segunda-feira, 17 de julho de 2023

Kenneth Grant - Magicka da Zona Malva


Pareceria que quase todas as mágickas realizadas com sucesso manifestam-se como um ricochete, um retorno para o grupo de cerimônias, rotina da loja ou procedimentos templários, ou para trabalhos mágickos individuais isolados. Denomino esta peculiaridade de tantrum tangencial. Anômalo ou não, isto não parece ter sido investigado por qualquer escritor ocultista anterior do assunto. É provável que se o mecanismo do fenômeno possa ser surpreendido, a mágicka transformar-se-ia na última da qual seus exponentes clamaram desde seu princípio, i.e., que ela é uma ciência mais do que uma arte. A experiência, entretanto, persuadiu-me que uma surpresa jaz além do reino da medida, dentro do qual embala o tipo de ocorrências ocultas aqui descritas que restarão imprevisíveis. E talvez isto seja favorável!

Entre os anos de 1955-1962, eu estava envolvido com uma Ordem oculta conhecida como Loja Nova Ísis.

Ela funcionava como um ramo da Ordo Templis Orientis (O.T.O.), com sede em Londres. Eu fundei a Loja para canal de transmissão de origens transplutoniana, e durante seus sete anos de atividades ela transformou a O.T.O. em um veículo altamente especializado de energia mágica que Aleister Crowley idealizou para ela desde 1945.

Era minha intenção incluir aqui os rituais da Loja, mas como isto teria necessariamente envolvido tecnicalidades e repetições, e como este livro não pretende ser um manual de rituais mágickos, a intenção foi abandonada. No entanto, certas formas de tantra tangencial lançados por ritos particulares tem sido extraídos dos Registros da Loja e editados, onde necessário, para preservar a continuidade textual.

Acima e além disto, o livro esforça-se para seguir os trabalhos deste fenômeno em dimensões que os cientistas estão apenas começando a explorar. Estas dimensões, as quais podem ser consideradas como existentes além ou entre os dois estados adormecido e desperto, chamo-as de Zona Malva. Ela inclui e exclui ambos os estados simultaneamente. A designação comporta implicações ocultas não necessitando de explanações para aqueles familiarizados com a função de Daäth como o Portal de Ingresso e Egresso para o outro lado da Árvore da Vida.

Para aqueles não tão familiarizados, a Zona Malva pode-se dizer que tem uma analogia mítica no símbolo do Deserto Vermelho dos Árabes, o qual, de acordo com Lovecraft, era o equivalente antigo do Roba el Khaliyeh, uma zona supostamente assombrada pelos maus espíritos e monstros da morte. A Parte I deste livro não necessita de comentário. A Parte II requer algumas explanações porque ela pretende iluminar um texto especifico – o Livro da Lei de Crowley (Liber AL vel Legis)

4 – o qual interpretei aqui com referência, não às suas implicações mundanas, mas à sua proveniência extraterrestre. Como é a primeira vez que isto é tentado, é rogado aos leitores exercitarem sua paciência à medida que o esqueleto é gradualmente desnudado de sua aparência perceptivelmente humana. Isto será recompensado quando ele passar à Parte III, onde os processos ocultos do trabalho na fabricação da Parte II são mais completamente revelados.

Com a publicação deste volume a roda fecha seu ciclo. The Magical Revival contém uma lista na qual os nomes de certas entidades mencionadas no AL vel Legis de Crowley são comparadas com aquelas que são apresentadas no AL Azif (O Necronomicom), o qual posteriormente, de acordo com Lovecraft, era completamente um produto de fantasia. Mais de uma década atrás, em um artigo em Man, Myth & Magic, eu sugiro uma origem comum para ambos estes livros. A idéia foi assimilada por vários editores e compiladores de grimoires e não menos do que quatro versões do Necronomicom foram publicadas desde então! Não é portanto de surpreender que o presente livro toca novamente, e explora mais adiante, as afinidades e identidades que espreitam além das máscaras sombrias destas duas esfinges. Isto também indica algumas das mais pertinentes pesquisas de Ufólogos que sugerem – talvez com mais probabilidade do que eles, até mesmo, podem preocuparem-se em admitir – que as entidades visualizadas por Crowley, Lovecraft, Castañeda, Bertiaux, e outros, realmente existem em algum lugar e alguma época, e que eles ocasionalmente aparecem aqui sobre a terra.

Obs.: é importante mostrar aos leitores brasileiros que a Loja Nova Ísis não é a Loja que se situa na Tijuca no Rio de Janeiro aqui no Brasil, e sim uma Loja de origem inglesa fundada muitas décadas antes da Loja brasileira e encabeçada por Kenneth Grant. A versão brasileira é apenas charlatanismo barato.

2 O corpo destas transmissões formam as bases da Trilogia Typhoniana ( ver bibliografia). Durante o transcurso de obtenção delas, todas as sortes de fenômenos inexplicáveis racionalmente foram experimentados pelos membros da Loja. Algumas destas experiências estão aqui descritas.

3 O assunto tem sido tratado extensivamente em Nightside of Eden.

4 Posteriormente refere-se à ele como AL.


PARTE UM

MÁGICKA DA ZONA MALVA

‘OBJETOS D’ARTE NOIR’


Um grande número de noções errôneas prevalecem hoje sobre talismãs, fetiches, objetos carregados com prana, ojas, vhril, mana – ou apenas evidente poder mágico. Parece necessário esclarecer o fundamento e eu não encontro melhor caminho do que basear minhas observações sobre objetos atualmente preservados no museu mágico da Loja Nova Ísis. Um deles é um fragmento de um envoltório-de-embalsamar Egípcio, pretensamente de maat sacerdotisa Egípcia da 26ª Dinastia. Restos da múmia que havia sido embalsamada ainda aderiam à sua superfície interna. As imagens do Macaco de Thoth e do sagrado chacal de Anúbis são claramente discerníveis. Logo após a virada do presente século o fragmento era utilizado como um foco psíquico por alguém do grupo cindido da Golden Dawn dirigido pela Sóror S.S.D.D.. Seu pequeno livro Magia Egípcia, formou parte da série ‘Collectanea Hermetica’ editada pelo Dr. Wynn Westcott e publicado pela Sociedade Teosófica de Londres em 1896. A Loja Nova Ísis veio a ter posse do fragmento através da generosidade de um colecionador que a apresentou em 1948. Durante a década de cinqüenta ele foi psicometrado por uma talentosa clarividente que recusou comentar sobre ele, se por conhecimento ou ignorância não se sabe. Ao redor deste período uma mulher chamada Mira uniuse a Loja. Ela foi imediatamente atraída pela relíquia embora ela não tivesse mais conhecimento de suas recentes associações do que nós tínhamos de suas antigas. Ela sugeriu, porém, que nós pudéssemos utilizá-lo para formar um ritual designado a explorar sua história mágica.

O Templo da Loja foi inteiramente mobiliado tanto quanto possível de acordo com o período da Dinastia relevante, e a sacerdotisa oficiante havia executado o ritual. Mira era uma sensitiva natural e havia demonstrado diversas vezes seus poderes peculiares.

Vestida em robes apropriados ela estava sentada diante um espelho mágico posto em um ângulo oblíquo contra o envoltório de modo que duas imagens distintas dele apareciam simultaneamente, uma sobre a outra. Alaúdes e flautas emprestaram uma atmosfera calma aos procedimentos e não havia muito tempo antes os olhos de Mira assumiram uma expressão distante e vazia.

É usual, em circunstâncias assim, apenas o clarividente ver imagens no espelho mágico. Nesta ocasião, entretanto, a sacerdotisa oficiante, sete acólitos, e um sacerdote ‘visitante’ de um coven de Gerald Gardner, viram o desvanecimento da imagem refletida e a introdução abrupta de entidades animadas encenando o seguinte drama nas profundidades do espelho:

Um objeto longo era movido com rodas por figuras encapuzadas de preto dentro de um túnel o qual parecia distanciar-se ao infinito. Ele assemelhava-se a um divã móvel, e sobre ele uma mulher – sedutoramente branca – reclinada sobre peles de cheeta. Patas e caudas suspensas identificadas posteriormente, mas havia atributos adicionais que não eram físicos, embora eles parecessem na refração tão substancialmente quanto os que eram. Eles poderiam ser extrusões ectoplásmicas dos karmas passados da mulher; eles giravam em espiral como poeira interestelar crescendo e nevando um pó luminoso sobre os muros do túnel onde eles formavam curiosos depósitos. Quando Mira finalmente retornou a si ela descreveu-os como “um tipo de fungos fantásticos”. Eles cobriam os muros como um musgo verde saturado de vida maligna o qual aglomerou-se sobre toda superfície que se apresentou.

Havia muitos porque o ângulo de visão de Mira era continuamente modificado de maneira que novas superfícies eram expostas à vista. A mulher branca sobre o carrilhão parecia mudar de cor enquanto um tentáculo fungóide saía do muro e explorava seu corpo. Ela se assemelhava a uma ampola de carne transparente inflada continuamente com vapores de verde, escarlate, malva, e finalmente com um fluído tingido de índigo. O objeto de execução restava obscuro. Ninguém podia alcançar o propósito de tal orgasmo colorido.

Aqui uma ligeira divagação parece necessária. É possível que estes kalas tenham sido ejaculados pelas entidades alienígenas e transmitidos a terra via sacerdotisa quem, em seu sono mágico, estava apta a conduzir a semente do Exterior. Tendo desprendido seus venenos, os tentáculos então lançaram um véu impenetrável que obscureceu a visão. Os únicos objetos que emergiram da névoa foram as duas reflexões originais do fragmento do envoltório.

Mira mergulhou em um profundo transe e nós aguardamos por manifestações adicionais. As visões tão distantes haviam nos confundido. Elas sugeriam que ela havia contatado – através de uma antiga sacerdotisa Egípcia – um estrato infinitamente mais remoto do que aquele pertencente à Dinastia na qual ela havia vivido. Era possível apenas que Mira houvesse esbarrado em linhas entrelaçadas. Havia elementos transplutonianos na visão e eles pareciam ter revelado, em um modo literal, regiões a partir das quais Lovecraft havia concebido o Fungi from Yuggoth. Era uma visão de um período mais fechado a vida da sacerdotisa mumificada do que o período o qual se seguiu. O espelho então ficou nublado como se as partículas de poeira tivessem se acumulado sobre o pára-brisa da ‘astronave’ de Mira. Padrões estranhos de cristais de gelo apresentaram-se em um rápido caleidoscópio. Era no princípio reconciliar uma impressão de neve ártica com o cáustico calor e poeira associada com o velho Egito. Sendo interpretado, porém, o fenômeno simboliza de um lado a austera virgindade da sacerdotisa, e, de outro, o terreno tórrido o qual karma ordenou como a cena de seu enterro. O período era identificável como aquele da 13ª Dinastia, sob o reinado da Rainha Sebek-nefer-Ra, uma dos grandes exponentes da Tradição Draconiana em épocas históricas. Para antecipar os eventos: havia-se tornado aparente que a hierarquia do envoltório havia sido também uma Grã-Sacerdotisa no Templo de Set fundado pela Rainha Sebek-nefer-Ra. O templo sobreviveu a devastações e depredações pelos seguidores de Osíris, quem, por séculos haviam buscado destruir todos os traços do ‘odioso’ Culto Typhoniano.

A próxima figura a aparecer no espelho estava também reclinada, e em processo de sofrer tratamento de uma espécie mágica reminiscente de uma visão experimentada por Joan Grant, com a diferença de que a placa colocada sobre os genitais da sacerdotisa possuía o hieróglifo de uma deidade desconhecida para a história, talvez de um daqueles ‘Deuses da Sombra’ que Beatty sugere. Novamente a série de múltiplos orgasmos, mas desta vez uma explanação prontamente sugere-se. A placa torna-se brilhantemente incandescente à medida que cada um dos orgasmos surge carregando seu metal com vívidas cores. O kalas real poderia ser visto como halos de arco-íris lançados como anéis graduando do ultravioleta a um indescritível matiz invisível à visão humana. Mas era registrado pelo espelho e transmitido ao templo da Loja onde causava um avivamento dos olhos e uma curiosa sensação de leveza. Uma acólita disse, após a sessão, que ela havia sido fisicamente levitada algumas polegadas acima do solo.

A cena novamente modificou-se abruptamente e o espelho pareceu ser envolvido por chamas. Uma procissão de figuras encapuzada emergiu de um túnel. Seus robes eram negros mas ornados com sigilos incandescentes que emanavam uma radiância esverdeada. A parte extraordinária disto era que, à medida que a procissão emergia, chovia um vapor esverdeado dentro da Loja; o espelho emanava uma onda de kalas os quais lentamente envolvia Mira até ela assemelhar-se a uma estátua de pedra com líquen. Não havia nenhum motivo, fisicamente falando, para estas sutis radiações, nem foi encontrado qualquer traço deles sobre a mobília da Loja. É inteiramente difícil distinguir tais visões de conteúdos oníricos irracionais e confusos.

Se a cor caísse do espaço, ela cairia como a do espelho mágico no qual Mira e outros membros da loja olhavam. Outro objeto, de nenhuma forma tão antigo quanto o envoltório mas tão fortemente carregado com poder, é o lustre de candeia que era utilizado como um bastão destruidor por Allan Bennett. Ele era também um membro da Golden Dawn e era instrumental em estabelecer o Sangha Budista no Oeste. Ele também instruiu Crowley em muitas técnicas orientais de meditação e mágicka. Olhando-o é um lustre muito ordinário, agora montado sobre uma trípode ornada e dourada. Bennett utilizou-o como uma extensão de seu bastão mágico. Não há necessidade para mim de descrever seu poder nas mãos de Bennett porque Crowley já o fez em seu Confessions. Uma arma até mesmo mais potente é a adaga utilizada por Crowley em sua invocação de Choronzon. Isto ocorreu no deserto próximo a Bou Saad em 1909 onde, com Frater Lampada Tradam (Victor Neuburg), Crowley sofreu uma série de iniciações em aethyrs parcialmente explorados dois séculos antes por Dee e Kelley. Foi-me dito por indivíduos psiquicamente ativos que a adaga tem uma aura decididamente sinistra, e eu não a entregaria para um psicômetra, uma pessoa vendada ou qualquer outra pessoa.

Mas o mais misterioso objeto mágico na coleção é indubitavelmente um retrato original de LAM, uma entidade extraterrestre, o qual eu selecionei – a convite de Crowley – de um de seus portfólios. O desenho de alguma forma projeta-se adiante e pode-se dizer sem exageros que Lam escolheu-me mais do que ao contrário. O retrato estava sendo mostrado em Greenwich Village, Nova York, por volta de 1919 em uma exibição chamada “Almas Mortas”. Esta era uma designação certa porque Lam saiu diretamente do Necronomicon, o tão falado. Apenas olhar nos olhos desta entidade é um convite para um potente contato. Há em seguida uma imediata sensação de lucidez, leveza, e então uma sensação de queda. Uma das reações iniciais é resistir a ser sugado para dentro do vórtice de um funil astral infernal. Todas as quais confirmam as opiniões daqueles que consideram Lam algo, ou alguém, não desta terra.

Falar de extraterrestres inevitavelmente evoca, se não o Grande Antigo, então Seus emissários ou servos. Eles algumas vezes mascaram-se, como Machen’s Jervase Craddock, em formas humanas deficientes. Foi de uma tal procedência que eu adquiri um jogo de ‘manequins’ mágicos os quais inegavelmente facilitavam o contato com O Grande Antigo.

As relíquias descritas acima são artefatos mágicos de poder oculto. Alguns deles, como o retrato de Lam, são mais do que isto por eles serem também Portais para outras dimensões, outros mundos ou aethyrs. Algumas vezes são formados cultos ao redor deles como Culto de Lam com o qual os leitores desta trilogia estão familiarizados. Poderosas máquinas podem manifestar-se em todos os objetos aparentemente inocentes. Em um moderno grimoire o qual faz associações com números da sorte, jogo, sistemas esotéricos de corrida de cavalos, e o mais profundo aspecto da feitiçaria, o autor faz referências às caixas de madeira pintadas as quais ele chama de Atua. Ornados sobre elas em cores apropriadas estão os sigilos e selos dos loa ou espíritos aos quais eles foram consagrados. Eu tenho em minha posse muitos de tais domicílios de espíritos. O grimoire diz que “nos Templos de Lucky Hoodoo e nas casas daqueles mais favorecidos pelos espíritos são encontradas as caixas de espíritos pintadas”.

Uma das minhas foi pintada por Zos vel Thanatos16 de quem o toque mágico era o bastante para consagrar uma caixa à quase qualquer espírito que você pudesse nomear. As outras foram embelezadas por Soror Ilyarun de quem os desenhos mágicos e pinturas são tão bem conhecidas quanto de Spare. O incidente aqui relatado concerne a uma das caixas pintadas por Ilyarun.

No período em questão a caixa continha quatro pequenas figuras de madeira dedicadas a um serviçal elemental do Grande Antigo – uma ao Fogo, uma a Água, as outras duas ao Ar e a Terra respectivamente. Os manequins eram nutridos periodicamente pela visão sagrada mencionada no grimoire, e sendo regularmente recarregadas elas estavam mui altamente carregadas com mana mágico, e excessivamente ativas no nível astral. Elas dormiam em seus atua como o morto mumificado dormia em seu silencioso sarcófago embelezado ou não com hieróglifos apropriados.

Um dos manequins havia sido dedicado ao Duplo Espaço18 no Culto de Hastur, Senhor do Ar, ou, mais propriamente, Senhor dos Ventos Espaciais. O domicílio de Hastur é o profundo Espaço Exterior o qual é representado na esfera mundana pelo elemento ar, e, quando próximo a terra, como um vento rápido. Uma noite, durante o terceiro ano de atividades esotéricas da Loja Nova Ísis, este manequim – o qual havia desaparecido por muitas semanas – reapareceu de uma maneira inesperada.

Os membros da Loja estavam performando um ritual de Lua Cheia o qual envolvia a utilização de chandrakalas. Eles haviam obtido sucesso na evocação e estavam manifestando ao ritmo e vibração de vários instrumentos de madeira de sopro, principalmente flautas. A Deusa nesta ocasião era representada por uma Grã Sacerdotisa Asiática chamada Lî que era quase que totalmente ignorante do Inglês embora seu corpo correspondesse perfeitamente à linguagem das flautas. Ela era lânguida, tinha olhos-de-lótus, e de cor de marfim cintilado de âmbar.

Uma de suas duas assistentes no ritual era Clanda que o nome será familiar aos leitores que se lembram do episódio da ‘Water-Witch’. Sua afinidade oculta com a água fez Clanda uma escolha desafortunada, à medida que a noite avançava isto seria provado. Ela perdeu a consciência no clímax do ritual, caiu contra a plataforma de metal entalhado sobre a qual Lî estava sentada, e bateu sua cabeça contra os alto-relevos, monstros fantásticos das profundezas mais apropriados ao Culto de Cthullu do que de Hastur. Porém, estas considerações não fazem parte do assunto e não tem referência sobre os eventos os quais são puramente procedimentos de rotina – até Clanda golpear a plataforma. Uma gota de sangue de seu lóbulo da orelha – lacerado pela cauda saliente do monstro marinho – conduziu ao encontro de meu manequim perdido o qual havia evidentemente caído de sua atua e rolado para trás da plataforma. Eu estava a ponto de recuperá-lo quando Lî retornou de um estado de imobilidade de quase-desmaio. Ela implorou-me para não recolocar o manequim em sua caixa. Ela não sabia Inglês, como eu disse, mas seus gestos eram repletos de imperiosos comandos. Eu instintivamente obedeci.

Por esse momento a lua havia perdido sua plenitude e o objeto do ritual, que requereu o enfrascamento de kalas, havia sido cumprido. Lî aproximou-se do altar e removeu a caixa tomando cuidado para não abrir a tampa. Eu não pude entender a razão para suas manobras mas consenti a elas porque ela havia estado, até recentemente, em um poderoso humor oracular e exibido completa e perfeitamente a fase final do rito lunar. Mas não até Clanda ‘voltar’ que eu soube que algo estava seriamente errado, e que uma inegável força poderosa estava crescendo no templo da loja.

Após muitos dos celebrantes terem deixado as premissas, e eu ainda podia ouvir, fracamente, algumas trocas de despedidas subindo do térreo dois andares abaixo, preparei-me para uma possível manifestação de ‘nervos’ pós-ritual a qual eu tinha esperado acontecer através das sacerdotisas exaustas. O que realmente ocorreu envolveu um ataque furioso tão concentrado em sua fúria que, se houvesse corrido seu curso desenfreado, poderia indubitavelmente ter derrubado o edifício e, possivelmente, a vizinhança inteira por milhas ao redor. Ele partiu daquele mais inócuo objeto – a caixa pintada.

Cinco de nós, ao todo, testemunharam a manifestação resultante. A caixa tombou neglicenciada sobre a plataforma onde Lî havia colocado-a. Ela havia sucumbido ao sono após seus esforços, e alguém que havia retornado desadvertido do andar de baixo totalmente despropositadamente deslizou a tampa para trás – e todo o inferno correu solto.

Primeiro uma leve brisa penetrou no templo. Ela subiu para uma corrente de ar forte e espalhou alguns documentos esparramados sobre uma mesa no canto da sala. Então sem qualquer aviso surgiu um vento incrivelmente forte e balançou as cortinas pesadas em seus anéis de metal e logo alcançou o impulso de um furacão. Tornou-se virtualmente impossível de respirar, e o pânico aterrador fundiu-se com a violente corrente de ar. A lanterna central, suspensa por uma pesada corrente sobre o altar ameaçou chocar-se contra o teto enquanto era levantada na tempestade. Olhando por uma minúscula janela no alto da parede norte eu notei que nem uma única folha balançava no jardim exterior; a noite estava totalmente calma. Na parte de dentro, o vento batia sugando para dentro de seu vórtice todos os objetos que se encontravam em seu caminho. Clanda, histérica, foi literalmente soprada para a plataforma. Ela teve a presença mental, entretanto, para agarrar a caixa, retornar aos seus confins o manequim mágico, e forçar a tampa de volta. Somente a vontade demoníaca da mulher, protegida sem dúvida pelas energias evocadas pelo rito, habilitou-a para fechar a caixa. Imediatamente – quietude perfeita, e um silêncio que parecia terrivelmente artificial.

Julgando a partir do tom geral das cartas que eu recebi de ocultistas do mundo inteiro, eu imagino que eu devo ser informado que isto é tudo facilmente explicável. Desta forma eu quero advertir o imprudente (se houver algum!) que há uma seqüela para este incidente. Clanda, como foi registrado em outro lugar, morreu no mar, reivindicada talvez pelo Senhor das Profundezas. Alguns meses após o episódio aqui descrito, Lî caiu do ar quando um avião carregando ela chocou-se sobre a Ásia Central contra montanhas. Ela também foi reinvindicada pelos servos elementais?

Mas houve o seguinte incidente que fez com que os membros começassem a referirem-se a tais episódios com os ‘Anais da Loja Negra’. Este incidente também originou-se como um efeito colateral ou tantrum tangencial da rotina ritual.

Os membros da Loja Nova Ísis encontravam-se toda sétima Sexta-feira, e parte do preâmbulo consistia na troca de experiências nos vários campos da cultura mágica, mística e espiritual. Nós tinhamos como uma convidado de honra nesta esta ocasião particular um indivíduo realmente notável conhecido somente por alguns no mais reservado dos círculos ocultos. Ele era uma daquelas raras almas que havia devotado a maior parte de sua vida ao estudo da alquimia. Este homem havia me apresentado alguns anos antes a um Tantrika do Sul da Índia profundamente versado na arte do Srividya.

Um dos candidatos do Círculo Kaula de Aquimistas era a ‘Water-Witch’, Clanda. Seu glamour havia alcançado até mesmo ele, a uma tal extensão que seu juramento original de bramacharya, tomado na presença de seu guru muitos anos antes, pareceu estar em perigo. Ele pediu-me para agir como um ‘pára-raio’, para agüentar o ímpeto de possíveis curto-circuitos.

O edifício da Loja havia sido equipado com uma extensa rede de apartamentos que formavam a base de uma loja comercial deceptivelmente pequena em uma das ruas laterais à rua principal do Fim Oeste. O Alquimista, que era também o proprietário da loja comercial, era um iniciado do Gômaya Diksha que o havia feito elegível para sua iminente iniciação no círculo interno do Kaula Chakra, um avançado grau envolvendo a prática da lambika yoga.

Clanda, com sua personalidade hiper-sensual havia – através da participação em vários trabalhos mágicos – uma idéia bastante astuta das vantagens ocultas inerentes à tal iniciação. É desnecessário extender-se sobre este aspecto do episódio além de mencionar o fato de que o Alquimista sem dúvida representou uma garantia em uma de suas tramas.

A Loja foi preparada para a performance de um tipo de ritual de licantropia e necromancia associado com dois túneis específicos de Set. Imagine, portanto, uma miniatura em versão ainda mais complexa das cavernas de Dashwood com – em lieu de várias grutas preparadas para carícias sensuais – uma série celas em forma de concha, como vórtices petrificados, criados com o único propósito de atrair em suas convoluções as energias ocultas de Yuggoth, e de focalizá-las através dos kalas da Nova-Ísis, representados por um prisma gigante de forma vésica. A decoração foi misteriosa ao extremo, a iluminação astutamente arranjada para dar um jogo sinistro e mutável de luz e sombra combinada com sons sugestivos de água corrente e ventos astrais silvantes; uma atmosfera completamente misteriosa criada por alguns toques inteligentes de suprema arte. O lugar foi a epítome do crepúsculo e daqueles estados equívocos de consciência peculiar para o lobisomem, o vampiro e o espectro, de quem a sutil presença foi sugerida por vários dispositivos engenhosos. Nesta ilusória atmosfera Clanda parecia com um ser escamoso nadando em um mar árido de substâncias etéricas sanguinolentas pululando com as correntes insalubres de qliphot.

O Alquimista, reclinado sobre uma laje de pedra adornada com emblemas do Grande Antigo tinha assumido a ‘postura da morte’ e aguardou o beijo da Deusa, quem ele havia evocado pelo modo peculiar de sua ‘morte’; ele havia peticionado-A a aparecer para ele e conferir sobre ele em seu sono mágico os supremos siddhis.

Assim prosseguiu o ritual, e os vários participantes foram adequadamente preenchendo seus respectivos papéis. Mas as coisas não procederam tão calmamente. Clanda havia inconscientemente abrigado em sua aura os restos do contato com questionáveis entidades engendradas por sua associação passada com um Culto de Bruxas. A conecção havia sido novamente reativada e isto causou um súbito e violento conflito em sua psiquê. Eu senti o choque disto mas estava totalmente despreparado para a erupção de energia negra que acompanhou o seu despertar.

Emergindo do transe no qual o ritual havia lançado ela, Clanda gritou, correndo em desvario pela Loja e agarrou um punhal que estava em uma parte do aposento em desuso então. Sua ação pode ter meramente resultado em uma disrupção temporária do ritual, mas a arma em questão aconteceu de ser a arma mágica utilizada por Aleister Crowley em sua invocação, anos antes, de Choronzon, quem Crowley uma vez descreveu como “o primeiro e mais mortal de todos os poderes do mal”. Desperto para o perigo da situação eu tentei agarrar a arma, percebendo enquanto eu assim procedia, que o Alquimista estava apertando o peito e contorcendo-se na laje como se ele sofresse a agonia de uma excruciante imolação. Clanda tropeçou e caiu a medida que o punhal – agora desembainhado – caiu sobre a laje. O Alquimista contou-me posteriormente que ele havia naquele momento visto uma forma encapuzada pairando sobre ele, próximo de injetar em seu coração o veneno que fluía de seus olhos em um jato de malva.

Esta foi minha primeira introdução às Necromancias em Malva que ocorreram persistentemente através da história da Loja Nova Ísis. Malva é uma das cores descritas para a ‘falsa’ sephira, Daath. Sua emanação como um kala, em um rito tendo sobretons de necrofilia, foi a prova significante para capacitar-me, em um período posterior, para penetrar a Gnose Lovecraftiana com referência especial aos Mistérios do “abominável Platô de Lêng”. Isto também deu-me insights na função mágica dos três maiores fantasmas noturnos: o lobisomem, que transforma os kalas do dia nos da noite; o vampiro, que bebe os kalas; e o espectro, que come a substância etérica destes kalas em sua forma de tornar-se carne, desta forma inibindo a completa revificação na luz do dia. Isto sugere o triunfo dos sonhos, ou irracionalidade, sobre a ‘razão’ ou estado de consciência desperta. Houve muitos anos, entretanto, antes que eu fosse capaz de desenvolver a partir destes insights a fórmula sistematizada de controle-onírico esquematizada em Nightside of Eden e sub-adicionar ao sistema de graus na O.T.O.. Pois escondida por detrás destas imagens demoníacas jaz uma suprema zona de poder de energia mágica. Crowley indicou-a em seus escritos; Lovecraft escondeu-se dela, atemorizado.

Como o morcego – o totem supremo desta corrente noturna – o sistema parece de cabeça para baixo para aqueles que não estão familiarizados com os modos da reversão protoplasmática peculiar a esses Mistérios, pois o Mago da Necromancia Malva é, em sua forma, como o sábio Hindu; o que é dia para o homem comum, é noite para o sábio, e vice-versa. É importante noter que na gama completa de kalas (ou cores) listados no Liber 777, malva em vários tons aparece apenas em conecção com os caminhos 17 e 28 da Árvore Sephirótica. O simbolismo destes caminhos esta por sua vez conectado com a letra Zain e com Aquário, respectivamente. Estes são glifos do aeon ou era atual (Aquárius), e do Aeon Sem Palavra ao qual referências já foram feitas. Note também 17 como 71 ao contrário, 71 sendo o número de LAM, o Caminho Silencioso ou Sem Palavra. 17 e 28 juntos perfazem 45, o número de ADM, ‘Homem’,38 de quem a perfeita manifestação é esperada ocorrer entre estes dois aeons. Mas há um significado anterior de ADM que significa o ‘homem vermelho’ e que aplica-se à fêmea, sendo idêntica com a corrente lunar manifestando-se como o kalas menstrual.

5 Uma reprodução dela aparece na p.54 de Aleister Crowley and the Hidden God.

6 Florence Farr, uma amiga de Bernard Shaw. Seu moto mágico na Golden Dawn era Sapientia Sapienti Dono Data.

7 O fato do livro de Lovecraft deste nome ser uma coleção de poemas sem referências diretas relacionadas as visões de Mira não é argumento contra uma sugestão assim. Poemas, como visões e antigos hieroglifos, tem sido interpretados por recurso para seu plano de origem, não em termos de sua final “terrificação”. Interpretadas nesta luz, as visões de Mira mostram sinais inequívocos de terem saltado de um período vastamente anterior para a vida da sacerdotisa Egípcia.

8 Ver Gate of Dreams, por Charles Beatty, Londres, 1972. A passagem relevante é citada em Cults of the Shadow, p.135.

9 O bastão é reproduzido em Outside the Circles of Time, gravura 12.

10 Capítulo 21.

11 Outside the Circles of Time, gravura 13.

12 Ele foi publicado primeiramente por Crowley em The blue Equinox (1919). Mais recentemente ele aparece no The Magical Revival e Outside the Circle of Times. Até mais recentemente, Robert Anton Wilson publicou o retrato de Lam em seu Masks of the Illuminati (1981). Ele aceitou como extraterrestre a proveniência de Lam mas também declarou que Crowley invocou a entidade pelas Chaves Enochianas. Não há, porém, concretização deste chamado em qualquer manuscritos ou diários sobreviventes de Crowley.

13 Em The Novel of the Black Seal.

14 Ver, em particular, Cults of the Shadow, cap.10, Outside the Circles of Time, cap.12, e a Revista Mezla, nº’s 12, 13.

15 Lucky Hoodoo – Uma curta viagem nos poderes secretos do vodu, por Dr. Bacalou Baca (Michael Bertiaux), publicado em Chicago por Absolute Science Institute, 1977.

16 O moto mágico de Austin Osman Spare.

17 Por volta de 1958.

18 Toda idéia projetada carregada magicamente pela mente na dimensão terrestre (estado acordado) tem um duplo no espaço que é refletido em infinitas dimensões.

19 Essência Lunar ou ‘medicinas’.

20 Ver Man, Myth & Magic, Nº65; Imagens &Oracles of Austin Osman Spare, por Kenneth Grant; Encyclopedia of Witchcraft & Demonology, por Hans Holzer; The Magical World of Aleister Crowley, por Francis King; The Runes, por Michael Howard.

21 Ver o artigo ‘Water – Witch’, Man, Myth & Magic, Nº65.

22 A ciência dos kalas; o equivalente oriental da alquimia.

23 Neste contexto, real abstinência sexual, mental e física.

24 Uma iniciação altamente secreta nos mistérios dos kalas lunares da metade escura. Ela possui certas afinidades com o XIº O.T.O. como

compreendido na Tradição Typhoniana.

25 Uma forma de yoga que envolve a imbibição de kalas.

26 Veja Nightside of Eden, pp204 – 206.

27 Aquela de Zos vel Thanatos (A.O.Spare), quem criou o fundo e outros equipamentos ritualísticos da Loja Nova-Ísis.

28 Ver Images & Oracles of Austin Osman Spare, and The Magical Revival, ch. 12.

29 Ele havia previamente performado um rito necrofilico e indentificado-se com o cadáver, interpretando este ato como moralmente compatível com seu voto de castidade!

30 Poderes Mágicos.

31 Este havia sido estabelecido por Gerald Gardner, um antigo membro da O.T.O.