sexta-feira, 2 de junho de 2023

Luciferianismo - A Lanterna De Lilith

Um termo arcaico no folclore inglês e na poesia para a Lua é a Lanterna de Lilith. Mas quem exatamente foi Lilith? Por que ela era associada à Lua e qual sua conexão com Lúcifer? Para responder a essas perguntas devemos voltar mil anos no tempo, para quando ela era vista como um demônio vampiro feminino que roubava bebês de seus berços, seduzia os homens com sonhos eróticos e gerava uma raça de diabos. Na mitologia hebraica, Lilith era conhecida por muitos títulos, incluindo “bela donzela”, “o demônio”, “vampiro prostituta”, “o fantasma na noite”, “súcubo”, “rainha dos demônios”, “monstro noturno”, “mãe das bruxas” e “o mocho”. Esses nomes refletem a crença comum de que ela raptava bebês ou sugava o sangue e a energia vital deles, causava abortos em mulheres e coletava o sêmen ejaculado pelos homens durante sonhos eróticos ou masturbação para criar demônios e elementais.

Sem maior análise, Lilith parece ser uma figura consideravelmente desagradável, mas, como já vimos neste livro, as divindades da antiga religião se transformam em demônios pela nova religião. É verdade também que os livros de história são sempre escritos pelos vencedores e isso se aplica também aos livros de religião ou mitologia. Lilith não foi sempre um demonio noturno hebreu. Na mitologia suméria, ela é retratada por volta de 2000 a.C. como uma bela mulher nua e alada com pés de pássaro. Ela está vestindo uma touca ou gorro com chifres e está em pé sobre duas leoas. Comjas a ladeiam pelos dois lados. Na Suméria antiga, Lilith, Lilitu ou Lily foi a líder das Lilu, uma raça de vampiros femininos que foram as predadoras sexuais dos humanos. Elas eram espíritos do ar que habitavam no deserto e se manifestavam durante as tempestades. Dizem que essas entidades se alimentavam de mulheres grávidas e, como no mito hebraico, concebiam demônios ao roubar o sêmen de masturbadores e homossexuais. Lilith era a filha de Ninlil, a deusa dos cereais e do vento que deu à luz a Lua. Por essa razão, os poderes de Lilith eram maiores no período da lua minguante, “quando os cães da noite estão livres de suas correntes para vagar até a manhã”.

A Epopéia de Gilgamesh nos conta a história da deusa Inanna, a Rainha do Céu, e como ela encontrou o salgueiro sagrado nas margens do Eufrates que havia sido desarraigado em uma forte tempestade. A deusa resgatou a árvore caída e a replantou em seu jardim. Ela planejava usar a madeira para uma nova cama e um trono. Entretanto, depois que foi plantada, a árvore se recusava a crescer porque uma cobra havia se aninhado em suas raízes, o feroz pássaro do trovão Zu ouAnzu estava empoleirado em seus galhos e Lilith havia construído uma casa no seu tronco. Inanna estava abalada e em prantos pediu socorro ao herói semidivino Gilgamesh. Este matou a cobra e dermbou a árvore e, por isso, Zu e Lilith perderam seus lares. Lilith fez crescer asas de comja e voou para longe, amaldiçoando a deusa e o defensor dela. Inanna recompensa Gilgamesh com um presente Xamânico de um tambor e uma baqueta, ambos feitos da madeira da árvore de seus galhos superiores e raízes. Esse instrumento mágico permitia que ele se comunicasse com os deuses no Céu (os galhos superiores) e descendesse ao mundo subterrâneo (as raízes).

Alguns escritores compreenderam essa história como uma metáfora que representava o poder em declínio das deusas do Oriente Médio enquanto os patriarcas assumiam o controle. George diz: “O pássaro antigo e a deusa serpente que construíram seus lares na copa e na base da Arvore da Vida uniram céu e terra. Essa imagem continha o poder e o conhecimento presente no pássaro com asas de águia e face de leão e [a] sabedoria da renovação sexual expressa pela serpente” (1992:177).

Nesse mito acima, o pássaro do trovão Zu é extremamente urna figura Luciferiana/Prometéica. Ele é descrito como uma águia com cabeça de leão que provoca furacões no deserto ao bater suas asas. Como o deus Zu, vimos como ele roubou as Tábuas do Destino dos Deuses e tentou se apoderar da ordem cósmica. As Tábuas deram poder a Zu sobre o Universo porque elas controlavam o poder do destino, que geralmente era representado por urna deusa. Por ter ousado desafiar a ordem cósmica, o pássaro Zu foi morto por um raio, as tábuas foram devolvidas e a ordem cósmica foi restaurada ao estado normal. O pássaro do trovão é comparado ao pássaro Bennu, do mito egípcio, à fênix e á Roca árabe.

A associação de Lilith estar vivendo na Arvore do Mundo ou Arvore da vida com urna cobra e um pássaro tem certa significância mística. Andrew Collins acuradamente identifica o pássaro Zu com a lenda bíblica de Azazel e os Vigias e também com os ciclos estrelares ligados aos ciclos cósmicos do destino (1996:226-28/353-55). O motivo da águia, ou certo pássaro lendário, vivendo nos galhos de uma árvore sagrada com um dragão ou serpente em suas raízes pode ser encontrado do norte da Europa até o Oriente distante.

Os animais sagrados de Lilith eram gatos, corujas, cobras, bacurais e cães negros. Tanto Inanna quanto Ishtar eram conhecidas como as “Divinas Damas Comjas”, e esse pássaro é um símbolo duplo de sabedoria e morte nos mitos antigos. Na única referência bíblica a Lilith, diz-se que ela vive “em deserto desolado com feras selvagens, chacais e sátiros como companhia(Isaías 34:14) Os sátiros são, naturalmente, os seirim ou “peludos” que seguem o mestre deles, o deus bode Azazel.

Lilith era associada na Suméria a Ereshkigal, a irmã de Inanna, e na Babilônia a Ishtar (Vênus). Na Fenicia, ela era Baalat, a “Grande Dama”, e a consorte de Baal. Dizem que, quando Inanna conspirou para destronar Ereshkigal, ela se vestiu com suas melhores jóias. Ela então visitou a irmã no seu palácio, parecido com um labirinto em formato de uma teia de aranha e com sete portões. Ereshkigal descobriu que ela estava vindo e ordenou que seus guardas parassem Inanna em cada um dos portões e arrancassem algumas de suas jóias e roupas. Quando chegou ao centro do palácio, ela estava totalmente nua. Naquele instante, sua irmã mais nova fez com que ela fosse enforcada.

Os hebreus provavelmente encontraram Lilith pela primeira vez quando invadiram e ocuparam Canaã, pois naquele tempo o culto a ela já havia se estendido além de suas origens na Suméria. Na tradição Cabalística, Lilith foi a primeira esposa de Adão antes de Eva. Ele havia supostamente pedido a Javé que lhe desse uma companheira feminina, já que estava cansado de se masturbar e de ter relações sexuais com animais - ambas as práticas eram comuns entre os pastores do Oriente Médio, que geralmente tinham vidas solitárias. Tendo sido presenteado com uma companheira sexual, o mal-agradecido primeiro homem se ofendeu com as exigências de Lilith em ignorar a tradicional posição de missionário43 durante o ato sexual e deixá-la tomar o papel dominante. Quando Adão se opôs, Lilith perguntou: “Por que eu devo me deitar debaixo de você? Eu também sou feita de barro e por isso sou igual a você”. Em circunstâncias um pouco diferentes, Lúcifer tinha recusado as exigências de Deus para reverenciar e adorar sua criação Adão. O primeiro se mostrou um bom menino religioso depois de tudo e se recusou a ceder a Lilith. Em um ódio frustrado, dizem que Lilith se transformou em uma coruja e voou para o deserto para se tomar uma banida “viajante no deserto”.

Depois que Javé cedeu às exigências de Adão por uma nova parceira feminina e o casal foi expulso do Éden, Lilith retomou do deserto. Embora Adão fosse abstêmio naquele momento, Lilith usou as ejaculações noturnas dele para criar uma raça de demônios e gigantes. Aliás, dizem que Lilith gerou a raça de fadas e elfos que eram considerados pelas religiões ortodoxas patriarcais como demônios. Os antigos hebreus, como certos cristãos puritanos que vieram depois, parecem ter tido um preocupação peculiar com a masturbação e outras formas de sexo não reprodutivo. Por exemplo, quando Javé viu homens “derramando suas sementes em árvores e rochas” ele os puniu por sua perversidade. Na realidade, essa prática parece com ritos de fertilidade em que a energia sexual estava sendo oferecida aos objetos naturais que supostamente estavam imbuídos de forças divinas.

Na propaganda patriarcal judaica, Lilith era temida por causa de sua independência sexual da dominação masculina, sua poderosa sexualidade e seu poder sobre os homens. A palavra Lilith vem da palavra hebraica Layil, que significa “noite”, e a palavra suméria Lil, que significa “vento” ou “morte”. Quase literalmente, ela é a Dama do Ar e “a morte que vem no vento da noite”, uma companheira perfeita para Azazel ou Azrael, como o Anjo da Morte. Uma derivação alternativa para o nome déla vem do termo sumério-acadiano para “tempestade de areia”. Esse era o termo usado para os incansáveis espíritos presos à terra que viajavam ao vento e eram o “pó da terra”. (Baring e Cashford, 1991:50) Asphodel Pauline Long sugeriu que Lilith pode não ser o “demônio do vento da noite”, mas o primeiro “sopro de vida”. Ela chama a atenção para o fato de que, no mito da criação no Gênesis, Elohim ou deuses sopraram a vida dentro de Adão para que ele se tomasse uma alma viva (1992). Kathy Spurin considerou a energia de Lilith como fogo feminino - o fogo de caos e destruição que apressa as mudanças e os novos começos, necessários à evolução. Esse é um conceito Luciferiano e, como o seu outro eu masculino, ela é muito mais a “deusa de fora”, um exemplo de rebeldia, uma anarquista que se recusa a aceitar a ordem estabelecida e um espírito independente que traça o seu próprio caminho.

Lilith frequentemente foi considerada uma deusa por méritos próprios. Barbara Walker a vê sob esse prisma, como uma figura de “Grande Mãe” para os agricultores assentados que se indignaram com as invasões dos pastores nômades (1983:541). Supostamente os primeiros hebreus não gostavam da Grande Mãe porque ela bebeu o sangue de Abel, o pastor, depois que ele foi assassinado por Caim, o patrono da Agricultura e da arte de trabalhar em metais. O suposto primeiro assassinato foi associado a Lilith por meio de sua identificação com Naamá a Tecelã, irmã de Tubalcaim. Ela era às vezes conhecida como Lilith, a Jovem. Naamá era tão linda que ela podería até levar seu irmão Tubal (Azazel) para o mau caminho.

Lilith Babellon associa sua homônima aos mistérios praticados na ilha grega da Samotrácia, e isso novamente a associa a (Tubal) Caim da mesma forma. Nos ritos praticados na ilha, a deusa das trevas Hécate deu à luz espíritos vampirescos conhecidos como as Lâmias ou Lillim. Blavatsky descreve a raça demoníaca dos Cabari ou Kabari, que já mencionamos, como modelos culturais que ensinaram a humanidade a Agricultura e a arte de trabalhar com metais. Ela também os identifica com a raça gigantesca grega de deuses antigos conhecida como os Titãs e os sete regentes planetários (1893: 408-9). Knight diz que os Cabari eram “uma linhagem de antigas divindades do mundo subterrâneo e servos da Grande Mãe - que eram deidades marinhas e trabalhadores de metaF (1985:58). Adescrição deles como deidades marinhas provavelmente significa que eles eram urna face dos deuses antigos, que na mitologia antiga diziam que “habitavam nas profundezas”.

Huson descreve os Cabari como uma “raça misteriosa (...) resultante do primeiro acasalamento divino, e sob outra terminologia eles podem bem ser chamadas de elfos e bruxas..." (1972:100-101) Os gregos dividiam os Cabari em dois grupos de acordo com o sexo. Os femininos eram bruxas que lançavam feitiços e encantamentos, enquanto os masculinos eram ferreiros e trabalhadores de metal. Eles tinham o poder de quebrar os feitiços das Cabari femininas e se assemelham aos históricos “homens habilidosos”. Os Cabari masculinos foram, além disso, associados com à invenção do alfabeto e da Matemática.

Os masculinos também se especializaram no uso do bronze em vez do ferro. A partir desse material, eles moldaram a foice de Cronos-Satumo usada para castrar seu pai Urano, o tridente do deus do mar Poseidon- Netuno (o deus patrono de Atlântida), o raio de Zeus-Júpiter, o elmo da invisibilidade usado por Hades-Plutão e o cinturão de Vênus-Afrodite. O nome deles vem da palavra grega “kabeiroi ” e da palavra fenicia “qabirim” e significa os “Poderosos”. Blavatsky alega que Caim pertenceu aos Cabari e foi um “instrutor de toda arte profissional em latão e ferro". Ela também se refere aos “misteriosos trabalhadores de ferro de Rodes, eles foram os primeiros a levantar estátuas aos deuses, se guarnecerem com armas e terem homens versados nas artes mágicas". Ela acrescenta: “E não foram eles que foram destruídos pelo Dilúvio a comando de Zeus, como os Cainitas foram por Jeová". Dizem que os Cabari eram filhos do deus grego do fogo, trovão e arte de forjar metais Hefesto e, fisicamente, eles eram negros, deformados e anões. Hefesto foi retratado usando um chapéu cônico, copiado pelos Cabari. Eles vestiam um píleo ou gorro frigio pontudo que também era usado por Átis e Mithras. Também se tomou o símbolo do alquimista e do mago. Talvez não coincidentemente, chapéus pontiagudos também são associados a gnomos, elfos e duendes, que eram espíritos da terra.

Dizem também que Caim ou Qayin foi um metalurgista sumério. Laurence Gardner diz que ele aparece na história suméria como Arwi ’um, o rei de Kish e o filho de Masda. O nome Masda significa “como uma serpente” e Arwi’um vem da palavra hebraica para serpente. Masda ou Mazda, “lorde”, na Pérsia era Ahura Mazda ou o deus da luz. Ele também era chamado de Ormuzd, “a serpente de luz”. Gardner alega que a tradição de magia persa pode ser traçada a partir de Masda e Arwi’um/Caim, e eles foram os ancestrais de Zoroastro (1999:105-106). No livro sagrado dos Mandeístas, Lilith é a esposa de Mazda, o rei da luz e da gnose. Gardner alega que ele é o equivalente ao anjo hebreu Samael, que era o consorte angelical de Lilith. A irmã gêmea e também esposa de Caim era chamada Luluwa, que significa “pérola”, e ela também foi a mãe de Enoch (Gênesis 4:17). Dizem que Luluwa foi a filha de Lilith e Samael.

O demônio feminino Lilith realmente é uma deusa? George diz que a reputação repulsiva como uma assassina de bebês se refere ao ciclo menstruai feminino e ao lado escuro da Lua. Ela diz: “Quando Lilith estava em seu período menstrual era odiada por se recusar a servir os homens e conceber os seus filhos'” (1992). Isso é parte da reação patriarcal e de misoginia ao princípio feminino e, como Black Koltuv destaca: “Lilith é parte da Grande Deusa que foi rejeitada e banida no período pós-bíblico. Ela representa as qualidades do eu feminino que a Shekinah não possui. A primeira dessas qualidades é a consciência lunar, que é uma conexão aos ciclos da lua crescente e minguante, vida e morte e renascimento; e a deusa como donzela, mãe e anciã. Lilith, a Jovem, é Naamá, a donzela e sedutora. Lilith, a Antiga, é a assassina de bebês, bruxa e raptora. Enquanto a própria Lilith é a mãe das multidões miscigenadas, deusa da Vida e Morte, e a chama da espada giratória”. (1986:121)

No texto Cabalista do século XIII chamado de Zohar ou o Livro dos Esplendores, o ódio de Lilith por Javé deriva do fato de que ela foi criada como a “luz inferior” depois do Sol (Lucifer), visto por essa razão pela ortodoxia como seu rival. Na tradição oculta judaica, ela foi criada no mesmo momento que Adão ou antes dele. Ela era considerada, como seu companheiro angelical Samael, como uma faceta do “poder de Deus” e era retratada na Árvore da Vida como a sefirah Geburah. Samael e Lilith eram originalmente um ser andrógino. Eles eram considerados os Qlippoth, ou opostos demoníacos ao hermafrodita Adão-Eva.

Na astrologia esotérica, Lilith é a “Lúa negra” ou asteroide que o astrólogo Sepheriel alegou ter achado no começo do século XX orbitando entre a Terra e a Lua. Nesse aspecto, ela é às vezes conhecida como a “velha Lua” e supostamente antecede o nosso atual satélite. Em um mapa astral, a Lua negra Lilith é o eu paralelo da personalidade que nos impulsiona para a satisfação dos desejos próprios e, no final, para a autodestruição. Ela representa as estranhas influências, os desejos incontroláveis, as paixões e compulsões cegas que, às vezes, afetam nossas vidas de uma forma totalmente inesperada. Em um nível mais positivo, Lilith pode ser a educadora que nos ajuda a lidar com as experiências emocionais desagradáveis e a confrontar nossos piores medos. A astróloga Lynne Steele-Smith diz que a mensagem de Lilith é: “Abrace suas sombras. Então pegue o fio da sua vida e eu o guiarei do labirinto para a luz do autoconhecimento, o objetivo espiritual supremo”. Um conselho muito Luciferiano.

Outro aspecto positivo de Lilith, astrológicamente falando, é o seu papel como a “dama negra” ou musa que inspira poetas e escritores. Mesmo assim, sua influência pode ser uma faca de dois gumes. Robert Graves escreveu sobre sua faceta como a Deusa Branca, mas o poeta Peter Redgrove a viu como a Deusa Negra. Ela também pode ser a “mara44 da noite”, cujo abrigo no alto de uma árvore é repleto de ossos de poetas mortos, e ela pode trazer morte e loucura no seu despertar. Astronómicamente, a estrela fixa Algol (Beta Persei) foi associada a Lilith e às suas (às vezes) más influências nas vidas humanas. Seu nome significa “diabo” ou “demônio” em árabe e é associado a mortes violentas por enforcamento, decapitação (desmembramento), afogamento e envenenamento. Mas por outro lado Lilith é “a morte que vem no vento da noite” e a esposa de Samel- Azrael, o Anjo da Morte. Ele é um aspecto do princípio feminino que deveríamos respeitar e cruzarmos (especialmente homens) com ela por nossa conta e risco.

Por mais que fosse uma figura tão apavorante, um demônio, vampiro, assassina de bebês e agente da Morte, a carreira de Lilith acaba sob estranhas circunstâncias em uma nota singularmente culminante. Javé expulsou a Matronit-Shekinah, a face feminina do Criador Cósmico, e a substituiu por uma “mulher escrava do Egito”, ou seja, Lilith. Isso aconteceu depois da destruição do templo de Salomão e do exílio dos hebreus na Babilônia no final do século VI a.C. Isso sugere que Shekinah estava encerrada no templo ou na Arca da Aliança; Lilith como a Matronit- Shekinah é associada à sefirah Chokmah na Arvore da Vida. Essa esfera é a expressão de “sabedoria” da natureza quádrupla de YHVH ou Javé. Ela também é associada à Binah como a Mãe Negra do Mar Amargo, às vezes considerada a Abençoada Virgem Maria. Dizem que Chokmah, ou Sabedoria, está com Javé desde o começo da criação.

Gardner (1999:115) comparou Matronit com Anat ou Anath, a Rainha do Céu, e uma filha de Astarote, a consorte de Baal. De acordo com os Gnósticos Mandeístas: “Lilith conhece o segredo da escuridão e da luz, e [ela] une Céu e Inferno. Seu aspecto é aquele da sabedoriaOs gnósticos também disseram que, como Sabedoria, Lilith teve um papel importante em uma versão do mito da Grande Enchente. Ela interveio quando Javé ameaçou afogar toda a raça humana por ter parado de adorá-lo. Um texto gnóstico diz: “¿Yod e sua família foram salvos na arca por causa de uma centelha de luz que veio dela [Sabedoria], e por meio dela o mundo foi novamente enchido de seres humanos.” (Pageis, 1981:65)

Uma das partes mais interessantes e freqüentemente mal compreendida da lenda de Lilith é a criação da raça de demônios pelo contato sexual com humanos adormecidos. Como Lilith Babellon diz: “ Visto que Lilith e Samael não são de origem humana, há uma semente dentro da raça humana que pertence a outra ordem de evolução. Isso é conhecido por muitos nomes, incluindo demônios, elfos, fadas e ninfas. Lilith age desse modo como ‘Deusa Fada Mãe ’, conduzindo as almas élficas para evoluírem através das formas humanas em planos onde o simplório Adão não tem a imaginação para entrar”. R.J. Stewart alega que, quando Lúcifer “caiu” na Terra, os seres do reino das fadas caíram com ele (1992: 79). Ele alega: “A antiga Igreja Celta ensinava que Lúcifer atraiu muitos anjos com ele quando caiu na Terra, muito antes de a humanidade ser formada. Esses se tomaram as raças de fadas, os anjos da Mãe abaixo” (1995:80). Stewart descreveu a suposta Aliança de Três em Um ou a Redenção de Lúcifer. Essa é uma ação espiritual na tradição das fadas para unir as três ordens de existência - a humana, a das fadas e a angelical - que foram separadas na Queda.

Nos mitos de Arthur, que contêm muitos elementos Luciferianos, o nascimento de Merlin e sua sedução por Nimue em sua velhice simbolizam aspectos esotéricos dos casamentos de fada entre humanos e elfos. Na propaganda cristã, Myrddin ou Merlin é o produto da união de um diabo com uma freira. Despida da camada artificial cristã, essa união é o acasalamento entre um ser/deus angelical e uma sacerdotisa humana. Para apoiar esse pensamento, o cronista histórico Geoffrey de Monmouth descreve o pai do mago chefe como um ‘ jovem extremamente bonito que foi um da raça de espírito que existe entre a Lua e a Terra, e que chamamos de demônios íncubos. Eles têm uma natureza que tem partes de homens e de anjos, e eles conversam com mulheres mortais'".

A sedução de Merlin na velhice pela encantadora Nimue, a serva da élfica Dama do Lago, é outro exemplo de um casamento de fadas. Ao passo que em termos cristãos a queda de Merlin é vista como um ato negativo, Knight (1983:164-66) a vê como uma forma poderosa de redenção baseada na “magia antiga”. Ele diz: “Quando Nimue, a donzela da terra, aprender toda a sabedoria estrelar de Merlin, e Merlin aprender toda a sabedoria da terra de Nimue, os dois juntos partirão em um casamento cósmico em direção às estrelas, levando com eles os filhos da Terra". Isso é refletido nos contatos entre o Povo Bom e os humanos gravados nos julgamentos de bruxas. O resultado final desses encontros próximos de fadas é que o humano recebe conhecimento oculto sobre ervas e poderes psíquicos de seus amigos élficos. Com relação à morte de Merlin, sua prisão em uma ‘Torre de Vidro”, que certos relatos chamam de observatório, o associa à doutrina dos deuses antigos e vigias e o identifica com um deles.

A propaganda patriarcal ao longo dos séculos tem denegrido, humilhado e transformado em demoníacos os mitos de Lilith e seu consorte Lúcifer. Conceitos esotéricos como os casamentos entre humanos e a raça élfica têm sido malcompreendidos e mal-interpretados como pactos malignos com intermediários diabólicos anti-humanos. Na realidade, essas intervenções em nossa evolução planetária têm ajudado a raça humana a progredir e a se desenvolver tanto espiritualmente quanto materialmente. Esses contatos também nos ajudaram a manter acesa a chama pura da sabedoria e do conhecimento passado pela primeira vez para a humanidade pelos deuses antigos éons atrás.