sexta-feira, 2 de junho de 2023

Luciferianismo - Fora Do Espaço e Do Tempo

Uma legítima compreensão dos mistérios dos Vigias ou dos Caídos e, consequentemente, da paternidade de seus descendentes gigantes depende do entendimento de certas doutrinas profundamente secretas. Essas doutrinas enunciam uma metafísica de liminaridade que define todo o Absoluto como o Outro, estando situada além de nossos horizontes terrenos humanamente condicionados de percepção e atividade mental. As águas primárias, representadas pela letra hebraica Nun, alongando-se de forma desconhecida em direção à infinidade perto da “bolha” finitamente delimitada do mundo-ilha, oferecem tal paradigma. Ele sugere o abismo antigo do firmamento oculto como a origem e a fundação de todas as coisas, a origem não manifestada do manifestado, de onde toda a criação surge e sobre a qual ela repousa.

Outra metáfora é aquela das Terras Despovoadas, a antiga terra incógnita, ou “terra oculta”, cercando o Cosmos finito, um reino diferente da experiência normativa e totalmente contrária aos estados comuns de consciência. Elas são o domínio das bestas e dos espíritos, aquelas máscaras em forma de animais do Outro Lado do ser que são feições verdadeiramente não-humanas dos Antigos ou Deuses Antigos - os “Deuses de Fora”. No mundo da realidade visível, o uso de máscaras de animais em rituais tem sempre sido um método de conseguir contato com as formas atávicas de deus. Na tradição oculta e nas religiões antigas, os animais eram considerados como “as primeiras formas percebidas” da corrente primária de consciência que provêm de uma fonte extraterrena. Eles eram, na verdade, a forma primária das energias cósmicas ou “deuses”, suas formas de deus prosaicas e a suposição, mais tarde, de que o uso dessas formas pelo homem foi um meio mágico de contatar o fluxo de consciência que primeiro penetrou este planeta a partir de “fora”. (Grant, 1973:16- 17) Isso sobreviveu na representação simbólica dos deuses antigos egípcios, em forma humanóide, mas com as cabeças de seus respectivos totens animais sagrados.

As Terras Desoladas são o lugar desconhecido pelos humanos habitado por demônios, espíritos e o Deus Antigo. Elas também são o vácuo imprevisível dos “espaços externos”. Com isso, o ciclo anual de estações, conhecido como a Roda do Ano, encapsula uma execução repetida da re-emergência rítmica, o término e a renovação do mundo a partir daquele território incompreensível do Ser (o Primeiro Existente), a cúspide do Ano-Novo representa a re-absorção do Todo em Um. É o interstício liminar, ou vácuo vazio, que se abre além da temporalidade serial e as dimensões regionais no “tempo entre tempos”. Não é coincidência que no uso popular os Doze Dias (o período entre o solstício de invemo/Natal e Ano-Novo) são marcados por celebrações desordeiras e anárquicas representando “Senhores da Desordem”, transvestismo, doces ou travessuras, o uso de máscaras de animais e todas as formas de “ações abagunçadas”. Essa “Grande Sensação de Não Ser Nem Uma Coisa Nem Outra” significa a negação absoluta e total dos limites condicionais, convenções e definição aparente entre este mundo e o Outro. É a destruição das divisões ilusórias entre estados de entidade na suprema Teose13 e o Grande Mistério da magia antiga. Nessa divisa liminar, as fronteiras que usualmente separam vida e morte, passado e futuro, dentro e fora, humano e não-humano parecem ter desaparecido ou parecem que nunca tiveram uma realidade intrínseca. Há uma reversão ao estado original de não-dualidade do ser, a sublime fonte não manifestada de toda a manifestação. 

O Livro de Enoch conta-nos que, depois da Queda, o anjo Azazel foi enviado para habitar o deserto mais distante, o deserto de Dudael, além do “limite do mundo”. Esse é o exílio do excluído e do banido. E Azazel e seus companheiros demonios são concebidos como quem caracterizam a natureza da pura Diversidade, como “assombradores dos espaços extemos”. Isso é visto na oferta ritualística do bode expiatorio sacrificatorio para Azazel, que até o ano 70 d.C. era enviado na vastidão do deserto no Ano-Novo Judaico. As terras temíveis, quase literalmente as “terras erodidas e inférteis”, que se situam “do lado de fora”, desprovidas de presença humana, por comparação análoga são um exemplo perfeito do reino do deus com máscara de bode, o Comífero, o Grande Vigia peludo das Térras Desoladas, com sua comitiva endemoninhada de entidades hirsutas, semi-animais, semi-homens, conhecidas como seirim ou “peludos”.

Ligada a esse padrão metacósmico, encontra-se a antiga divisão da terra antiga do Egito - e por reflexo o Universo - em Kmt, a Terra Negra que é produtiva com as férteis lamas do Nilo e cultivada por humanos, e Deshret, a Terra Vermelha (Desher = vermelho), o deserto ao sul governado pelo Vermelho. Ele é o forasteiro ou estrangeiro divino Seth. Uma raça peluda de bode, conhecida como os serau, era sagrada para Seth e o ligava tanto com Azrael/Azazel quanto com o centro de adoração de bodes em Mendes. G. Hart menciona que Seth era acompanhado de bodes, sacrificados em Busiris, cujo sangue era derramado sobre a terra.

Seth, Set ou Sut significa quase literalmente “preto” e é, às vezes, chamado de “o negro” ou “o queimado”. Essa é uma referência críptica dupla ao Egito, como Khem ou Khemu - “a terra negra” - e a fertilidade abundante nas margens do Nilo que permitiu que a civilização florescesse no deserto inóspito. Foi a partir de historias medievais e propaganda cristã sobre o Egito Antigo como a terra de demonios e magos que recebemos nossos termos modernos “magia negra” e “bruxaria”. A palavra “Alquimia” (al khem ia) também vem do velho nome para o Egito porque as ciências da Química e da Metalurgia eram praticadas lá desde tempos antigos. Seth também é conhecido como “o negro” ou “o queimado” porque representa simbolicamente o calor queimante do sol do deserto.

Uma análise dos símbolos e mitos acerca de Seth revela certos atributos e conexões Luciferianas interessantes. Para começar, acredita-se que ele é a divindade masculina mais velha no panteão egípcio. Isso é representado em um comentário no Livro dos Morios egipcio, que declara: “Os poderes de Seth, que pereceu, eram maiores dos que os poderes de todos os outros deuses”. Seth era o filho da deusa primária Sept, “sete”, que era associada às sete estrelas da Ursa Maior, e dizem que nasceu na forma de um raio de luz. Sept é identificada com a deusa estrelar Nut ou Neith e aparece no livro Apocalipse como o dragão de sete cabeças. (Grant, 1973:226) O culto a Seth era realizado desde os períodos pré-dinásticos, e acredita-se que ele se desenvolveu na Africa. Os Sabeus, adoradores árabes dos deuses estrelares, supostamente o adulteraram. Por essa razão, Seth sempre foi considerado como o deus dos estrangeiros. Os sabeus adoravam a mãe dele, a Deusa das Sete Estrelas, e também seu filho Seth, considerado como a estrela-cachorro, Sírio ou Sothis. Tempos mais tarde, Seth tomou-se filho ou irmão de ísis, e ela adotou Sírio como seu símbolo estrelar. Também foi sugerido que Thoth originalmente era Sírio e idêntico a Seth. (Grant, 1975:45 e 1972:60)

Seth é produto de uma partenogênese e não tem pai; portanto, ele é simbolicamente o primeiro arquétipo de bastardo e outra forma de forasteiro ou banido social. O centro do culto a ele era originalmente em Nebet, ao lado do Nilo, ao norte de Luxor, e governava o Alto, ou do sul, Egito. Ele era conhecido como o Senhor do Deserto, o deus do trovão e o regente dos metais. Na verdade, o minério de ferro era ffeqüentemente conhecido como “os ossos de Seth” e Nebet era o começo de uma estrada de abastecimento que conduzia as antigas minas de ouro no deserto. Os símbolos e as formas zoomórficas do deus são elementos importantes para a compreensão da sua natureza e atributos. Por exemplo, ele era associado ao signo de Capricórnio e, na astrologia egípcia, tal signo era chamado de a Casa de Seth. Seus outros símbolos incluíam o pentagrama reverso, ou invertido, conhecido como a Estrela de Seth, o hexagrama, chamado de Selo de Salomão, a estrela de sete pontas, que era o símbolo da Grande Fraternidade Branca e a deusa Ishtar, e a Cruz Tau.14 Outros símbolos de Seth eram o pilar, ou menir, simbolizando o axis mundi ou o pilar do mundo, a cimitarra, ou “espada curvada”, e a segadeira. Um hieróglifo importante usado para representar Seth era a serpente com cabeça de leão, que simbolizava a união dos poderes lunares e solares. (Grant, 1973:12)

Seth ganhou uma imagem negativa, como o inimigo dos Deuses e humanos, mais tarde nos períodos dinásticos, e era considerado um oponente à dinastía solar de Osíris e seu filho Hórus. No entanto, seu culto recebeu um impulso, quando o Egito foi invadido pelos hicsos, chamados de “reis pastores”, por volta de 1670 a.C. Eles associaram Seth com o seu deus tempestade da fertilidade Baal. Nesse processo, Seth ganhou duas esposas, Anat e Astarte (As - tar - te), do mesmo panteão. Quando os hicsos foram derrotados, depois de quatrocentos anos de ocupação, todas as imagens de Seth foram destruídas, e era proibido escrever ou pronunciar seu nome. Os hicsos adoravam Seth sob o nome de Sutekh, mas originalmente, como um “viajante ñas térras desoladas”, ele era adorado principalmente por caçadores nômades. Foi alegado que os sacerdotes de Seth eram originalmente astrónomos, o que se adequaria ao papel antigo dele como deus chefe do culto estrelar e também os arquitetos das “montanhas dos deuses estrelares” ou pirâmides. Se esse era o caso, então Seth teve um papel mais importante na historia e mitologia do antigo Egito do que é sugerido por sua imagem posterior de uma personificação do mal.

Na mitologia egípcia, Seth é mais bem lembrado pelo seu papel na morte de Osíris. ísis e seu irmão/esposo Osíris sentavam no trono do Egito pré-dinástico como os primeiros faraós. Nesse papel, eles eram sábios governantes e modelos culturais. Antes do reinado deles, diziam que as pessoas do delta do Nilo eram como bárbaros selvagens viciados em canibalismo e práticas sexuais pervertidas. ísis e Osíris estabeleceram um código legal, construíram templos e apresentaram a forma correta de adoração aos Deuses. Osíris ensinou agricultura aos seus súditos e como fazer ferramentas para cultivar a terra para plantações. Ele também os ensinou a plantar vinhas para produzir vinho e plantar cevada para produzir cerveja. Aset ou ísis instruiu as mulheres egípcias nas artes de fiar linho, tecer tecidos e moer cereais. Ela também era uma especialista nas artes medicinais e passou seus conhecimentos para suas servas e sacerdotisas dos templos construidos pelo marido déla.

Por causa das ações civilizatórias, o povo egípcio amava seus governantes benevolentes e eventualmente eles foram deificados e adorados como seres divinos. O rival e irmão gêmeo de Osíris, Seth, no entanto, tinha inveja do sucesso deles e tramou para destronar o casal e tomar o trono. Em grego, Seth era conhecido como Typhon, que significa “orgulho”. Ele supostamente conspirou com a Rainha da Etiopia e outras pessoas de dentro da corte para destruir Osíris. O deus negro secretamente mediu seu irmão e fez um esquife ricamente decorado que comportaría o rei perfeitamente. Quando Osíris retomou de uma viagem ao exterior, Seth organizou uma festa em sua homenagem. No banquete, ele disse que daria o esquife decorado de jóias para a pessoa que se encaixasse perfeitamente nele. Todos tentaram sem sucesso, até que Osíris se voluntariou e entrou no esquife. Imediatamente Seth e seus comparsas fecharam com força a tampa e a selaram com chumbo derretido. Depois jogaram o esquife no Nilo e Seth se tomou o novo governante do Egito.

isis ficou obviamente devastada quando ouviu as notícias sobre o assassinato brutal do marido. Ela sabia que, se o corpo dele não fosse encontrado e enterrado com os ritos funerais adequados, seu espírito preso à terra não entraria no mundo subterrâneo. Em vez disso, seu espírito iria vagar pelo mundo mortal, como um espírito mundano. ísis então partiu na busca do corpo de Osíris. Ela eventualmente encontrou o esquife na cidade fenicia de Tiro, onde ele tinha sido levado pelas águas e se alojado em uma tamargueira. A árvore tinha sido derrubada e constituía um dos pilares do palácio da rainha Astarte. ísis tomou-se uma serva no palácio e eventualmente resgatou o esquive e o corpo do seu marido.

De volta ao Egito, ela colocou o corpo em um lugar seguro, mas Seth estava caçando um dia e o encontrou. Em sua furia, ele desmembrou o cadáver do faraó morto e o espalhou em 13 pedaços pelo Egito. Em tempos antigos, isso era um ritual reconhecido quando um rei divino era sacrificado. ísis viajou longe para achar cada parte do corpo e, em cada lugar que ela enterrava uma parte, construía um santuário. A décima terceira parte - o órgão reprodutor, conhecido popularmente como o Talismã de Seth-, nunca foi encontrada, por ter sido engolida por um peixe. ísis fez uma réplica em ouro dele e enterrou essa representação do órgão sexual do marido em 

Mendes. Seth é por vezes associado com o deus anão coxo e corcunda Hoor-paar-kraat e é descrito como “o órgão genital de Osíris”.

Hórus, o filho de Osíris e ísis com cabeça de abutre ou falcão, buscou vingança pela morte de seu pai. Ele e Seth lutaram pelo controle das Duas Terras do Egito. Em algumas versões, Hórus governava o Baixo Egito (o norte fértil) e Seth governava o Alto Egito (as regiões desertas ao sul). Seth foi finalmente derrotado e simbolicamente sofreu uma “queda” abaixo do horizonte (simbolizada pela cruz Tau), onde ele se tomou o Senhor das Terras Escondidas. De certa forma, ao matar Osíris, Seth fez com que o deus solar tomasse seu lugar como o deus negro do mundo subterrâneo.

Depois da “queda” de Seth, ele ficou associado ao inverno, à escuridão e à morte. Na verdade, o mito inteiro envolvendo Osíris, Seth e Hórus é uma história de luta entre a religião patriarcal solar e o antigo culto estrelar centrado na deusa. Sendo que a primeira tomou o lugar da segunda. E um clássico exemplo de como os deuses da religião antiga são degenerados e transformados em demônios da nova religião. O primeiro deus único de Horizonte Duplo foi dividido em dois, e Seth se tomou o duplo divino ou o gêmeo negro, o segundo em importância, de Osíris- Hórus. Seth tomou-se o Senhor do Ocidente (o sol poente ou morrendo), e Hóms era o Senhor do Oriente (o sol nascente ou renascido). Seth ou Sírio era conhecido como “a Luz na Escuridão” e, em alguns dos mais iluminados períodos da história egípcia, ele e Hórus eram adorados ao mesmo tempo. Eles eram unidos como Sut-har e representavam o primeiro deus do Horizonte Duplo como uma entidade. Dizem também que, nos ritos dos mistérios egípcios, o candidato era levado para dentro de um santuário interior, e um sacerdote sussurrava em seu ouvido a aterradora revelação de que “Osíris é um deus negro”.

Referindo-se à “queda” simbólica de Seth, Albert Churchward, em seu livro Origin andEvolution of Religión15 (1924), diz: “Seth era considerado um líder caído das multidões angelicais porque ele tinha sido o primeiro na glória e no poder governante...” Churchward, além disso, identificou Seth com o Anjo Pavão adorado pelos Yazidis. Ele lembra o fato de que os Yazidis acreditavam que “existe uma restauração, assim como uma queda”, e o Rei Anjo será restaurado ao seu lugar de direito no Céu.

Seth também era conhecido como o “filho (ou sol) atrás do sol”, “o sol negro” e o “sol da meia-noite”. Isso se relaciona com o simbolismo do deserto, onde tanto ele quanto Azazel habitaram. Na Cabala, é a “imensidão do tempo e do espaço que divide a sefirah Tiphareth (o centro solar) na árvore da vida da sefirah mais alta Kether”. (Grant, 1973:47) Tiphareth é a esfera da influência associada ao rei divino sacrificado, ou “filho de Deus”, tal como Osíris, Jesus, etc. Kether é o local do Absoluto ou Deus Oculto além do Abismo. O ocultista do caminho esquerdo e chefe da Tifoniana O.T.0.16 Kenneth Grant descreveu a extremidade do abismo como “o Deserto Vermelho de Seth; a mesmíssima extremidade na direção da qual os Grandes Antigos têm guiado o espírito humano durante éons de tempo, na verdade, na direção da qual todos os sistemas verdadeiros de conhecimento oculto, místico, espiritual e mágico preparam para guiar seus aspirantes”. (1992:131)

A forma zoomórfica tomada por Seth sempre intrigou os egiptólogos. Ele foi descrito como “uma besta estranhamente composta (...) ele tinha uma longa cauda aforquilhada posicionada rigidamente para cima, sua face tinha um focinho ou nariz curvado e estendido, e suas orelhas para cima, mas com pontas agudamente achatadas”. (Barratt, 1992:127) A primeira vista, ele não parece lembrar nenhum animal conhecido. Alguns analistas o viram como um burro, mas Grant diz que é um feneço ou raposa do deserto. Em hebraico, é a Shugal, a Uivadora do Deserto. Um outro animal relacionado a Seth é o camelo, como “o navio do deserto”. Na cultura árabe, esse animal é símbolo da genitália feminina. Dizem que, quando o anjo negro Samael “desceu [à Terra] com seus bandos”, buscou uma companheira como ele. Infelizmente ela tinha a aparência de um camelo. Expressivamente, o camelo também significa morte ou, mais propriamente, transmutação e, na demonologia Judaica, Samael é o anjo da morte.

A letra hebraica “Gimel” significa “camelo” e é atribuída ao décimo terceiro caminho ligando a sefirah na Árvore da Vida. Na realidade, ele marca o ponto de travessia para o Daath, ou Véu do Abismo, que leva a Kether, o Grande Não Manifesto em que o humano simples é transformado em Adam Kadmon, o Homem Celestial. Gimel é esotéricamente ligada a Aleph e Beth. No Taró, essas letras são associadas respectivamente com O Louco e O Mago. Para o não iniciado, essas duas cartas parecem ser opostas, mas o iniciado identifica as duas apenas como aspectos do mesmo estado de ser. Ao “atravessar o abismo”, o explorador é transformado de urna simbólica criança inocente em um “tolo sábio”. Ele ou ela é alguém cujos “olhos foram abertos”, e eles se tomam um mago no sentido verdadeiro desse termo extremamente mal usado. Um dos símbolos menos conhecidos de Seth é a cruz com braços iguais em um círculo ou Marca de Seth ou a Marca de Caim. Ela representa “a travessia mostrada pelo pólo ou axis setentrional, ou seja, a morte, a Passagem do Abismo”. (Grant, 1977:211)

Grant simbolicamente associou o Deserto de Seth com o deserto Gobi, na Ásia, mas sem se aprofundar no assunto (1999:41). De fato, o Gobi é supostamente o local ou entrada neste mundo para a cidade lendária e mítica de Shambhala. O também conhecido como Vale dos Imortais supostamente é uma região verdejante escondida no deserto ou no interior das montanhas cobertas de neve do Himalaia. No famoso romance e filme pré-guerra de Hollywood Horizonte Perdido, ele era chamado de Xangrilá, e esse nome veio a significar qualquer utopia ou paraíso terreno escondido do observador extemo. Shambhala é um dos muitos mitos relacionados a cidades ou terras misteriosas que estão normalmente ocultas da visão humana ou que agora estão desaparecidas embaixo das areias cambiantes de desertos ou nas profundezas do mar. Em muitos mitos, esses lugares sobrenaturais eram habitados por bruxos e feiticeiros que desafiavam os deuses e foram destruídos pela sua imprudência.

Shambhala é incomum nesse sentido, já que ela nunca foi destruída e ainda existe. Há muitos relatos de viajantes que encontraram por acaso a cidade que às vezes parece existir no plano físico e outras vezes, no Outro Mundo; por essa razão, um dos seus nomes é “Oásis de Luz”. Ela foi chamada de “o reino secreto dos sábios” e, na tradição oriental, é o lar de um grupo de elite de mahatmas, “grandes almas”, ou Bodhisattvas.

Esses adeptos são alegadamente humanos avançados com poderes sobre-humanos e sobrenaturais que completaram seu ciclo de evolução neste planeta. No entanto, eles preferiram reencarnar em “capas de pele” para auxiliar no progresso espiritual da raça humana. Eles são guiados por um misterioso ser imortal, possivelmente não-humano, chamado o Rei ou Senhor do Mundo, e estão também associados às Nagas, ou “pessoas serpentes”. As Nagas são supostamente uma raça espiritual avançada, possivelmente das estrelas, que se casou com a raça diferente dos humanos no passado antigo, na maioria das vezes com reis e rainhas. (Tomas, 1977:62)

O antigo livro persa Shahnameh, ou Livro dos Reis, descreve como Yima, o filho do Mestre do Mundo, viveu em uma fortaleza ou cidade subterrânea com seu povo, que eram descritos como Arianos ou “de sangue puro”. O deus Abura deu a Yima uma visão de uma grande enchente futura que destruiría a humanidade. Em uma cópia ou, para dizer melhor, em um primeiro modelo da história bíblica de Noé e a arca, Yima foi instruído a recolher um espécime de cada planta, peixe, animal e ave, mais mil casais humanos. Ele deveria levá-los para sua cidade subterrânea para que a Terra pudesse ser repovoada depois do dilúvio.

Na tradição esotérica ocidental, Shambhala é também associada à “pedra negra”, supostamente de origem extraterrena, e a uma torre, que é seu local de repouso terreno. Dizem que essa pedra pertenceu temporariamente ao Rei Salomão. Na década de 1920, o explorador, artista e ocultista russo Nicholas Roeoh levou um fragmento dessa pedra para Nova York, em uma missão política, para ajudar na fundação da fadada ao fracasso Liga das Nações. De acordo com uma fonte oriental, quando a pedra está em seu lugar de direito dentro da cidade escondida, dizem que, “como um diamante, ela irradia a luz na Torre do Senhor de Shambhala”.

Kenneth Grant também associa Seth à serpente de fogo ou força da serpente (kundalini) levantada pelos ocultistas durante os ritos de magia sexual. Então o calor do deserto representado pelo deus pode também ser entendido como o calor da sexualidade. Grant alega que “a corrente mágica iniciática é manifestada no Egito como o culto Draconiano, o culto do Dragão ou Serpente de Fogo. Esse culto representa a primeira forma sistemática dos primeiros mistérios africanos, que os egípcios aprimoraram em um poderoso sistema adaptado de ocultismo, que finalmente amadureceu nos tantras da índia, Mongólia, Tibete e ChincF (1975:50).

Isso se conecta à chamada “perda da inocência (sexual)” pelos primeiros humanos, que está presente no mito do Jardim do Éden. Conforme se alega, o conhecimento proibido usado pelo culto Draconiano era baseado na relação sexual com espíritos com características vampirescas, de súcubos ou íncubos. Tais técnicas mágicas fazem-nos lembrar as primeiras relações sexuais entre os Vigias ou anjos educadores e suas estudantes humanas. Não é de se estranhar que as religiões sistematizadas sempre condenaram o relacionamento com “demônios” do “lado de fora”, e a tradição folclórica popular desaprovava os supostos “casamentos de fadas, que levavam os participantes humanos a ganhar conhecimento oculto e poderes psíquicos. Talvez não seja coincidência o que diz a tradição rústica, ou seja, que as fadas, elfos e duendes são as almas dos anjos caídos que caíram na Terra.

No Egito, acreditava-se que todas as terras estrangeiras estavam sob o domínio de Seth como o deus dos estrangeiros. O que está implícito aqui é o que é diferente ou estranho no sentido verdadeiro da palavra latina alienus, que significa forasteiro ou estrangeiro. Essa idéia está mais bem resumida na frase de um conto de Edgar Alian Poe como a “selvagem, estranha região que se encontra de forma sublime, fora de espaço e fora de tempo”. Há o título iniciático gnóstico de Alógeno - estrangeiro ou nascido no exterior-, que indica que o adepto finalmente ultrapassou as fronteiras do Universo profano. Eles são agora um estrangeiro ou forasteiro que se libertou dos sistemas normativos de valores terrenos e realidades convencionais. Eles alcançaram o estado dos Psykhikoi, que confere a compreensão da essência do verdadeiro eu “fora” de todas as coisas, estados e condições concebíveis. Ele ou ela se tomou um “viajante nas terras desoladas” ou no deserto, como Seth, Azazel, Caim e Jesus. Infelizmente, aquele que é espiritualmente liberto é freqüentemente visto como um “estranho em sua própria terra” ou um excluído social pela xenofobia primitiva da sociedade humana. Tristemente, isso em geral condena à fogueira, à forca ou à cruz aquela pessoa banida, que é diferente dos seus pares.


quinta-feira, 1 de junho de 2023

Luciferianismo - O Senhor Da Estrela Da Manha

Na Biblia, existe apenas uma referência explícita ao arcanjo e ser celestial conhecido popularmente como Lúcifer. Em Isaías 14:12, o profeta diz: “Como caíste do céu, ó Lúcifer, filho da manha Essa frase tem sido vista por alguns estudiosos bíblicos como uma referência a um rei da Babilonia e sua queda do poder. Hoje o nome Lúcifer se tomou intercambiável com o demonio cristão Satã, mas uma análise cuidadosa desse ser divino sugere que ele tem pouco ou nada a ver com esse conceito dualístico de mal cósmico. Como Aleister Crowley disse: “Essa serpente, Satã, não é o inimigo do Homem, mas Ele que fez Deuses de nossa raça, conhecendo o Bem e o Mal; Ele ordenou ‘Conhece a Ti Mesmo! ’ e ensinou a Iniciação” (Magick in Theory and Practice).

Uma visão alternativa de Lúcifer também pode ser encontrada em Aradia: o Evangelho das Bruxas, compilado pelo folclorista americano na década de 1890. Uma bruxa toscana chamada Maddalena supostamente forneceu o material desse livro para Leland e alegou seguir tradição familiar hereditária no norte da Itália. Essa tradição de magia parece ter sido uma combinação rica do paganismo etrusco e romano ainda existente e de magia popular revestida com um toque de Cristianismo e elementos gnósticos. Essa tradição é única se a compararmos com a Wicca moderna em seu ponto de vista anticristão, com Cristo e a Virgem Maria sendo rejeitados como “falsos deuses”. No Evangelho, a bruxa é enaltecida a dizer aos membros do clero que “Seu Deus, o Pai e Maria são três demonios (..) porque o verdadeiro Deus, o Pai, não é o seu”.

No primeiro capítulo do livro, é contada a historia de como a deusa clássica romana da Lua e da caça Diana engravidou e deu à luz uma filha chamada de Aradia ou Herodias. É assim contado: “Diana amava muito o seu irmão Lúcifer, o deus do Sol e da Lua, o deus da luz (esplendor), que era vaidoso por sua beleza, e que pela sua vaidade foi expulso do Paraíso. Diana teve com seu irmão uma filha, a quem eles deram o nome de Aradia (ou também Herodias)”. A missão de Aradia era encamar na terra e ensinar aos camponeses oprimidos pelo sistema feudal as artes mágicas, para que eles pudessem combater os nobres corruptos e os padres maldosos. Nas palavras de Diana para sua filha: “É verdade que você é sem dúvida um espírito, mas você nasceu para se tomar uma mortal novamente. Você deve ir à Terra abaixo e ser uma professora para mulheres e homens que têm anseio de estudar bruxaria em sua escola.’’’

Diana diz a Aradia que ela nunca será como a “filha de Caim” ou os Judeus e ciganos que vagam pela Terra. Curiosamente, o Evangelho também possui uma conjuração de Caim, que dizem estar preso na Lua. Na tradição esotérica, a Lua é observada às vezes como o lugar aonde os espíritos dos mortos vão, como uma escala para o mundo espiritual. Caim é descendente de Vigias e aqui ele é intimamente associado tanto a Lúcifer quanto a uma deusa da Lua pagã em um mito que é uma variação da história dos anjos caídos.

O Evangelho também inclui um mito de criação, envolvendo Diana e Lúcifer, que possui alguns aspectos gnósticos impressionantes e elementos sobre Vigias. Ele afirma que Diana foi criada antes de toda a criação e “nela estavam todas as coisas”. A partir dela mesmo, as trevas iniciais, ela se dividiu em luz e trevas.

Lúcifer, descrito como seu irmão, filho e outro eu, era a luz. Quando Diana viu a luz, esta era tão bonita que Diana imediatamente se apaixonou por ela. A deusa queria receber a luz de volta dentro dela e tremulava de desejo. Esse desejo foi a aurora. Infelizmente, Lúcifer, como um rato diante de um gato, fugiu dela.

De acordo com o Evangelho, Diana foi consultar “os pais e as mães do Começo”. Eles são descritos como “os espíritos que existiam antes do primeiro espírito”, soando como versões dos Deuses Antigos. Eles disseram a ela que, para conquistar o coração de Lúcifer, ela deveria descer à Terra e se tomar uma mulher mortal. O Evangelho prossegue dizendo que, depois que a Terra foi criada e Lúcifer caiu do Céu, Diana encarnou em forma humana. Ela ensinou magia e feitiçaria “às crianças da Terra”. Dos ensinamentos dela, surgiram todas as bruxas e também as fadas e os duendes.

Naquela época, Lúcifer tinha um gato de estimação que ele amava sobre todas as outras criaturas e dormia com ele em sua cama todas as noites. Diana mudou sua forma para a forma do gato e engatinhou para a cama de Lúcifer. Uma vez na cama, ela voltou para forma humana e fez amor com ele. Quando Lúcifer acordou de manhã, ele percebeu o que tinha acontecido e que a luz tinha sido conquistada pelas trevas. Ele ficou muito bravo, mas a deusa o acalmou com um feitiço poderoso chamado Canção da Noite. Ela cantarolou a canção com os lábios fechados, parecendo um zunido de abelhas, um peão ou uma roda de fiar. E Diana esticou todas as vidas dos homens em sua roda de fiar (A Roda da Fortuna no Taró), e era o encantado e fascinado Lúcifer que rodava a alça.

Uma versão levemente diferente da descrita é dada pelo mago hermético do século XVI Giordano Bruno, que foi martirizado pelas suas crenças pagãs pela Inquisição em 1600. Ele disse: “Vão épossível ver o Sol, o universal Apollo, luz pura, em sua melhor e mais alta forma. E possível, no entanto, ver a sombra dele, a Diana dele, o mundo, o Universo, a natureza, que está dentro das coisas [o anima mundi ou ‘espírito do mundo’], que é a luz dentro das trevas da matéria, brilhando nas trevas.” (citado em Couliano, 1987:75-76)

Poucos Wiccanos modernos que leram o livro de Leland indagaram sobre por que as bruxas italianas do século XIX deviam aceitar Lúcifer - identificado como o Satã na demonologia Cristã - como o companheiro da deusa bruxa Diana e o pai de Aradia. Na verdade, Aradia foi um dos nomes da deusa usado originalmente na Wicca Gardneriana. Uma resposta possível é que neo-pagãos e Wiccanos modernos são extremamente paranóicos sobre qualquer coisa que possa arruinar a imagem pública de “luz branca” deles, por associar suas tradições com algo popularmente percebido como “Satânico” ou de “adoração demoníaca”. Ainda, em alguns círculos tradicionais de magia, Lúcifer é venerado com o salvador e redentor da raça humana.

A tradição Luciferiana tem pouco em comum com a heresia cristã do Satanismo, especialmente em suas manifestações juvenis, em nossa sociedade moderna. Na mitologia hebraica, um satã era um anjo tentador menor enviado por Javé para testar a fé das “pessoas escolhidas”. No Livro dejó, Satã é descrito como um dos “filhos de Deus” (anjos), e ele aparece diante do trono de Deus com todos os outros. Javé envia Satã para a Terra para testar Jó e ver se ele iria amaldiçoar seu Deus (2:3-6). No Novo Testamento, Satã aparece para tentar e testar Jesus durante sua provação iniciática no deserto. Considerando a verdadeira identidade do Cristo, Satã e Lúcifer são necessariamente duas entidades diferentes.

Foi somente com o estabelecimento político da Igreja em seus primórdios e sua demonização dos antigos deuses pagãos que Satã é confundido com o mito do anjo caído. Esse mito tomou como bases as ideias dualísticas do Zoroastrismo e a heresia Maniqueísta sobre a luta entre as forças da luz e os poderes das trevas. Ele criou uma personificação satânica de mal cósmico que, às vezes, na Idade Média parecia mais poderosa que o próprio Deus. Lúcifer não é uma figura satânica que conduz a humanidade para a tentação e o mal. Ele é o “guardião do Tempo e da Eternidade” e “o anjo de Deus (que) se rebelou contra a ordem cósmica estática e estabelecida e colocou em movimento as forças da mudança e evolução que também implicam morte e destruição.” (Flowers, 1990:43-44) Madame Blavatsky o descreveu como “a entidade angelical regendo sobre a luz da Verdade como se fosse sobre o dia de luz”. Ela ainda diz: “Lúcifer, ou Portador da Luz, está em nós; é a nossa mente, nosso tentador e redentor, nossa inteligência e salvador do animalismopuro” (1893, Volume II: 539-540). Ele é o primogênito da criação, o Logos Solar, a energia fálica do Sol que vitaliza e sustenta a Terra.

É possível que Lúcifer possa ter surgido em Canaã como Shahar, o deus da Estrela da Manhã. Ele tinha um gêmeo chamado Shalim, que também era Vênus, mas como a Estrela Vespertina. Esses gêmeos divinos representavam a luz solar na aurora e no crepúsculo e seu ciclo de (aparente) morte e renascimento a cada dia. Eles eram os filhos da Grande Deusa Mãe, Asherah, e há evidência arqueológica de que sua adoração foi adotada pelos hebreus. O Velho Testamento tem diversas referências à adoração da deusa como a Rainha do Céu em santuarios construidos em colinas e em bosques sagrados. Sugeriu-se que ela foi por um período considerável a consorte de Javé, embora a ortodoxia se esforce em dizer que, após Moisés e o incidente com o Bezerro de Ouro, os Israelitas tomaram-se monoteístas fervorosos.

No mito canaanita, Shahar, o Senhor da Estrela da Manhã, foi lançado do Céu na forma de um raio, que fertilizou a Mãe Terra. Ele foi associado ao deus da tempestade assírio-babilônico Zu, que foi punido por ter roubado as Tábuas do Destino. Estas foram dadas pela Grande Deusa Mãe Tiamat para seu primogénito, o pai dos Deuses. Zu planejava usar os oráculos divinos para dominar os espíritos ou deuses do Céu. A própria Tiamat era conhecida como a “rainha dragão”. Ela foi gerada nas profundidades do oceano e deu origem a uma raça de homens-serpentes. Serpentes sempre foram associadas a Lúcifer e aos anjos caídos.

Como o arauto do amanhecer, Lúcifer pode ter sido o filho/amante da deusa do amanhecer Aurora, que era conhecida por muitos nomes nas culturas indo-européias. Ela foi a filha do acasalamento de um Titã e a Mãe Terra. Os gregos representavam o arauto do amanhecer como um jovem radiante cruzando o céu da manhã em um cavalo branco. Seu gêmeo das trevas, Vênus como a Estrela Vespertina, anunciava a “morte” do sol no crepúsculo. Entre eles, existe o mistério eterno do balanço cósmico entre luz e escuridão que se encontra no centro da criação.

O mito do Velho Testamento do Jardim do Éden e de como a primeira mulher e mãe da humanidade foi supostamente seduzida pela serpente perversa foi também usado pelos padres da Igreja em seus primordios para desonrar Lúcifer e taxá-lo como Satã. Durante a caça às bruxas na Europa, teólogos tentaram dar explicações sobre o número de mulheres acusadas dizendo que, “como o Diabo, já que ele primeiro tentou Eva, era propenso a oferecer seus Engodos a tais paladares, pois elas são mais desejosas em experimentar Frutos proibidos; e mais negligentes em Questionar a Natureza daquilo que elas Engolem”

(Richard Bovet 1684). A doutrina Católica medieval também acusava as mulheres, especialmente aquelas que eram acusadas de bruxaria, de terem relações com íncubos ou demonios masculinos. Isso novamente se associa à lenda dos Vigias e sobrevive hoje no folclore como os “casamentos de fadas” entre humanos de ambos os sexos e o Povo Bom.

Embora a serpente no mito edênico geralmente fosse identificada com Satã e lembrada como uma criatura maligna, em muitas sociedades não-cristãs, ou que existiram antes do Cristianismo, a serpente não era vista sob esse ponto de vista. Como veremos mais tarde neste livro, quando examinarmos o mito do Jardim do Éden mais detalhadamente, os gnósticos consideravam a serpente como a encarnação do conhecimento, da sabedoria e do esclarecimento. Ao contrário de ser uma criatura maligna, ela era vista como uma libertadora que “abriu os olhos” de Adão e Eva para a realidade do Universo e de suas maravilhas.

A serpente é um símbolo antigo para o poder fálico solar, que é associado a Lúcifer. Quando Adão e Eva perceberam que estavam nus e correram para cobrir seus genitais, eles se tomaram conscientes do “poder da serpente”, que pode ser criado pela relação sexual e outros atos sexuais não reprodutivos. Se for controlada por um mago experiente, a serpente ou a força sexual pode ser usada para fins mágicos e como um auxílio para alcançar a gnose ou o autoconhecimento. Esse foi também o começo do ciclo de nascimento, vida, morte e renascimento, pois “com a procriação a morte veio, mas claro que sem morte não há mudanças nem evolução. Então a abertura do portão da morte, o ato de ‘afundar na matéria ’, era um passo necessário para ligar o homem ao fluxo por meio do qual o Paraíso pode ser recuperado. Mas dessa vez a humanidade vai fazer isso de forma consciente e de própria vontade, ganhando então vida e sabedoria eternas. Dessa forma, o homem, verdadeiramente, tornar-se-á seupróprio deus”. (Flowers, 1990:56)

O mito do Éden, Eva e a serpente é também o mito da Queda humana, que é o fim da “Era de Ouro” inicial de harmonia cósmica e a inocência original que pode ou não ter existido. É a destruição simbólica de um paraíso terreno ou de outro mundo no qual animais e humanos viviam juntos, em paz e contentamento, falando uma língua universal. Em termos Xamânicos, isso é chamado de a Grande Separação, quando os humanos não sabiam ou não entendiam mais como falar a língua dos animais. Ele intimamente se iguala e está conectado com a Queda de Lúcifer do Céu para se tomar o Senhor Deste Mundo. Foi a intervenção deliberada dele na evolução humana em desafio à ordem cósmica, e não por qualquer pecado de vaidade ou tentativa de usurpar a autoridade divina, que o fez cair em desgraça. O único crime de Lúcifer e seus anjos caídos foi querer ajudar a humanidade a progredir tanto espiritualmente quanto materialmente.

O líder dos Vigias ou anjos caídos era Semyasa ou Azazel - “separado de Deus”. O nome dele aparece no Velho Testamento e está associado ao bode expiatório sacrificado como uma “oferta pelo pecado” por Arão e lançado ao deserto para morrer. Por esse sacrifício, o bode era oferecido a Azazel e levava os pecados da tribo.

O sacrifício é descrito com certo detalhe. Dois bodes eram escolhidos, e era tirada a sorte para escolher um para Javé e um para Azazel. O animal escolhido para Javé era morto, mas o bode de Azazel, o bode expiatório, era solto no deserto onde supostamente o anjo caído residia com seus demônios em forma de bode, os Seirim. Antes de ser mandado para o deserto, Arão, como sumo sacerdote, colocava suas mãos sobre a cabeça do bode e confessava todos os pecados dos israelitas. No Livro de Enoch, Semyaza-Azazel foi acusado por Javé de revelar para a humanidade “todas as coisas secretas que estão no Céu”. Por causa desse crime, Azazel foi expulso do Céu e deixado para vagar pelo mundo.

Azazel foi uma forma inicial do rei de sacrifício ou divino que tinha de morrer para que a terra pudesse ser tratada e fertilizada. O simbolismo do rei sagrado é muito antigo e poderoso. Originalmente, o detentor do cargo morrería ao fim do seu reinado predeterminado. Ele simbolicamente se acasalava com Soberania, ou a deusa da terra, no “casamento sagrado” antes de ser ritualisticamente morto, e seu sangue era usado para fertilizar as plantações. Um exemplo famoso do rei sagrado foi o guardião do bosque sagrado de Diana na Itália clássica. Conhecido como Rex Nemorensis, ou “Rei da Floresta”, ele tinha de lutar com um desafiante ao seu cargo a cada sete anos para ter a posse do célebre “ramo de ouro” de uma árvore de carvalho no bosque. 

Nas demonologias hebraica e árabe, Azazel era conhecido como o pai dos djinns ou jinns (espíritos), que geralmente se acreditava que moraram nas regiões áridas e desertas. Como vimos, ele também era o líder dos Seirim. Estes eram demônios na forma de sátiro ou meio humano e meio bode. Não é coincidência que uma das formas tomadas pelo Deus Comífero no sabá das bruxas era a de um bode preto. É também uma das diversas formas tomadas pelo Baphomet, o deus supostamente adorado pelos heréticos Cavaleiros Templários que, de acordo com o que se acredita, obtiveram informações secretas do antigo “conhecimento proibido” dos hebreus e árabes no Oriente Médio.

No que diz respeito ao Igrejismo, um dos maiores crimes de Azazel- Lúcifer e dos anjos caídos foi ensinar para as mulheres as artes mágicas. Os Vigias escolhiam fêmeas humanas como suas alunas na Arte porque Lúcifer sempre preferiu ensinar mulheres. Paul Huson disse: “São os Vigias, os Poderosos dos Locais Celestiais, os pais dos gigantes e dos humanos também, como vistos em forma simbólica e arquetípica como os pais da humanidade, seja como mestres de sabedoria e amor ou simplesmente como poderes benevolentes de fertilidade e caça, que formam as entidades verdadeiras da bruxa’'Explícitamente, Huson afirma: “Azael ouAzrael é um dos deuses modernos da bruxa" (1970: 10-12).

O britânico Huson escreveu três livros muito bons sobre bruxaria, herbalismo e Tarô na década de 1970. Enquanto viveu nos Estados Unidos, ele se tomou um roteirista em Hollywood e, supostamente, fundou vários covens, que permaneceram secretos. Ele foi, conforme o que algumas pessoas alegam, um iniciado de uma tradição inglesa de magia que tinha uma linhagem do século XVI. Parecida com grupos existentes, conhecidos pelos autores, ela combinava magia tradicional com magia cerimonial e uma filosofia gnóstica Luciferiana. O fato de Huson, em seu livro sobre a Arte, recomendar aos aspirantes a Magos que recitassem o Pai- Nosso ao contrário como parte da iniciação solitária deles causou alguma controvérsia. Isso e o conteúdo mágico do livro levaram alguns Wiccanos ignorantes e intransigentes a condenar a publicação como “Satânica”. Na verdade, tudo o que Huson estava fazendo era desprogramar culturalmente o pretenso iniciado e quebrar os grilhões que o prendiam ao condicionamento cristão de sua infância. Isso é relativamente uma técnica gnóstica legítima. Com toda essa confusão, os comentários perceptivos de Huson sobre os Vigias e o importante papel deles na bruxaria tradicional foram amplamente negligenciados.

Huson mencionou a tradição Cabalística em que Naamá, a irmã de Tubalcaim, seduziu Azazel. Naamá era associada à filha ou á forma mais jovem da deusa sumério-hebraica da Lúa negra Lilith. Ela também era associada a outras deusas médio-orientais, incluindo Ishtar da Babilonia, Innana da Suméria e Astarte da Fenicia. Seu irmão Tubalcaim é descrito como Uum artífice de cobre e ferro” (Génesis 4:22). Em termos lendários, ele é um dos avatares de Azazel-Lúcifer e um dois reis sacerdotes da linhagem de seu ancestral Caim (Fesold 1990:69). Huson identifica Tubalcaim e Azazel com o deus sol babilónico Shamash em sua aparência do mundo subterráneo como o Senhor das Riquezas e o Artífice de Metais.

Na magia angelical moderna, Azazel ou Azrael é o regente do re- cém-descoberto (1930) planeta Plutão, o deus romano do tesouro escondido e do mundo subterráneo, e ele é também o Anjo da Morte. No Livro de Enoch, Azazel é descrito como o anjo caído que fez espadas e outras armas para os humanos. Essa é uma imagem de VulcanoAVayland do forjador de metais que fabrica as armas dos Deuses. Curiosamente, Azrael também ensinou para as mulheres a arte dos cosméticos. Ele parece estar associado ao “encanto” mágico da atração sexual usado pelas bruxas no correr dos séculos e, pelo seu relacionamento com Naamá, a figura da mulher fatal.

É consideravelmente óbvio que, nas historias dos anjos caídos, no Jardim do Éden e no Dilúvio estamos lidando com mitos alegóricos que antecedem a religião hebraica. Sabemos que eles constituíram sua mitologia adotando elementos de outras culturas semitas no Oriente Médio antigo, que eles encontraram e conquistaram ou por elas foram conquistados. Personalidades do Velho Testamento, como Moisés e José, parecem ter sido iniciados das escolas de mistérios egípcias, e os exílios dos hebreus no Egito e na Babilônia os colocaram em contato com outras mitologias. Os hebreus também adotaram a adoração de vários “deuses estrangeiros” em Canaã, e há várias referências sobre esse fato no Velho Testamento. Mesmo o termo Elohim, usado para descrever Javé no Gênesis, é uma palavra no plural que significa “os Deuses” ou “Deuses e Deusas”. A versão confusa do mito da criação dos hebreus deixa claro que o primeiro homem e a primeira mulher lendários foram feitos à imagem dos Deuses. Como já vimos, os hebreus copiaram, inclusive, o conceito de anjos de fontes caldéias, assírias, sumérias e egípcias.

No Cristianismo esotérico (ou seja, a forma verdadeira da crença cristã que a Igreja tem tentado reprimir, censurar e perseguir no decorrer de séculos manchados de sangue), Lúcifer representa um papel interessante e único como uma suposta figura satânica do mal. Uma lenda, documentada no romance sobre o Graal do século XIII intitulado Parsifal, alega que o Santo Graal, o cálice usado na Última Ceia por Jesus, foi entalhado a partir de uma esmeralda que caiu da testa ou coroa de Lúcifer durante a guerra no Céu. Supostamente, ou essa pedra foi trazida para a Terra por anjos rebeldes que foram banidos do Céu por não apoiar o lado de Deus ou ela “caiu como um meteorito” enquanto Lúcifer estava lutando com São Miguel. Essa pedra verde alegadamente pertenceu ao Rei Salomão, o filho do Rei Davi e uma personalidade importantíssima na tradição Maçônica e Templária. Depois ela chegou a José de Arimatéia, um mercador rico, que era o tio e o pai adotivo de Jesus depois da morte de seu velho pai. José é descrito como um comerciante de metais e um “artífice de metais”, e foi a pessoa que entalhou a esmeralda Luciferiana, transformando-a em um cálice que ele deu para o seu sobrinho.

O Novo Testamento descreve como um centurião romano golpeou a parte lateral do corpo de Jesus com sua lança enquanto ele estava sendo pregado à cruz. Sangue e água fluíram abundantemente da ferida. Esse é o tão chamado sang rael ou “sangue sagrado”, e ele simbolicamente representa a linhagem hereditária de Jesus. A lança usada para matar Jesus como o bode expiatório ou rei divino sacrificado não era uma arma comum. Supostamente, ela era o símbolo oficial do rei judaico e pertenceu a Salomão. Tubalcaim, cujo nome significa “lança” ou “arpão”, tinha forjado a cabeça daquela lança com ferro de meteorito. O antigo clã de Caim, conhecido popularmente como “o povo do fogo”, era composto de ferreiros hereditários e sacerdotes sacrificatorios da Grande Deusa do Oriente Médio. Eles eram também chamados de “os bons pastores”, título dado aos deuses da vegetação sacrificatorios da região. Eles incluíam Adônis, Átis, Baal, Tamuz, Osíris e Jesus. (Walker, 1983:132-134)

Diz-se que, quando a esmeralda caiu da testa de Lúcifer, ela deixou uma cicatriz. Essa era a também conhecida “Marca de Caim”, que pode ser vista nas auras daqueles que possuem o antigo “sangue bruxo” ou “sangue élfico”. Esses indivíduos são aqueles que são física ou espiritualmente (por encarnação da alma através de vidas passadas) descendentes dos Nephilim nascidos a partir dos casos amorosos entre os Vigias e os humanos. A Marca de Caim foi dada ao primeiro assassino por Javé para protegê-lo de outros seres humanos. Ela também tem o objetivo de separar Caim e seus familiares do resto da raça humana (Gênesis 4:15).

O mestre de bruxaria moderna Andrew Chumbley, do clã tradicional de bruxaria do Cultus Sabbati, que segue um mito Cainita, declarou que, por meio da gnose Luciferiana: “A humanidade poderá incorporar a verdade do Absoluto e então chegar ao estado de Unidade Divina”. Ele acrescenta que “escondida dentro do mito [da Queda, Lúcifer e os fühos de Caim] há uma doutrina iniciática a respeito da natureza da Divindade e da evolução do homem." (1996:70-71) Esses comentários são baseados na crença esotérica de que o próprio progresso de Lúcifer está tão próximamente alinhado à evolução humana por meio da intervenção dos Vigias que a descoberta pessoal do Graal, em um sentido metafísico no nível interior, terá uma repercussão profunda tanto no nosso progresso espiritual quanto na redenção e restauração dos anjos rebeldes aos seus lugares de direito na ordem cósmica.

Nós percorremos um longo caminho desde a história de amor entre Diana e Lúcifer até os simples camponeses, que iniciaram este capítulo. Talvez não, pois, apesar de parecer simples, a história encapsula o mistério cósmico da “luz nas trevas” que está no centro do mito dos Vigias. Nos textos da medieval Ordem da Rosa-Cruz ou Rosa-cruzes, está escrito que a luz e as trevas são idênticas. Elas só podem ser divididas pela mente humana, que as transforma em dualidades opostas. O alquimista, astrólogo e Cabalista do século XVII Robert Fludd disse: “As trevas receberam a iluminação para que pudessem fazer-se vistas”. Infelizmente, a Igreja jamais compreendeu esse fato simples e criou uma fé sobre uma falsa dualidade a partir dos ensinamentos de seu fundador, que resultou na morte brutal de qualquer um que ousasse contrariá-la.

Madame Blavatsky, referindo-se às doutrinas do ocultismo ocidental, alegou que “As trevas são a única realidade verdadeira, a base e a raiz da Luz, sem a qual essa última jamais podería se manifestar, nem mesmo existir. A Luz é a matéria e as Trevas são espírito puro. As trevas, em sua base radical e metafísica, são Luz subjetiva e absoluta. Ao passo que a luz, em todo seu esplendor e glória aparente, é meramente uma massa de sombras, pois nunca poderá ser eterna e é simplesmente uma ilusão ou o Maya”. (1893, Volume I: 99)

A tradição esotérica ensina-nos que, até encontrarmos o Graal, e é preciso deixar bem entendido que não se trata de um objeto físico nesse continuum de tempo-espaço, Lúcifer deve representar o seu papel de rei sacrificatorio. Ele está condenado a encamar em uma “capa de pele” como um avatar para a raça humana, e pagar o preço supremo, como um bode expiatório em favor da humanidade. Esse é o sacrifício supremo por ter sido o portador da luz que trouxe do Céu a iluminação da sabedoria gnóstica e o fogo original da criatividade. Lúcifer eternamente morre e é renascido no intuito de salvar a humanidade de si mesma. Conforme a raça humana progride espiritualmente, ele pode lentamente subir a Escada de Luzes de volta ao reino dos Deuses além da Estrela Polar. Ele é o Senhor da Estrela da Manhã e a Lux Mundi (Luz do Mundo), cujo renascimento da escuridão celebramos todos os anos no solstício de inverno.


Luciferianismo - As Torres Dos Titãs


A semente dos anjos unida com a substância mortal da primeira humanidade animal produziu, de acordo com a Bíblia e o Livro de Enoch, “valentes, varões de renome, na Antiguidade”. Eles foram descritos pelos antigos como gigantes. Se eles eram verdadeiramente gigantes no aspecto físico é difícil de saber. Restos mortais de humanos pré-históricos de grande dimensão já foram desenterrados em várias partes do mundo. No entanto, comparativamente falando, para alguém que é baixo em estatura, uma pessoa acima de 1,80 metro de altura parecerá um “gigante” nos olhos dele. Porém, é possível que os termos “valentes”, “varões de renome” e “gigantes” possam ter sido usados para descrever e identificar uma raça híbrida meio angelical com poderes mágicos e psíquicos sobrehumanos. Para os antigos celtas, “gigantes” não eram necessariamente criaturas sobrenaturais, mas o nome dado a qualquer ser que fosse maior ou mais alto que o humano comum e tivesse poderes incomuns que o fazia ser superior. Tradicionalmente, tais gigantes não poderíam ser subjugados meramente pelo uso da força física, mas também pelo uso inteligente de artifícios e magia.

Fragmentos, ruínas e relíquias de civilizações arcaicas estão cheios de insinuações silenciosas de uma era incrivelmente remota, quando raças gigantescas de grande beleza e sabedoria profunda dominavam a Terra antediluviana no meio de cidades titánicas e torres ciclópicas. Tradições difundidas e consistentes localizam os centros dessas culturas pré-históricas nas regiões da Atlântida, Hiperbórea e de Shambhala, que se encontrariam no Oceano Atlântico, na Europa Setentrional e no deserto Gobi na Asia, respectivamente. Os vestígios desgastados das civilizações perdidas estão supostamente ocultos nas profundezas oceânicas, embaixo das areias cambiantes do deserto ou sepultados sob milhares de camadas de gelo polar. Com o aquecimento global, quem sabe o que a vastidão glacial das calotas polares irá revelar no futuro.

Platão descreveu os atlantes em seu famoso relato sobre a ilha perdida determinada por sacerdotes egípcios como “... um poder grande e maravilhoso dos reis, governando sobre a própria ilha, muitas outras ilhas e partes do continente (...) até o Egito, a Europa e as fronteiras com a Etrurid’. Apesar de algumas pessoas considerarem a Atlântida de Platão como um conto utópico e ficcional, outras vêem os reis atlantes de um ponto de vista mais real. Na tradição esotérica ocidental, eles são considerados como transmissores da Tradição Secreta para a humanidade atual. Os gigantes e soberanos colossais conhecidos comoNephilim ou Awwim (serpentes) eram descritos nas Escrituras proféticas de Amós como sendo altos como cedros e vigorosos como carvalhos. Eles foram os criadores das construções ciclópicas, muitas fortalezas de templos e governantes do período antediluviano, dos quais descendiam figuras heróicas e lendárias como Ninrode ou Nimbroth, o “valente caçador” e inspetor da Torre de Babel.

Tradições antigas estão repletas de descrições de raças primitivas, desde os Titãs, da Teogonia de Hesíodo, e os Cabari, da Samotrácia, até os Jotuns, do mito Hiperbóreo, e os Daityas, do Oriente. Tal gigantismo e estrutura alta também é característica dos Seguidores de Hóms, a dinastia semidivina que descende dos Deuses (Neteru) do antigo Egito. Existem ainda espíritos khu que colhem o cereal do céu, “... cada espírito com 9 côvados [por volta de 4 metros] de altura que o colhem na presença de Rá Horakhty”. Isso está compatível com a estatura conferida ao rei Ogue, de Basã, um descendente dos Nephilim: “Porque só Ogue, rei de Basã, restou dos despojos dos gigantes; eis que o seu leito, leito de ferro (...) Nove côvados o seu comprimento...’’’’ (Deuteronômio 3:11). O autor árabe Tabari nos fala de uma ponte na cidade de Bagdá (Iraque) construída dos ossos da costela do rei gigante Og-ibn-Unk, ou “Ogue do Pescoço Longo”.

A capital dos Amontas, uma cidade que supostamente havia sido originalmente habitada por antepassados gigantes, era a cidade real de Basa, chamada de Astarote Camaim. Esse nome indicava sua condição como um centro de culto da “Astarote Cormiera” e a cidade templo da Rainha do Céu Astarte. Crónicas hebraicas preservam as memorias de outras tribos de titãs descendentes dos Nephilim, incluindo os amalequitas e os filhos de Anaque (“de pescoço longo”), que habitavam na antiga terra de Canaã.

Em uma anotação sobre os lendários governantes gigantes da Síria, o explorador e aventureiro vitoriano sir Richard Burton teceu comentários sobre a raça gigante dos Jababirah. Esse nome deriva de Giabber, ou “imenso, gigante”. Ele se relaciona à palavra hebraica Ghibbor/Ghibborim e à persa Diván. Burton diz: “... desses eram Ad e Shaddad, Reis da Síria; os Falastan (Filisteus), Auj, Amalik e Banu Shayth, ou descendentes de Seth, os filhos de Deus (Benu Elohim) (...) que habitaram no Monte Her- mon e viveram em pureza e castidade.”

Nas tradições arábicas, os amalequitas eram os habitantes originais da cidade sagrada de Meca, e os Adites eram uma raça de gigantes que morava em Al-Ahkaf, situada entre Hadramaut e Omã, no sul da Arábia. Eles eram descendentes de Cão, filho de Nuh ou Noé, e quem os uniu como um povo foi o rei gigante Ad. O filho de Ad, rei Shaddad, construiu uma cidade imponente em um local próximo a Omã, na Arábia Rochosa, chamada de Ubar dos Muitos Pilares. Sua grande quantidade de elevadas torres, abóbadas e colunas repletas de metais preciosos e adornadas com jóias, banhada por correntes de água melodiosas debaixo de jardins com arcos de árvores e flores era a própria maravilha do mundo antigo e um paraíso terrestre.

A tradição diz que, no final, o excesso de confiança do rei Shaddad se mostrou impotente, quando Ubar foi engolida pelas areias do deserto e afundou para debaixo da terra para ser avistada apenas por dervixes perdidos nas ruínas. Um viajante solitário supostamente passou pelas altivas ruínas de Ubar enquanto viajava pelo deserto no século VIL Ele levou jóias de lá para o palácio do primeiro Califa Omíada Mu’Awiyah, em Damasco, a fim de provar a sua narrativa. Mitos árabes falam de várias dessas raças perdidas, incluindo as nações de Jadis, Tasm, Thamud e Ad. Foram construtores Adites, ou djins sob controle de um mago Adite, que construíram o dique de pedra enorme em Ma’arib, na capital iemenita Sana, lar dos adoradores de estrelas sabeus. Analisando seus antepassados tão incomuns, podemos supor que eles herdaram o culto transestrelar dos arcanjos.

De acordo com a doutrina esotérica, sangue dos Nephilim corria nas veias de Ninrode: “Cuxe gerou a Ninrode, o qual começou a ser poderoso na terra. Foi valente caçador diante do Senhor (...) O princípio do seu reino foi Babel.” O Manuscrito Maçônico de Cooke, datado do ano de 1430 d.C., concede a Ninrode a posição de primeiro Grão-Mestre dos maçons. Ele supostamente entregou as instruções e constituições originais aos irmãos da Maçonaria que supervisionou durante a construção da Torre de Babel no centro simbólico do Universo. Babilônia é Bab-Illani ou Portão dos Deuses (Ilu = Elohim), o portal entre as dimensões terrestres e celestiais. As pesquisas de Clemente Stratton confirmaram que, no primeiro grau da Maçonaria Operativa medieval, o juramento feito pelo candidato era chamado de Juramento de Ninrode. A Torre de Babel foi iniciada por Ninrode, a quem o escritor em bruxaria e demonologia Montague Summers chama de “um bruxo gigante de grande poder”.

E relatado no Gênesis: “Eia, edifiquemos nós uma cidade e uma torre cujo cume toque nos céus” (11:4). Do topo desse zigurato colossal, de acordo com lendas árabes, Ninrode tentou voar ao Céu em uma carruagem áurea puxada por quatro pássaros - demônios. Isso tem sido observado como uma alegoria gnóstica representando a alma caída, aspirando irromper as esferas e recuperar o estado divino. Como um símbolo da aspiração Luciferiana em direção ao Absoluto e da nostalgia mística pelo infinito, ela permanece influente como um emblema da busca gnóstica na tradição oculta ocidental. Ela aparece no Taró como o arcano maior A Torre Atingida por Raios, que mostra figuras humanas caindo dela enquanto buscam, e falham em conseguir, recuperar a posição espiritual perdida delas.

Na tradição babilónica, o protótipo zigurato ou torre sagrada é chamado de Dur-an-ki ou “ligação do Céu com a Terra”. Philo Judaeus fornece um relato de sete imagens áureas de demônios ancestrais adorados pela raça de gigantes Amoritas. Eles incluem Nembroth ou Ninrode como o gênio fundador da Babilônia e Canaã ou Caim como o pai da Fenicia, o que confirma as ligações de Ninrode com os Nephilim. A estrutura planetária da Torre de Babel ou Babilônia é espelhada em outros edifícios parecidos, como o zigurato Sabeu “das sete esferas”, descoberto por escavações na cidade de Harã (A Ur bíblica dos caldeus) por Rawlinson em 1854.

Harã, como veremos mais tarde neste livro, foi um centro antigo e renomado de adoração estrelar e hermética até o século XII d.C. Seus terraços eram embelezados com as cores simbólicas dos planetas na ordem sabéia, ou seja, preto como carvão para Saturno, marrom-dourado para Júpiter, vermelho-alaranjado para Marte, vermelho-escarlate para o Sol, amarelo para Vênus, azul lustroso e dourado para Mercúrio e prata para a Lua. Escrevendo sobre as imagens do pico cósmico, o antropologista dr. Mircea Elíade notou que o zigurato era uma representação simbólica do Monte Cósmico e do Cosmos. Os sete andares simbolizavam os sete céus planetários contendo as cores do mundo (1964: 134,264). A Torre de Bab-Illanu também se estendeu para baixo em imagem invertida dentro dos domínios ctônicos como a Bab-Apsu ou a “Passagem do Abismo”. Dessa forma, a Torre colocava juntos os três mundos Xamânicos do Céu, Terra e Mundo Subterrâneo.

Dentro do contexto do sistema de mundo ptolemaico, a construção por Ninrode da Torre de Babel representa a jomada ascendente da alma dos mundos elementáis por meio dos sucessivos circuitos astroplanetários para os Mundos Divinos ou Noosfera Divina das Mentes Puras. O mistério da Torre de Babel encapsula a elevação do iniciado dentro da gnose. Ela se eleva no ônfalo ou “centro do mundo”, um axis mundi ou pilar do mundo ciclópico no meio da cidade templo, e é o ponto de ruptura entre o fenômeno e o nômeno.

As lendárias cidades ciclópicas, os edifícios sagrados buscando alcançar os céus e os impérios poderosos dos reis gigantes e seus povos foram varridos da face da Terra e submersos nas águas de uma poderosa enchente. No Livro de Enoch, o anjo Uriel avisa o profeta da “... consumação que está prestes a acontecer; pois toda a terra perecerá; as águas do dilúvio virão sobre toda a terra, e todos os que estão nela serão destruídos'”. Memórias greco-egípcias da lendária ilha continente de Atlântida e sua destruição são totalmente pertinentes a essa descrição. Vários outros mitos, incluindo a tentativa de destronar Zeus pelos Titãs e as terras perdidas de Lyonesse e Ys, descrevem como praticantes iníquos de magia negra ou usurpadores da ordem cósmica são destruídos por Deus ou Deuses.

A lenda de uma Enchente ou Dilúvio mundial pode ser encontrada nos mitos de criação de todas as culturas. Em setembro de 2000, um grupo de cientistas alegou ter achado os resquícios de uma aldeia neolítica a aproximadamente 90 metros sob o Mar Negro. Essa descoberta supostamente prova que os primeiros humanos viveram às margens de um lago de água doce no local 7500 anos antes de eles serem levados para longe do lago por uma enchente cataclísmica. Isso foi causado pela elevação do nível dos mares depois do derretimento da extensa calota polar no fim da Era Glacial. Memórias desse desastre ecológico foram registradas na mitologia suméria e no relato de Noé e a Arca na Bíblia.

A tradição esotérica postula várias ondas de migração da Atlântica, que transmitiu a sabedoria angelical preservada das raças Azelaicas, para enclaves nos mais altos locais da Terra para propagação no mundo pós- diluviano. Se isso realmente aconteceu ou se é um evento imaginário, é difícil saber. Discutiremos o simbolismo Luciferiano da Maçonaria mais tarde neste livro, mas é importante registrar que essa transmissão pós- diluviana da magia arcana se encontra no centro da chamada tradição Noachita da Maçonaria. Isso é particularmente verdade no simbolismo do grau de Nauta da Arca Real e em suas cores do arco-íris correspondentes. Simbolicamente, em muitas culturas antigas, o arco-íris tem sido visto como uma ponte entre o Céu, ou reino dos Deuses, e a Terra. A tradição Noachita foi fundada para celebrar a destruição da Torre de Babel. As reuniões da Loja devem acontecer uma vez por mês durante a Lua cheia em uma sala em que haja uma grande janela ou clarabóia para que a luz da lua possa iluminar os trabalhos. De acordo com a história maçônica, os ritos da Antiga Ordem dos Noachitas foram traduzidos do alemão para o francês pela primeira vez em 1757, e a ordem foi chamada ocasionalmente de Cavaleiros Prussianos. Os preceitos Noachitas eram basicamente relacionados com a justiça e, curiosamente, eles tinham uma proibição de comer carne animal contendo sangue. (Macoy, 1989:268 e Mackenzie, 1877:508-509)

Na tradição, a Arca é místicamente parecida com a Loja perfeita, presidida pelo Comandante e os Vigilantes, que assumem os papéis de Noé e seus filhos Jafé e Sem. O fechamento da Loja é interpretado como sendo parecido com a ancoragem da Arca no Monte Ararat. No século XVIII, o Conselho Maçônico Francês de Imperadores do Ocidente e Oriente operou, no seu 25° grau do Rito, o grau de Patriarca Noachita. Isso resumia as simbologias do Dilúvio, a Torre de Babel e a suposta descoberta, na Alemanha, do túmulo de Pelegue, o arquiteto da Torre de Babel. O grau detalha a preservação da arte dos construtores após o Dilúvio. Em seguida, essa revelação é dada ao iniciado, e ele é saudado como um “maçom Noachita” nos Mistérios. O túmulo de Pelegue foi supostamente encontrado em uma mina de sal alemã, juntamente com uma coluna de mármore branco. Nele estava escrito em hebraico a história dos Noachitas. Estava supostamente gravado no túmulo: “Aqui jazem as cinzas de Pelegue, um Grande Arquiteto da Torre de Babel. O Todo- Poderoso teve compaixão dele porque ele se tomou humilde.'’' Essa inscrição sugere que ele escapou do destino dos outros habitantes da Babilônia, quando Javé lançou sua fúria sobre eles pela arrogância de construir uma torre para alcançar o céu.

Na mitologia grega, a raça de gigantes era chamada de Titãs, e eles possuíam poderes mágicos que usavam as forças elementais: ar, terra, fogo e água. Os gregos acreditavam que os Titãs se originaram no Oriente distante. Tanto Atlas, que deu o nome para a Atlântida e o Oceano Atlântico, e Albion, que deu seu nome à antiga Grã-Bretanha, supostamente eram de origem Titánica. Dizem que depois do Dilúvio o gigante Albion conduziu a raça dele, descendente do filho de Noé Cam, para a Grã- Bretanha. O ocultista Lewis Spence disse que é aceitável considerar que Atlas foi a divindade tutelar de uma terra no ocidente no oceano, cujo mito é lembrado com seu nome. A questão de se a Atlântida realmente existiu ou foi um paraíso imaginário da era lendária, chamada de “Idade de Ouro”, ainda é objeto de um intenso debate. Outro Titã famoso foi Prometeu que, em um grande gesto Luciferiano de rebeldia aos Deuses, trouxe o fogo do Céu para a Terra a fim de beneficiar a humanidade e foi punido. Se esse era na verdade o “fogo criador divino”, então a analogia Luciferiana é até mais sugestiva.

Em termos míticos, os Titãs eram “os Deuses antes dos Deuses” ou os Deuses Antigos que supostamente governaram a Terra antes da criação da raça humana. Os gregos certamente consideram o período dos Titãs como uma idade de ouro, quando a Terra era um paraíso. De acordo com os seus mitos, os Titãs e os Ciclopes eram a descendência do deus Urano com sua companheira Gaia, a deusa da terra. Infelizmente Urano e suas crianças gigantes não se davam bem e, como em uma situação doméstica, ele as expulsou do Céu e as exilou na Terra. Um dos Titãs, Cronos (Saturno), conspirou com sua mãe para matar o pai. No entanto, ele apenas conseguiu castrá-lo com uma foice. Em nível simbólico, isso privou o deus de seus poderes criadores e masculinos, que foram transferidos para seu filho rebelde. Cronos foi então reconhecido pelos outros Titãs como seu senhor e mestre. Uma versão alternativa e posterior desse mito mostra os Titãs se rebelando contra o deus pai olímpico Zeus, ou Júpiter. Os Titãs também foram responsáveis pelo assassinato de Dioniso, a “criança divina” comífera. Eles o enganaram com seu próprio reflexo em um espelho e, então, o dilaceraram em pedaços antes de comê-lo. Quando Zeus abateu os rebeldes com seus raios, a lenda diz que a humanidade surgiu de suas cinzas. Porque os Titãs haviam incorporado parte do jovem deus, a humanidade herdou uma centelha divina de Dioniso, que era um dos avatares de Lúcifer. Nos mistérios órficos, a morte de Dioniso representa a “queda” na encarnação material e a perda da unidade primitiva - a Grande Separação da crença xamânica.

Embora os Ciclopes fossem apenas uma nota de rodapé na mitologia grega, por razões que se tomarão evidentes mais tarde neste livro, eles tiveram um papel importante na cultura Titánica. Na realidade, eles, apesar da reputação injustificada de serem criaturas estúpidas, foram descritos como parte de uma “elite científica” entre seus colegas gigantes. (Roberts, 1978:151) Alega-se que eles tinham oficinas subterrâneas em que faziam instrumentos de pedra e metal em fomos enormes. Expressivamente, dizem que eles inventaram a foija e os raios usados por Zeus como armas. Acredita-se que os primeiros humanos provavelmente descobriram o uso do fogo observando raios acertarem árvores e ao baterem pedras com pedras.

A mitologia escandinava também tem suas próprias referências aos seres titánicos, que são chamados de a geada ou gigantes de gelo. Assim como os Titãs, eles foram os “primeiros a ser criados” e eram os controladores das forças elementais, incluindo trovões e tempestades de granizo. Também existe uma referência a uma lenda de dilúvio. No mito, há uma luta entre os filhos de Bor (Odin, Vili e Ve) e o deus criador gigante Ymir. O gigante é atingido por um golpe na cabeça, cai e o sangue do ferimento inunda o mundo. Todos os gigantes de gelo morrem afogados, com exceção de um chamado Bergelmir. Ele consegue refugio em um moinho, de onde a família dele dá uma nova origem à raça de gigantes.

Esse dilúvio de sangue é citado no poema épico anglo-saxão Beowulf, que faz referência a “uma luta na Antiguidade / quando um forte dilúvio / um mar estrondoso / destruiu a raça de gigantes / eles viviam em vaidade / aquele povo afastado do Deus eterno / que deu a eles como recompensa este castigo final, um dilúvio arrebatador.:” Outra referência no poema descreve: “Os gigantes que por muito tempo lutaram contra Deus”. Os traços Luciferianos nessa descrição são absolutamente surpreendentes.

O mais famoso da raça de gigantes era Loki, conhecido como o “criador de trapaça” e o Senhor da Desordem. Ele era o deus do fogo metamórfíco e andrógino, considerado pelos cristãos como um protótipo de Satã ou Satanael. Isso porque ele era considerado o culpado pela chamada “guerra no Céu” entre os Deuses e a raça dos gigantes de gelo. De acordo com a ocultista russa e fundadora da Sociedade Teosófíca Madame Helena Blavatsky, o nome Loki vem de uma antiga palavra “Liuhan”, que significa “iluminar”. Ela alega que, como um deus do fogo e luz, ele é idêntico a Lúcifer, o portador da luz. (1893: Volume II: 296)

Loki é o pai do lobo cósmico Fenris, a serpente de Midgard que circula a Terra (também conhecida como a Serpente do Mundo), a deusa do mundo subterrâneo Hei e a mãe do cavalo sobrenatural com oito patas de Odin, Sleipnir, que pode viajar entre a Terra e o mundo subterrâneo. Dizem que pelo menos uma tradição da magia tradicional hoje venera a Serpente do Mundo como uma de suas divindades. Veja Water Witches,10 de Tony Steele. (Capall Bann, 1999) Na mitologia nórdica, Loki íf eqüen- temente causa problemas para os Deuses, mas seu papel principal é na morte do deus da luz Baldur. Isso ocasiona o Ragnarõk ou Crepúsculo dos Deuses, mas o mito diz que alguns Deuses renascerão após esse cataclisma cósmico, e uma nova Terra será criada e repovoada por humanos.

Na guerra no Céu entre os Aesir e os Vanir, a deusa Freya foi raptada de Asgard, lar dos Aesir, no qual ela permanecia com os gigantes de gelo. Como resultado, a natureza foi virada de ponta-cabeça, as estações foram invertidas e as plantações apodreceram nos campos. Mesmo o Sol e a Lua se recusaram a brilhar no céu. Os Vanir eram os deuses da fertilidade da família e da terra, e foi sugerido, assim como nos outros mitos similares em outras culturas, que essa é parte do processo em que os Deuses Antigos se tomam os demonios da nova religião, que substitui a adoração deles. Tanto os gigantes de gelo quanto os Titãs foram transformados em demonios, ao passo que novas entidades eram apresentadas para substituir os Deuses Antigos dos tempos remotos. A mesma coisa aconteceu quando o Cristianismo tomou o lugar das religiões pagãs.

Blavatsky referiu-se específicamente aos Titãs como os anjos caídos. Ela os descreveu como os criadores ou arquitetos dos mundos e os progenitores da raça humana. Como anjos caídos, ela os descreve como “espelhos legítimos da Sabedoria Eterna” (1893 Volume II: 543). No entanto, rejeita completamente as alegações feitas pelos teólogos cristãos de sua época de que os Titãs são demoníacos ou associados a Satã. Aliás, ela descreve tais alegações como “uma conspiração de difamação” (Volume II: 369). Blavatsky vai além e afirma que Lúcifer era “a mais alta sabedoria oculta, espiritual e divina da Terra - que é naturalmente contrária a toda ilusão evanescente, terrena, dogmática ou até mesmo a uma religião eclesiástica’' (Volume II: 394).

O que foi citado anteriormente deve ser entendido à luz da interpretação secreta dos mitos antigos do Dilúvio, ou Grande Enchente, que é um mito universal encontrado em culturas por todo o mundo. Sólon, o Grego, aprendeu com a classe sacerdotal egípcia em Sais, a cidade no delta do Nilo da deusa Neith, que: “Aconteceram muitas des- truições da humanidade, e muitas outras acontecerão. As maiores são pelo fogo e pela água, mas além dessas existem outras menos destruidoras”. O Universo de espaço, tempo e matéria passa por reabsorções cíclicas e periódicas nas águas disformes do não revelado. Isso está de acordo com os “Solstícios dos Deuses” no “Grande Ano” da precessão ou platônico de 25.950 anos solares.

O sábio caldeu Beroso descreveu em detalhes a doutrina da dissolução cíclica no século III a.C. Em seu trabalho Babyloniaca, ele afirma que, quando todos os sete planetas estão em conjunção no signo do Caranguejo (Câncer), as águas consomem o mundo. Quando os corpos celestiais estão alinhados da mesma forma no signo do Bode (Capricórnio), o Cosmos inteiro é devorado pelo fogo. De acordo com essa visão, existiram incontáveis raças humanas antes da espécie atual. Muitas outras virão depois da nossa espécie, quando o mundo é absorvido e ressurgido, de acordo com as evoluções rítmicas e inexoráveis do Círculo da Necessidade astral. Essa é uma dança de roda interminável de dissolução e criação se intercalando infinitamente.

As chaves emblemáticas sobre a escatologia mística do Dilúvio consistem na compreensão de que, para os antigos, as águas que antecedem a criação do não revelado - o Tehom hebraico, o Nun egípcio e o Abzu babilônio-acadiano - são a matriz nula do espaço puro. A partir dessa matriz, a ordem mundial cósmica emerge periodicamente. E, portanto, o fundamento supremo, insondável, vazio, inconcebível, mas, não obstante, é também o terreno imprevisível do Ser, a fonte incognoscível. Esse é o significado do símbolo egipcio Mau, que quer dizer “águas, ou mar”. Como o hieróglifo místico do Dilúvio, ele consiste de três hieróglifos Nun, simbolizando a nulidade do Céu (Pet), Terra (Ta) e o Mundo Subterráneo (Duat), e abase essencialmente nula do Universo triplo. O mesmo significado é expresso pelo símbolo primordial canaanita Mayyuma e a letra hebraica Mem. Eles são símbolos tipológicos da nulidade plena do oceano das águas abissais de espaço vazio; o firmamento do grande mistério; a “Grande Noite dos Deuses”, a renovação e preservação perpétua da Revelação Divina dentro do Mar da Nulidade.

A transmissão do Grande Segredo inextingüível através de cataclisma e destruição sem-fim, a teofania eterna da Sabedoria que não pode morrer, é simbolizada pela letra hebraica Nun. Ela é interpretada como o símbolo do Peixe, o emblema da redescoberta e da renovação pós- diluviana dos Mistérios Divinos, e foi empregada nesse contexto esotérico pelas seitas gnósticas por volta do século I d.C. e até antes. O símbolo Ictus dos primeiros cristãos representava essa regeneração da gnose pura, e Eliade pertinentemente comentou sobre a valência mítica do “peixe” e do “pescador” e que esses símbolos possuem uma “... relação com a ‘revelação’, ou a passagem de uma doutrina do estado de esquecimento ou ‘eclipse’ para o estado de manifestação total.” Essa revelação é a visão irradiada da Xvarenah do Humano de Luz transcendente, a revelação da nossa divindade inata e autoluminosa do esplendor imutável da Mente Divina.


Luciferianismo - Magia Angelical do Oriente

Como devemos interpretar corretamente e, com isso, compreender inteiramente o significado daquelas lendas antigas e enigmáticas relacionadas com a Queda dos anjos relatada no Velho Testamento da Bíblia judaico-cristã e nas Escrituras apócrifas? De que maneira essas referências e mitos enigmáticos e misteriosos possuem a Alta Magia Angelical do Oriente, e quais verdades elas possuem para transmitir àquele que busca a magia nos dias de hoje? As respostas que essas perguntas fornecem são singularmente esclarecedoras e permitem que tenhamos relances extraordinários da história secreta do desenvolvimento evolucionário inicial da humanidade e do desprendimento do estado instintivo animal na pré-história.

O relato bíblico da descida dos anjos é limitado a alguns versículos crípticos no Gênesis: “Como foram se multiplicando os homens na terra, e lhes nasceram filhas, vendo os filhos de Deus que as filhas dos homens eram formosas, tomaram para si mulheres, as que, entre todas, mais lhe agradaram.” (6:1-2)5

As conseqüências notáveis desse relacionamento incomum entre anjos e a humanidade são relatadas adiante no nascimento da raça gigante antediluviana chamada de Nephilim. “Ora, naquele tempo havia gigantes na terra; e também depois, quando os filhos de Deus possuíram as filhas dos homens, as quais lhes deram filhos; estes foram valentes, varões de renome, na antiguidade.” (6:4).

Nas Escrituras canônicas ortodoxas, esse é o único fragmento que sobreviveu, e suas implicações místicas até agora têm sido deliberadamente evitadas por especialistas bíblicos, teólogos e membros do clero. Um relato mais completo do acontecimento estava no então perdido etiópico Livro de Enoch,6 7 que foi preservado no enclave da Igreja Abissínia. Acredita-se que o explorador escocês James Bruce trouxe pela primeira vez uma tradução para a Europa no fim do século XVIII. No entanto, uma cópia de um volume chamado o Livro de Enoch é catalogada como um dos livros do acervo da famosa biblioteca ocultista de Abbot Trithemus, de Würzburg, no século XV. Outros volumes interessantes na biblioteca incluíam o Livro de Raziel, o Livro de Hermes e vários grimórios mágicos atribuídos ao Rei Salomão. (Couliano, 1987:167)

Na edição de outubro de 1999 do Jerusalem Report, foi publicado um relato sobre a descoberta do supostamente chamado Pergaminho do Anjo,1 que parece estar ligado ao Livro de Enoch. Escrito em uma mistura de hebraico, aramaico e grego, esse documento foi achado na Jordânia, sudeste do Mar Morto, escondido dentro de um jarro em uma caverna. Diz-se que ele foi secretamente comprado na década de 1970 por um grupo de monges beneditinos, que levaram o pergaminho clandestinamente para um mosteiro na fronteira entre a Áustria e Alemanha. Lá ele permaneceu por mais de uma década enquanto era traduzido. Conforme se alega, o texto, similarmente ao Livro de Enoch, descreve uma excursão ao Céu conduzida por um anjo Vigia. Todos “os segredos do Céu” são mostrados ao autor do Pergaminho do Anjo e também lhe é ensinado como ver sinais no Sol, na Lua e nas estrelas para prever o futuro (Astrologia). Além disso, ele aprende a doutrina do estado atmosférico, escrita, o uso de plantas e pedras (cristais?) para curar doenças e prever eventos futuros e o método de viajar no tempo. O Pergaminho do Anjo refere-se a Deus pelo nome canaanita de El e a Satanás pelo nome de Beliel, literalmente “fogo ou luz de Deus”. O pergaminho é dedicado a Yeshua (a forma hebraica de Jesus!), que é descrito como “o Sagrado” e como o filho de um sacerdote. Foi recentemente sugerido que José, o pai de Jesus, pode ter sido na verdade um sacerdote no templo de Jerusalém (reportagem do site na internet de Andrew Collins 24/01/00).

James Bruce não hesitou em descrever o Livro de Enoch como uma “escritura gnóstica”, e acredita-se que ele data entre os anos 165 a.C. e 100 d.C. Essa foi uma percepção mais apurada que aquela da maioria dos analistas clericais, que persistem em conclusões vagas e moralistas sobre o documento. A tradução do texto por Bruce forneceu apenas a confirmação literária da corrente altamente sigilosa e misteriosa dos mistérios angelicais transmitidos ao longo dos séculos em alguns cultos e círculos esotéricos na Europa. Bruce era uma pessoa interessante, que não era quem parecia ser superficialmente. Era um aristocrata escocês de sangue real que dizia descender de Robert the Bruce. Era um estudioso clássico e bíblico e um maçom importante. Como um maçom escocês, foi alegado que ele teve algum contato com os cavaleiros templários maçôni- cos. (Collins, 1996:12) Em sua função de explorador, Bruce partiu em 1768 para tentar descobrir a nascente do Nilo. Foi sugerido que essa era apenas uma mentira para esconder sua verdadeira missão, que era encontrar documentos antigos e tesouros escondidos ligados aos chamados Judeus Negros da Etiópia.

No Livro de Enoch, o profeta do Velho Testamento tem uma visão do Céu e, em desacordo com o Pergaminho do Anjo, é levado a uma visita guiada ao Céu pelo Arcanjo Rafael, que, como nos é dito, é um dos mocinhos que não se rebelaram contra Deus. No entanto, Enoch encontra os Grigori, que são descritos como gigantes guerreiros de forma humana e “guardiões do mundo”. Grigori significa “vigias” e se refere à função deles em zelar pelo mundo. Quando o curioso Enoch pergunta sobre a natureza dos Grigori, lhe contam que eles e o príncipe deles Satanael viajaram para a Terra e chegaram ao Monte Ermon ou Hermon. Diz-se que eles viram as “filhas dos homens” e as tomaram como suas esposas, como é descrito no relato do Gênesis. Em tempos romanos, o Monte Hermon era o local de um santuário ao deus com pemas de bode Pan. Ele foi construído em volta de uma caverna e uma fonte natural, que era a nascente do Rio Jordão.

No centro das lendas da Guerra no Céu, quando Lúcifer se rebelou contra Deus, foi derrotado pelo Arcanjo Miguel e expulso do Céu, e também na descida dos anjos caídos encontram-se urna diamonosofia gnóstica e uma antropogénese misteriosa. O Grande Anjo da Luz e sua corte eleita desceram e se sacrificaram ao tomarem-se matéria para ajudar a evolução psíquica e espiritual da humanidade primitiva. Os humanos primitivos estavam mergulhados profundamente na matéria. A consciência deles era ainda mais turva que a de hoje e limitada ao nivel automático e instintivo da vida animal. Atarefa dos anjos caídos era a de literalmente redimir e libertar os humanos de sua prisão material. Ensinamentos esotéricos descrevem que, quando o organismo humano eventualmente transpôs e se diferenciou de milhões de predecessores nos géneros vegetal, réptil e mamífero, ele ainda era desprovido da luz verdadeira da consciência autocompreendida. Ele ainda estava preso ao “sono” dentro das trevas do Universo material.

A revolta angelical foi um sacrifício de proporções prometéicas, no qual os anjos se encarnaram dentro da dimensão material de tempo e espaço no intuito de conduzir a semente luminosa da gnose para dentro dos seres humanos. Eles se dotaram da sua capacidade inata de realizar a divindade para conseguir a liberdade dos limites da existência material. Os anjos caídos, de acordo com a doutrina oculta, não eram malignos ou “pecaminosos”. Pelo contrário, eles eram avatares transcendentais da salvação espiritual e eventual redenção da humanidade por meio da gnose. Eles “revelaram os segredos eternos que estavam no Céu, segredos que os homens estavam se empenhando para aprender”. Os Ben Elohim, ou Filhos de Deus, eram então os portadores da iluminação divina para o dormente “Adão do Barro Vermelho”, o humano mergulhado na matéria. Eles permitiram que ele acordasse para o conhecimento de seu destino e seus poderes verdadeiros como um ser espiritual não por acidente, revelando o “Adão de Diamante” mencionado dos textos gnósticos cópticos; a essência imortal de nossa verdadeira existência, além de todos os mundos condicionais. A redenção da matéria negra (hylé) pela transmissão da LuxAngelicae ou Luz Angelical era o objetivo dos Vigias ao descer no plano terreno. Amissão deles foi planejada para levar a liberação eventual de todas as entidades e, no final, a elevação de todo o mundo para seu estado paradisíaco original.

E.W. Liddell (1994) escreveu sobre a interpretação desse mito pela quase maçônica organização Compagnons Du Tour ou os Companheiros da Torre (de Babel) na França medieval, que eram responsáveis por ajudar na construção das grandes catedrais góticas. Ele observa que eles acreditavam que “Lúcifer era considerado como o espírito que mora dentro do mecanismo humano. A Queda dos anjos foi corretamente compreendida para representar a encarnação da Divindade na carne mundana”. Explicando sobre o mito bíblico dos filhos de Deus e “as filhas dos homens”, ele diz que o mito compõe “... ainda outra tentativa de explicar o mistério por meio do qual a Divindade se tornou ligada a morte.” Como veremos mais adiante neste livro, o que foi mencionado tem uma influência em outro “filho de Deus” que encarnou na carne mundana.

É óbvio para todos, menos para aquele com baixíssima capacidade de percepção, que aqui o Grande Anjo Lúcifer, o Portador da Luz, representa uma figura típica de origem anterior ao Cristianismo, ou não-Cristã, totalmente desassociada com a personificação dualista de “mal” moral chamada de Satã pela Igreja. Até mesmo nas peças místicas medievais, nós encontramos a memória do prestígio exaltado do anjo rebelde.

Por exemplo, no círculo Chester de peças místicas, Lúcifer (sic) diz: “Nove ordens foram habilmente criadas, tu fizestes aqui de todo direito /Em tua glória o ser brilha / e eu o principal!, senhor, aqui em tua visão”. Isso se refere à supremacia dele diante das hierarquias dionisíacas embeleza, luz e conhecimento.

Para obter uma visão mais completa da intervenção angelical na evolução das espécies humanas, devemos nos dirigir para o texto original no mito enochiano em Charles (1912). Essa é a história da descida do Portador da Luz e da entrada dos anjos na matéria contada como um conto gnóstico da queda da alma na encarnação física, do cativeiro do espírito, no esquecimento da consciência profana, a transmissão do fogo de vivificação dos anjos na Terra Vermelha da Imortalidade e as origens supracelestes da civilização humana neste planeta: “E aconteceu que, quando os filhos dos homens se multiplicaram, naquele tempo nasceram entre eles belas e graciosas filhas. E os anjos, os filhos do Céu, viram-nas e cobiçaram-nas, dizendo uns aos outros: ‘Venham, vamos escolher esposas entre as filhas dos homens e gerar filhos para  nós ’. E esses eram os nomes de seus líderes: Semiazaz [Semyasa ou Azazel], o líder deles, Arakiba, Rameel, Kokabiel, Tamil, Ramiel, Danei, Ezeqeel, Baraqijal, Asael, Armaros, Batarel, Ananel, Zaqiel, Samsapeel, Satarel, Turel, Jomjael, Sarei.”

Novamente, as consequências dessa miscigenação divina entre as esferas dos anjos e dos mortais levaram ao nascimento dos Nephilim, os gigantes da Terra antiga, pois as “filhas dos homens” “ficaram grávidas e deram à luz gigantes enormes, cuja altura era de 3 mil varas”. Após isso, os anjos então introduziram gradualmente uma variedade de conhecimentos mágicos em seus filhos e esposas, supondo que a prática de poderes mágicos é uma herança própria do reino angelical, um legado dos “eternos segredos que estavam no Céu”.

Citando mais uma vez do Livro de Enoch: “E Azazel ensinou os homens a fazer espadas e facas, escudos e peitorais, e introduziu a eles os metais [da terra] e a arte de trabalhá-los, braceletes e ornamentos, o uso de antimonio [um elemento metálico delicado de cor branca prateada usado para fazer ligas], a ornamentação das pálpebras [com cosméticos], e todos os gostos de pedras preciosas, e todas as tinturas colorantes - Semjaza ensinou feitiços e mudas de raiz; Armaros, a resolução de feitiços [contra-magia]; Baraqijal, Astrologia; Kokabiel, as constelações; Ezeqeel, o conhecimento das nuvens [doutrina do clima]; Araqiel, os sinais da terra [geomancia]; Shamsiel, os sinais do Sol; e Sariel, o curso da Lua. ”

Há uma estrutura planetária claramente evidente nessa descrição dos anjos educadores. Azazel, o primeiro artesão de metais (cuja aparência mais recente é Tubalcaim, o primeiro ferreiro na Bíblia) e feiticeiro, que trabalhava com fogo, era associado com Marte (Madim) na tradição rabínica. Ele era o deus babilónico do fogo infernal e o Sol do mundo subterrâneo, Nergal. Juntamente com seus seguidores de Seirim satíricos, ou “Peludos” na demonologia judaica, ele também representa uma forma de Uz, divindade acadiana com chifres de bode. Semjaza, um nome alternativo para Azazel, mas tratado pelo Livro de Enoch como um anjo distinto, é o Senhor Luciferiano dos Feitiços. Ele se correlaciona com Vênus (Nogah) como a Estrela da Manhã, que era conhecida como Helel ben Shanar pelos os hebreus e se relaciona com a “Rainha dos Céus”, Ishtar. Baraqijal, aquele que ensina Astrologia, conecta-se com a esfera de Mazloth dos Caelum Stellatum e Kokabiel, que ensina a sabedoria das constelações, evidentemente vem do termo Kokab ou “luz estrelar”. Isso se refere em hebraico ao planeta Mercúrio, que por sua vez se compara ao escriba divino Nebo ou Nebu, “orador”, que escreveu os sinais dos céus no Shitir Shame ou Livro dos Deuses.

Araqiel, o instrutor em “os sinais da terra”, provavelmente corresponde a Shabbathai ou Saturno, de Sator, que significa “semear”, como o principal deus da Agricultura, Horticultura e Pecuária. O profeta Amos do Velho Testamento chama-o de “a estrela do deus Renta”, referindo-se a Renta, o termo egipcio para Saturno. Ezeqeel, que revela “o conhecimento das nuvens”, corresponde ao Rei dos Céus, Júpiter (Tzedek) ou o assírio Marduk. Shamsiel, cujo ramo de conhecimento é os mistérios solares, obviamente corresponde à esfera do Sol (Shemesh) e talvez seja derivado do grande Deus Sol dos babilonios, Shamash. Sariel, que instrui os humanos nos mistérios lunares, é o soberano da esfera lunar (Levenah) e pode ser urna forma do deus mesopotámico Zin ou Sin.

Mais tarde, na tradição mágica medieval e cabalística, os anjos planetários foram chamados de Miguel (Sol), Gabriel (Lúa), Rafael (Mercúrio), Samael (Marte), Sachiel (Júpiter) e Cassiel (Saturno). Na magia mais contemporánea, como novos planetas foram descobertos, outros anjos foram adicionados à lista. Esses são Uriel (Urano), Asariel (Netuno) e Azrael (Plutão).

No mito angelical dos Yazidis, que nós examinamos no Capítulo I, o Grande Anjo Melek Taus (o Rei Pavão) é relacionado com Azazel ou Azazil. Ele é descrito como uma Serpente Negra, a serpente primeira da sabedoria no Jardim do Éden. Seu outro epíteto divino é Lasifarus, a forma curda do Portador da Luz. Suas ligações com Marte são resumidas em seu pseudônimo hebraico, como anjo de Marte Zamael ou Samael, que também é identificado com a serpente edênica. Isso pode derivar do conceito egípcio do planeta Marte, como Rá Horakhty ou “Hórus Vermelho”, e se liga aos mistérios antediluvianos dos Servos ou Seguidores de Hórus. Eles eram a linhagem divina dos Shesu-Hor,8 que governaram o Egito pré-dinástico antes dos soberanos mortais.

Um importante ponto de comparação na compreensão do significado essencialmente gnóstico do mito enochiano do Vigia como a descida da alma para a matéria é oferecido pela antropogenia mística do tratado alexandrino do século I d.C. intitulado Poimandres, que é o Libellus I da coletânea hermética completa de textos místicos. Ele tem uma visão surpreendentemente vibrante da descida do Homem Divino para o reino de natureza material e fornece muitos pontos profundos de coerência, como urna chave para o mistério dos Vigias. O primeiro homem (Anthropos), sendo da espécie do Espirito ou Mente Divina, foi um ser imortal de vida (Zoé) e luz (Phos), o Humano de Essência Eterna. No relato hermético, estimulado pelo impulso criativo, o Anthropos divino descendia da mais alta esfera de Espírito/Mente. Ele irrompeu o circuito estelar e o planetário e, ao observar o dominio terrestre da matéria (Hylé), foi seduzido pela beleza meditativa da natureza (Physis). “Amor Insaciável” atraiu o Humano Divino para a Mulher Escura da natureza que, “quando apanhou aquele por quem ela era apaixonada, o envolveu em seu abraço e eles se tornaram um; pois estavam apaixonados”.

Desde então, diz o texto hermético, do Anthropos: “Ele é imortal e tem todas as coisas em seu poder; mesmo assim ele sofre a sina de um mortal, ao estar sujeito ao destino.” Nesse sentido, como entendido pelos filósofos do mundo clássico, destino ou Parcas eram as deusas supremas que controlavam os assuntos humanos. Na “descida para a matéria”, o Anthropos entrou no domínio condicional de criação e dissolução da causalidade, o reino inexorável do Tempo sobre as coisas mortais, como representado pelo domínio inevitável dos corpos luminosos zodiacais e planetários, os “Sete Administradores”, adotando dimensão material como moradia.

Dessa união do espírito com a matéria, os “sete humanos”, correspondendo aos governantes planetários, se originaram. Então a vida (Zoe) do Humano Divino tomou-se a psique, a luz (Phos) tomou-se evidente na Mente (Espírito) de humanos encamados. O estudioso renascentista dr. Francés A. Yates comentou com grande discernimento sobre a descida: “A queda do homem hermético é mais parecida com a queda de Lúcifer que com a queda de Adão” (1969:27). Na descrição de Trismegisto sobre a queda da luz divina (Phos) para a matéria, talvez seja útil lembrar que o termo grego Phosporos é equivalente ao termo latino “Lucifer” e, como um epíteto da Estrela da Manhã, significa o “portador da luz”. O ocultista e membro da Ordem Hermética da Aurora Dourada,9 do século XIX, Arthur Edward Waite, ao se referir aos entalhes no Arco de Constantino, comenta sobre a representação jovial de “umAnjo, segurando urna tocha e supostamente representando a Estrela da Manhã ou Lúcifer, emergindo das nuvens - representadas por um véu em volta dele (...) De um ponto de vista maçônico, o símbolo em seu significado perfeito é o surgimento da luz vitoriosa.

O caminho para a iniciação suprema nos Mistérios Herméticos é a ascensão gnóstica do iniciado liberto por meio das esferas, livrando-se das influências impuras do dominio material no retomo ao estado primário de autoluminosidade do Ser Divino: “Se, então, sendo feito de Vida e Luz, você aprender que é feito delas, você voltará para a Vida e Luz”. O problema existencial da humanidade “caída” é definido nos termos da ignorância da nossa verdade, da natureza que não tem início e é imortal, da identificação errada e confusa com o mundo provisório de aparências materiais, da conseqüente limitação, amnésia e sofrimento sentido nele. A chave para a libertação e “regeneração” mística encontra-se interiormente, por meio da compreensão de nossa essência pura, no domínio da gnose ou conhecimento transcendental.

Com isso, existe uma antiga e difundida ligação entre luminosidade e a semente humana na tradição esotérica ocidental, a descida da “semente luminosa do Céu” pode marcar a transmissão do espírito nas trevas fenomenais da natureza material. No entanto, a tradição esotérica ensina-nos que, mesmo no nosso estado de “caídos”, a humanidade não está sozinha. Pois Adão é “admitido na sociedade dos Sete Governadores [regentes angelicais planetários] que o amam e transmitem a ele seus poderes.” Na verdade, Adão é “mais que humano; ele é divino e integrante da raça dos demônios estrelas, os divinamente criados governantes do reino dos mortos. Dizem até que ele é ‘irmão ’ do criativo Criador do Mundo - ‘Filho de Deus’, o ‘segundo deus’que move as estrelas.” (Yates, 1969:27)

Se levarmos em conta as raízes indo-iranianas da Angelologia no culto dos Yazatas e no conceito de Xvarenah, o nimbo iluminado de soberania mágica divinamente lançada, alguns aspectos da doutrina mágica a respeito da redenção do “Homem da Luz” poderão ajudar nossa compreensão da Hermética Luciferiana embutida na gnose dos anjos caídos. Na Pérsia antiga, aquele que se iniciava na magia se esforçava para atingir o estado de “purificação luminosa” ou “separação” (apecakih) da Essência Iluminada de Xvarenah, o Farr I Yazdan, do estado de consciência do corpo profano.

Quando está em transfiguração suprema, a “Grande Luz surge como se estivesse saindo do corpo, e brilhará continuamente sobre a Terra”. Isso foi resumido pelo estado mental espiritual chamado de maga na língua dos medos. Essa é a raiz da palavra grega magos e da latina magus, que significam mágico. Nesse estado mental, a essência espiritual (menok) separa-se do corpo físico e assume a natureza dos Amesha-Spenta, os arcangélicos “Imortais Bondosos”. Na gnose elevada, chamada de maga, o mago vive e trabalha no nível arcangélico. Ele ou ela literalmente tomase um arcanjo e tem como característica um poder mágico milagroso (xshathra), uma visão-consciência onisciente (cisti, o cognato da palavra sánscrita Cit ou “pura consciência”) e a compreensão da liberdade soberana e incondicional da “vontade pura” (axvapecak), tendo conseguido a transfiguração mística (frashkart) para o “’Corpo Perfeito de Luz”.

É com interesse histórico que notamos a difusão dos ensinamentos mágicos relativos à Xvarenah, aos Amesha-Spentas e ao Homem da Luz em direção ao Ocidente para formar o núcleo central da Angelologia hermética, a magia divina do Ocidente. Eles também se espalharam simultaneamente do Oriente, do antigo Império Persa, até as regiões além do Himalaia. Ali eles permearam os cultos Xamânicos lamaicos pré-budistas no Tibete, Butão e Nepal, chamados de Bon, com a adoração deles por gShen-lha-od-dkar (o Deus Shen da Luz Branca) e a veneração das Divindades Iluminadas (Lha). Eles também formaram alguns conceitos centrais em relação à Bodhicitta nas ações mágicas do “Veículo do Raio” ou o tantra budista de Vajrayana. Traços de influência de Yazatas nas regiões do Himalaia são identificados pelo fato de alguns textos do culto Bon parecerem na verdade ser traduções de originais persas.

Para voltar ao mito gnóstico hermético da “queda” da semente luminosa Luciferiana da sabedoria perfeita ou Luz Angelical (Lux Angelicae) nas condições encamadas de existência material e de sua liberação final, veremos que existem certas correntes do esoterismo dos Yazidis, indo- iranianos e greco-romanos que tratam desse enigma.

O primeiro versículo do Livro Negro dos Yazidis descreve como, na criação, “...Deus criou a Pérola Branca de Sua mais preciosa essência, e criou um pássaro chamado de Anphar. Ele colocou a Pérola nas costas dele e ali ela ficou por quarenta mil anos.” (Furlani, 1975:9) Da mesma forma, o “fogo divino” seminal do misticismo iraniano, a Xvarenah, foi transportado ao xá terrestre, quando ele foi investido no trono do pavão pelo Varaghna, uma variante do milagroso pássaro chamado saena ou simurgh. É importante notar que, nas tradições Sufistas indo-persas, o simurgh se tomou símbolo do “mais alto elemento divinamente espiritual no homem” e foi importante nas formas artísticas indianas durante o século XVII. Também relacionado com esse conjunto mágico, está o Falcão Branco dos círculos místicos dos Yaresan, que traz a semente luminosa real para a Terra no intuito de inseminar a virgem mortal Dayerak e o pássaro sagrado Anqa da Arábia, cuja moradia é na montanha coroada de esmeralda, o Pico de Kaf.

Todos esses pássaros sagrados, portadores celestiais da semente cósmica do Senhor da Luz, são espécies da fênix original ou pássaro Bennu dos mistérios antigos egípcios. O Papiro deNebseni fala a respeito dele: “Eu apareço como o pássaro Bennu, a Estrela da Manhã de Rá (o deus sol)”. Esse pássaro lendário ou era uma garça ou um grou e pode ser comparado ao lendário pássaro gigante árabe chamado de a Roca, que foi mencionada em As mil e uma noites e Sindba, O Marujo. Nos hieróglifos egípcios, a Fênix podería representar o Akh, como um sinal de transformação mágica, os Akhu sendo os Iluminados ou Imortais que vivem além das estrelas circumpolares dos céus do norte. AFênix- Akh simboliza um conceito ligado aos Fravashi persas, a “superalma” ou natureza angelical e espiritual dos seres humanos. No ensinamento egípcio hermético, a Fênix voou na aurora do Tempo de uma Ilha do Fogo além dos céus trazendo para baixo o nume mágico (Hike) nos círculos de tempo-espaço terrestres. O historiador, viajante e também escritor grego Heródoto registrou que a fênix supostamente aparecería em Heliópolis a cada quinhentos anos e veio da Arábia. Mitológicamente, ela veio “¿/o lugar da luz eterna além dos limites do mundo, onde os Deuses nasceram ou despertaram-se e de onde eles foram lançados para o mundo”. Ela representava Osíris e o Logos, ou Palavra de Deus, que servia como mediadora entre a Mente Divina e a criação. (Buaval e Gilbert, 1994: 197-200)

Essa é a semente divina de Luz identificada com a meteórica Ben- Ben, a pedra piramidal dourada preservada no complexo de templos de Heliópolis na Mansão da Fênix que dizem ter caído do céu, em uma época remota. Na verdade, ela era chamada de “a pedra que caiu do sol”. Tais pedras meteóricas eram consideradas presentes dos deuses das estrelas em tempos antigos. Benu ou Bennu veio do radical egípcio “ben” e era associada à relação sexual, fertilização e semeadura. Por isso, a palavra egípcia Bn significa “semear, inseminar”, a palavra Weben, “brilhar”, e a palavra hebraica lingüisticamente relacionada Ben, “progênie, semente, filho”, uma nuance sutil que está provavelmente presente no nome oficial dos anjos caídos. Eles são chamados de Bene-ha-Elohim ou Filhos de Deus, a adamantina “semente dos Deuses”, como Elohim em hebraico é pluralista. A descida daquela essência divina é a história esquecida da encarnação da alma na matéria.