quinta-feira, 1 de junho de 2023

Luciferianismo - Magia Angelical do Oriente

Como devemos interpretar corretamente e, com isso, compreender inteiramente o significado daquelas lendas antigas e enigmáticas relacionadas com a Queda dos anjos relatada no Velho Testamento da Bíblia judaico-cristã e nas Escrituras apócrifas? De que maneira essas referências e mitos enigmáticos e misteriosos possuem a Alta Magia Angelical do Oriente, e quais verdades elas possuem para transmitir àquele que busca a magia nos dias de hoje? As respostas que essas perguntas fornecem são singularmente esclarecedoras e permitem que tenhamos relances extraordinários da história secreta do desenvolvimento evolucionário inicial da humanidade e do desprendimento do estado instintivo animal na pré-história.

O relato bíblico da descida dos anjos é limitado a alguns versículos crípticos no Gênesis: “Como foram se multiplicando os homens na terra, e lhes nasceram filhas, vendo os filhos de Deus que as filhas dos homens eram formosas, tomaram para si mulheres, as que, entre todas, mais lhe agradaram.” (6:1-2)5

As conseqüências notáveis desse relacionamento incomum entre anjos e a humanidade são relatadas adiante no nascimento da raça gigante antediluviana chamada de Nephilim. “Ora, naquele tempo havia gigantes na terra; e também depois, quando os filhos de Deus possuíram as filhas dos homens, as quais lhes deram filhos; estes foram valentes, varões de renome, na antiguidade.” (6:4).

Nas Escrituras canônicas ortodoxas, esse é o único fragmento que sobreviveu, e suas implicações místicas até agora têm sido deliberadamente evitadas por especialistas bíblicos, teólogos e membros do clero. Um relato mais completo do acontecimento estava no então perdido etiópico Livro de Enoch,6 7 que foi preservado no enclave da Igreja Abissínia. Acredita-se que o explorador escocês James Bruce trouxe pela primeira vez uma tradução para a Europa no fim do século XVIII. No entanto, uma cópia de um volume chamado o Livro de Enoch é catalogada como um dos livros do acervo da famosa biblioteca ocultista de Abbot Trithemus, de Würzburg, no século XV. Outros volumes interessantes na biblioteca incluíam o Livro de Raziel, o Livro de Hermes e vários grimórios mágicos atribuídos ao Rei Salomão. (Couliano, 1987:167)

Na edição de outubro de 1999 do Jerusalem Report, foi publicado um relato sobre a descoberta do supostamente chamado Pergaminho do Anjo,1 que parece estar ligado ao Livro de Enoch. Escrito em uma mistura de hebraico, aramaico e grego, esse documento foi achado na Jordânia, sudeste do Mar Morto, escondido dentro de um jarro em uma caverna. Diz-se que ele foi secretamente comprado na década de 1970 por um grupo de monges beneditinos, que levaram o pergaminho clandestinamente para um mosteiro na fronteira entre a Áustria e Alemanha. Lá ele permaneceu por mais de uma década enquanto era traduzido. Conforme se alega, o texto, similarmente ao Livro de Enoch, descreve uma excursão ao Céu conduzida por um anjo Vigia. Todos “os segredos do Céu” são mostrados ao autor do Pergaminho do Anjo e também lhe é ensinado como ver sinais no Sol, na Lua e nas estrelas para prever o futuro (Astrologia). Além disso, ele aprende a doutrina do estado atmosférico, escrita, o uso de plantas e pedras (cristais?) para curar doenças e prever eventos futuros e o método de viajar no tempo. O Pergaminho do Anjo refere-se a Deus pelo nome canaanita de El e a Satanás pelo nome de Beliel, literalmente “fogo ou luz de Deus”. O pergaminho é dedicado a Yeshua (a forma hebraica de Jesus!), que é descrito como “o Sagrado” e como o filho de um sacerdote. Foi recentemente sugerido que José, o pai de Jesus, pode ter sido na verdade um sacerdote no templo de Jerusalém (reportagem do site na internet de Andrew Collins 24/01/00).

James Bruce não hesitou em descrever o Livro de Enoch como uma “escritura gnóstica”, e acredita-se que ele data entre os anos 165 a.C. e 100 d.C. Essa foi uma percepção mais apurada que aquela da maioria dos analistas clericais, que persistem em conclusões vagas e moralistas sobre o documento. A tradução do texto por Bruce forneceu apenas a confirmação literária da corrente altamente sigilosa e misteriosa dos mistérios angelicais transmitidos ao longo dos séculos em alguns cultos e círculos esotéricos na Europa. Bruce era uma pessoa interessante, que não era quem parecia ser superficialmente. Era um aristocrata escocês de sangue real que dizia descender de Robert the Bruce. Era um estudioso clássico e bíblico e um maçom importante. Como um maçom escocês, foi alegado que ele teve algum contato com os cavaleiros templários maçôni- cos. (Collins, 1996:12) Em sua função de explorador, Bruce partiu em 1768 para tentar descobrir a nascente do Nilo. Foi sugerido que essa era apenas uma mentira para esconder sua verdadeira missão, que era encontrar documentos antigos e tesouros escondidos ligados aos chamados Judeus Negros da Etiópia.

No Livro de Enoch, o profeta do Velho Testamento tem uma visão do Céu e, em desacordo com o Pergaminho do Anjo, é levado a uma visita guiada ao Céu pelo Arcanjo Rafael, que, como nos é dito, é um dos mocinhos que não se rebelaram contra Deus. No entanto, Enoch encontra os Grigori, que são descritos como gigantes guerreiros de forma humana e “guardiões do mundo”. Grigori significa “vigias” e se refere à função deles em zelar pelo mundo. Quando o curioso Enoch pergunta sobre a natureza dos Grigori, lhe contam que eles e o príncipe deles Satanael viajaram para a Terra e chegaram ao Monte Ermon ou Hermon. Diz-se que eles viram as “filhas dos homens” e as tomaram como suas esposas, como é descrito no relato do Gênesis. Em tempos romanos, o Monte Hermon era o local de um santuário ao deus com pemas de bode Pan. Ele foi construído em volta de uma caverna e uma fonte natural, que era a nascente do Rio Jordão.

No centro das lendas da Guerra no Céu, quando Lúcifer se rebelou contra Deus, foi derrotado pelo Arcanjo Miguel e expulso do Céu, e também na descida dos anjos caídos encontram-se urna diamonosofia gnóstica e uma antropogénese misteriosa. O Grande Anjo da Luz e sua corte eleita desceram e se sacrificaram ao tomarem-se matéria para ajudar a evolução psíquica e espiritual da humanidade primitiva. Os humanos primitivos estavam mergulhados profundamente na matéria. A consciência deles era ainda mais turva que a de hoje e limitada ao nivel automático e instintivo da vida animal. Atarefa dos anjos caídos era a de literalmente redimir e libertar os humanos de sua prisão material. Ensinamentos esotéricos descrevem que, quando o organismo humano eventualmente transpôs e se diferenciou de milhões de predecessores nos géneros vegetal, réptil e mamífero, ele ainda era desprovido da luz verdadeira da consciência autocompreendida. Ele ainda estava preso ao “sono” dentro das trevas do Universo material.

A revolta angelical foi um sacrifício de proporções prometéicas, no qual os anjos se encarnaram dentro da dimensão material de tempo e espaço no intuito de conduzir a semente luminosa da gnose para dentro dos seres humanos. Eles se dotaram da sua capacidade inata de realizar a divindade para conseguir a liberdade dos limites da existência material. Os anjos caídos, de acordo com a doutrina oculta, não eram malignos ou “pecaminosos”. Pelo contrário, eles eram avatares transcendentais da salvação espiritual e eventual redenção da humanidade por meio da gnose. Eles “revelaram os segredos eternos que estavam no Céu, segredos que os homens estavam se empenhando para aprender”. Os Ben Elohim, ou Filhos de Deus, eram então os portadores da iluminação divina para o dormente “Adão do Barro Vermelho”, o humano mergulhado na matéria. Eles permitiram que ele acordasse para o conhecimento de seu destino e seus poderes verdadeiros como um ser espiritual não por acidente, revelando o “Adão de Diamante” mencionado dos textos gnósticos cópticos; a essência imortal de nossa verdadeira existência, além de todos os mundos condicionais. A redenção da matéria negra (hylé) pela transmissão da LuxAngelicae ou Luz Angelical era o objetivo dos Vigias ao descer no plano terreno. Amissão deles foi planejada para levar a liberação eventual de todas as entidades e, no final, a elevação de todo o mundo para seu estado paradisíaco original.

E.W. Liddell (1994) escreveu sobre a interpretação desse mito pela quase maçônica organização Compagnons Du Tour ou os Companheiros da Torre (de Babel) na França medieval, que eram responsáveis por ajudar na construção das grandes catedrais góticas. Ele observa que eles acreditavam que “Lúcifer era considerado como o espírito que mora dentro do mecanismo humano. A Queda dos anjos foi corretamente compreendida para representar a encarnação da Divindade na carne mundana”. Explicando sobre o mito bíblico dos filhos de Deus e “as filhas dos homens”, ele diz que o mito compõe “... ainda outra tentativa de explicar o mistério por meio do qual a Divindade se tornou ligada a morte.” Como veremos mais adiante neste livro, o que foi mencionado tem uma influência em outro “filho de Deus” que encarnou na carne mundana.

É óbvio para todos, menos para aquele com baixíssima capacidade de percepção, que aqui o Grande Anjo Lúcifer, o Portador da Luz, representa uma figura típica de origem anterior ao Cristianismo, ou não-Cristã, totalmente desassociada com a personificação dualista de “mal” moral chamada de Satã pela Igreja. Até mesmo nas peças místicas medievais, nós encontramos a memória do prestígio exaltado do anjo rebelde.

Por exemplo, no círculo Chester de peças místicas, Lúcifer (sic) diz: “Nove ordens foram habilmente criadas, tu fizestes aqui de todo direito /Em tua glória o ser brilha / e eu o principal!, senhor, aqui em tua visão”. Isso se refere à supremacia dele diante das hierarquias dionisíacas embeleza, luz e conhecimento.

Para obter uma visão mais completa da intervenção angelical na evolução das espécies humanas, devemos nos dirigir para o texto original no mito enochiano em Charles (1912). Essa é a história da descida do Portador da Luz e da entrada dos anjos na matéria contada como um conto gnóstico da queda da alma na encarnação física, do cativeiro do espírito, no esquecimento da consciência profana, a transmissão do fogo de vivificação dos anjos na Terra Vermelha da Imortalidade e as origens supracelestes da civilização humana neste planeta: “E aconteceu que, quando os filhos dos homens se multiplicaram, naquele tempo nasceram entre eles belas e graciosas filhas. E os anjos, os filhos do Céu, viram-nas e cobiçaram-nas, dizendo uns aos outros: ‘Venham, vamos escolher esposas entre as filhas dos homens e gerar filhos para  nós ’. E esses eram os nomes de seus líderes: Semiazaz [Semyasa ou Azazel], o líder deles, Arakiba, Rameel, Kokabiel, Tamil, Ramiel, Danei, Ezeqeel, Baraqijal, Asael, Armaros, Batarel, Ananel, Zaqiel, Samsapeel, Satarel, Turel, Jomjael, Sarei.”

Novamente, as consequências dessa miscigenação divina entre as esferas dos anjos e dos mortais levaram ao nascimento dos Nephilim, os gigantes da Terra antiga, pois as “filhas dos homens” “ficaram grávidas e deram à luz gigantes enormes, cuja altura era de 3 mil varas”. Após isso, os anjos então introduziram gradualmente uma variedade de conhecimentos mágicos em seus filhos e esposas, supondo que a prática de poderes mágicos é uma herança própria do reino angelical, um legado dos “eternos segredos que estavam no Céu”.

Citando mais uma vez do Livro de Enoch: “E Azazel ensinou os homens a fazer espadas e facas, escudos e peitorais, e introduziu a eles os metais [da terra] e a arte de trabalhá-los, braceletes e ornamentos, o uso de antimonio [um elemento metálico delicado de cor branca prateada usado para fazer ligas], a ornamentação das pálpebras [com cosméticos], e todos os gostos de pedras preciosas, e todas as tinturas colorantes - Semjaza ensinou feitiços e mudas de raiz; Armaros, a resolução de feitiços [contra-magia]; Baraqijal, Astrologia; Kokabiel, as constelações; Ezeqeel, o conhecimento das nuvens [doutrina do clima]; Araqiel, os sinais da terra [geomancia]; Shamsiel, os sinais do Sol; e Sariel, o curso da Lua. ”

Há uma estrutura planetária claramente evidente nessa descrição dos anjos educadores. Azazel, o primeiro artesão de metais (cuja aparência mais recente é Tubalcaim, o primeiro ferreiro na Bíblia) e feiticeiro, que trabalhava com fogo, era associado com Marte (Madim) na tradição rabínica. Ele era o deus babilónico do fogo infernal e o Sol do mundo subterrâneo, Nergal. Juntamente com seus seguidores de Seirim satíricos, ou “Peludos” na demonologia judaica, ele também representa uma forma de Uz, divindade acadiana com chifres de bode. Semjaza, um nome alternativo para Azazel, mas tratado pelo Livro de Enoch como um anjo distinto, é o Senhor Luciferiano dos Feitiços. Ele se correlaciona com Vênus (Nogah) como a Estrela da Manhã, que era conhecida como Helel ben Shanar pelos os hebreus e se relaciona com a “Rainha dos Céus”, Ishtar. Baraqijal, aquele que ensina Astrologia, conecta-se com a esfera de Mazloth dos Caelum Stellatum e Kokabiel, que ensina a sabedoria das constelações, evidentemente vem do termo Kokab ou “luz estrelar”. Isso se refere em hebraico ao planeta Mercúrio, que por sua vez se compara ao escriba divino Nebo ou Nebu, “orador”, que escreveu os sinais dos céus no Shitir Shame ou Livro dos Deuses.

Araqiel, o instrutor em “os sinais da terra”, provavelmente corresponde a Shabbathai ou Saturno, de Sator, que significa “semear”, como o principal deus da Agricultura, Horticultura e Pecuária. O profeta Amos do Velho Testamento chama-o de “a estrela do deus Renta”, referindo-se a Renta, o termo egipcio para Saturno. Ezeqeel, que revela “o conhecimento das nuvens”, corresponde ao Rei dos Céus, Júpiter (Tzedek) ou o assírio Marduk. Shamsiel, cujo ramo de conhecimento é os mistérios solares, obviamente corresponde à esfera do Sol (Shemesh) e talvez seja derivado do grande Deus Sol dos babilonios, Shamash. Sariel, que instrui os humanos nos mistérios lunares, é o soberano da esfera lunar (Levenah) e pode ser urna forma do deus mesopotámico Zin ou Sin.

Mais tarde, na tradição mágica medieval e cabalística, os anjos planetários foram chamados de Miguel (Sol), Gabriel (Lúa), Rafael (Mercúrio), Samael (Marte), Sachiel (Júpiter) e Cassiel (Saturno). Na magia mais contemporánea, como novos planetas foram descobertos, outros anjos foram adicionados à lista. Esses são Uriel (Urano), Asariel (Netuno) e Azrael (Plutão).

No mito angelical dos Yazidis, que nós examinamos no Capítulo I, o Grande Anjo Melek Taus (o Rei Pavão) é relacionado com Azazel ou Azazil. Ele é descrito como uma Serpente Negra, a serpente primeira da sabedoria no Jardim do Éden. Seu outro epíteto divino é Lasifarus, a forma curda do Portador da Luz. Suas ligações com Marte são resumidas em seu pseudônimo hebraico, como anjo de Marte Zamael ou Samael, que também é identificado com a serpente edênica. Isso pode derivar do conceito egípcio do planeta Marte, como Rá Horakhty ou “Hórus Vermelho”, e se liga aos mistérios antediluvianos dos Servos ou Seguidores de Hórus. Eles eram a linhagem divina dos Shesu-Hor,8 que governaram o Egito pré-dinástico antes dos soberanos mortais.

Um importante ponto de comparação na compreensão do significado essencialmente gnóstico do mito enochiano do Vigia como a descida da alma para a matéria é oferecido pela antropogenia mística do tratado alexandrino do século I d.C. intitulado Poimandres, que é o Libellus I da coletânea hermética completa de textos místicos. Ele tem uma visão surpreendentemente vibrante da descida do Homem Divino para o reino de natureza material e fornece muitos pontos profundos de coerência, como urna chave para o mistério dos Vigias. O primeiro homem (Anthropos), sendo da espécie do Espirito ou Mente Divina, foi um ser imortal de vida (Zoé) e luz (Phos), o Humano de Essência Eterna. No relato hermético, estimulado pelo impulso criativo, o Anthropos divino descendia da mais alta esfera de Espírito/Mente. Ele irrompeu o circuito estelar e o planetário e, ao observar o dominio terrestre da matéria (Hylé), foi seduzido pela beleza meditativa da natureza (Physis). “Amor Insaciável” atraiu o Humano Divino para a Mulher Escura da natureza que, “quando apanhou aquele por quem ela era apaixonada, o envolveu em seu abraço e eles se tornaram um; pois estavam apaixonados”.

Desde então, diz o texto hermético, do Anthropos: “Ele é imortal e tem todas as coisas em seu poder; mesmo assim ele sofre a sina de um mortal, ao estar sujeito ao destino.” Nesse sentido, como entendido pelos filósofos do mundo clássico, destino ou Parcas eram as deusas supremas que controlavam os assuntos humanos. Na “descida para a matéria”, o Anthropos entrou no domínio condicional de criação e dissolução da causalidade, o reino inexorável do Tempo sobre as coisas mortais, como representado pelo domínio inevitável dos corpos luminosos zodiacais e planetários, os “Sete Administradores”, adotando dimensão material como moradia.

Dessa união do espírito com a matéria, os “sete humanos”, correspondendo aos governantes planetários, se originaram. Então a vida (Zoe) do Humano Divino tomou-se a psique, a luz (Phos) tomou-se evidente na Mente (Espírito) de humanos encamados. O estudioso renascentista dr. Francés A. Yates comentou com grande discernimento sobre a descida: “A queda do homem hermético é mais parecida com a queda de Lúcifer que com a queda de Adão” (1969:27). Na descrição de Trismegisto sobre a queda da luz divina (Phos) para a matéria, talvez seja útil lembrar que o termo grego Phosporos é equivalente ao termo latino “Lucifer” e, como um epíteto da Estrela da Manhã, significa o “portador da luz”. O ocultista e membro da Ordem Hermética da Aurora Dourada,9 do século XIX, Arthur Edward Waite, ao se referir aos entalhes no Arco de Constantino, comenta sobre a representação jovial de “umAnjo, segurando urna tocha e supostamente representando a Estrela da Manhã ou Lúcifer, emergindo das nuvens - representadas por um véu em volta dele (...) De um ponto de vista maçônico, o símbolo em seu significado perfeito é o surgimento da luz vitoriosa.

O caminho para a iniciação suprema nos Mistérios Herméticos é a ascensão gnóstica do iniciado liberto por meio das esferas, livrando-se das influências impuras do dominio material no retomo ao estado primário de autoluminosidade do Ser Divino: “Se, então, sendo feito de Vida e Luz, você aprender que é feito delas, você voltará para a Vida e Luz”. O problema existencial da humanidade “caída” é definido nos termos da ignorância da nossa verdade, da natureza que não tem início e é imortal, da identificação errada e confusa com o mundo provisório de aparências materiais, da conseqüente limitação, amnésia e sofrimento sentido nele. A chave para a libertação e “regeneração” mística encontra-se interiormente, por meio da compreensão de nossa essência pura, no domínio da gnose ou conhecimento transcendental.

Com isso, existe uma antiga e difundida ligação entre luminosidade e a semente humana na tradição esotérica ocidental, a descida da “semente luminosa do Céu” pode marcar a transmissão do espírito nas trevas fenomenais da natureza material. No entanto, a tradição esotérica ensina-nos que, mesmo no nosso estado de “caídos”, a humanidade não está sozinha. Pois Adão é “admitido na sociedade dos Sete Governadores [regentes angelicais planetários] que o amam e transmitem a ele seus poderes.” Na verdade, Adão é “mais que humano; ele é divino e integrante da raça dos demônios estrelas, os divinamente criados governantes do reino dos mortos. Dizem até que ele é ‘irmão ’ do criativo Criador do Mundo - ‘Filho de Deus’, o ‘segundo deus’que move as estrelas.” (Yates, 1969:27)

Se levarmos em conta as raízes indo-iranianas da Angelologia no culto dos Yazatas e no conceito de Xvarenah, o nimbo iluminado de soberania mágica divinamente lançada, alguns aspectos da doutrina mágica a respeito da redenção do “Homem da Luz” poderão ajudar nossa compreensão da Hermética Luciferiana embutida na gnose dos anjos caídos. Na Pérsia antiga, aquele que se iniciava na magia se esforçava para atingir o estado de “purificação luminosa” ou “separação” (apecakih) da Essência Iluminada de Xvarenah, o Farr I Yazdan, do estado de consciência do corpo profano.

Quando está em transfiguração suprema, a “Grande Luz surge como se estivesse saindo do corpo, e brilhará continuamente sobre a Terra”. Isso foi resumido pelo estado mental espiritual chamado de maga na língua dos medos. Essa é a raiz da palavra grega magos e da latina magus, que significam mágico. Nesse estado mental, a essência espiritual (menok) separa-se do corpo físico e assume a natureza dos Amesha-Spenta, os arcangélicos “Imortais Bondosos”. Na gnose elevada, chamada de maga, o mago vive e trabalha no nível arcangélico. Ele ou ela literalmente tomase um arcanjo e tem como característica um poder mágico milagroso (xshathra), uma visão-consciência onisciente (cisti, o cognato da palavra sánscrita Cit ou “pura consciência”) e a compreensão da liberdade soberana e incondicional da “vontade pura” (axvapecak), tendo conseguido a transfiguração mística (frashkart) para o “’Corpo Perfeito de Luz”.

É com interesse histórico que notamos a difusão dos ensinamentos mágicos relativos à Xvarenah, aos Amesha-Spentas e ao Homem da Luz em direção ao Ocidente para formar o núcleo central da Angelologia hermética, a magia divina do Ocidente. Eles também se espalharam simultaneamente do Oriente, do antigo Império Persa, até as regiões além do Himalaia. Ali eles permearam os cultos Xamânicos lamaicos pré-budistas no Tibete, Butão e Nepal, chamados de Bon, com a adoração deles por gShen-lha-od-dkar (o Deus Shen da Luz Branca) e a veneração das Divindades Iluminadas (Lha). Eles também formaram alguns conceitos centrais em relação à Bodhicitta nas ações mágicas do “Veículo do Raio” ou o tantra budista de Vajrayana. Traços de influência de Yazatas nas regiões do Himalaia são identificados pelo fato de alguns textos do culto Bon parecerem na verdade ser traduções de originais persas.

Para voltar ao mito gnóstico hermético da “queda” da semente luminosa Luciferiana da sabedoria perfeita ou Luz Angelical (Lux Angelicae) nas condições encamadas de existência material e de sua liberação final, veremos que existem certas correntes do esoterismo dos Yazidis, indo- iranianos e greco-romanos que tratam desse enigma.

O primeiro versículo do Livro Negro dos Yazidis descreve como, na criação, “...Deus criou a Pérola Branca de Sua mais preciosa essência, e criou um pássaro chamado de Anphar. Ele colocou a Pérola nas costas dele e ali ela ficou por quarenta mil anos.” (Furlani, 1975:9) Da mesma forma, o “fogo divino” seminal do misticismo iraniano, a Xvarenah, foi transportado ao xá terrestre, quando ele foi investido no trono do pavão pelo Varaghna, uma variante do milagroso pássaro chamado saena ou simurgh. É importante notar que, nas tradições Sufistas indo-persas, o simurgh se tomou símbolo do “mais alto elemento divinamente espiritual no homem” e foi importante nas formas artísticas indianas durante o século XVII. Também relacionado com esse conjunto mágico, está o Falcão Branco dos círculos místicos dos Yaresan, que traz a semente luminosa real para a Terra no intuito de inseminar a virgem mortal Dayerak e o pássaro sagrado Anqa da Arábia, cuja moradia é na montanha coroada de esmeralda, o Pico de Kaf.

Todos esses pássaros sagrados, portadores celestiais da semente cósmica do Senhor da Luz, são espécies da fênix original ou pássaro Bennu dos mistérios antigos egípcios. O Papiro deNebseni fala a respeito dele: “Eu apareço como o pássaro Bennu, a Estrela da Manhã de Rá (o deus sol)”. Esse pássaro lendário ou era uma garça ou um grou e pode ser comparado ao lendário pássaro gigante árabe chamado de a Roca, que foi mencionada em As mil e uma noites e Sindba, O Marujo. Nos hieróglifos egípcios, a Fênix podería representar o Akh, como um sinal de transformação mágica, os Akhu sendo os Iluminados ou Imortais que vivem além das estrelas circumpolares dos céus do norte. AFênix- Akh simboliza um conceito ligado aos Fravashi persas, a “superalma” ou natureza angelical e espiritual dos seres humanos. No ensinamento egípcio hermético, a Fênix voou na aurora do Tempo de uma Ilha do Fogo além dos céus trazendo para baixo o nume mágico (Hike) nos círculos de tempo-espaço terrestres. O historiador, viajante e também escritor grego Heródoto registrou que a fênix supostamente aparecería em Heliópolis a cada quinhentos anos e veio da Arábia. Mitológicamente, ela veio “¿/o lugar da luz eterna além dos limites do mundo, onde os Deuses nasceram ou despertaram-se e de onde eles foram lançados para o mundo”. Ela representava Osíris e o Logos, ou Palavra de Deus, que servia como mediadora entre a Mente Divina e a criação. (Buaval e Gilbert, 1994: 197-200)

Essa é a semente divina de Luz identificada com a meteórica Ben- Ben, a pedra piramidal dourada preservada no complexo de templos de Heliópolis na Mansão da Fênix que dizem ter caído do céu, em uma época remota. Na verdade, ela era chamada de “a pedra que caiu do sol”. Tais pedras meteóricas eram consideradas presentes dos deuses das estrelas em tempos antigos. Benu ou Bennu veio do radical egípcio “ben” e era associada à relação sexual, fertilização e semeadura. Por isso, a palavra egípcia Bn significa “semear, inseminar”, a palavra Weben, “brilhar”, e a palavra hebraica lingüisticamente relacionada Ben, “progênie, semente, filho”, uma nuance sutil que está provavelmente presente no nome oficial dos anjos caídos. Eles são chamados de Bene-ha-Elohim ou Filhos de Deus, a adamantina “semente dos Deuses”, como Elohim em hebraico é pluralista. A descida daquela essência divina é a história esquecida da encarnação da alma na matéria.