quarta-feira, 18 de outubro de 2017

Templo do Vampiro


Aparentemente nem só de Satanismo vive Satã. Com a cisão da Church of Satan em 1975 e o sucesso dos grupos que começaram a surgir, o Satanismo deixou de ser apenas uma religião sinistra e abriu portas para algo até então aparentemente inédito. Uma nova estética religiosa. Não demorou muito para que novas crenças começassem a surgir, trazendo consigo não apenas a estética desenvolvida por LaVey, mas toda uma filosofia inspirada pelo espírito que ele libertou nos anos 1960.

Um desses grupos que logo ganhou notoriedade entre os ocultistas e simpatizantes do Caminho da Mão Esquerda veio para preencher uma lacuna criada em 1897 por Bram Stoker. Dentro da filosofia satânica original, Satã não passava de um arquétipo, uma figura mitológica, o que não o impedia de interferir de forma bem real em nosso mundo. Bram Stoker popularizou a imagem do vampiro que, tal qual Satã, foi injustiçada por quase um século. O Vampiro surgia como um aristocrata banido, um ser elitizado e marginalizado ao mesmo tempo. Uma criatura de magia, mas que não se preocupava em fazer o bem para outros. Uma criatura de trevas, poder, ódio. Assim não é surpresa que a inspiração de LaVey tocasse também este ser.

O Temple of the Vampire (Templo do Vampiro) não é propriamente uma organização satanista, mas sua história e filosofia esta tão intimamente ligadas com as organizações citadas anteriormente neste livro, que fica difícil não mencioná-la nesta história. Não existe uma filiação direta entre o Temple of the Vampire e a Church of Satan, mas as duas organizações desfrutam de apreciação pública mútua. Ambas permitem que seus membros participem de ambosos grupos - e o alto escalão, incluindo seus fundadores de fato participam. Entretanto pertencer a um dos grupos não significa necessariamente que a pessoa também participa, ou mesmo tem simpatia, com o outro. Tanto é que os dois grupos pedem que seus membros evitem mencionar juntas a Church of Satan e o Temple of Vampire para evitar que qualquer associação seja implicada diretamente por quem é de fora. 
Para entender a influência do Satanismo neste grupo, basta dar uma rápida lida n'O Credo do Vampiro, um dos textos base do Temple:

"Eu sou um Vampiro.

Eu adoro o meu ego e eu adoro minha vida, pois sou o único Deus que existe.

Eu tenho orgulho de ser um animal predador e eu honro meus instintos animais.

Eu exalto minha mente racional e não acredito que isso seja um desafio da razão.

Eu reconheço a diferença entre o mundo real e a fantasia.

Eu reconheço a fato de que a sobrevivência é a lei mais forte.

Eu reconheço que os Poderes da Escuridão escondem leis naturais através das quais eu posso fazer minha magia.

Eu sei que minhas crenças no ritual são uma fantasia, mas a magia é real e eu respeito e reconheço os resultados da minha magia.

Eu percebo que não há céu como não há inferno e vejo a morte como destruidora da vida.

Portanto eu tirarei o máximo proveito da vida aqui e agora.

Eu sou um Vampiro.

Curve-se diante de mim. "

Muitos Satanistas afirmam cinicamente que basta que você troque a palavra "Vampiro" por "Satanista" e você tem uma nova versão das Declarações Satânicas de LaVey. Mas isso não quer dizer que o Temple of Vampire seja uma versão cosplay da Church of Satan.

Perceba que o Templo do Vampiro foi fundado em 1989 e assim suponho que, por todo contexto do Pânico Satânico, seus fundadores resolveram se afastar do rótulo do diabo e como uma serpente, trocar de pele para tentar algumas coisas novas. Os livros de Anne Rice estavam na moda e o ser vampírico, elegante e bestial, predador e elitista, habitante das trevas e acima da humanidade parecia ser o modelo perfeito. É sintomático o fato de que nesta mesma época Zeena LaVey, aquela filhinha do LaVey que passou pelo batismo satânico, e Nikolas Schreck , seu esposo, fundaram a "Werewolf Order" (Ordem do Lobisomem) explorando as implicações da besta interior e dos escritos da licantropia dentro do satanismo.

O Temple of the Vampire foi então legalmente registrado em Washington por George C. Smith, também conhecido como "Nemo" ou "Lucas Martel". E possui desde então uma série de publicações internas encabeçada pela "Biblia Vampírica". Um fato pouco conhecido, e que novamente justifica a presença do Templo neste livro, é que George Smith era membro do Templo de Set e grande parte do conteúdo de suas bíblias foi originalmente escrito nos três anos em que ele atuava no grupo criado por Michael Aquino.

Smith conseguiu unir o satanismo de LaVey com o misticismo encontrado dentro do Templo de Set. Ele uniu a filosofia materialista com uma série de ideias esotéricas orientais como a Força Vital (Ki), yoga, meditação e embrulhou tudo isso com referências as mitologias assírias e babilônicas. Sua saída para resolver as óbvias contradições que surgiriam entre o objetivismo laveyano e o esoterismo setiano não poderia ser mais criativa. Ele postulou que todo Vampiro possuía dois lados: o Lado Diurno, materialista e o Lado Noturno, voltado as práticas mágicas. A postura é uma formalização e ampliação do próprio conselho de Anton LaVey, que ensinou na Bíblia Satânica que a câmara ritual era o local onde a linha entre fantasia e realidade devia ser apagada.

A organização criada por Nemo também inaugurou uma moda que se repetiria em quase todas as organizações do gênero dai para frente. A alegação de que seus rituais e doutrinas são muito, muito antigos. Os membros do Templo do Vampiro dizem praticar uma religião antiquíssima que foi conhecida com vários nomes no decorrer dos séculos: Ordem do Dragão, Templo do Dragão, Templo da Deusa Dragão Vampírica Tiamat, etc..

Inicialmente qualquer pessoa que comprasse a "Biblia Vampírica" podia ser aceita como parte do grupo. Tempos depois criou-se a opção de inscrição de membro ativo na qual por uma quantia determinada o sócio passava a receber alguns materiais adicionais e seguia uma escalada de cinco graus: O Vampiro Iniciado, o Predador, o Sacerdote, o Feiticeiro e finalmente, o Adepto. Cada grau possui seus próprios ensinamentos, materiais e objetivos, sendo que este tipo de organização é um dos legados do Templo do Vampiro com relação ao Templo de Set. Acima de todos estes graus impera o círculo interno da ordem conhecido como "Ordem de Prometeus" composto basicamente pelos sócios fundadores.

Por fim, não se deve confundir o Vampirismo do grupo com os Vampíros Psíquicos criticados por LaVey na Biblia Satânica. De fato em muitos aspectos trata-sem de duas coisas quase que contrárias uma a outra. O vampiro descrito no livro de lúcifer é um dependente emocional enquanto que o vampiro da TOV é um caçador. Pessoalmente, este autor considera o Vampirismo da Temple of the Vampire como uma modalidade de Satanismo. O nome é outro, a  estética é diferente e ele possui uma metafísica própria que nenhum outro grupo tem, mas mesmo assim sua origem e sua essência estão absolutamente manchadas com a cor do sangue de LaVey.

Morbitvs Vividvs