popular, e ainda hoje como Umbanda Popular, descendem dos terreiros de Cabula que não foram absorvidos pelo espiritismo de Zélio. Alguns ritos umbandistas como Omolocô, Almas e Angola também surgiram a partir desses terreiros de Cabula, mas absorvendo mais influências do Candomblé. A Cabula se dividiu em dois grupos principais:

Cabula Bantu: surgiu em meados do século XIX, em Minas Gerais e na Bahia e é descendente direta do Calundu praticado pelos escravizados. Espalhou-se pelos estados do Rio de Janeiro e Espírito Santo, onde sofreu perseguição das elites cristãs até os dias de hoje. A Cabula Bantu sincretizava o Calundu, a religião Bantu, com elementos do catolicismo, crenças indígenas e, já nas últimas décadas do século XIX, espiritismo.
Macumba Popular: surgiu no final do século XIX, no Rio de Janeiro e espalhou-se rapidamente em São Paulo e Espírito Santo. Essa Macumba Popular do Rio diferenciava-se da Cabula Bantu de Minas e Bahia pela influências do ritualismo e práticas jejê-nagô e do esoterismo europeu através de publicações como O Livro de São Cipriano da Capa Preta. Tanto no Rio de Janeiro, como em São Paulo e no Espírito Santo, a Macumba agregava em si elementos religiosos dos mais variados tipos e origens como as crenças já populares no Brasil, as luso-brasileiras, as árabes, as francesas, as ciganas, as hebraicas e tantas outras oriundas de várias partes do mundo. A Macumba era altamente sincrética ao agregar em si diversas concepções religiosas e diversidade ritualística nos terreiros.
Por conta de seu sincretismo, esta Macumba Popular era frequentada por parte da elite como também pelas classes menos favorecidas e pessoas de diversas religiões e origens. O jornalista João do Rio falará a respeito disso: "A mistura na Macumba não estava presente somente nos mitos, ritos e doutrinas, mas também, estava no campo social que era totalmente heterogêneo. Frequentavam seus cultos pessoas de diversos níveis da sociedade, misturando-se no mesmo espaço, grandes empresários, altos funcionários do governo, delegados e policiais, com simples operários, favelados, ladrões, bandidos, assassinos, malandros gigolôs e homossexuais. Senhoras e moças brancas da alta sociedade com as domésticas pretas e as prostitutas." Desta Macumba se dividirão dois grupos principais: um atrelado ao espiritismo kardecista, que irá abolir alguns elementos bantu e iorubás, como o sacrifício de animais e o uso de atabaques, dando origem à Umbanda branca e demanda, de Zélio; e outro, a Umbanda Popular, que continuou seu curso normal, mas relegado à marginalidade pela classe média e alta.

Zélio Fernandino e o anúncio da Umbanda
Por volta de 1907/1908 (15 de novembro de 1908) (as fontes divergem quanto à data precisa), um jovem chamado Zélio Fernandino de Morais, prestes a ingressar na Marinha, passou a apresentar comportamento estranho que a família chamou de "ataques". O jovem tinha a postura de um velho dizendo coisas incompreensíveis, em outros momentos se comportava como um felino. Após ter sido examinado por um médico, esse aconselhou a família a levá-lo a um padre, mas Zélio foi levado a um centro espírita. Assim, no dia 15 de novembro, Zélio foi convidado a se sentar à mesa da sessão na Federação Espírita de Niterói, presidida na época por José de Souza.

Incorporou um espírito, levantou-se durante a sessão e foi até ao jardim para buscar uma flor e colocá-la no centro da mesa, contrariando a regra de não poder abandonar a mesa uma vez iniciada a sessão. Em seguida, Zélio incorporou espíritos que se apresentavam como negros escravizados e índios. O diretor dos trabalhos alertou os espíritos sobre seu atraso espiritual, convidando-os a sair da sessão quando uma força tomou conta de Zélio e disse:
Por que repelem a presença desses espíritos, se nem sequer se dignaram a ouvir suas mensagens? Será por causa de suas origens sociais e da cor?
— Caboclo das Sete Encruzilhadas
Ao ser indagado por um médium ele respondeu:
Se querem um nome, que seja este: sou o Caboclo das Sete Encruzilhadas, porque para mim não haverá caminhos fechados. O que você vê em mim são restos de uma existência anterior. Fui padre e o meu nome era Gabriel Malagrida.[30] Acusado de bruxaria, fui sacrificado na fogueira da Inquisição em Lisboa, no ano de 1761. Mas em minha última existência física, Deus concedeu-me o privilégio de nascer como Caboclo brasileiro.
— Caboclo das Sete Encruzilhadas
A respeito de sua missão, assim anunciou:
Se julgam atrasados esses espíritos dos negros e dos índios, devo dizer que amanhã estarei na casa deste aparelho para dar início a um culto em que esses negros e esses índios poderão dar a sua mensagem e assim, cumprir a missão que o plano espiritual lhes confiou. Será uma religião que falará aos humildes, simbolizando a igualdade que deve existir entre todos os irmãos, encarnados e desencarnados. E se querem o meu nome, que seja este: Caboclo das Sete Encruzilhadas, porque não haverá caminho fechado para mim.
— Caboclo das Sete Encruzilhadas
No dia seguinte, na residência da família de Zélio, na Rua Floriano Peixoto, nº. 30, no bairro Neves, reuniram-se os membros da Federação Espírita de Niterói, visando comprovar a veracidade do que havia sido declarado pelo jovem. Novamente incorporou o Caboclo das Sete Encruzilhadas, que declarou que os velhos espíritos de negros escravizados e índios de nossa terra poderiam trabalhar em auxílio do seus irmãos encarnados, não importando a cor, raça ou posição social. Assim, neste dia se fundou o primeiro terreiro de umbanda chamado de Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade.

O espírito estabeleceu normas como a prática de caridade, cuja base se fundamentaria no Evangelho de Cristo e seu nome "allabanda", substituído por "aumbanda", e posteriormente se popularizando como "umbanda".

Período intermediário: tentativas de unificação e rupturas na Umbanda
No ano de 1918, fundaram-se sete tendas para a propagação da Umbanda: Tenda Espírita Nossa Senhora da Guia, Tenda Espírita Nossa Senhora da Conceição, Tenda Espírita Santa Bárbara, Tenda Espírita São Pedro, Tenda Espírita Oxalá, Tenda Espírita São Jorge e Tenda Espírita São Gerônimo. Até a morte de Zélio em 1975, mais de 10 mil templos foram fundados além desses iniciais. Em 1939, na tentativa de uma unificação, foi criada a União Espírita de Umbanda do Brasil. A partir desse momento, somente as práticas que seguiam os fundamentos propostos pelo Caboclo Sete Encruzilhadas incorporado em Zélio passaram a ser consideradas como Umbandistas pela ramificação branca e espiritista.

Em 1940, o escritor Woodrow Wilson da Matta e Silva apresentou a Umbanda como ciência e filosofia, criando então a Escola Iniciática da Corrente Astral do Aumbhandan, a "Umbanda Esotérica" na Tenda Umbandista Oriental, em Itacuruçá, no Rio de Janeiro. Em 1941 a UEUB organizou sua primeira conferência, o I Congresso Brasileiro de Espiritismo de Umbanda como forma de tentar definir e codificar a Umbanda como uma religião em direito próprio e como uma religião que unisse todas as religiões, raças e nacionalidades. A conferência também promoveu uma dissociação das tradições afro-brasileira. Os participantes concordaram em fazer uso das obras de Allan Kardec como fundação doutrinária da Umbanda, ao mesmo tempo que se dissociavam das outras tradições religiosas afro-brasileiras. Ainda assim, os espíritos fundadores da Umbanda, os Caboclos e os Preto Velhos ainda foram mantidos como espíritos altamente evoluídos.

Em termos gerais, os participantes do Congresso concentraram-se em remover as raízes africanas e afro-brasileiras da Umbanda. Para tanto, usaram como artifícios mesmo teorias científicas ultrapassadas, como a do continente submerso de Lemúria, por onde a Umbanda teria cruzado ao sair do seu berço hipotético, o Oriente, em direção à África, onde se teria degenerado em fetichismo, em cuja forma foi trazida ao Brasil pelos escravizados. A influência africana na Umbanda não foi de todo rejeitada, haja vista a manutenção dos Pretos-Velhos e Caboclos. Mas foi uma assimilação gritantemente racista, com a percepção de corrupção da tradição religiosa original, como uma fase de retrocesso evolutivo em que a Umbanda teria sido exposta ao barbarismo na forma de costumes vulgares e praticada por pessoas com "costumes rudes e defeitos psicológicos e étnicos". No limite, o caráter Africano da Umbanda era aceito na compreensão de ter-se originado no Egito, sendo então da parte mais "civilizada" do continente.

O rastreio das raízes "genuínas" da Umbanda até ao Oriente, juntamente com a rejeição das raízes africanas, foi refletida na invenção de nova definição do termo "Umbanda", que é comprovadamente derivado do idioma Banto. Declarou-se que "Umbanda" vinha das palavras do sânscrito aum e bhanda, termos que foram traduzidos como "o limite no ilimitado", "Princípio divino, luz radiante, a fonte da vida eterna, evolução constante". A partir da década de 1950, os setores mais humildes da população umbandista composta por negros e mulatos começaram a contestar o distanciamento da Umbanda das práticas africanas. A "umbanda branca" se opunha à tendência de recuperar os valores africanos presentes na religiosidade popular.

O segundo congresso ocorreu em 1961 evidenciando o crescimento da vertente branca da religião, que teve sua imagem reconstruída pela imprensa. Milhares de devotos compareceram ao Maracanãzinho com representantes de vários estados e a presença de políticos municipais e estaduais. O jornal O Estado de S. Paulo noticiou a realização do congresso no Rio de Janeiro afirmando que a "preocupação central do Congresso parece ser a elaboração de um código que orientará a feitura de uma Carta Sinódica da Umbanda". No mesmo ano, o jornal Diário de S. Paulo publicou uma grande reportagem com o título "Saravá meu Pai Xangô, Saravá Mamãe Oxum", onde o jornalista descreve uma "sessão assistida pelos repórteres a convite do deputado gaúcho Moab Caldas".

Em 1950, em resposta às perseguições que os terreiros sofriam por parte das autoridades civis bem como em resposta ao projeto de "embranquecimento" da Umbanda pregada pela União Espírita de Umbanda do Brasil, o pai de santo Tancredo da Silva Pinto liderou o movimento que deu origem à Federação Umbandista de Cultos Afro-Brasileiros. A federação visava organizar e dar maior representatividade aos terreiros que sofriam preconceito por conta de seus ritos afro-brasileiros. A federação, que nasceu no Rio de Janeiro, promoveu várias ações e eventos religiosos bem como se expandiu para os estados de Minas Gerais, São Paulo, Rio Grande do Sul e Pernambuco. Defensora tenaz das origens africanas da Umbanda em contraposição ao grupo que pregava uma Umbanda com forte ênfase no kardecismo.

Mesmo após as tentativas de unificação, nas décadas de 40, 50 e 60 ainda existiam inúmeros terreiros no Rio de Janeiro não vinculados à União Espírita de Umbanda do Brasil, principalmente por discordarem das normativas propostas pela federação e por serem consideradas atividades isoladas. Também não eram vinculadas à Federação Umbandista de Cultos Afro-Brasileiros. Esses terreiros realizavam práticas ritualistas sob a denominação de Umbanda, por exemplo a Tenda Espírita Fé, Esperança e Caridade e Pai Luiz D'Ângelo, praticante do segmento Umbanda de Almas e Angola.

Consolidação popular, apagamento histórico e racismo
No terceiro congresso realizado em 1973 a Umbanda afirmou-se em definitivo como uma religião expressiva no campo das atividades assistenciais. Além dos centros onde ocorriam as atividades espirituais, a religião contava com escolas, creches, ambulatórios etc. articuladas em torno da missão de promover a caridade e a ajuda.

Assim, a Umbanda teve seu auge ao ser declarada como religião de muitas personalidades como os cantores Clara Nunes, Dorival Caymmi, Vinícius de Moraes, Baden Powell, Bezerra da Silva, Raul Seixas, Martinho da Vila entre outros, e a opinião pública tornou-se mais favorável após a década 1980, porém essa aceitação mais aberta restringia e restringe-se às vertentes onde se operou um apagamento dos elementos negros em detrimento do sincretismo católico. Na década de 1990 a Umbanda e outras religiões de matrizes africanas foram alvo do crescente neopentecostalismo brasileiro. Em 2003, foi fundada a Faculdade de Teologia Umbandista (FTU), mantida pela Ordem Iniciática do Cruzeiro Divino fundada em 1970 por Francisco Rivas Neto, na Água Funda, São Paulo.

Apesar de a Umbanda ter sido anunciada como religião organizada por Zélio e seu guia espiritual Caboclo Sete Encruzilhadas, não foi a sua vertente que se tornou popular no Brasil. A umbanda se popularizou através de sua raiz africanista encontrada na cabula do Rio de Janeiro, também conhecida como macumba. Há muitos estudos e fontes documentais que mostram que a raiz da Umbanda precede ao anúncio de Zélio, e que o trabalho dele foi ter incorporado elementos das religiões afro-brasileiras a um ritual com características espíritas kardecistas.

Na Umbanda de Zélio, muitos elementos africanos como o uso de atabaques, a prática do sacrifício animal ritualístico, manifestações de exus e pombajiras e outros mais foram suprimidos. Tal processo foi chamado de "embranquecimento" da Umbanda, visto que tal prática tornava a Umbanda mais palatável aos costumes das classes alta e média do Rio, sofrendo estas vertentes menos preconceito da sociedade, ao contrário das que mantiveram mais elementos africanos. Os terreiros como da Umbanda Popular, do Ritual Almas e Angola, do Omolocô e da Umbanda Traçada, praticados por pessoas de classe baixa e situados nas comunidades, zonas rurais e favelas conservaram mais práticas africanas próximas da antiga Macumba e do Candomblé. Um dos grandes proponentes ao retorno da Umbanda às suas raízes africanas foi o, já citado, escritor e pai de santo Tancredo da Silva Pinto.

Características
Crenças e práticas

A Umbanda possui muitas vertentes com práticas diversas, nomeadas de diferentes formas, como Umbanda Nação, Umbandomblé, Umbanda Sagrada, Umbanda Omolocô, umbanda Crística, etc. Essas diferentes vertentes partilham o culto a entidades ancestrais e a espíritos associados a divindades diversas de cultos não só africanos, mas mesmo hindus, árabes, católicos, entre outros, a depender da vertente. Apesar, existem comuns a todas, sendo:

Um deus único e onipresente, chamado pela tríade Olódùmarè, Olorum e Oxalá. Na Umbanda Angola é Zambi.
Crença nos Orixás.
Crença na existência de Guias ou entidades espirituais.
Lei de causa e efeito pela qual os umbandistas pagam o bem recebido com o bem e o mal com a justiça divina.
A Umbanda se fundamenta na obediência a ensinamentos básicos de valores humanos, como a fraternidade, a caridade, a não discriminação e a coletividade. Além desses preceitos, também há necessidade de práticas mediúnicas como servir de "aparelho" (o medium) para viabilizar a comunicação entre espíritos e Orixás com os seres humanos.

A antropóloga brasileira Patrícia Birman falará o seguinte a respeito da diversidade de crença dentro da Umbanda e a unidade doutrinária na diversidade:

Entre os terreiros são encontradas diferenças sensíveis no modo de praticar a religião. Tais diferenças, contudo, se dão num nível que não impede a existência de uma crença comum e de alguns princípios respeitados por todos. Há, pois, uma certa unidade na diversidade.
A diversidade se expressa nas várias e reconhecidas influências de outros credos na umbanda. Encontramos adeptos de umbanda que praticam a religião em combinação com o candomblé, com o catolicismo, que se dizem também espíritas, absorvendo os ensinamentos de Kardec e, entre estes, as variações continuam: centros que aceitam determinados princípios do candomblé e excluem outros, que se vinculam a uma tradição por muitos ignorada etc. Não há limites na capacidade umbandista de combinar, modificar, absorver práticas religiosas existentes dentro e fora desse campo fluido denominado "afro-brasileiro".

Fato é que os umbandistas desenvolveram formas próprias de lidar com essas características da sua religião. A segmentação, a dispersão, a multiplicidade se combinam de alguma maneira com a unidade, a doutrina, a hierarquia. Essas combinações estão claramente presentes nas formas como os religiosos elaboram a relação dos médiuns com os espíritos, mas formas pelas quais organizam a multiplicidade de santos num conjunto inteligível e como também conseguem, apesar da segmentação, reunir todos os fiéis numa mesma doutrina.

Panteão
O panteão Umbandista é formado por seus Orixás e entidades de trabalho. Os espíritos (entidades) que trabalham na Umbanda são organizados em linhas e falanges (legiões). Cada linha está sob a direção de um Orixá ou alguma entidade africana ou indígena, enquanto os nomes e configurações exatas variam dentro da Umbanda. São na maioria compostos a partir de divisões étnicas, por exemplo, "Povo de Moçambique", "Legião de Tupi-Guarani". Em geral, os espíritos nos rituais da umbanda se enquadram nestas categorias:

Caboclos, espíritos indígenas, como o Sete Encruzilhadas.
Pretos-velhos, os espíritos de africanos escravizados.
Crianças.
Exus, mensageiros dos orixás; entidades mais próximas dos humanos, protegendo as suas estradas, caminhos.
Pombajiras, entidades da linha da esquerda com hierarquia própria.
Todas acima são chamadas "espíritos de luz", trabalhando exclusivamente propósitos considerados benignos. Na vertente da Umbanda Branca, extremamente sincretizada ao cristianismo, não se cultuam entidades como os Exus, que são considerados espíritos banidos. Tradicionalmente, ao contrário, as raízes africanas da cosmovisão Umbandista não adota a divisão maniqueísta entre bem e mal.

Orixás
Os Orixás (Òrìṣà), na cultura iorubá, são divindades que podem ser masculinas, os Aborós (aborò), ou femininas, as Iabás (Iyagba). Etimologicamente, em tradução livre, Orixá significa "a divindade que habita a cabeça" (em iorubá, ori é cabeça e Xá é rei, divindade). Os orixás se relacionam com os elementos da natureza sendo interpretados como manifestações da mesma. A interpretação sobre o que significam os Orixás variará conforme a linha doutrinária, mesmo de terreiro para terreiro: Por exemplo, nas linhas mais sincretizadas com catolicismo, espiritismo e demais elementos brancos, Orixás são considerados como manifestações e qualidades de Deus, enquanto nas vertentes que mais conservaram as tradições e cosmovisão africanas eles são entidades próprias. Ainda, terreiros mais próximos do Espiritismo e Catolicismo, não cultuam os Orixás de forma direta, e muitos de maneira alguma cultuam os Exus. Terreiros com influência Gêge e Angola cultuam os voduns e inquices respectivamente. Pode ocorrer a mescla entre os tipos de divindades dependendo da tradição do terreiro. O sincretismo com os santos católicos varia principalmente de região para região, havendo duas grandes vertentes diferentes de dispersão, a da Bahia e a do Rio de Janeiro.

A grande maioria dos terreiros de Umbanda segue os orixás-iorubá de forma semelhante ao candomblé do Queto e sincretiza os orixás-iorubá com os santos católicos traçando as qualidades dos orixás e suas semelhanças com os santos.

Em sua diversidade, há terreiros com influência de cultos Mina-Gegê e Congo. Nos de influência Mina-Gegê, denominam os Orixás de Voduns, de forma semelhante do Candomblé Jeje. Nos de influência do rito Congo, semelhante ao Candomblé Angola, denominam os Orixás de Inquices. Variam-se os nomes dependendo da casa. O sincretismo católico parte da divisão de Orixás Iorubás. Apesar de vários Orixás na Nação Congo serem denominados de forma diferente, as entidades possuem o mesmo nome em algumas ocasiões, além de muitos ritos semelhantes.

Ritos
Os rituais da Umbanda visam evocar os Orixás e ancestrais e toda sua hierarquia composta por Orixás menores, Guias e Protetores. Os rituais não têm forma ou modo definido, variando de casa para casa, subordinados à tradição seguida por cada Pai-de-santo e cada entidade protetora do terreiro. O local onde se dão as celebrações e o atendimento do público é geralmente uma casa denominada por Casa ou Tenda que contém um local apropriado para sessões, podendo ser um terreiro, aberto, ou um salão.

Alguns termos e rituais comumente mencionados:

Giras, é como são chamadas as sessões onde se reúnem os espíritos de várias categorias, as giras podem ser festivas, de trabalho ou de treinamento.
Bater cabeça, é como é chamado o ato de prostração, a reverência dada ao chefe do terreiro, por exemplo. O contexto desse gesto varia de terreiro para terreiro, sendo unânime que seja feito antes da defumação.
Defumação, é usada para purificar o ambiente, através do seu aroma desfaz-se no ambiente todo o negativo expulsando os espíritos trevosos.
Passe, é o gesto de imposição de mãos presente também no kardecismo
Pontos riscados são diagramas desenhados no chão como ângulos, retas, símbolos representativos, desenhos geométricos, pontos cardeais, etc representando a assinatura do Guia
Pontos cantados são as músicas e cantos entoados como forma de louvor ou invocação.
Ebó (do iorubá "Ẹbọ", oferta ou oferenda), ou Oferenda, é a prática de dispor comida ritual e objetos específicos nos templos ou locais ao ar livre, em dias e/ou para fins especiais, pedidos ou agradecimentos aos Guias e Orixás. As vertentes com mais influência dos cultos africanos como a Umbanda de Nação se utiliza de ebós que são para finalidades próprias como reequilibrar aspectos da vida da pessoa. Diferente da tradição africana, as casas de Umbanda que seguem Zélio não se utilizam do sacrifício de animais.
Obrigação é um ritual onde se oferenda animais aos Orixás ou Exus. "Nesses rituais se oferece o axorô, ou seja, o sangue que simboliza o axé de vida". "A noção de obrigação não se restringe somente ao ritual de corte, mas trata também da relação permanente com o Orixá assentado, dos cuidados com a água nas quartinhas [...]”
Assentamento (em pedras, objetos, plantas, etc): É o local onde seu Orixá ou Exú é depositado. "O assentamento não “representa” o Orixá, o Acutá é o/a Orixá". O “Acutá não remete para um poder que do além se faz representar num mediador simbólico. O Acutá – esta pedra sagrada aqui e agora – já carrega de imediato a totalidade do ser da divindade. Esta pedra sagrada, aqui e agora, é o Xangô, o Ogum, a Iemanjá”.
Descarrego é o nome dado a rituais para limpeza espiritual ou livrar-se de cargas negativas, podem ser banhos com ervas especiais como a guiné, espada-de-ogum etc. ou rituais como a roda de fogo" que usa pólvora.
Batismo, como ocorre em muitas outras religiões, só pode ser realizado por líderes religiosos, no caso o babalorixá ou a ialorixá.
Hino
Originalmente com o título de Refletiu a Luz Divina, tem autoria atribuída a José Manoel Alves. No Segundo Congresso Nacional de Umbanda, em 1961 no Rio de Janeiro, a música foi oficialmente reconhecida como o Hino da Umbanda.
Refletiu a luz divina
Em todo seu esplendor
É do Reino de Oxalá
Onde há paz e amor
Luz que refletiu na Terra
Luz que refletiu no Mar
Luz que veio de Aruanda
Para tudo iluminar
Umbanda é paz e amor
Um Mundo cheio de luz
É a força que nos dá vida
E a grandeza nos conduz
Avante filhos de fé
Como a nossa lei não há
Levando ao mundo inteiro
A bandeira de Oxalá.

Organização
Espaço físico

A parte física de um terreiro de umbanda contém seis elementos fundamentais:

Peji (do fom "Kpeji"): É o Quarto de Santo, uma peça onde se encontra o Congá.
Congá: O altar, dentro do Quarto de Santo, onde se localizam as imagens e onde estão assentados os Orixás.
Assentamento: "O assentamento não “representa” o Orixá, o Acutá é o/a Orixá".
Porteira ou Tronqueira
Cruzeiro das Almas ou Casa das Almas

Hierarquia

A hierarquia na Umbanda varia dependendo da quantidade de membros, de modo que pode dividir-se em um grupo administrativo e grupo espiritual além de variar de acordo com o tipo de Umbanda (de Nação, Esotérica etc).

Os templos de Umbanda não possuem uma uniformidade quanto às hierarquias, pois sendo diversificada tanto quanto na ritualística seus títulos e cargos podem ser variados entre si. A hierarquia da linha de Nagô é a mais comum, existindo muitas variações dessa.

Birman vai dizer o seguinte a respeito da fluidez organizacional da Umbanda:

No plano da organização social, a religião umbandista pode ser considerada um agregado de pequenas unidades que não formam um conjunto unitário. Não há, como na Igreja Católica, um centro bem estabelecido que hierarquiza e vincula todos os agentes religiosos. Aqui, ao contrário, o que domina é a dispersão. Cada pai-de-santo é senhor no seu terreiro, não havendo nenhuma autoridade superior por ele reconhecida. Há, portanto, uma multiplicidade de terreiros autônomos, embora sejam unidos na mesma crença, havendo também um esforço permanente por parte dos líderes umbandistas no sentido de promover uma unidade tanto doutrinária quanto na organização. Criam federações, tentam estabelecer formas de relacionamento entre os vários centros decisórios, tentam enfim enfrentar a dificuldade de conviver simultaneamente com formas de organização dispersas e tentativas de centralização.
Contudo, seguem abaixo as divisões hierárquica catalogadas, registradas e apresentadas por Tancredo da Silva Filho:

Linha de Nagô
Sacerdote (babalorixá/pai de santo) e Sacerdotisa (ialorixá/mãe de santo) : responsáveis por toda a atividade espiritual que ocorre no terreiro, como iniciar, conduzir e encerrar as giras e estabelecer as ordens e doutrinas passadas pelo astral.
Iaô (Pai Pequeno e mãe pequena): responsáveis na ausência dos pai ou mãe, têm os mesmos ensinamentos e participam de todos os rituais.
Abiã ou assistência: são as pessoas que começam a frequentar o terreiro sem que sejam iniciadas.
Iabacê ou cozinheiro de santo: é o iaô encarregado de preparar as comidas ritualísticas. Na Umbanda, apesar de ser um cargo não muito comum na maioria dos terreiros, o trabalho é bem mais simples que no candomblé.
Ogãs
Ogã Axogum (ogã de corte ou mão de faca): é o ogã que tem o poder da mão de faca, ou seja, é quem tem a autorização perante o pai de santo e dos orixás para realizar qualquer matança (sacrifício de animais). Não são todos os terreiros de umbanda que possuem tal função, pois muitos deles não aceitam a imolação (sacríficio) animal.
Ogã Alabê (Yatabaxê, curimbeiro ou atabaqueiro): responsável pela curimba e instrutor dos toques de atabaques. É também responsável por tocar e cantar os pontos cantados nas giras além do ensino a novos ogãs.
Filhos de santo (Médiuns)
Médium iniciante: médiuns que ainda não incorporam, sendo às vezes colocados como cambonos até adquirirem experiência.
Médium em desenvolvimento: médiuns em processo de desenvolvimento.
Médium de trabalho: médiuns que prestam consultas nas giras de atendimento e já passaram por todos os preceitos e obrigações (batismo, amaci e coroação).
Cambono: médium designado a auxiliar a entidade trabalhando como um intérprete entre a entidade e o consulente.
Linha de Angola
Otata: sacerdote chefe do terreiro.
Otata ti inkice: o sacerdote que "faz" o santo.
Mamêto: mãe de inkice/mãe de santo.
Muzenza: filha de santo, no gonzemo (santuário).
Sarapabé: cambono.
Linha de Omoloko
Tata: sacerdote-chefe do terreiro.
Ganga: sacerdote.
Ginja: sacerdotiza.
Macóta: ajudante do ganga.
Macamba: filho do terreiro feito.
Camba: adepto/assistência.
Cóta: zeladora do santo.
Ogan (Ogã):
Ogã colofé: ogã de confiança.
Ogã de atabaque: ogã de tambor.
Ogã do terreiro: ogã responsável pelo terreiro.
Samba: dançarina sagrada.
Kambone (Cambone): auxiliar, com os nomes de cambono de ebó e cambono de gira.
Iabá: cozinheira ritualística.
Linha de Cambinda
Ganga: sacerdote-chefe do terreiro.
Tata: sacerdote.
O restante: igual a Linha de Omoloko.
Linha de Gêge
Vodúno: o sacerdote chefe.
Vodunci: filha de santo.
Linha de Cáritas

Embanda: o chefe.
Cassuêto: médium mais desenvolvido.
Tempo-cassuêto: médium a se desenvolver.
Kambone (Cambone): ajudante, que abre e fecha a gira.
Ogan (Ogã): Tamboreiro, que canta e "puxa os pontos".

Ramificações


A umbanda possui ramificações que se diferenciam em rituais, métodos, hierarquia, etc. Mesmo pertencendo a um mesmo grupo, estudiosos concluem que a religião é extremamente diversificada sendo quase impossível encontrar um terreiro totalmente semelhante ao outro. Originalmente, a Umbanda surgiu a partir da Cabula. Simultaneamente surgiram quatro vertentes: Umbanda popular, Umbanda branca e demanda, Umbanda Almas e Angola e Umbanda Omolokô. Todavia, considera-se a vertente iniciada por Zélio Fernandino de Moraes como sendo a primeira. Entre as vertentes mais conhecidas estão:

Branca, de Cáritas e Mirim
Também chamada Alabanda; Linha Branca de Umbanda e Demanda; Umbanda Tradicional; Umbanda de Mesa Branca; Umbanda de Cáritas; e Umbanda do Caboclo das Sete Encruzilhadas, é a primeiras vertente que se organizou como estrutura religiosa, iniciada pelas entidades Caboclo das Sete Encruzilhadas, Pai Antônio e Orixá Malê, através do médium Zélio Fernandino de Morais e pela ala elitista e embranquecida da Macumba do Rio de Janeiro que tinha a intenção de retirar da mesma os elementos iorubás, considerados pelo seu racismo como "primitivos" e "selvagens". Baseia-se nos princípios da caridade e fraternidade do iluminismo. Cultua Caboclos, Preto-Velhos e Crianças, mas renega Exus, tidos como espíritos caídos, que possuem papel somente em descarregos. Não há giras de Exus e os mesmos não dão consultas. Como se vê, a vertente não é adepta das práticas africanas, porém nla se usam guias, fumo, defumadores, etc. Vinculada aos princípios espíritas do Kardecismo, os cantos são cantados à capela sem palmas. É considerada por muitos como a primeira a ter-se organizado em estrutura religiosa, é uma reformulação dos rituais da macumba/cabula sob uma visão influenciada pelo Espiritismo, mas não se atendo a esse.

Chama-se Umbanda de Cáritas os centros oriundos da Umbanda Branca e Demanda que, possuindo ainda mais influência do Espiritismo e do catolicismo, abrem as suas reuniões com a Prece de Cáritas, além de não trabalhar com Exus e Pombajiras, nem utilizar fumo, álcool, pontos cantados e atabaques. Nessa vertente não há qualquer culto aos Orixás que, quando aparecem, é em extremo sincretismo com santos católicos.

A umbanda mirim, ou ainda Aumbandã e Escola da Vida, é outra das vertentes que excluiu elementos africanos, ainda que não sincretize santos católicos. Foi fundamentada pelo médium Benjamin Gonçalves Figueiredo (26 de dezembro de 1902 – 3 de dezembro de 1986), no Rio de Janeiro, RJ, em 13 de março de 1924, com a fundação da Tenda Espírita Mirim. Ainda que sem sincretismo católico, seus Orixás (nove: Oxalá, Ogum, Oxóssi, Xangô, Obaluaiê, Iemanjá, Oxum, Iansã e Nanã) foram reinterpretados de maneira totalmente distinta e desvinculada das tradições africanas. Possui sete linhas de trabalho: de Oxalá, de Iemanjá (onde inclui Iemanjá, Oxum, Iansã, Nanã), de Ogum, de Oxóssi, de Xangô, do Oriente (onde agrupa as entidades orientais) e de Yofá (onde agrupa os Pretos-Velhos e as Pretas-Velhas). Não há gira para Exus e Pomba-giras, pois esses são considerados sendo exclusivamente Quimbandeiros.

Popular
Umbanda popular, também chamada umbanda cruzada e umbanda mística, é uma das primeiras vertentes da Umbanda, sendo a mais popular e aberta a sincretismos. Sua origem se encontra nas antigas casas de Macumba dos morros e comunidades do Rio de Janeiro que mantiveram seus rituais originais. Utiliza-se de ritos africanos, católicos, ocultistas e, em baixo grau, espíritas. É a vertente mais flexível em termos ritualísticos e de costumes. Foi relegada à marginalidade por umbandistas da elite branca que rejeitavam os rituais mais africanizados.

Há três versões para as linhas de trabalho na Umbanda Popular: Na mais antiga, são consideradas a existência de sete linhas de trabalho: de Oxalá (onde inclui as Crianças), de Iemanjá (onde inclui Iemanjá, Oxum, Nanã), de Ogum, de Oxóssi, de Xangô (onde inclui Xangô e Iansã), do Oriente (onde agrupa as entidades orientais) e das Almas (onde agrupa os Pretos-Velhos e as Pretas-Velhas). Na intermediária, também sete: de Oxalá, de Iemanjá (onde inclui Iemanjá, Oxum, Nanã), de Ogum, de Oxóssi, de Xangô (onde inclui Xangô e Iansã), das Crianças e das Almas (onde agrupa os Pretos-Velhos e as Pretas-Velhas). E, na mais recente, as linha de trabalho dividem-se pelo tipo de entidade: de Caboclos(as), de Pretos(as)-Velhos(as), de Crianças, de Baianos(as), etc.

Traçadas
Umbanda traçada é um termo guarda-chuva para as vertentes que conservaram maior influência das raízes candomblecistas.

A Umbanda de Almas e Angola também é chamada de Umbanda Traçada por ter ests semelhança característica. É uma das primeiras vertentes, surgida da Umbandização de antigas casas de Cabula e Banto, e utiliza-se, principalmente, de ritos africanos do Banto. Cultua nove Orixás bastante sincretizados ao catolicismo: Oxalá, Ogum, Oxóssi, Xangô, Obaluaiê, Iemanjá, Oxum, Iansã e Nanã, e possui sete linhas de trabalho: de Oxalá, do Povo d’Água (onde inclui Iemanjá, Oxum, Nanã e Iansã), de Ogum, de Oxóssi, de Xangô, das Beijadas (onde agrupa as Crianças) e das Almas (onde inclui Obaluaiê e agrupa os Pretos-Velhos e as Pretas-Velhas).

A umbanda omolocô, também pode ser conhecida como Umbanda Traçada, devido às semelhanças em termos de influência tradicional africana. Seu culto, também antigo, foi sistematizado a partir da década de 1950 no Rio de Janeiro por Tata Tancredo da Silva Pinto. Sua origem se encontra nas antigas casas de cabula banto e Omolocô, sendo um culto africanista aos Orixás, aos guias e Linhas da Umbanda bem similar e próximo ao candomblé, ainda que havendo forte sincretismo presente.

O Umbandomblé são casas oirundas da umbandização de antigas casas de candomblé, notadamente as de Candomblé de Caboclo, já desde os primórdios. Em alguns casos, o mesmo pai-de-santo (ou mãe-de-santo) celebra tanto as giras de Umbanda quanto o culto do Candomblé, porém em sessões diferenciadas por dias e horários. O sincretismo com santos católicos é mínimo, sendo os Orixás fortemente vinculados às tradições africanas, principalmente as da nação Ketu, podendo inclusive ocorrer a presença de outras entidades no panteão que não são encontrados nas demais vertentes da Umbanda (Oxalufã, Oxaguiã, Ossain, Obá, Ewá, Logun-Edé, Oxumaré). Considera-se como linha de trabalho cada tipo de entidade: de Caboclos(as), de Pretos(as)-Velhos(as), de Crianças, de Baianos, etc, e os trabalhos são realizados por vários tipos de entidades como Falangeiros de Orixá, Caboclos(as), Pretos(as)-Velhos(as), Crianças, Boiadeiros, Baianos(as), Marinheiros, Sereias, Ciganos(as), Exus, Pombagiras e Malandros(as). Embora a roupa branca seja a vestimenta principal dos médiuns, essa vertente aceita o uso de roupas de outras cores pelas entidades, bem como o uso de complementos (tais como capas e cocares) e de instrumentais próprios (espada, machado, arco, lança, etc.). Nela encontra-se o uso de guias, imagens dos Orixás na representação africana, fumo, defumadores, velas, bebidas e atabaques nos trabalhos. Nesta vertente também são utilizadas algumas cerimônias de iniciação e avanço de grau semelhantes à forma como são realizadas nos Candomblés, incluindo o sacrifício de animais, podendo ser encontrado, também, curimbas cantadas em línguas africanas (banto ou iorubá).

Outras vertentes
Umbanda de caboclo: tem influência da cultura indígena brasileira, trabalhando com caboclos. Não trabalha com orixás.
Umbanda esotérica: seu maior difusor foi W.W. da Matta e Silva (Mestre Yapacany), considerada como um conjunto de leis divinas.
Umbanda iniciática: derivada da Umbanda esotérica, foi fundada por Pai Francisco Rivas Neto (Mestre umbanda Yamunisiddha Arhapiagha), com influência iniciática oriental,como uso de mantras indianos e do Sânscrito e também do candomblé do queto.
Umbanda Sagrada: é a vertente iniciada a partir dos ensinamentos transmitidos por Rubens Saraceni, através de psicografias ditadas por Pai Benedito de Aruanda no início da década de 90. A partir dessa linha surgiram a Associação Umbandista e Espiritualista do Estado de São Paulo e o Curso de Teologia Umbandista (1996). Além das práticas religiosas tradicionais da Umbanda, a vertente também incorpora elementos da espiritualidade oriental.
Apesar de ser mais forte no estado de São Paulo, é bem difundida e divulgada no país inteiro através de seus cursos, aulas e vídeos na internet.
Umbandaime: é o sincretismo entre umbanda e Santo Daime.
Mesmo pontuando tais linhas, de acordo com estudiosos da área, cada terreiro possui sua tradição com modalidades demasiadamente diferenciadas entre si, correspondendo assim apenas a uma parcela dos participantes dessa religião. A umbanda é extremamente aberta e diversificada, apesar de ter seus princípios e bases religiosos.

Perseguição
Era Vargas até a década de 1950
Assim como outras religiões afro-brasileiras, a Umbanda sofreu repressão política aberta durante a era Vargas, até ao início de 1950. Uma lei de 1934 colocava estas religiões sobre a jurisdição do Departamento de Tóxicos e Mistificações da polícia de modo que era preciso um registro especial para funcionarem. Durante esses anos vários grupos se mantinham na clandestinidade ou, quando se registravam, procuravam omitir suas ligações ou inspirações africanas registrando-se como sendo apenas "espiritistas".

Em 1946, o escritor Jorge Amado, na época deputado federal pelo Partido Comunista Brasileiro de São Paulo, propôs uma emenda à Constituição garantindo a liberdade de culto no Brasil. O texto foi aprovado, e com isso os terreiros passaram a ter o amparo da lei. Mas a omissão, embranquecimento, ou desafricanização que rejeitava as influências tradicionais africanas já havia sido estabelecida claramente no I Congresso Brasileiro de Espiritismo de Umbanda realizado em 1941, que definiu para seus participantes que a raiz da Umbanda provinha de "antigas religiões e filosofias da Índia". Roger Bastide argumentou que o espiritismo "branqueia" ou "europeíza" a Umbanda, distorcendo suas reais raízes africanas.

Perseguição do protestantismo neopentecostal
No Brasil, a Umbanda e demais religiões de matrizes africanas sofrem com a intolerância religiosa, sendo as religiões neopentecostais ditas Renovadas de maior intolerância em relação à Umbanda e ao Candomblé.

Em 1997, o bispo Edir Macedo, líder da Igreja Universal do Reino de Deus, lança um livro sobre Orixás, Caboclos e Guias que se tornou leitura obrigatória para evangelicalistas pentecostais, neopentecostais e até mesmo tradicionais. O livro relaciona a Umbanda ao satanismo para tentar dar razão às práticas de "exorcismo" de sua religião. Em 2005, a Justiça Brasileira determinou a retirada de circulação de todos os exemplares do livro por conta de seu teor preconceituoso contra as religiões afro-brasileiras. Mas, um ano depois, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região liberou a venda com a justificativa de que a proibição contrariava o princípio da liberdade de expressão, garantido pela Constituição Federal Brasileira.

Críticas
Alguns Candomblecistas mais tradicionalistas criticam a Umbanda por considerá-la superficial e desconhecer os ritos mais profundos dos cultos aos Orixás, além de criticarem a Umbanda por não separar o culto dos espíritos do culto às entidades, já que o candomblé considera os orixás e deuses como sendo mais puros e de energia mais primordial e que, desse modo, não podem ser maculados pela energia dos espíritos que viveram na Terra.

Elogios e honrarias
O Encanto dos Orixás
O teólogo da Teologia da Libertação Leonardo Boff, em seu texto "O Encanto dos Orixás", enaltece a religião dizendo que a umbanda representa a verdadeira brasilidade ao misturar em si as raízes africanas, europeias e indígenas além de colocar em primeiro plano os conselhos dos mais humildes e marginalizados. O teólogo pega emprestado o título do livro escrito pelo diplomata e político brasileiro Flávio Miragaia Perri, que se tornou umbandista após conhecer melhor a religião e sua dinâmica. O diplomata escreveu outros livros acerca do tema.

Comunidade LGBTQIA+
A Umbanda é reconhecida e elogiada pela sua abertura à diversidade sexual. Homens e mulheres homossexuais, bissexuais, heterossexuais, transexuais são acolhidos em suas diferenças sem nenhuma distinção. Mesmo nos terreiros com maior influência do candomblé, homens e mulheres podem exercer papéis diferentes, mas com dignidade e importância igual. Outro ponto importante é o fato de que pessoas não heterossexuais terem a possibilidade de se tornarem pais ou mães de santo, médiuns, cambonos ou ogãs sem nenhuma distinção. Muitos casais homossexuais casam-se religiosamente pelas mãos de sacerdotes umbandistas.

Patrimônio imaterial
Em 2016, após os estudos do Instituto Rio Patrimônio da Humanidade (IRPH), a Umbanda se tornou um dos patrimônios imateriais do Rio de Janeiro. O estudo reconheceu a importância da cultura sincrética afro-indígena brasileira, o sincretismo religioso como mola propulsora de vários aspectos sociais de grande impacto sociocultural.

Além disso, o Inventário Nacional de Referências Culturais (INRC) está em processo de reconhecimento de vários terreiros de Umbanda como patrimônios históricos em todo o estado do Rio de Janeiro.

Exu de Umbanda
Exu, dentre as religiões de matriz Amerindio-afro, é uma Legião de espíritos, que podem estar em diversos níveis de iluminação, que auxiliam os trabalhos espirituais, incorporando ou não nos médiuns, enquanto trabalham nas religiões que os cultuam.

Também estão presentes nas religiões denominadas Jurema, Omolocô, Candomblé de Caboclo,Umbanda Popular e Umbanda esotérico entre outras manifestações religiosas Amerindio-afro, assim como em terreiros "traçados" de Umbanda ou Quimbanda e Candomblé. Não estão presentes em terreiros de Candomblés puro, tais como o Jeje, Queto, Angola, Ijexá e Nagô, sendo estes, apenas é cultuado Legba (Jeje e Jeje-Nagô), Exú (Ketu, Nagô, Jeje-Nagô), com o qual os Exus não devem ser confundidos, e Pambunjila, com o qual não se deve confundir com a Pombagira.

Pela influência católica na colonização e formação político-social do Brasil, o exu foi logo associado ao Diabo, mesmo nos primórdios da Umbanda. Essa associação também ocorria em traduções para o inglês: Èṣù no "Vocabulary of the Yoruba" de Samuel Ajayi Crowther (1842) é traduzido como diabo ou satã. Mesmo nos dias de hoje, há pontos de Umbanda que remetem a esse a esse pensamento como uma forma de retaliação e proteção dos umbandista,juremeiros e etc.

Uma vez, no entanto, que a Umbanda não é uma religião essencialmente Que tem o teor de maquiavélico, o exu, ainda que atue nas trevas, eles atuam nas sobras e também na luz, é considerado um ser benigno.

Definição
Um Exu se compreende como um espírito que por procedência e similaridade, passa a utilizar o nome de um Orixá, sendo esse Exu, para realizar trabalhos semelhantes ao dessa Divindade, assim podemos muito encontrar Exus de Encruzilhadas ( sendo essa, a morada de Exú enquanto Orixá ), como os conhecidos Tranca-Ruas e 7 Encruzilhadas, Exus ligados ao movimento, tais como Exu Gira-Mundo, e Exu Gererê, Exus de Prosperidade, tais como, Exu Chama-Dinheiro e Exu Pedra-Negra, dentre outros que são patronatos originalmente de Exu.

A denominação Exu pode ser aplicada a todo e qualquer espírito, seja ele Negro, Indígena, masculino ou feminino. Exus Negros, recebem o nome de Preto Velho Quimbandeiro, nomenclatura essa mais comum na Umbanda, pois na Quimbanda, todo e qualquer espírito que ali manifeste, é um Exu, Exus Indígenas, recebem o nome de Caboclo Quimbandeiro, mesmo caso com os Pretos Velhos, nomes esses que a Umbanda utiliza para não discerni-lo, pois em sua matriz, ainda existe um tabu muito forte sobre a figura de Exu, dando para o mesmo nomes como Coroado, Batizado, Exu de Lei, Cruzado ou Espadado, coisas que estão longe de serem realmente verdades dentre o que realmente seria Exu, no entanto, também temos as donzelas chamadas especificamente de Pombajiras, que são entidades que quando encarnadas, pertenceram ao gênero feminino, e que por inúmeras razões foram agregadas a egrégora de Exu, passando a trabalhar na Quimbanda e mais tarde na Umbanda e em outras religiões desta forma.

Quando incorporam, os Exus masculinos costumam se caracterizar com capas, cartolas e bengalas, mas não é obrigatório que os médiuns se utilizem dessas vestimentas para a incorporação, a partir do momento que os espíritos utilizam essas roupas devido a sua própria individualidade, muito até se remetendo sua vida enquanto encarnado. Cada terreiro trabalha de forma autônoma. Alguns centros uniformizam a roupa dos médiuns; todos, por exemplo, vestem branco.

Também existe um outro tipo de entidade relacionada aos exus, o Exu-Mirim.

Falange
Uma Falange é que um agrupamento de espíritos, que se compreendem em harmonia, através de um arquétipo semelhante a ser seguido, ou seja, não existe somente um Exu 7 Facadas, existem centenas de espíritos que usam esse nome, pois todos se compreendem estarem harmonicamente em uma mesma egrégora.

Saudação
A saudação aos exus e pombajiras é "laroiê". Significa algo como "salve o mensageiro".

História
A ideia do exu de Umbanda deriva do orixá de mesmo nome, no Candomblé, que era considerado o mensageiro dos demais orixás.

Sua identificação histórica com o diabo cristão se estabeleceu não por conta de suas características funcionais, mas devido a aspectos de sua aparência. Uma vez que o Exu da religião iorubá é uma divindade do fogo, à qual eram atribuídos chifres, membro viril e sexualidade sem freios, acabou-se por relacionar sua figura a de um demônio.

Uma vez que a Umbanda foi citada a partir dos cultos africanos desenvolvidos no Brasil como o Omolokô, e mais tarde com o advento de 1908, passa a receber influências do Kardecismo, conforme Zélio Fernandino de Morais, os Exus passaram a ser vistos na teologia umbandista como agentes da lei do karma, conceito presente em outras religiões predecessoras. Os Exus seriam assim, para esta visão umbandista, seres elementares, isto é, espíritos em evolução espiritual dentro de determinadas funções cármicas.

A partir daí surgiu-se a nomenclatura "exu batizado", para se referir aos exus-de-lei, e "exu pagão", para se referir, na verdade, a quiumbas.

Para algumas tradições umbandistas, um Exu estaria em patamar inferior, mas para outras, seriam entidades espirituais com a mesma evolução das demais entidades, como caboclos e pretos-velhos, apenas posicionado em uma linha de trabalho diferente. Atuariam os exus, bem como pombajiras e exus-mirins, em um plano espiritual muito denso, tendo mais liberdade de trânsito que as demais entidades, e podendo assim conhecer e resolver melhor as necessidades humanas mais imediatas.

Hierarquia
Os exus mais evoluídos são chamados de "Exus cabeças/chefes de legião", e comandam uma legião espiritual. São eles:

Exu Sete encruzilhada- serventia direta de Oxalá.
Exu Tiriri - serventia direta de Yori.
Exu Tranca ruas - serventia direta de Ogum.
Exu Marabô - serventia direta de Oxossi
Exu Marabô - serventia direta de Oxóssi.
Exu Caveira - serventia direta de Obaluaê.
Exu Gira mundo - serventia direta de Xangô.
Exu Pomba gira(são várias mas regidas por Yemanjá e cruzada com outros orixás) - serventia direta de Yemanja.

Essas legiões se subdividem em planos, subplanos, grupos, subgrupos e colunas. Cada uma dessas subdivisões atende por um nome, mais ou menos específico. Assim, por exemplo, os espíritos que se autodenominam da falange de João Caveira, na verdade são uma subdivisão de Exu Caveira.

Notas
Nos terreiros marcadamente influenciados pelo Catolicismo, Deus continua sendo representado pela Santíssima Trindade. Neste caso, a Trindade é representada por Olorum sendo a comunhão entre o Pai, neste caso Obatalá; o Filho Jesus Cristo, neste caso Oxalá; e Espírito Santo, representado por Ifá.
 Essas funções podem variar de acordo com o terreiro, porém funções como a de apetebi (a mulher filha de Oxum que, em muitos terreiros, é a única mulher que pode jogar os búzios), o ialaxé (o que cuida dos "axés" dos orixás, ou seja, todos os objetos e alimentos oferecidos aos oxirás), o babalaô (o que faz o jogo de búzios, obís e outras advinhações), o babalossaim (o homem responsável pela colheita das ervas sagradas e preparação de banhos e remédios naturais), o babaogé (sacerdote responsável pelo culto dos antepassados) são algumas das funções que são praticamente inexistentes na Umbanda, mas que são encontradas nas ramificações do Candomblé.
Em Umbanda: Guia e Ritual para Organização de Terreiros, Rio de Janeiro: Editora Eco, 1972, página 33, o autor Tancredo da Silva Pinto diz: "Essa umbanda não tem organização própria, imita a dos umbandistas, mas usando sapatos brancos em soalhos taqueados. Muito espalhada no Estado da Guanabara, com o rótulo de "Umbanda de branco". Pratica a caridade sinceramente, com muita fé. Constitui a "Ordem de Cáritas da Umbanda", porque abre o centro com a prece de Cáritas, de muita força espiritual,"
 A Macumba popular se dividirá em dois grupos principais: um atrelado ao Espiritismo, que irá abolir várias práticas consideradas primitivas e selvagens, como o sacrifício de animais e o uso de atabaques e um outro grupo que continuará com o seu curso normal, porém que serão relegados à marginalidade pela classe mais elitista. O primeiro grupo dará origem à Umbanda branca e demanda, de Zélio Fernandino de Moraes e o segundo grupo será conhecido como sendo Umbanda popular.
Essa vertente também é conhecida como Ordem de Cáritas da Umbanda, umbanda de mesa, umbanda espírita e Umbanda branca.
Essa vertente também é conhecida como Ordem de Cáritas da Umbanda, umbanda de mesa, umbanda espírita e 'umbanda branca.
A Macumba se dividirá em dois grupos principais: um atrelado ao Espiritismo, que irá abolir várias práticas consideradas primitivas e selvagens, como o sacrifício de animais e o uso de atabaques e um outro grupo que continuará com o seu curso normal, porém que serão relegados à marginalidade pela classe. O primeiro grupo dará origem à Umbanda branca e demanda, de Zélio Fernandino de Moraes e o segundo grupo será conhecido como sendo Umbanda popular.
Essa vertente também é conhecida como Umbandomblé.


Quimbanda

 

Kimbanda ou Quimbanda é um conceito religioso afro-brasileiro com raízes na mitologia Bantu, ainda controverso quanto a sua real definição na atualidade. Por vezes, é classificada como uma religião autônoma, e por vezes como uma Linha de Trabalho (Linha de Esquerda) da Umbanda e do Candomblé, ou seja, uma modalidade de atuação e conhecimento do mundo astral e espiritual onde Umbandistas têm a possibilidade de fazer o uso da magia e feitiços para atingir os objetivos, seja práticos, seja objetivos de evolução espiritual pregados pelo culto aos Orixás.
Suas entidades, conhecidas como "Povo da Rua", dividem-se entre Exus (masculinos) e Pombagiras (femininas), os ambos mensageiros e guardiões, que vibram nas matas, cemitérios, encruzilhadas, etc

Etimologia
O nome vêm da palavra de língua Quimbundu (ou Mbundu) Kimbanda, que significa "curador" ou "xamã", também se refere a "aquele que se comunica com o além".

Descrição
A Quimbanda trabalha diretamente com os Exus e com as Pambu ia-njila (Pombajiras), de uma forma não trabalhada na linha direita da Umbanda, pois esta trata do culto a Orixás. De acordo com a cosmologia Umbandista, Exus e Pombajiras manipulam tanto forças negativas quanto positivas - o que não significa que sejam malignas: as raízes da cosmovisão da Kimbanda não adota a divisão maniqueísta entre bem e mal. Os Exus e Pombajiras de Quimbanda diferenciam-se de (e atuam contra) as Kiumbas, que são espíritos obsessores que mantêm-se presos à terra por atrasos em sua evolução, e que por vezes podem mesmo se manifestar fantasiados de falsos Exus e Pombajiras. Os Exus e Pombajiras trabalham basicamente para o desenvolvimento espiritual das pessoas, com o intuito de evolução espiritual, além de proteção de seu médium. Como são as entidades mais próximas à faixa vibratória dos encarnados, apresentam muitas semelhanças com os humanos.
A entrega de oferendas é comum na Kimbanda, assim como na Umbanda, mas variam de acordo com cada entidade. Podem ser oferecidas bebidas alcoólicas, tais como cachaça (Marafo), uísque, vinho, sidra, conhaque, entre outras, além de velas, charutos e cigarros.
Lourenço Braga, seguidor da tradição da Umbanda Branca (que renega o culto a Exus), escreveu em 1942 o livro "Umbanda (magia branca) e Quimbanda (magia negra)", onde ele lista sete linhas de Quimbanda:

Linha das Almas - Exu Omulu
Linha dos Caveiras - Exu Caveira
Linha de Nagô - Exu Gererê
Linha de Malei - Exu Rei
Linha de Mossurubi - Exu Kaminaloá
Linha dos Caboclos Quimbandeiros - Exu Pantera Negra
Linha Mista - Exu dos Rios/Exu das Campinas

Há um tipo específico de Quimbanda que trata de um culto de Exu independente, denominada "Quimbanda independente", uma prática da Quimbanda sem vinculação com a Umbanda.

História
O termo "Quimbanda" (da mesma forma que o termo "Umbanda") tem origem na língua Mbundu, e dentro do Candomblé de Angola designa, desde o período pré-colonial, um rito próprio, cujo sacerdote que o pratica é chamado de "Tata Kimbanda".
No Brasil, com o advento da Umbanda enquanto religião organizada pela tradição de Zélio, o termo "Quimbanda" passou a ser usado para descrever pejorativamente todos aqueles trabalhos espirituais que eram negados pelos preceitos desta Umbanda de corte espírita e católico, que utiliza mesmo termos como "fariseus" para se referir a Umbandistas que fazem trabalhos com Exus de Umbanda; trabalhos que, de acordo com a cosmovisão africana alheia ao maniqueísmo ocidental, não são necessariamente "malignos". Não se pode confundir a Quimbanda (culto de Exus e Pombajiras) com "Quiumbanda", que é outro nome para os Kiumbas.