sexta-feira, 13 de outubro de 2017

Ōbaku



A escola Ōbaku ou Ōbaku-shū (黄檗宗?), frequentemente denominada a terceira seita do Zen Budismo no Japão, foi estabelecida em 1661 por uma pequena facção de mestres da China e seus estudantes japoneses no Mampuku-ji em Uji, Japão. Hoje o Mampuku-ji funciona como o templo Obaku central, com 420 subtemplos espalhados pelo Japão (em 2006).  Além de sua contribuição para a cultura do Zen no Japão, a escola Obaku também "disseminou muitos aspectos da cultura do período Ming" no país. Muitos dos monges que vieram da China eram excelentes calígrafos, e o fundador da Obaku, Yinyuan Longqi, e outros dois mestres Obaku, Mokuan Shōtō e Sokuhi Nyoitsu, tornaram-se conhecidos como os "Obaku no Sanpitsu" (ou, os "Três Pincéis do Obaku"). Steven Heine escreveu, "As áreas onde a influência do — ou da reação ao — Obaku deixaram uma marca no Budismo japonês são inúmeras, e o seu impacto atingiu até mesmo os campos das técnicas culturais japonesas, tais como impressão e pintura.[3] A medicina e arquitetura chinesas também foram introduzidas, bem como a prática de "escrita do espírito"—praticada por monges Obaku os quais diziam-se poder comunicar-se com Chen Tuan.

Originada da linhagem (ou, escola) de Linji e portanto compartilhando uma relação tipo familiar com a escola Rinzai do Japão, o enfoque Obaku da prática revela a influência chinesa nos dias de hoje. Historicamente a escola Obaku é as vezes denominada "Nenbutsu Zen" — uma caracterização pejorativa com o objetivo de descrever seu uso de "práticas Zen e Terra Pura." Helen J. Baroni escreveu que nos dias de hoje, "Com poucas exceções notáveis, como o estilo do canto dos sutras (que ainda é feito numa aproximação do dialeto de Fujian), os templos e monastérios Obaku são muito semelhantes aos seus vizinhos Rinzai." Estatisticamente a menor escola/seita Zen no Japão moderno, a Obaku também assemelha-se à Rinzai-shu no fato de que é conhecida por ser mais conservativa e de inclinação intelectual que a Sōtō-shu.

História

O desenvolvimento da escola Obaku no Japão começou por volta do ano 1620, um período no qual imigrantes chineses estavam indo para Nagasaki, Japão, devido a um decreto pelo shogunato permitindo comerciantes chineses de conduzir seus negócios lá. Os comerciantes chineses, por sua vez, começaram a requisitar que monges da China viessem a Nagasaki "para atender às necessidades religiosas de sua comunidade e construir monastériosno estilo Ming tardio com os quais eles eram familiares." A comunidade chinesa, portanto, ficou animada quando o fundador da escola Obaku, um mestre da escola Linji chamado Yinyuan Longqi (J. Ingen Ryuki), chegou em Nagasaki vindo da China em 1654 com um pequeno grupo de discípulos chineses. Além disso, Yinyuan também estava feliz de sair da China, que experimentava uma guerra terrível. Yinyuan foi para lá com o objetivo declarado de ajudar o crescimento de três templos subdesenvolvidos fundados por imigrantes chineses na cidade. Estes templos de Nagasaki eram conhecidos como os três "templos da boa sorte," respectivamente Kōfuku-ji, Fukusai-ji e Sōfuku-ji. Com o tempo muitos japoneses ouviram falar de seus ensinamentos e viajaram a Nagasaki para vê-lo, alguns dos quais juntaram-se à sua comunidade e tornaram-se seus discípulos. Tendo planejado ficar no Japão por um curto período de tempo, Yinyuan foi persuadido por um grupo de seus estudantes japoneses a ficar no Japão; este grupo conseguiu permissão governamental para que ele se mudasse para Kyoto, onde seu estudante Ryūkai Shōsen queria que ele se torna-se o abade d templo Rinzai Myoshin-ji. Autoridades dentro da organização Rinzai não se interessaram muito pela idéia, principalmente devido a desacordos dentro da congregação com relação à questão se Yinyuan ensinasse um Zen muito chinês para o gosto japonês. Consequentmente, Yinyuan começou a construção do atual templo chefe da Obaku conhecido como Ōbaku-san Mampuku-ji em 1661 em Uji na prefeitura de Kyoto (Ōbaku-san sendo o nome da montanha). Isto marca o início da escola Obaku de Zen Budismo no Japan.

A construção foi completada em 1669, no estilo arquitetônico chinês da dinastia Ming. Com autorização dos líderes bakufu locais (i.e. Tokugawa Tsunayoshi), o Obaku-shu emergiu para revitalizar a prátic Rinzai no Japão. A prática no Mampuku-ji era diferente da de outros templos e monastérios Rinzai do Japão durante este período, sendo muito mais no estilo chinês. Yinyuan trouxe consigo aspectos do Budismo esotérico e do Terra Pura. Segundo Heinrich Dumoulin, "Para a prática Zen em geral, zazen (meditação sentada) e a prática de koan são centrais, ao passo que cerimônia de culto possuem uma importância secundária. Como Obaku pertencia à tradição Rinzai, zazen e koan eram partes da vida diária, mas o ritual também tinha um lugar de grande importância." Além disto, os monastérios e templos Obaku passaram a ser governados por uma doutrina conhecida como Ōbaku shingi, que importou práticas chinesas como a recitação (dharani) do nenbutsu e "procurou preservar o caráter chinês do grupo." Obaku também cantava sutras derivados do Budismo Terra Pura com música chinesa.

Após o retiro de Yinyuan em 1664 e morte em 1673, outros monges que vieram ao Japão por volta da mesma época que ele ajudaram a continuar a tradição da prática em Mampuku-ji. O mais importante de seus discípulos foi Mokuan Shōtō, que tornou-se o segundo abade de Mampuku-ji em 1664. Durantes seu anos de formação, Mampuku-ji foi muito popular no Japão com muitosadeptos vindo ao templo para instrução. De acordo com o livro Últimos Dias da Lei, "Pelo próximo século, Manpuku-ji foi liderado por monges imigrantes chineses, e eles mandaram seus seguidores japoneses fundar outros templos. O Zen Obaku espalhou-se rapidamente pelo país." Pelo meno um abade de Mampuku-ji durante este período inicial da história do Obaku provou ser controverso. Seu nome era Tu-chan Hsing-jung (Dokutan Shōtei), e ele serviu como o quarto abade de Mampuku-ji. Críticos o acusaram de levar a ênfase da recitação do nenbutsu no Mampuku-ji longe demais, e ele é chamado pejorativamente hoje em dia "Nenbutsu Dokutan."

Talvez o mais importante praticante de Obaku além de Yinyuan Longqi foi Tetsugen Dōkō, um japonês que viveu entre 1630 e 1682. Tetsugen é lembrado por ter transcrito o Tripitaka chinês do período Ming para blocos de madeira—conhecido como o Tetsugen-ban ou Ōbaku-ban (ban significa edição). Tendo estudado Jodo Shinshu do Japão, Tetsugen encontrou Yinyuan pela primeira vez em 1655 em Kofukuji em Nagasaki e acabou juntando-se à escola Obaku. O primeiro abade japonês do Mampuku-ji assumiu a liderança do Obaku em 1740, um certo Ryūtō Gentō. A partir de 1786 até os dias de hoje, o Obaku tem sido liderado exclusivamente por japoneses.

Características

As práticas monásticas da Obaku-shu eram determinadas principalmente pelo Ōbaku shingi (ou, regras Obaku), composto em 1672 com dez seções indicando o regime de prática no Mampuku-ji. Steven Heine escreveu que "O texto refletia algumas poucas evoluções que haviam tido lugar nos monastérios chineses desde Yuan, mas era exatamente na tradição das regras clássicas de pureza como o Chanyuan qingui e o Chixiu baizhang qingqui." É interessante notar que o ramo Rinzai Myoshinji escreveu seu próprio conjunto de regras monásticas (escrito por Mujaku Dōchū) em resposta a isto em 1685. Claramente Myoshinji estava preocupado sobre a perda de estudantes para a Obaku, que estavam crescendo em popularidade. "A ênfase da Obaku nos preceitos e a observação estrita das regras monásticas do Ōbaku shingi parece ter estimulado e encorajado alguns mestres japoneses com inclinações similares. Na escola Sōtō, por exemplo, os mestres chineses influenciaram os códigos monásticos de reformadores tais como Gesshū Sōko e Manzan Dōhaku que haviam estudado sob mestres Obaku."

A escola Obaku enfatizava a adoção de vários preceitos e também observava o Vinaia e o Dharmagupta bem como tradução de sutras. Mas talvez a característica mais óbvia para o povo japonês era o uso do nembutsu e também o uso do "koan nembutsu." Isto compreendia a prática de recitar o nome de Amitabha durante a prática do koan, "Quem recita?" Embora estranha aos japoneses (apesar desta "prática dupla" ter sido introduzida no Japão já no século XIII), isto era muito comum no Ch'an do período Ming, onde não havia divisão sectária entre budistas Terra Pura e praticantes de Ch'an. Steven Heine escreveu que, "...independente de sua inclusão de elementos do Terra Pura, o fato permanece que a escola Obaku, com sua prática de zazen em grupo nas plataformas do salão de meditação e sua ênfase na observação dos preceitos, representava um tipo de disciplina monástica bem mais rigorosa que qualquer outra escola de Budismo existente naquela época no Japão." Como resultado dessa ênfase, muitos mestres Rinzai e Sōtō passaram a reformar e revitalizar suas próprias instituições monásticas, como por exemplo o mestre Rinzai Ungo Kiyō que começou até mesmo a implementar a prática do nenbutsu no regime de treinamento no Zuiganji. T. Griffith Foulk escreveu que, "Os seguidores de Hakuin Ekaku (1687—1769) tentaram eliminar os elementos de Zen Obaku que eles achavam questionáveis. Eles suprimiram a prática Terra Purade recitar o nome do Buda Amida, diminuíram a ênfase no Vinaia e substituíram o estudo dos sutras pela ênfase nas coleções tradicionais de koan." Além disso, os sutras budistas na Obaku-shu continuam a ser cantados em chinês até os dias de hoje. Mampukuji também é conhecido pelo seu estilo de culinária vegetariana conhecida como Fucha Ryori, introduzida por Yinyuan e seu grupo.

Templos notáveis

Templo chefe

Mampuku-ji A construção iniciou em 1661 e foi concluída em 1669. Localizado em Kyoto, Mampuku-ji serve como o templo chefe da escola Obaku. É um "exemplo raro" de um templo construido puramente no estilo arquitetônico do período Ming chinês no Japão.

Subtemplos

Fukusai-ji Fundado em 1628 em Nagasaki e posteriormente destruido em 1945, Fukusai-ji foi reconstruido no fomato de uma tartaruga com uma estátua de aluminio de 18 m de altura de Kannon, a Bodhisattva da compaixão.

Kofuku-ji (Nagasaki)
Ryūshin-ji
Shōhō-ji (Gifu)
Sōfuku-ji (Nagasaki)
Toko-ji
Zuishō-ji

Linji Yixuan



Linji Yixuan ou Yixuan de Linji (chin.. 臨濟義玄, Línjì Yìxuán, W.-G.: Lin-chi I-hsüan; jap. Rinzai Gigen;  — 866/867) foi o fundador da escola chinesa de budismo chán linji zong (chin. 臨濟宗, Línjì zōng, W.-G.: Lin-chi tsung). Ele nasceu no condado Cao, na província de Shandong. Com cerca de vinte anos de idade, foi estudar com Huangbo na província Anhui. Obteve a iluminação espiritual e foi morar em Zhenzhou, na província Hebei, onde fundou o mosteiro Linji, criando o seu estilo próprio de zen, o linji. Uma característica marcante desta escola era o uso do grito do mestre para produzir a iluminação espiritual de seus discípulos.

A escola rinzai

A escola rinzai japonesa descende da escola linji. Esta foi levada ao Japão em 1191 por Myōan Eisai, tendo, então, adotado o nome "rinzai", que é a adaptação do nome "linji" para a língua japonesa. Sua prática se caracteriza por uma busca ativa da iluminação, através de processos árduos como o trabalho com koans e a prática de artes marciais, além de meditação. Com traços mais intelectuais e práticas mais ativas que as outras escolas do zen, a escola rinzai foi a adotada pelas classes dominantes japonesas, como a dos samurais, o que lhe proporcionou influência e prestígio, mas o que, ao mesmo tempo, limitou seu número de adeptos.

Rinzai



Rinzai ((臨|済|宗); Japonês: Rinzai-shū, Chinês: línjì zōng) é uma das três escolas Zen budistas no Japão, as outras sendo a Soto e a Obaku. Rinzai é a linha japonesa da escola chinesa Linji, que foi fundada durante a dinastia Tang por Linji Yixuan (J.: Rinzai Gigen). Embora se tenha tentado estabelecer linhagens Rinzai no Japão por diversas vezes, esta escola só conseguiu estabelecer-se através dos esforços do monge Myōan Eisai, após seu retorno da China em 1191. Eisai é portanto usualmente aceito como tendo transmitido os ensinamentos Rinzai ao Japão. A escola estabeleceu-se firmemente e alcançou uma identidade distintamente japonesa com Shuho Myocho (Daito Kokushi, 1283-1337) e Muso Soseki (1275–1351), mestres influentes que não foram à China estudar.

Características

Rinzai Zen caracteriza-se pela ênfase dada ao kensho ("ver a própria verdadeira natureza", ou iluminação) como o principal caminho da prática budista e por sua insistencia na necessidade de vários anos de treinamento exaustivo após a iluminação para incorporar o funcionamento livre da sabedoria nas atividades da vida diária. Treinamento baseado no uso de koans, os quais foram desenvolvidos em um alto grau por esta escola, é um dos caminhos para a obtenção do kensho. Em geral a escola Rinzai é conhecida pelo rigor e severidade de seus métodos de treinamento.

O Zen Rinzai no Japão atual não possui uma única estrutura organizada. Encontra-se dividido em quinze ramos, conhecidos pelos nomes de seus templos principais. O templo maior e mais influente é o do ramo Myoshin-ji, cujo templo principal foi fundado em 1342 por Kanzan Egen Zenji (1277–1360). Outros ramos importantes incluem o Nanzen-ji e o Tenryū-ji (ambos fundados por Muso Soseki), Daitoku-ji (fundado por Shuho Myocho), e Tofuku-ji (fundado por Enni Ben'en, 1202-1280). Devemos notar que estes ramos são simplesmente divisões organizacionais que surgem devido à história do templo e da linhagem mestre-discípulo e não representa divisões sectárias ou diferenças fundamentais na prática.

Desenvolvimentos posteriores

Por volta do século XVIII a escola Rinzai entrou num período de estagnação e declínio. Nesta época, o monge Hakuin Ekaku (1686–1769) tornou-se proeminente como um revitalizador do Zen Rinzai, e seu métodos vigorosos abriram caminho para uma revitalização duradoura. A influência de Hakuin e de seus seguidores foi tanta que todos os mestres Rinzai atuais traçam sua linhagem através dele. A sistematização do sistema de treinamento por koan feita por Hakuin serve atualmente como base para a prática formal Rinza.

Várias linhas Rinzai foram transplantadas do Japão para a Europa, Américas e Austrália e praticantes não japoneses foram certificados como professores e sucessores destas linhagens. Templos Rinzai, bem como grupos de prática liderados por praticantes leigos, podem ser encontrados em muitos países.

Eihei Dogen



Dōgen Zenji (道元禅師; também conhecido como Dōgen Kigen 道元希玄, Eihei Dōgen 永平道元, Koso Joyo Daishi ou simplesmente Dogen) (19 de janeiro de 1200 – 22 de setembro de 1253) foi um mestre zen-budista japonês nascido em Kyōto. Dogen fundou a escola Soto de zen. Ele foi uma figura religiosa proeminente em seu tempo, bem como um filósofo importante. Dogen é conhecido pelo sua obra "Tesouro do Olho do Dharma verdadeiro" (Shōbōgenzō), uma coleção de 95 fascículos relacionados à prática budista e à iluminação.

Vida

O mestre zen-budista Eihei Dogen nasceu em 1200, em Kyoto, então capital imperial do Japão. Filho de nobres, perdeu o pai aos três anos e a mãe aos oito. A perda de sua mãe parece ter causado forte impressão sobre ele, fazendo-o entrar em contato com o conceito budista da impermanência (無常 mujō) e iniciar o curso de suas questões sobre a natureza da existência. Aos 13 anos, foi para um monastério no Monte Hiei, onde foi ordenado monge budista da escola tendai. Ao dedicar-se com afinco ao estudo das escrituras budistas, defrontou-se com uma questão que, para ele, teve papel fundamental em suas escolhas:

“As escolas de budismo ensinam que os seres humanos são dotados de natureza búdica por nascimento. Se isto é verdade, por que os budas de todas as épocas — indubitavelmente iluminados — ensinam que é necessário buscar a iluminação e engajar-se em práticas espirituais?”
Esta questão foi originada em grande parte pelo conceito tendai de "iluminação original" (本覚 hongaku), que atesta que todos os seres humanos são iluminados por natureza e que, consequentemente, toda ideia de se atingir a iluminação através da prática é fundamentalmente errônea.

Como Dogen não encontrou uma resposta para esta questão no Monte Hiei, decidiu visitar outros mestres. Visitou o mestre Koin, abade tendai do Templo Onjōji (園城寺). Koin lhe disse que, para encontrar uma resposta, Dogen deveria considerar estudar chan na China. Kōin mandou Dogen a Myōan Eisai, em Kyoto, um famoso monge tendai que havia estado na China e trazido a prática da escola zen rinzai em 1191. Em 1214, Dōgen foi estudar com Eisai no Templo Kennin-ji (建仁寺) e, após a morte de Eisai no ano seguinte, ele continuou seu estudo sob o sucessor de Eisai, Myōzen (明全). Em 1221, Myōzen conferiu a transmissão do darma para Dōgen, reconhecendo que ele havia compreendido os ensinamentos. Dois anos depois, Dogen decidiu fazer a perigosa travessia através do Mar da China Oriental até a China para tentar encontrar uma resposta. Seu mestre Myōzen o acompanhou nessa viagem.

Viagem à China

Na China, Dogen foi inicialmente aos principais monastérios chan na província de Zhèjiāng. Naquela época, a maior parte dos mestres de chan baseavam seu treinamento no uso de gōng-àns (Japonês: kōan). Embora Dogen tenha estudado os koan assiduamente, ele ficou desencantado devido à grande ênfase dada a eles, e começou a se perguntar por que os sutras não eram mais estudados. Dogen chegou mesmo a recusar-se a receber a transmissão do darma de um mestre devido a este desencanto. Então, em 1225, ele decidiu retornar ao Japão e, em seu caminho de retorno, voltou ao primeiro local de peregrinação na China para despedir-se de seu mestre Myozen. Foi lá que conheceu e tornou-se discípulo do mestre Rújìng (如淨; Japonês, Nyōjo), o décimo-terceiro patriarca da escola Cáodòng (japonês, Sōtō)de budismo zen, no monte Tiāntóng (天童山 Tiāntóngshān; J. Tendōzan) em Níngbō. Rujing era famoso por ter um estilo de zen diferente dos outros mestres que Dogen havia até então visitado.

Rujing era um mestre muito rigoroso, o treinamento levado a cabo no mosteiro era referido como sendo muito duro e difícil. Os monges dormiam pouco e se dedicavam durante muitas horas do dia à pratica da meditação sentada silenciosa (zazen). A principal instrução recebida por Dogen foi para que abandonasse corpo e mente ao caminho, significando um abandono completo de si mesmo e de toda e qualquer ideia de identidade ou preconcepções acerca dos próprios ensinamentos, dedicando-se à prática central da meditação silenciosa com todo o seu ser:

“Deixar cair corpo e mente é sentar em meditação. Ao praticar sinceramente o intenso sentar, os cinco desejos desaparecem e os cinco obstáculos são removidos.”

O abandono da compreensão intelectual através da absorção meditativa e do corpo através da disciplina foram decisivos para realizar o completo desapego. O mestre Rujing participava de todos os momentos de prática junto com os monges, e revelava com sua forma de viver a realização dos ensinamentos oferecidos.

Sob Rujing, Dōgen atingiu a libertação do corpo e da mente, guardando cuidadosamente as palavras de seu mestre, "Jogue fora o corpo e a mente" (身心脱落 shēn xīn tuō luò). Esta frase continuaria a ter grande importância durante a vida de Dogen e pode ser encontrada em vários lugares em seus escritos, como por exemplo na seção famosa de seu "Genjōkōan" (現成公案):

“Estudar o Caminho é estudar a si próprio. Estudar a si próprio é esquecer-se de si próprio. Esquecer-se de si próprio é tornar-se iluminado por todas as coisas do universo. Ser iluminado por todas as coisas do universo é livrar-se do corpo e da mente, de si próprio bem como dos outros. Até mesmo os traços da iluminação são eliminados, e vida com iluminação sem traços continua para sempre.”

Logo após Dogen chegar ao monte Tiantong, Myōzen morre. Em 1227, Dōgen recebeu a transmissão do Darma e inka de Rujing, e comentou como finalmente ele havia resolvido sua "busca de uma vida da grande questão".

Retorno ao Japão

Dogen retornou ao Japão em 1227 ou 1228, para o templo Kennin (Kennin-ji), onde ele havia treinado sob Eisai. Uma de suas primeiras ações ao voltar foi escrever o Fukan Zazengi (普観坐禅儀; "Instruções Universalmente Recomendadas para a Prática de Zazen"), um texto curto mostrando a importância e dando instruções para a prática do zazen, ou "meditação sentada".

Tensões começaram a surgir quando a comunidade tendai tentou suprimir tanto o zen quanto a escola Jōdo Shinshū, as novas formas de budismo no Japão. Devido a esta tensão, Dogen deixou os domínios tendais de Kyoto em 1230 e se estabeleceu num templo abandonado na hoje cidade de Uji, ao sul de Kyoto. Em 1233, Dōgen fundou o Kannon-dōri-in, um pequeno centro de prática, em Uji; mais tarde, ele expandiu este templo para formar o templo Kōshō-hōrinji (興聖法林寺). Em 1243, Hatano Yoshishige (波多野義重) ofereceu realocar a comunidade de Dogen para a província Echizen, bem ao norte de Kyoto. Dōgen aceitou devido às tensões com a comunidade tendai e seus seguidores construíram um centro de prática nesta localidade, chamando-o de Daibutsuji (大仏寺), "templo do Grande Buda". Enquanto a construção ocorria, Dogen vivia e ensinava no templo Yoshimine-dera (Kippōji, 吉峯寺), próximo a Daibutsuji. Em 1246, Dōgen mudou o nome de Daibutsuji, passando a chamá-lo Eihei-ji. Este continua a ser um dos dois templos-chefe da seita sōtō zen no Japão atual, o outro sendo Sōji-ji.

Dogen passou o resto de sua vida ensinando e escrevendo em Eiheiji. Em 1247, o novo regente, Hōjō Tokiyori, convidou Dōgen a vir a Kamakura ensiná-lo. Dōgen fez a longa viagem, ordenou o regente como leigo e voltou a Eiheiji em 1248. No outono de 1252, Dōgen adoeceu. Ele transmitiu seu manto ao principal aprendiz, Koun Ejō (孤雲懐弉), fazendo-o abade de Eiheiji. A convite de Hatano Yoshishige, Dōgen foi a Kyoto em busca de uma cura para sua doença. Em 1253, pouco depois de chegar a Kyoto, Dogen faleceu. Pouco antes de sua morte, ele havia escrito o poema:

Cinquenta e quatro anos iluminando os céus.
Um salto trêmulo arrebenta com bilhões de palavras.
Hah!
O corpo inteiro procura por nada.
Vivendo, eu mergulho nas Fontes Amarelas.

Zen

No cerne da variação de zen que Dogen ensinava, existe uma série de conceitos-chave, enfatizados diversas vezes nos seus escritos. Todos estes conceitos, entretanto, estão intimamente relacionados no sentido de que todos estão conectados diretamente com o zazen, ou "meditação sentada", que Dogen considerava idêntico ao zen, como pode ser visto claramente na primeira sentença do manual de instruções de 1243 Zazen-gi (坐禪儀; "Princípios do Zazen"): "Estudar zen... é zazen".[4] Ao se referir ao zazen, Dogen, na maioria das vezes, está se referindo especificamente ao shikantaza, ou "apenas sentar-se", que é um tipo de meditação na qual senta-se "num estado totalmente alerta, livre de pensamentos, dirigido a nenhum objeto e ligado a nenhum conteúdo em particular".

Unidade entre prática e iluminação

O conceito primário permeando a prática zen de Dogen é a "unidade prática-iluminação" (修證一如 shushō-ittō / shushō-ichinyo). Este conceito é tão fundamental na variedade de zen de Dogen — e, consequentemente, na escola soto como um todo — que formou a base para o trabalho Shushō-gi (修證儀), compilado em 1890 por Takiya Takushū (滝谷卓洲) do Eihei-ji e Azegami Baisen (畔上楳仙) do Sōji-ji como uma introdução ao enorme trabalho de Dogen, o Shōbōgenzō ("Tesouro do Olho do Darma Verdadeiro").

Para Dōgen, a prática de zazen e a experiência de iluminação eram uma e a mesma coisa. Este ponto foi sucintamente indicado por Dogen no Fukan Zazengi, o primeiro texto que compôs ao retornar ao Japão: "Praticar o caminho diligentemente é, por si só, iluminação. Não há qualquer diferença entre prática e iluminação ou entre zazen e vida diária". Previamente no mesmo texto, a base desta identidade é explicada em mais detalhes:

“Zazen não é "meditação passo a passo". Ao invés disso, é a prática simples e agradável de um buda, a realização da Sabedoria do Buda. A verdade surge onde não há ilusões. Se você entender isso, você é completamente livre, como um dragão que obteve água ou um tigre que reclina-se em uma montanha. O Dharma (lei suprema) surgirá por si mesmo, e você estará livre de cansaço e confusão.”

A unidade entre prática e iluminação também foi enfatizada no Bendōwa (弁道話 "Discurso sobre o que segue caminho") de 1231:

“Pensar que a prática e a iluminação não são a mesma coisa não é mais que um ponto de vista que está fora do Caminho. No buddha-dharma [ou seja, no budismo], prática e iluminação são a mesma coisa. Porque é a prática da iluminação, a prática diligente do Caminho de um iniciante é exatamente a totalidade da iluminação original. Por esta razão, ao passar a atitude essencial para a prática, ensina-se que não devemos esperar a iluminação fora da prática.”

Os escritos de Dogen

A obra-prima de Dogen é o Shōbōgenzō, discursos e escritos reunidos em 99fascículos sobre tópicos que vão desde a prática monástica até a filosofia da linguagem, do ser e do tempo. Neste trabalho, como em sua vida, Dogen enfatiza a absoluta primazia do shikantaza e a inseparabilidade entre prática e iluminação.

Embora fosse comum que trabalhos budistas fossem escritos em chinês, Dōgen escrevia frequentemente em japonês, transmitindo a essência do seu pensamento num estilo que era, ao mesmo tempo, conciso e inspirador. Um mestre no estilo, Dogen é notável não apenas pela sua prosa mas também por sua poesia (em estilo japonês waka e em vários estilos chineses). O uso da linguagem por Dogen era não convencional. De acordo com Steven Heine, especialista em Dogen: "Os trabalhos filosóficos e poéticos de Dogen são caracterizados por um esforço contínuo em expressar o inexprimível através do aperfeiçoamento do discurso imperfeito pelo uso criativo do jogo de palavras, neologismos e lírica, bem como pela redefinição de expressões tradicionais".

Desde 1930, a obra de Dogen desperta interesse nos ocidentais, mas a primeira edição inglesa do Shobogenzo só foi feita em 1958. A versão completa só foi editada em 1983, em quatro volumes, traduzidos por Gudo Wafu Nishijima e Chodo Cross. Atualmente, desperta grande interesse em países da Europa e nos Estados Unidos, onde diversos centros dedicam-se a estudar seu pensamento. Alguns escritos foram editados como trabalhos independentes, e ainda alguns ensinamentos foram reunidos e transcritos por seu discípulo direto e sucessor Koun Ejo.

No Brasil, um único trabalho reúne alguns capítulos selecionados e traduzidos sob o título: A Lua Numa Gota de Orvalho – (DOGEN, 1993). Uma versão em língua portuguesa está atualmente disponível, e em preparação para edição, podendo ser visualizada no site do autor - Marcos Beltrão Frederico, o monge zen Marcos Ryokyu, formado em filosofia e discípulo do mestre Iagarashi Roshi.

Zazen



Zazen (japonês: 坐禅; chinês: zuò chán (pinyin) ou tso-chan (Wade-Giles)) é a base da prática Zen Budista. O objetivo do zazen é "apenas sentar", com a mente aberta, sem apegar-se aos pensamentos que fluem livremente. Isto é feito tanto através do uso de koans, o principal método Rinzai, ou o sentar-se completamente alerta (o "apenas sentar", shikantaza), o qual é o método da escola Soto. O princípio do zazen é o de que uma vez que a mente esteja livre de suas diversas camadas, pode-se realizar a natureza búdica, atingindo-se a iluminação (satori).

Prática

A prática do zazen consiste basicamente em sentar-se em uma posição confortável, com a coluna ereta, em períodos de até 40 minutos, intercalados com meditação andando (Kinhin). Durante esse tempo deve-se procurar observar os pensamentos e sensações que surgem, sem buscar reprimi-los, causá-los ou julgá-los. É tradicional o uso de zafu e zabuton como almofadas, na qual o praticante fica sentado.

Um excelente guia para a prática do zazen foi escrita pelo monge zen budista japonês Dogen no século XIII.

Zen



Zen é o nome japonês da tradição (e filosofia) religiosa ch'an, que surgiu na China por volta do século VII. O zen costuma ser associado ao budismo do ramo mahayana. Foi cultivado, inicialmente, na China, Japão, Vietnã e Coreia. A prática básica do zen é o zazen (literalmente, "meditar sentado"), tipo de meditação contemplativa que visa a levar o praticante à "experiência direta da realidade" através da observação da própria mente.

O zen, tal como o conhecemos hoje, só foi possível devido à forte influência que o budismo sofreu do taoismo. Para alguns estudiosos, o zen nada mais é que a síntese dessas duas correntes de pensamento (budismo e taoismo). Outros concluem que o zen deveria ser considerado à parte do budismo, pois sua natureza e tradição tão peculiares só foram possíveis e criadas devido à influência do pensamento chinês.

No zen japonês, há duas vertentes principais: soto e rinzai. Enquanto a escola soto dá maior ênfase à meditação silenciosa, a escola rinzai faz amplo uso dos koans, ou "enigmas". Atualmente, o zen é uma das escolas budistas mais conhecidas e de maior expansão no Ocidente.

Segundo Alan Watts, inglês que se notabilizou no Ocidente pela divulgação do zen,este, em sua forma original chinesa, não se encontra mais na China, e o que de mais próximo se pode conhecer desta versão original é encontrado em formas de arte tradicionais do Japão que tenham sido cultivadas e transmitidas segundo esta tradição.

História

Como todas as escolas budistas, o zen remete as suas raízes ao budismo indiano. A palavra "zen" vem do termo sânscrito dhyāna, que denota o estado de concentração típico da prática meditativa. Na China, esse termo foi transliterado como channa e logo reduzido à sua forma mais curta, ch'an (禪). Daí, para o coreano como sŏn (선) e, finalmente, para o japonês como zen.

Segundo os relatos tradicionais, o estilo de prática zen foi levado da Índia à China pelo monge indiano Bodhidharma (em japonês, Daruma) por volta do ano 520. Embora a historicidade desse relato tenha sido colocada em dúvida por estudiosos modernos, a história (ou lenda) de Bodhidharma continua sendo a metáfora fundamental do zen sobre o cerne de sua prática.

Segundo conta o "Registro da Transmissão da Lâmpada", um dos mais antigos textos do zen, Bodhidharma chegou à China pelo território da Dinastia Liang e, devido à sua fama de sábio, foi imediatamente convocado à corte do famoso Imperador Wu-ti. O imperador, que havia apoiado enormemente o budismo na China, perguntou a Bodhidharma sobre o mérito que havia ganhado por apoiar o budismo, esperando que esse mérito lhe garantisse uma boa vida em sua encarnação seguinte. Bodhidharma, porém, respondeu: "Nenhum mérito". O imperador, enraivecido, perguntou então: "Quem é esse que está diante de mim?" (em linguagem atual, algo como "Quem você pensa que é?") Bodhidharma respondeu: "Não sei". Aturdido, o imperador concluiu que Bodhidharma devia ser louco e o expulsou da corte. Um dos ministros então perguntou ao imperador: "Vossa Majestade Imperial sabe quem é esta pessoa?" O imperador disse que não sabia. O ministro disse: "Ele é o bodisatva da compaixão, portador do selo do coração de Buda"". Cheio de arrependimento, o imperador quis chamar Bodhidharma de volta, mas o ministro advertiu que ele não voltaria nem mesmo se todos os chineses fossem buscá-lo. Outras pessoas, porém, ficaram intrigadas com sua resposta e o seguiram até a caverna aonde ele havia ido viver. Lá, se tornaram seus discípulos, e descobriram que Bodhidharma era o herdeiro espiritual de Mahakashyapa, um dos grandes discípulos de Buda.

De acordo com os ensinamentos tradicionais, Bodhidharma não sabia responder porque sua verdadeira natureza, assim como a verdadeira natureza de todas as coisas, estava além do conhecimento discursivo, de definições e de palavras. É a esta experiência direta da realidade que aspira o zen.

Mahakashyapa, de quem Bodhidharma era herdeiro espiritual e sucessor, havia tido essa experiência e se iluminado. Segundos os sutras, Mahakashyapa foi o único discípulo de Buda a compreender o seu Discurso do Lótus, em que Buda, sem dizer nada, apenas levantou uma flor. Era a realidade imediata, além das palavras.

Depois de treinar seus discípulos por muitos anos, Bodhidharma morreu, deixando o seu aluno Huike (em japonês, Daiso Eka) como sucessor. Huike foi o segundo patriarca do zen e também deixou uma linha de sucessão da qual pouco se sabe, até chegar a Huineng (em japonês, Daikan Eno, 638-713), o sexto e último patriarca. Huineng, um dos maiores mestres da história do zen, participou de uma famosa disputa quando sucedeu a seu mestre: um grupo de monges recusava-se a aceitá-lo como patriarca, e propunha outro praticante, Shenxiu, em seu lugar. Sob ameaças, Huineng foi obrigado a fugir para um templo no sul da China; no final, apoiado pela maioria dos monges, foi reconhecido como patriarca.

Algumas décadas depois, porém, a contenda foi ressucitada. Um grupo de monges, dizendo-se sucessor de Shenxiu, enfrentou um outro grupo, a Escola do Sul, que se apresentava como sucessora de Huineng. Depois de debates acalorados, a Escola do Sul acabou prevalecendo e seus rivais desapareceram. Os registros dessa disputa são os mais antigos documentos históricos fiéis sobre a escola zen de que dispomos hoje.

Mais tarde, monges coreanos foram à China para estudar as práticas da escola de Bodhidharma. Quando chegaram, o que encontraram foi uma escola que já havia desenvolvido identidade própria, com fortes influências do taoismo, e que já era conhecida pelo nome chan. Com o tempo, o chan acabou se estabelecendo na Coreia, onde recebeu o nome seon.

Da mesma forma, monges chegavam de outros países da Ásia para estudar o Chan, e a escola foi-se espalhando pelos países vizinhos. No Vietnã, recebeu o nome thien e, no Japão, ficou conhecida como zen. Através da história, essas escolas cresceram de maneira independente, tendo desenvolvido identidades próprias e características bastante diferentes umas das outras.

Os Seis Patriarcas do Zen na China

Bodhidharma (बोधिधर्म) (c. 440 - c. 528)
Huike (慧可) (487 - 593)
Sengcan (僧燦) (? - 606)
Daoxin (道信) (580 - 651)
Hongren (弘忍) (601 - 674)
Huineng (慧能) (638 - 713)

O Zen no Japão

No Japão, há quatro escolas de zen: a rinzai, a soto, a obaku e a sanbo kyodan.

A escola rinzai descende da escola chinesa do mestre Linji Yixuan (em japonês, Rinzai Gigen) e foi levada até ao Japão em 1191 por Myōan Eisai, tendo adotado o nome japonês de seu fundador. A sua prática caracteriza-se por uma busca ativa da iluminação, através de processos árduos como o trabalho com koans e a prática de artes marciais, além de meditação. Com traços mais intelectuais e práticas mais ativas, a escola rinzai foi adotada pelas classes dominantes, como a dos samurais, o que lhe proporcionou influência e prestígio, mas que limitou o seu número de adeptos. A obra "A Mente Liberta", de autoria do monge Takuan Sōhō (1573-1645) da escola rinzai, é um dos primeiros registros de fusão entre o zen e a arte da espada.

A escola soto descende da escola chinesa caodong, que foi levada ao Japão no século XIII pelo célebre mestre Eihei Dogen Zenji (1200-1253). A sua prática fundamental é a Shikantaza ("apenas sentar-se"), um tipo simples de meditação cuja prática é identificada com a própria iluminação. A sua simplicidade atraiu os governadores rurais e a classe camponesa, proporcionando à escola um grande número de adeptos. Atualmente, é a maior escola de zen tanto no Japão quanto no Ocidente. Em tempos recentes, a soto exerceu papel de destaque no estabelecimento do zen no Ocidente, enviando mestres como o pioneiro Shunryu Suzuki para fundar mosteiros e centros de prática. No Brasil, todos os senseis (professores de zen que receberam a transmissão do Dharma) em atividade são da escola soto.

A obaku foi fundada no Japão em 1661 pelo monge chinês Yinyuan Longgi (em japonês, Ingen Ryuki, 1592-1673), que havia sido treinado na escola de Linji Yixuan.

Finalmente, a sanbo kyodan ("Escola dos Três Tesouros") é a escola de zen mais recente do Japão. Foi fundada em 1954 por Yasutani Hakuun, discípulo e sucessor de Harada Daiun. Ambos foram treinados e receberam a transmissão do Dharma na escola soto, e Harada também completou o treinamento de koans da escola rinzai. Ainda assim, sentiam-se insatisfeitos com a prática de zen disponível no Japão. Deste modo, a sanbo kyodan foi fundada para ser uma escola que congregasse tantos as práticas da soto quanto as da rinzai, e se focasse em atingir o satori. Aceitando na prática que tanto monges quanto leigos podem atingir a iluminação, ambos tinham tratamento igualitário, podendo inclusive receber a transmissão do Dharma e ocupar cargos de liderança na hierarquia da escola. Além disso, movidos pelo espírito libertário do Japão pós-Segunda Guerra Mundial, a sanbo kyodan recebeu e treinou ocidentais, tanto zen-budistas quanto de qualquer outra religião. Por isso, apesar de ser uma escola pequena no Japão, a Sanbo Kyodan exerceu grande influência no zen praticado no Ocidente—mestres como Robert Aitken, Philip Kapleau e o padre Hugo Enomiya-Lassalle foram formados lá.

Alguns mestres contemporâneos, como Shunryu Suzuki e Harada Daiun, já criticaram muito o zen no Japão atual, descrevendo-o como um sistema formalizado de rituais vazios, em que poucos praticantes realmente atingem a iluminação, com templos comparáveis a negócios familiares, passados de pai para filho (pois os monges podem casar-se), onde os monges se limitam a oficiar funerais e casamentos, pelos quais cobram pequenas fortunas.

Budismo e Zen

O zen é um ramo da tradição budista mahayana e baseia-se fundamentalmente nos ensinamentos de Siddhartha Gautama, o Buda histórico e fundador do budismo. No entanto, através de sua história, o zen também foi recebendo influências das diversas culturas dos países por onde passou.

O seu período de formação na China, em particular, determinou muito de sua identidade. Ensinamentos e práticas taoistas exerceram grande influência no chan chinês. Conceitos como o wu wei, a natureza fluida da realidade e a "pedra não entalhada" ainda podem ser identificados no zen japonês e nas escolas correlatas. Mesmo a tradição zen de "mestres loucos" é claramente uma continuação da tradição dos mestres taoistas. Outra influência, embora menor, veio do confucionismo e a isso soma-se, ainda, a influência que o zen recebeu do xintoísmo ao chegar no Japão.

Tais peculiaridades já levaram alguns estudiosos a considerar o zen como uma escola "independente", fora da tradição mahayana — ou até mesmo fora do budismo. Essas posições, no entanto, são minoritárias: a vasta maioria dos estudiosos considera o zen uma escola budista, inserida na tradição mahayana.

Todas as escolas de zen são versadas em filosofia e doutrina budistas, incluindo as Quatro Nobres Verdades, o Nobre Caminho Óctuplo e as Paramitas. No entanto, a ênfase do zen em experimentar a realidade diretamente, além de ideias e palavras, o mantém sempre nos limites da tradição.

Essa abertura permitiu (e permite) que não budistas praticassem o zen, como o padre jesuíta Hugo Enomiya-Lassalle, que chegou a receber a transmissão do Dharma, e muitos outros. Existe até mesmo uma corrente de "zen cristão", assim como outras que se denominam "não sectárias".

Práticas e ensinamentos do zen

De um modo geral, os ensinamentos do zen criticam o estudo de textos e o desejo por realizações mundanas, recomendando, antes, a dedicação à meditação (zazen) como forma de experimentar a mente e a realidade de maneira direta. No entanto, o zen não chega a ser uma doutrina quietista - o mestre chan chinês Baizhang (em japonês, Hyakujo, 720-814), por exemplo, dedicava-se ao trabalho braçal em seu monastério. Ele tinha, por lema, um ditado que ficou famoso entre os praticantes de zen: "Um dia sem trabalho é um dia sem comida."

De fato, o zen tem uma longa tradição de trabalho meditativo, desde atividades braçais até atividades mais refinadas, como caligrafia, iquebana e a famosa cerimónia do chá - além das artes marciais, às quais o zen sempre esteve ligado.

Essas práticas estão bem fundamentadas nas escrituras budistas, principalmente nos sutras Mahayana compostos na Índia e na China, em particular o Sutra da Plataforma de Huineng, o Sutra do Coração, o Sutra do Diamante, o Lankavatara Sutra e o Samantamukha Parivarta, um capítulo do Sutra do Lótus. A grande influência do Lankavatara Sutra, em particular, levou à formação da filosofia "apenas mente" do zen, na qual a consciência em si mesma é a única realidade.

O zen não é um estilo de prática intelectual ou solitário. Templos e centros de prática congregam sempre um grupo de praticantes (uma sangha), e conduzem atividades diárias e retiros mensais (sesshins). Além disso, o zen é tido como um "estilo de vida" e não apenas como um conjunto de práticas ou um estado de consciência.

Zazen

Para o zen, experimentar a realidade diretamente é experimentar o nirvana. Para experimentar a realidade diretamente, é preciso desapegar-se de palavras, conceitos e discursos. Para se desapegar disso, é preciso meditar. Por isso, o zazen ("meditação sentada") é a prática fundamental do zen. Ao meditar, o praticante senta-se sobre uma pequena almofada redonda (o zafu) e assume a postura de lótus, a postura de meio lótus, a postura burmanesa ou a postura de seiza. Unindo as mãos um pouco abaixo do umbigo (fazendo o mudra cósmico), ele semicerra suas pálpebras, pousando a vista cerca de um metro à sua frente. Na escola rinzai, os praticantes sentam-se virados para o centro da sala. Na escola soto, sentam-se virados para a parede.

Então o praticante "segue a sua respiração", contando cada ciclo de inspiração e expiração, até chegar a dez. Então o ciclo recomeça. Enquanto isso, a sua única tarefa é manter uma mente relaxada, aberta, concentrada, mas sem tensão, e estar presente no "agora" do momento, sem se deixar levar por pensamentos ou ruminações. Quando isso acontece, ele volta a concentrar-se na contagem. Os praticantes mais experientes, cujo poder de concentração (samadhi) é maior, podem abster-se de contar ou seguir sua respiração. Fazendo assim, eles estarão praticando o tipo de zazen chamado shikantaza, "apenas sentar-se".

A duração de um período de meditação varia de acordo com a escola. Embora o período tradicional de meditação seja o tempo que uma vareta de incenso leva para queimar (de 35 a 40 minutos), escolas como a sanbo kyodan recomendam a seus alunos que não meditem por mais de 25 minutos de cada vez, pois a meditação pode tornar-se inerte. Na maioria das escolas, porém, os monges rotineiramente meditam entre quatro e seis períodos de 30-40 minutos, todos os dias. Quanto a leigos, o mestre Dogen dizia que cinco minutos diários já eram benéficos—o que importa é a constância.

Durante os retiros (sesshins) mensais, porém, as atividades são intensificadas. Com duração de um, três, cinco ou sete dias, a rotina dos retiros prevê de nove a 12 períodos de 30-40 minutos por dia, ou até mais. Entre cada período de zazen, os praticantes "descansam" fazendo kinhin (meditação andando).

O professor

Como o zen dá relativamente pouca importância à palavra escrita, o papel do professor é muito importante para o treinamento do praticante. De um modo geral, um professor de zen é uma pessoa ordenada em qualquer escola que tenha recebido permissão para ensinar o Dharma a outros. Uma parte central de toda a tradição zen é a noção de transmissão do Dharma, ou seja, a ideia de que há uma linhagem ininterrupta de mestres que, a partir de Buda, transmitiram e receberam os ensinamentos e atingiram pelo menos algum grau de realização. Essa noção se originou da famosa descrição do zen feita por Bodhidharma:

Uma transmissão especial, fora das escrituras;
Sem depender de palavras ou letras;
Apontando diretamente à mente humana;
Contemplando a sua própria natureza e atingindo o estado de Buda.
Quando um professor é reconhecido oficialmente como tendo atingido um certo grau de realização e é admitido à linhagem de mestres, diz-se que ele "recebeu a transmissão do Dharma". Desde pelo menos a Idade Média, essa transmissão, "de mente a mente", "de mestre a discípulo", tem tido um papel fundamental em todas as escolas de zen. Durante a cerimônia de transmissão, o novo professor é presenteado com uma carta genealógica que mapeia toda a linhagem, de Buda até ele próprio.

Títulos honoríficos ligados a professores que receberam a transmissão do Dharma incluem: na China, Fashi e Chanshi; na Coreia, Sunim e Seon Sa; no Vietnã, Thay; e, no Japão, Osho ("sacerdote"), Sensei ("professor") e Roshi ("professor mais velho"). De um modo geral, fala-se em um "mestre Zen" apenas em referência a professores de renome, especialmente os medievais ou os antigos.

A iluminação

No zen, a iluminação é geralmente chamada de satori ou kensho. O kensho é o primeiro vislumbre, por assim dizer, da verdadeira natureza da realidade e de si mesmo, é mais breve e pouco profundo. O satori, por sua vez, é uma experiência mais profunda e duradoura, em que o praticante tem uma experiência intensa da Natureza de Buda e vê sua "face original".

Não se trata, porém, de uma experiência visionária. Embora algumas pessoas suponham que a experiência de iluminação deva levar quem a experimente a universos de luz intensa, ou coisa que o valha, o depoimento dos mestres zen contradiz essa hipótese. Perguntado sobre como a sua vida era antes e como ficou depois do satori, um mestre zen moderno respondeu: "Agora meu jardim parece mais colorido."

Na iluminação, o praticante não é arrebatado a nenhum outro lugar.

Outra suposição comum é que, sendo iluminado, o fluxo de pensamentos pára e o praticante fica como um espelho polido, refletindo a pura realidade, sem pensamentos que o atrapalhem. Pelo contrário, os pensamentos não param—o que ocorre é que o praticante abre mão deles, deixa-os passar, se esquece deles, e se esquece de si mesmo.

Quando o quinto patriarca, Hongren (em japonês, Daiman Konin, 601-647), decidiu escolher quem o sucederia, propôs a seus discípulos que tentassem captar a essência do zen em um poema; o autor do melhor poema seria seu sucessor. Quando receberam a notícia, os monges já sabiam quem seria o vencedor: Shenxiu, o aluno mais antigo de Hongren. Ninguém se deu ao trabalho de competir com ele. Apenas esperaram, e Shexiu escreveu seu poema e o pendurou na parede:

"Este corpo é a árvore de Bodhi.

A alma é como um espelho brilhante.
Toma cuidado para que sempre esteja limpo,

não deixando o pó se acumular sobre ele".
Todos os monges gostaram. Com certeza, Hongren também iria gostar. Entretanto, no dia seguinte, havia outro poema pendurado ao lado, que alguém havia pregado durante a noite:

"Bodhi não é como uma árvore.

O espelho brilhante não brilha em parte alguma:
Se nada há desde o princípio,

Onde se acumula o pó?"
Os monges ficaram assombrados. Quem teria escrito aquilo? Depois de algum tempo, descobriram: o autor do poema era Huineng, o cozinheiro do monastério. E, percebendo a sua origem, foi a ele que Hongren estendeu seu manto e sua tigela, fazendo de Huineng o sexto patriarca.

Ensinamentos radicais

Algumas das histórias tradicionais do zen descrevem mestres usando estranhos métodos de ensino, e muitos praticantes de hoje tendem a interpretar essas histórias de maneira excessivamente literal. Por exemplo, muitos ficam indignados quando ouvem histórias como a do mestre Linji, fundador da escola rinzai, que disse: "Se você encontrar o Buda, mate o Buda. Se você encontrar um patriarca, mate o patriarca." Um mestre contemporâneo, Seung Sahn, também ensina a seus alunos que todos precisamos matar três coisas: matar nossos pais, matar o Buda e matar nosso professor (no caso, o próprio Seung Shan). No entanto, é claro que nem Linji nem Seung Sahn estavam falando de maneira literal. O que eles queriam dizer era que precisamos "matar" nosso apego a professores e coisas externas. Quando visitam templos ou centros de prática zen, os iniciantes que leram muitas dessas histórias e esperam encontrar professores iconoclastas normalmente surpreendem-se com a natureza conservadora e formal das práticas.

O zen e outras religiões

Desde meados do século XX, o zen tem-se aberto ao diálogo interreligioso, tendo figurado em inúmeros encontros e conferências ao redor do mundo. Talvez a figura mais representativa do zen nesse diálogo seja o monge vietnamita Thich Nhat Hanh, indicado ao Prêmio Nobel da Paz em 1967, que se tem dedicando ao diálogo interreligioso há décadas e que mantém, em seu altar, imagens tanto de Buda quanto de Jesus.

Em templos e centros de prática zen ao redor do mundo, é comum que muitas pessoas não budistas frequentem as atividades e pratiquem zazen. Essa prática é geralmente bem aceita pelos professores, já que o budismo é uma religião de tolerância que vê as outras religiões como caminhos espirituais válidos e que está aberta a quem quiser apenas meditar, sem qualquer filiação religiosa.

Em algumas escolas, como a sanbo kyodan, a aceitação de praticantes de outras religiões é tão grande que, sem ter de abandonar a sua religião, um praticante pode receber a transmissão do Dharma e tornar-se professor.

Textos Zen

Existem várias lendas dentro da tradição zen, transmitidas e renovadas pela tradição oral e parte dos folclores chinês e japonês, que se entrelaçam com a história. Narrativas da tradição oral, muitas das quais compiladas em antologias literárias, podem ser, de acordo com diferentes visões de teóricos, consideradas lendas, folclore, mitologia ou literatura propriamente dita.

Ao tratar das narrativas setsuwa説話 no Japão, narrativas breves, contadas "de um fôlego só", compiladas na antologia literária Konjaku Monogatarishu今昔物語集 , ou Antologia de Narrativas de Hoje e de Ontem, do período Heian 平安時代(794-1192), Yoshida considera que tais narrativas são "transmitidas como reais ou supostamente reais, frutos, portanto, de uma criação coletiva anônima e reunidas numa coletânea de narrativas setsuwa (説話) por um compilador". A antologia contém histórias referentes à China, Índia e Japão, algumas das quais associadas ao budismo.

O Sermão da Flor

As origens do zen são apontadas para o Sermão da Flor, cuja fonte mais antiga vem do século XIV. Gautama Buddha juntou seus discípulos para um discurso do Dharma. Quando eles se juntaram, o Buda permaneceu completamente silencioso e alguns acharam que ele estava cansado ou doente. Silenciosamente, o Buda levantou uma flor e vários discípulos tentaram interpretar o que isso significava, embora nenhum deles corretamente. Um dos discípulos, Mahakashyapa (em sânscrito, Mahākāśyapa), também silenciosamente, olhou para a flor e obteve um entendimento especial, para além das palavras, ou prajna (do sâncrito prajñā, "sabedoria"), diretamente da mente do Buda. Mahakashyapa de alguma forma compreendeu o verdadeiro sentido inexprimível da flor e o Buda sorriu para ele, reconhecendo o seu entendimento e dizendo:

Eu possuo o verdadeiro olho do darma, a mente maravilhosa do nirvana,a forma verdadeira do informe, o portal sutil do Dharma que não depende de palavras ou escritos, mas é uma transmissão especial fora das escrituras. Isto eu passo a Mahakashyapa.

Mahakashyapa é, por este dom raro de compreensão, considerado o primeiro patriarca pelo Zen chinês, ou (Ch'an).

Desta forma, através do zen, desenvolveu-se um caminho que se concentrou na experiência direta mais do que em crenças racionais ou escrituras reveladas. A sabedoria era passada, não por meio de palavras, mas através da linhagem da transmissão direta, de mente a mente, do pensamento de um mestre a um discípulo. Comumente, acredita-se que esta linhagem continuou ininterrupta, desde o tempo do Buda até os dias de hoje. Historicamente, esta crença é discutível, devido à falta de evidência que dê suporte a ela. De acordo com D. T. Suzuki, a ideia de uma linha de descendência a partir de Sidarta Gautama é uma instituição distintiva do zen. Ele acredita que foi inventada por estudiosos, através da hagiografia, para dar legitimidade e prestígio ao zen.

Parábola de Buda

Ao atravessar um campo, um homem encontrou um tigre. Fugiu a sete pés, com o tigre atrás dele. À sua frente, encontrou um precipício em que acabou por cair. Mas conseguiu agarrar-se à raiz de uma velha videira e ali ficou pendurado, com o tigre a cheirá-lo. Tremendo de medo, olhou para baixo e viu outro tigre, lá longe em baixo,que o esperava, cheio de apetite. A sua vida estava completamente dependente da videira. Mas apareceram dois ratos, um branco e outro preto, os quais, pouco a pouco, começaram a roer a raiz da videira. Foi só nesse momento que se apercebeu que, mesmo ao pé da raiz, crescia um morango apetitoso. Agarrando-se à videira com uma mão, colheu o morango com a outra. Foi o melhor morango que alguma vez comeu!

Temperamento

Um estudante de Zen foi ter com Bankei e queixou-se:
- Mestre, tenho um temperamento ingovernável. Como posso curá-lo?
- Tens uma coisa muito estranha, replicou Bankei. Mostra-me lá então isso que tens.
- Neste preciso momento, não lhe posso mostrar, respondeu o outro. Acontece inesperadamente!..., respondeu o estudante.
- Então, concluiu Bankei, não deve ser a tua verdadeira natureza. Se fosse, podias mostrar-me em qualquer altura. Quando nasceste, não o tinhas e não foram os teus pais que to deram. Pensa nisso.

A estrada enlameada

Tanzan e Ekido caminhavam juntos numa estrada enlameada. Caía ainda uma chuva forte. Junto a um cruzamento da estrada, encontraram uma moça bela, que não conseguia atravessar, porque não queria sujar o kimono de seda que trazia.

- Anda moça, disse Tanzan imediatamente. E, carregando-a nos seus braços, atravessou-a para o outro lado da zona mais enlameada.

A partir daí, Ekido ficou calado todo o caminho que percorreram até à noite. Ao chegarem ao templo onde ficariam a pernoitar, Ekido não conseguiu conter-se e disse a Tanzan:

- Nós, os monges, não nos aproximamos de mulheres. Especialmente se são jovens e bonitas. É perigoso. Por que fizeste aquilo?

- Eu deixei a moça lá atrás - disse Tanzan. Tu ainda estás a carregá-la?

Tudo é melhor

Quando Banzan passeava num mercado, ouviu uma conversa entre um carniceiro e um cliente.

- Dê-me o melhor bocado de carne que tem, disse o cliente.
- Na minha loja, tudo é o melhor, respondeu o carniceiro. Não encontrará aqui nenhum bocado de carne que não seja o melhor!

Ao ouvir estas palavras, Banzan tornou-se um iluminado.

O meu coração arde como fogo

Soyen Shaku (1859-1919), um roshi, mestre do zen-budismo japonês, (ch. laoshi) da escola rinzai, disse, um dia: "O meu coração arde como fogo. Mas os meus olhos são frios como cinzas mortas". Ele propôs as seguintes regras de vida:

De manhã, antes de vestir-se, acenda incenso e medite.
Coma a intervalos regulares e deite-se a uma hora regular. Coma sempre com moderação e nunca até ficar plenamente satisfeito.
Receba as suas visitas com a mesma atitude que tem quando está só. Quando só, mantenha a mesma atitude que tem quando recebe visitas.
Preste atenção ao que diz e, o que quer que diga, pratique-o.
Quando uma oportunidade chegar, não a deixe passar, mas pense sempre duas vezes antes de agir.
Não se deixe perturbar pelo passado. Olhe para o futuro.

A sua atitude deve ser a de um herói sem medo, mas o coração deve ser como o de uma criança, cheio de amor.
Ao retirar-se, ao fim do dia, durma como se tivesse entrado no seu último sono.
Ao acordar, deixe a cama para trás, instantaneamente, como se tivesse deixado fora um par de sapatos velhos.

Confucionismo


O confucionismo (儒學, Loudspeaker.svg? Rúxué) ou confucianismo é um sistema filosófico chinês criado por Kung-Fu-Tsé, (孔夫子). Entre as preocupações do confucionismo estão a moral, a política, a pedagogia e a religião. Conhecida pelos chineses como "ensinamentos dos sábios". Fundamentada nos ensinamentos de seu mestre, o confucionismo encontrou uma continuidade histórica única. O confucionismo é considerado uma filosofia, ética social, ideologia política, tradição literária e um modo de vida. Confúcio, forma latina de Kung Fu Tsé, filósofo chinês do século VI a.C, compila e organiza antigas tradições da sabedoria chinesa e elabora uma doutrina assumida como oficial na China por mais de 25 séculos. Combatido como reacionário durante a Revolução Cultural chinesa (1966-1976), o confucionismo toma novo impulso após as recentes mudanças políticas no país. Atualmente, 25% da população chinesa declara-se adepta do confucionismo.De particular importância Confúcio deu caráter moral a funcionários-apoiar o governo e seus representantes.

Temas do raciocínio confucionista

A humanidade é o núcleo no confucionismo. Uma maneira simples de apreciar o pensamento de Confúcio é considerá-lo como sendo baseado em diferentes níveis de honestidade, e uma forma simples de entender o pensamento de Confúcio é examinar o mundo usando a lógica da humanidade. Na prática, os elementos do confucionismo acumularam-se ao longo do tempo. Existe o clássico (Wuchang , constituído por cinco elementos: Ren (仁, a Humanidade), Yi (justiça), Li (礼, ritual), Zhi, conhecimento) e Xin (信, integridade), e há também o Sizi clássico, com quatro elementos: Zhong (忠, lealdade), Xiao (孝 , a piedade filial), Jie (节, continência) e Yi (义, justiça). Há ainda muitos outros elementos, tais como o Cheng (诚, honestidade), Shu (恕, bondade e perdão), Lian (廉, honestidade e pureza), Chi (耻, vergonha, juízo e senso de certo e errado), Yong (勇, bravura), Wen (温, amável e gentil), Liang (良, bom, bom coração), Gong (恭, respeitoso, reverente), Jian (俭, frugal) e Rang (让, modéstia, discrição). Entre todos os elementos, o Ren (Humanidade) e o Yi (Justiça) são fundamentais. Às vezes, a moralidade é interpretada como o fantasma da Humanidade e da Justiça.

Ver agir em relação aos outros, mas de uma atitude subjacente da humanidade. O conceito de Confúcio de humanidade (仁, ren) é provavelmente melhor expresso na versão confucionista de Ética da reciprocidade, ou a Regra de Ouro: "não faça aos outros o que você não gostaria que fizessem a ti".

Confúcio nunca disse se o homem nasce bom ou mau, observando que, naturalmente, os homens são semelhantes, mas, na prática, são diferentes. Confúcio percebeu que todos os homens nascem com semelhanças intrínsecas, mas também que o homem é condicionado e influenciado pelo estudo e pela prática. A opinião de Xunzi é que os homens originalmente só querem o que eles instintivamente querem, apesar dos resultados positivos ou negativos que aquilo pode trazer; por isso o desenvolvimento é necessário. Do ponto de vista de Mencius todos os homens nascem para compartilhar a bondade, como a compaixão e o bom coração, embora possam se tornar malignos. O texto clássico dos Três Personagens começa assim: "As pessoas no momento em que nascem são naturalmente boas (bondosas)", que decorre da ideia de Mencius. Todos os pontos de vista, eventualmente, levam ao reconhecimento da importância da educação humana e do desenvolvimento.

O Ren também tem uma dimensão política. Se o governante não tem o Ren, o confucionismo diz que será difícil, se não impossível, para os seus súditos comportarem-se humanamente. O Ren é a base da teoria política confuciana: pressupõe um governante autocrático, exortado a não agir desumanamente com seus súditos. Um governante desumano corre o risco de perder o "Mandato dos Céus", o direito de governar. Um governante sem tal mandato não precisa ser obedecido. Mas um governante que reina de forma humana e cuida do povo deve ser obedecido rigorosamente, pois a benevolência de seu governo mostra que ele foi incumbido pelo céu. O próprio Confúcio tinha pouco a dizer sobre a vontade do povo, mas seu principal seguidor, Mêncio, disse em uma ocasião que a opinião das pessoas sobre certos assuntos importantes devem ser consideradas.

Ao contrário de profetas de religiões monoteístas, Confúcio não pregava uma teologia que conduzisse a humanidade a uma redenção pessoal. Pregava uma filosofia que buscava a redenção do Estado mediante a corretude do comportamento individual. Tratava-se de uma doutrina orientada para esse mundo, pregava um código de conduta social e não um caminho para a vida após a morte.

Ritual

No Confucionismo, o termo "ritual" logo foi estendido para incluir o comportamento cerimonial secular e, eventualmente, refere-se também ao decoro ou polidez que se vê no dia a dia. Rituais foram codificados e tratados como um sistema completo de normas. O próprio Confúcio tentou reanimar a etiqueta das dinastias antigas. Após sua morte, as pessoas o viam como uma grande autoridade sobre os comportamentos dos rituais.

É importante notar que o "ritual" desenvolveu um significado específico no confucionismo, ao contrário de seus significados religiosos usuais. No confucionismo, os atos da vida cotidiana são considerados rituais. Os rituais não são necessariamente regimentados ou práticas arbitrárias, mas sim as rotinas em que muitas vezes as pessoas se inserem, consciente ou inconscientemente, durante o curso normal de suas vidas. Moldar os rituais de uma forma que leve a uma sociedade saudável e satisfeita e a um povo saudável e satisfeito é um objetivo da filosofia confucionista.

Lealdade

A lealdade ( 忠, zhong) é equivalente à piedade filial em um plano diferente. É particularmente relevante para a classe social a que a maioria dos alunos de Confúcio pertencia, porque a única maneira de um jovem estudioso e ambicioso fazer o seu caminho no mundo confuciano chinês era entrar em um serviço civil no governo. Como a piedade filial, no entanto, a lealdade era frequentemente subvertida pelos regimes autocráticos da China. Confúcio defendia uma sensibilidade à realpolitik das relações de classe na sua época. Ele não propôs que "o poder dá a razão", mas que um ser superior que recebeu o "mandato do céu" (天命) deveria ser obedecido devido a sua retidão moral.

Anos mais tarde, no entanto, a ênfase foi colocada mais sobre as obrigações dos governados para o governante, e menos nas obrigações do governante para os governados.

A lealdade era também uma extensão dos deveres do indivíduo com os amigos, cônjuge e familiares. A lealdade para com a família vinha primeiro, em seguida para o cônjuge, depois para o governante, e por último aos amigos. A lealdade era considerada uma das grandes virtudes humanas.

Confúcio também percebeu que a lealdade e a piedade filial podem entrar em conflito.

História

Dos seguidores de Confúcio, o século I A.C. encontrou em Meng Zi (孟子) (Mêncio) e Xun Zi (荀子) um grande desenvolvimento e expansão na sociedade. Esses dois autores buscaram compreender o confucionismo dentro de um pensamento natural, recorrente nas forças que atuavam na sociedade em seus períodos de vida.

Mêncio

Mêncio acreditava na importância da educação para retificar a boa natureza humana, que teria sido depravada em função dos conflitos e das necessidades impostas pela vida. O ser humano possuiria a capacidade de desenvolver um espírito de ajuda mútua de modo a evitar os conflitos interpessoais inerentes à existência humana.

Xun Zi

Já Xun Zi recorreu ao verso da moeda para compreender o papel de Confúcio. Ele acreditava numa natureza perversa do homem, derivado dos mesmos instintos de preservação dos animais. Talvez pensando nos rituais propostos para a sociedade, e pela necessidade de ordenação, tal como no maior fundamento das lendas de fundação chinesas e na influência jurista, Xun Zi via no interior do homem uma inteligência capaz de articular meios pelo qual poderia evitar sua condição natural de forma arbitrária, mas que para isso haveria de ter criado uma escala de valores delimitantes da ação humana.

Mêncio conseguiu uma boa repercussão popular por sua abordagem otimista da vida, mas as classes altas da sociedade viram em Xun Zi uma explicação razoável para suas dúvidas. Assim ao menos deixam transparecer algumas biografias de Sima Qian (II a. C.).

Império chinês

O Confucionismo se tornaria a doutrina oficial do império chinês durante a dinastia Han ( séculos III a. C. - III d. C.), encontrando continuadores ao longo deste período que se destacaram em vários campos diferentes. Donz Zhong shu, por exemplo, buscou revigorar e re-interpretar o confucionismo através das teorias cosmológicas dos [cinco elementos] (Terra, Madeira, Fogo, Metal e Água); Wang Chong utilizou-se de um ceticismo lógico para criticar as crenças infundadas e os mitos religiosos.

Embora tivesse perdido um certo vigor após a dinastia Han, o confucionismo seria novamente desenvolvido no movimento conhecido como neoconfucionismo, datado do século X d.C., através da figura de personagens como os irmãos Cheng e Zhu xi, o grande comentador confucionista.

Antiguidade

De qualquer modo, já na antiguidade o confucionismo atingiu um pleno sucesso, tornando-se uma filosofia moral de profundo impacto na estrutura social e cotidiana da sociedade. O valor ao estudo, à disciplina, à ordem, à consciência política e ao trabalho são temas que o confucionismo introjetou de maneira definitiva na vida da civilização chinesa da antiguidade aos dias de hoje. Note-se que, ao contrário do que muitos afirmam, o confucionismo não se trata de uma religião. Não possui um credo estabelecido, mas apenas determinações rituais de caráter social, que permitem a um adepto do confucionismo a liberdade de crença em qualquer tipo de sistema metafísico ou religioso que não vá contra as regras de respeito mútuo e etiqueta pessoal.

Dias de hoje

O confucionismo é ainda praticado em vários países. Apesar da sua origem asiática, diversos países incorporam alguns conceitos do sistema em suas práticas notadamente urbanas. No Brasil, o confucionismo não é observado em nenhum segmento da sociedade.

Acredita-se que existam cerca de 6,5 milhões de adeptos do confucionismo no mundo todo.

Ditos do Confucionismo

Mesmo nas situações mais pobres uma pessoa que vive corretamente será feliz. Coisas mal adquiridas sempre trarão tristeza.