sexta-feira, 1 de julho de 2022

Inconsciente Coletivo

Inconsciente Coletivo, segundo o conceito de psicologia analítica criado pelo psiquiatra suíço Carl Gustav Jung, é a camada mais profunda da psiquê. Ele é constituído pelos materiais que foram herdados, e é nele que residem os traços funcionais, tais como imagens virtuais, que seriam comuns a todos os seres humanos. O inconsciente coletivo também tem sido compreendido como um arcabouço de arquétipos cujas influências se expandem para além da psiquê humana. Além do inconsciente coletivo, há o inconsciente pessoal, composto de materias adquiridos ao longo da vida.


Características

A existência do inconsciente coletivo não é derivada de experiências individuais, tal como o inconsciente pessoal, trabalhado por Freud, embora precise de experiências reais para poder se manifestar. Tais traços funcionais do inconsciente coletivo foram chamados por Jung de arquétipos, que não seriam observáveis em si, mas apenas através das imagens que eles proporcionam. Jung chamou a atenção para o fato de que o inconsciente coletivo retém informações arquetípicas e impessoais, e seus conteúdos podem se manifestar nos indivíduos da mesma forma que também migraram dos indivíduos ao longo do processo de desenvolvimento da vida.

O psicanalista Erich Fromm apresenta outra posição a respeito. É denominada de "inconsciente social", que seria a parte específica da experiência dos seres humanos que a sociedade repressiva não permite que chegue à consciência dos mesmos.

O inconsciente coletivo complementa o inconsciente pessoal, e muitas vezes se manifesta igualmente na produção de sonhos. Desta forma, enquanto alguns dos sonhos têm caráter pessoal e podem ser explicados pela própria experiência individual, outros apresentam imagens impessoais e estranhas, que não são associáveis a conteúdos da história do indivíduo. Esses sonhos são então produtos do inconsciente coletivo, que nesse caso atua como um depósito de imagens e símbolos, que Jung denomina arquétipos. Dele também se originam os mitos. No entanto, sendo o inconsciente coletivo algo que foi e está sendo continuamente elaborado a partir das experiências obtidas pelos seres, o acesso individual às informações contidas no inconsciente coletivo pode ser uma forma de explicar o mecanismo de operação de alguns dos fenômenos psíquicos incomuns que foram considerados desde o princípio da psicologia junguiana. Por outro lado, isso corresponde a introduzir mais do que arquétipos nesta estrutura psíquica universal, que pode conter igualmente dados fundamentais de operação dos fenômenos naturais, que se manifestam como leis das descrições químicas e físicas da natureza (ver mais), além, é claro, da biologia. Em síntese, o inconsciente coletivo da psicologia analítica pode ser um modelo adequado para a compreensão dos fenômenos mentais.

Os instintos são comuns aos animais e aos homens, entre eles estão o instinto sexual e a exigência de autoafirmação. Portanto, são fatores impessoais, universalmente difundidos e hereditários de caráter mobilizador, e de modo algum apenas qualidades pessoais. Muitas vezes se encontram tão afastados do limiar da consciência, que a moderna psicoterapia se vê diante da tarefa de ajudar o paciente a tomar consciência deles - os instintos. Estes não são vagos e indeterminados por sua natureza, mas forças motrizes especificamente formadas, que perseguem suas metas inerentes antes de toda conscientização, independendo do grau de consciência. Por isso eles são analogias rigorosas dos arquétipos, logo, os arquétipos são imagens inconscientes dos próprios instintos. Em outras palavras, representam o modelo básico do comportamento instintivo.

A atividade humana é, em grande escala, influenciada por instintos - abstração feita das motivações racionais da mente consciente. O inconsciente coletivo não é uma questão especulativa nem filosófica, mas empírica. É uma área da psique relacionada com tais formas universais, como nossos pensamentos, percepções e fantasias, que são influenciados por elementos formais inatos e universalmente presentes, cuja uma inteligência normal poderá, nessa ideia, descobrir tanto ou tão pouco misticismo como na teoria dos instintos.

Para comprovar a existência dos arquétipos, que formam o inconsciente coletivo, pressupõe-se o animismo, o que faz referência questões próprias ou relacionados à alma, logo são necessárias explicações mais profundas de como o material pode ser percebido.

Em primeiro lugar - e mais importante -, é necessário observar os sonhos. Estes, como produtos espontâneos da psique humana, não são influenciados por questões do consciente. Durante a avaliação, pode-se observar motivos do sonho conhecidas pelo pacientes, além dos desconhecidos. Quando não se sabe as causas,  é importante excluir as que o indivíduo tenha alguma noção sobre.

Ainda como modo de analisar o material, há a imaginação ativa. Esta tem relação com as fantasias advindas de concentração intencional, que são produtos que acabam por aparecer em nossos sonhos também. Quando sonhamos com determinada fantasia, ela tende a se tornar consciente. Após isso, a frequência com que sonhamos com ela diminui consideravelmente.

Por fim, os delírios dos doentes mentais, das fantasias em estado de transe e dos sonhos da primeira infância, que se sucede dos 3 aos 5 anos, são passíveis de observações. Para esse material ser válido, é essencial que sejam achados relações históricas convincentes. Como exemplo, não é interessante, de imediato, relacionar uma serpente presente em um sonho à mitologia, pois a presença de tal animal pode estar relacionada a outros fatores. Esse passo é algo que pressupõe um trabalho exaustivo, pois os símbolos não podem ser retirados de seus contextos. Assim, é quase impossível fazer essa etapa em apenas uma conferência.


Inconsciente pessoal

O inconsciente pessoal, na psicologia analítica de Carl Jung, representa todo o material inconsciente que foi adquirido em algum momento da vida do indivíduo. Entre essas aquisições pessoais, incluem-se "o esquecido, o reprimido, o subliminalmente percebido, pensado e sentido", bem como os complexos. Ao conceito de inconsciente pessoal, opõe-se o de inconsciente coletivo, composto por arquétipos herdados e comuns a todos os seres humanos.

Uma diferença importante a ideia de inconsciente de Jung e de Freud é que, para Freud, o inconsciente continha materiais reprimidos. Esses materias poderiam se tornar conscientes caso fosse suprimida a repressão Para Jung, por outro lado, o inconsciente (tanto o pessoal como o coletivo) inclui não só o reprimido, mas, basicamente, tudo aquilo que subjaz o limiar da consciência.

Os complexos são parte importante elemento do inconsciente pessoal.

Inconsciente

Inconsciente, do latim inconscius (às vezes chamado também subconsciente), é um termo psicológico com dois significados distintos. Em um sentido amplo, mais genérico, é o conjunto dos processos mentais que se desenvolvem sem intervenção da consciência. O segundo significado, mais específico, provém da teoria psicanalítica e designa uma forma específica de como o inconsciente (em sentido amplo) funciona. Enquanto a maior parte dos pesquisadores empíricos está de acordo em admitir a existência de processos mentais inconscientes (ou seja, do inconsciente em sentido amplo), o modelo psicanalítico tem sido alvo de muitas críticas, sobretudo de pesquisadores da psicologia cognitiva. Para evitar a confusão entre os significados, alguns autores preferem utilizar o adjetivo "não consciente" no primeiro significado, reservando o adjetivo "inconsciente" para o significado psicanalítico. Segundo Carl Gustav Jung (1875-1961), psiquiatra suíço, há uma distinção crucial entre características conscientes e inconscientes da psique: consciência é o que conhecemos e inconsciência é tudo aquilo que ignoramos. "O inconsciente não se identifica simplesmente com o desconhecido; é antes o psíquico desconhecido, ou seja, tudo aquilo que presumivelmente não se distinguiria dos conteúdos psíquicos conhecidos, quando chegasse à consciência." Para Jung ainda, o ego forma o centro crítico da consciência e, de fato, determina em grande medida que conteúdos permanecem no domínio da consciência e quais se retiram, pouco a pouco, para o inconsciente. O inconsciente inclui todos os conteúdos psíquicos que se encontram fora da consciência, por qualquer razão ou qualquer duração.

Carl Jung atribuiu, a Carus, médico e pintor do século XIX, a indicação do inconsciente como a base essencial da psiqueː

Embora vários filósofos, entre eles Leibniz, Kant e Schelling, já tivessem apontado muito claramente o problema do lado sombrio da psique, foi um médico que se sentiu impelido, de sua experiência científica e médica, a apontar para o inconsciente como a base essencial da psique. Este foi Carl Gustav Carus, a autoridade que Karl Robert Eduard von Hartmann seguiu.


História

Influências sobre o pensamento que se originam fora da consciência de uma pessoa já eram expressas nas antigas ideias de tentação, inspiração divina e influência dos deuses no comportamento das pessoas. Ideias semelhantes já eram expressas também nos Vedas hindus (2 500-600 a.C.).


No budismo

Os primeiros textos budistas, como o Cânon Pali, apresentam uma teoria sobre tendências mentais latentes (Anusaya, "viés latente", "predisposição", "disposição latente") que são pré-conscientes ou inconscientes. Esses padrões são mais tarde denominados "vasanás" (impressão) pelos budistas iogachara posteriores e foram considerados como residindo em uma camada mental inconsciente. O termo "grilhões" também está associado às tendências latentes.

Um texto posterior do Teravada, o Abhidhammattha-sangaha (séculos XI e XII) diz: “As disposições latentes são impurezas que 'repousam junto' do processo mental ao qual pertencem, surgindo à tona como obsessões sempre que encontram condições adequadas” (Abhs 7.9). A escola Teravada também sustenta que existe um fluxo de consciência subconsciente chamado Bhavanga. Outro conjunto de fatores mentais inconscientes responsáveis por influenciar o comportamento de alguém inclui os asavas (em sânscrito, asrava, "afluxo"). Diz-se que esses fatores "intoxicam" e "confundem" a mente. O Buda ensinou que era preciso removê-los da mente através da prática, a fim de alcançar a libertação. Diz-se que os asavas surgem de diferentes fatores: sensualidade, agressão, crueldade, corpo e individualidade são alguns dos fatores dados.

A escola Iogachara do budismo Maaiana (começando do século III ao V EC) estendeu essas ideias ao que foi chamado de teoria budista da mente inconsciente. Este conceito foi denominado ālaya-vijñāna (a consciência fundamental) que armazena sementes cármicas (bija) e sofre renascimento. Essa teoria foi incorporada a uma teoria Iogachara mais ampla das Oito Consciências e também é sustentada no budismo tibetano. Ver Budismo e psicologia.


No Ocidente

Platão, em diversas obras, falou sobre a realidade do irracional no ser humano. Em A República, ele descreve como os homens, no estado de sono, podem dar vazão a diversas coisas que, despertos, rechaçariam. Alguns autores, como Giovanni Reale, vêem essa passagem como uma antecipação da reflexão psicanalítica. Diversos filósofos antigos e medievais, ao se ocuparem da parte irracional do ser humano, reconheceram que há realidades encobertas, profundezas que às quais cada um não tem acesso livre. Desse modo, pode-se considerar que a filosofia falou, desde os primórdios, do inconsciente, ou ao menos apontou para a sua existência.

Paracelso é tido como o primeiro a fazer menção a um aspecto inconsciente da cognição em seu trabalho "Sobre doenças" (1567). Sua metodologia clínica criou um sistema convincente que alguns consideram o início da moderna psicologia científica. William Shakespeare explorou o papel do inconsciente em muitas de suas peças, sem, no entanto, nomeá-lo como tal.

Alguns usos raros do termo "inconsciência" (em língua alemãː Unbewußtseyn) podem ser encontrados na obra do médico e filósofo alemão do século XVIII Ernst Platner.

Já o termo "inconsciente" (em língua alemãː Unbewusste) foi cunhado pelo filósofo idealista alemão do século XVd III Friedrich Schelling (em sua obra "Sistema de idealismo transcendental") e, posteriormente, foi introduzido na língua inglesa pelo poeta romântico e ensaísta Samuel Taylor Coleridge (em sua obra "Biografia literária").

Filósofos ocidentais como Arthur Schopenhauer, Baruch Espinoza, Gottfried Wilhelm Leibniz, Johann Gottlieb Fichte, Georg Wilhelm Friedrich Hegel, Eduard von Hartmann, Søren Kierkegaard e Friedrich Nietzsche já usavam o termo "inconsciente".

Em 1880, Edmond Colsenet apoiou, na Sorbonne, uma tese filosófica sobre o inconsciente. Elie Rabier e Alfred Jules Émile Fouillée realizaram sínteses do inconsciente "em um tempo em que Freud não estava interessado no conceito".

O psicólogo Jacques Van Rillaer aponta que "o inconsciente não foi descoberto por Freud. Em 1890, quando ainda não se ouvia falar de psicanálise, William James, em seu monumental tratado de psicologia ("Os princípios da psicologia"), examinou a maneira pela qual Schopenhauer, von Hartmann, Pierre Janet, Alfred Binet e outros usaram os termos "inconsciente" e "subconsciente".

O historiador da psicologia Mark Altschule observa que "é difícil - ou talvez impossível - encontrar um psicólogo ou psiquiatra do século XIX que não reconhecia que a atividade cerebral inconsciente era não apenas real mas também da maior importância".

Van Rilliaer poderia também haver mencionado que Eduard von Hartmann publicou um livro dedicado ao assunto, "Filosofia do inconsciente", em 1869 - antes de qualquer outra pessoa.

Os psicólogos alemães do século XIX Gustav Fechner e Wilhelm Wundt começaram a usar o termo "inconsciente" em sua psicologia experimental, no contexto de múltiplos e confusos dados dos sentidos que a mente organiza num nível inconsciente antes de revelá-los num todo convincente na forma consciente.

Sigmund Freud e seus seguidores desenvolveram um registro da mente inconsciente. Ele tem um importante papel na psicanálise. Segundo a leitura lacaniana de Freud, a pulsão é o conceito psicanalítico que mais se revela inseparável da questão sobre o que é o inconsciente.


De acordo com Sigmund Freud:


O inconsciente é certamente o verdadeiro intermediário entre o somático e o psíquico, talvez seja a ligação perdida tão procurada.

De acordo com Jacques Lacan:

O inconsciente é estruturado como uma linguagem.

Carl Gustav Jung, um psiquiatra suíço, desenvolveu o conceito mais além. Ele concordou com Freud que o inconsciente é um determinante da personalidade, mas propôs que o inconsciente pode ser dividido em duas camadasː o inconsciente pessoal e o inconsciente coletivo.

Análises do inconsciente também já foram feitas em relação ao conceito de potência e ato de Aristóteles. Ver Potencialidade e atualidade#Na psicologia.


Modelos do inconsciente

O inconsciente define um complexo psíquico (conjunto de fatos e processos psíquicos) de natureza praticamente insondável, misteriosa, obscura, de onde brotariam as paixões, o medo, a criatividade e a própria vida e morte.

Nos livros "Psicopatologia da vida cotidiana" e "A Interpretação dos sonhos", Sigmund Freud mostra que há um significado nos esquecimentos e outros atos falhos e nos sonhos, que não está em geral aparente de imediato. O fato de haver esse significado, mas ao mesmo tempo que ele não seja transparente ao indivíduo, sugere que o que consideramos nossa mente é como uma ponta de um aicebergue. A parte submersa seria, então, o inconsciente.

O conceito de inconsciente de Carl Gustav Jung se contrapõe ao conceito de inconsciente e pré-consciente de Freud. O pré-consciente seria o conjunto de processos psíquicos latentes, prontos a emergirem para se tornarem objetos da consciência. Assim, o pré-consciente poderia ser explicado pelos conteúdos que fossem aptos a se tornarem conscientes (determinismo psíquico). Já o inconsciente seria uma esfera ainda mais profunda e insondável. Haveria níveis inatingíveis no inconsciente.

O inconsciente não se confunde com o id. Este é uma parte do inconsciente, enquanto o ego e o superego possuem porções conscientes.

Jung separou o inconsciente pessoal do inconsciente coletivo. À camada mais profunda da psique humana deu o nome de inconsciente coletivo e concebeu o seu conteúdo como uma combinação de padrões e forças universalmente predominantes, chamadas "arquétipos" e "instintos". Em sua concepção, nada existe de individual ou único nos seres humanos nesse nível. Todos temos os mesmos arquétipos e instintos. O inconsciente é povoado por complexos. Foi esse o território que Jung explorou inicialmente em sua carreira como psiquiatra. Depois deu-lhe o nome de inconsciente pessoal. Todas as experiências comuns às mãos de pessoas que se encontram similarmente investidas de autoridade criam padrões psicológicos de base social, através de uma espécie de sutil programação do inconsciente pessoal. Os complexos materno e paterno continuam a dominar a cena no inconsciente pessoal. São os gigantes. Hoje, não existe consenso sobre se realmente existe um inconsciente coletivo, igual ou distribuído igualmente entre todas as culturas e povos. Mas os estudos de mitologia/religião comparada, de todos os povos e de todas as épocas da humanidade, dão fortes indícios e força a esse modelo. Cabe aqui citar um grande nome nessa área, Joseph Campbell, autor do livro The Power of Myth (O Poder do Mito). Seus estudos reforçam o modelo de inconsciente coletivo de Jung.


Controvérsia

Existe uma polêmica sobre a existência ou não da mente inconsciente.


Franz Brentano rejeitou o conceito de inconsciente em seu livro de 1874 "Psicologia de um ponto de vista empírico", embora sua rejeição se baseie em suas definições de "consciência" e "inconsciência". Jean-Paul Sartre oferece uma crítica à teoria do inconsciente de Freud em seu livro O Ser e o Nada, baseado na afirmação de que a consciência é, essencialmente, autoconsciente. Sartre também argumenta que a teoria freudiana da repressão tem uma falha interna. O filósofo Thomas Baldwin argumenta que o argumento de Sartre se baseia numa má compreensão sobre Freud. Erich Fromm argumenta que "a expressão 'o inconsciente' é uma mistificação (embora possa ser usada por razões de conveniência, como sou culpado de estar fazendo nestas páginas). Não existe algo como 'o' inconsciente; existem, apenas, experiências das quais temos consciência, e outras das quais não temos consciência, ou seja, das quais somos inconscientes. Se eu odeio um homem porque o temo, e sou consciente do meu ódio mas não do meu medo, podemos dizer que meu ódio é consciente e meu medo é inconsciente; ainda assim, meu medo não reside nesse lugar misteriosoː 'o' inconsciente".

John Searle ofereceu uma crítica ao inconsciente freudiano. Ele argumenta que os casos freudianos de estados mentais rasos, conscientemente mantidos poderiam ser melhor caracterizados como "consciência reprimida", enquanto a ideia de estados mentais mais profundamente inconscientes é mais problemática. Ele argumenta que a própria noção de coleção de "pensamentos" que existe em uma região privilegiada da mente que nunca é acessível à mente consciente é incoerente. Isso não implica que não existam processos "não conscientes" que formam a base de muito da vida consciente. Ao invés disso, Searle, simplesmente, argumenta que postular a existência de algo que é como um "pensamento" em tudo exceto no fato de que ninguém pode ter consciência dele (de fato, não pode sequer "pensar" nele) é um conceito incoerente. Falar de "algo" como sendo um "pensamento" implica que ou ele está sendo pensado por um pensador, ou poderia ser pensado por um pensador. Processos que não são relacionados causalmente ao fenômeno chamado pensamento são mais apropriadamente chamados de processos não conscientes do cérebro.

Outros críticos do inconsciente freudiano são David Stannard, Richard Webster, Ethan Watters, Richard Ofshe e Eric Thomas Weber.

David Holmes examinou sessenta anos de pesquisa sobre o conceito freudiano de repressão, e concluiu que não existe evidência positiva para esse conceito. Devido à falta de evidência para muitas hipóteses freudianas, alguns pesquisadores propuseram a existência de mecanismos inconscientes que são muitos diferentes dos mecanismos freudianos. Esses pesquisadores falam de um "inconsciente cognitivo" (John Kihlstrom), um "inconsciente adaptativo" (Timothy Wilson), ou um "inconsciente idiota" (Loftus e Klinger), que executa processos automáticos mas não possui os complexos mecanismos de repressão e retorno simbólico do reprimido.

Na moderna psicologia cognitiva, muitos pesquisadores procuraram retirar, da noção de inconsciente, o seu passado freudiano, e termos alternativos como "implícito" e "automático" foram adotados. Essas tradições enfatizam o grau pelo qual os processos cognitivos acontecem fora do âmbito da atenção cognitiva, e mostram como as coisas das quais somos inconscientes, não obstante, influenciam outros processos cognitivos, assim como o comportamento. Tradições de pesquisa ativa sobre o inconsciente incluem memória implícita e aquisição não consciente de conhecimento.


Psicologia cognitiva contemporânea

Pesquisa

Enquanto, historicamente, a tradição de pesquisa psicanalítica foi a primeira a focar no fenômeno da atividade mental inconsciente, existe um extensivo corpo de pesquisa conclusiva e conhecimento em psicologia cognitiva contemporânea devotado à atividade mental que não é mediada pela atenção consciente.

A maior parte da pesquisa cognitiva sobre os processos inconscientes foi feita na tradição acadêmica dominante do paradigma do processamento da informação. Em oposição à tradição psicanalítica, guiada por conceitos relativamente especulativos (no sentido de ser dificilmente verificáveis empiricamente) como o complexo de Édipo e o complexo de Electra, a tradição cognitiva de pesquisa sobre os processos inconscientes baseia-se em relativamente poucas premissas teóricas e é empiricamente orientada (isto é, primordialmente orientada pelos dados). A pesquisa cognitiva revelou que, automaticamente, e claramente fora da atenção consciente, os indivíduos registram e adquirem mais informação do que eles podem experimentar através de seus pensamentos conscientes.


Processamento inconsciente de informação sobre frequência

Por exemplo, uma extensa linha de pesquisa conduzida por Hasher e Zacks demonstrou que os indivíduos registram informação sobre a frequência de eventos automaticamente (isto é, fora da atenção consciente e sem o uso de recursos conscientes de processamento da informação). Mais ainda, as pessoas fazem isso de modo não intencional, "automaticamente", não importa as orientações que elas recebam. A habilidade de registrar inconscientemente e de modo relativamente acurado a frequência de eventos aparenta ter pouca ou nenhuma relação com a idade da pessoa, educação, inteligência ou personalidade. Consequentemente, pode representar um dos elementos fundamentais de construção da orientação humana no ambiente e possivelmente da aquisição de conhecimento processual e de experiência em geral.

Consciência

A consciência ou consciez é uma qualidade da mente, considerando abranger qualificações tais como subjetividade, autoconsciência, senciência, sapiência, e a capacidade de perceber a relação entre si e um ambiente. É um assunto muito pesquisado na filosofia da mente, na psicologia, neurologia e ciência cognitiva.

Alguns filósofos dividem consciência em consciência fenomenal, que é a experiência propriamente dita, e consciência de acesso, que é o processamento das coisas que vivenciamos durante a experiência (Block, 2004). Consciência fenomenal é o estado de estar ciente, tal como quando dizemos "estou ciente" e consciência de acesso se refere a estar ciente de algo ou alguma coisa, tal como quando dizemos "estou ciente destas palavras". Consciência é uma qualidade psíquica, isto é, que pertence à esfera da psique humana, por isso diz-se também que ela é um atributo do espírito, da mente, ou do pensamento humano. Ser consciente não é exatamente a mesma coisa que perceber-se no mundo, mas ser no mundo e do mundo, para isso, a intuição, a dedução e a indução tomam parte.


Etimologia

"Consciência" vem do termo latino conscientia, de consciens, particípio presente de conscire = estar ciente (cum = com, partícula de intensidade e scire = sei). Também encontramos uma possível raiz formada de junção de duas palavras do latim; conscius+sciens: conscius (que sabe bem o que deve fazer) e sciens (conhecimento que se obtém através de leituras; de estudos; instrução e erudição).


Consciência - função alta da mente

Duas abordagens comuns à consciência são aqueles que (1) adotam o "modelo de bloco de construção" do tipo "LEGO", segundo a qual qualquer campo consciente é feita de suas diversas partes, e o (2) "modelo do campo unificado", segundo o qual devemos tentar explicar o caráter unificado de estados subjetivos de consciência.


Modelo de bloco de construção

Função mental de perscrutar o mundo, conforme afirma Steven Pinker, a consciência é a faculdade de segundo momento – ninguém pode ter consciência de alguma coisa (objeto, processo ou situação) no primeiro contato com essa coisa; no máximo se pode referenciá-la com algum registro próximo, o que permite afirmar que a coisa é parecida com essa ou com aquela outra coisa, de domínio.


A consciência, provavelmente, é a estrutura mais complexa que se pode imaginar atualmente.


António Damásio, em O Mistério da consciência, divide a consciência em dois tipos: consciência central e consciência ampliada. Inspirados na tese damasiana, entende-se que a faculdade em pauta é constituída com uma espécie de anatomia, que pode ser dividida, didaticamente, em três partes:


dimensão fonte - onde as coisas acontecem de fato, o aqui agora: o meu ato de escrever e dominar o ambiente e os equipamentos dos quais faço uso, o ato do internauta de ler, compreender a leitura e o ambiente que o envolve a todo os instantes etc. Essa dimensão da consciência não retrocede muito ao passado e, da mesma forma, não avança para o futuro; ela se limita a registrar os atos presentes, com um espaço-tempo (passado/futuro) suficiente para que os momentos (presentes) tenham continuidade.

dimensão processual - amplitude de sistema que abriga expectativas, perspectivas, planos e qualquer registros mental em aberto; aquelas questões que causam ruídos e impulsionam o ser humano à busca de soluções. Essa amplitude de consciência permite observar questões do passado e investigar também um pouco do futuro.

dimensão ampla - região de sistema que, sem ser um dispositivo de memória, alberga os conhecimentos e experiências que uma pessoa incorpora na existência. Todo os conhecimentos do passado e experimentações pela qual o ser atravessou na vida: uma antiga profissão que não se tem mais qualquer habilidade para exercer, guarda registros importantes que servirão como experiência em outras práticas. Qual dimensão processual, esse amplitude da consciência permite examinar o passado e avançar no futuro - tudo dentro de limites impostos pelo próprio desenvolvimento mental do indivíduo.

Além da anatomia de constituição, listada acima, a consciência humana também guarda alguns estados:


Condições de consciência (vigília normal, vigília alterada e sono com sonhos), modos de consciência (passivo, ativo e ausente) e focos de consciência (central, periférico e distante).


Modelo do campo unificado

O modelo do campo unificado é defendido pelo filósofo John Searle


Consciência, autoconsciência e autoconhecimento

Manfred Frank (em "Self-consciousness and Self-knowledge", ver bibliografia abaixo) apresenta a relação entre consciência, autoconsciência e autoconhecimento da seguinte maneira:


Consciência pressupõe autoconsciência. Não há como alguém estar consciente de alguma coisa sem estar consciente de estar consciente dessa coisa.

A autoconsciência é pré-reflexiva. Se a autoconsciência fosse o resultado da reflexão, então só teríamos autoconsciência após termos consciência de alguma coisa que fosse dada à reflexão. Mas isso não pode ser o caso, pois, como dissemos antes, consciência pressupõe autoconsciência. Logo, a autoconsciência é anterior à reflexão.

Autoconsciência e consciência são distintas logicamente, mas funcionam de maneira unitária.

O autoconhecimento isto é, a consciência reflexiva ou consciência de segunda ordem pressupõe a consciência pré-reflexiva, isto é, a autoconsciência.

De acordo com o esquema acima, a autoconsciência é o elemento fundamental da consciência. Sem ela não há consciência nem reflexão sobre a consciência.


Definições do Senso Comum

Ação do indivíduo ou grupo sem o intuito ou vigilância da área central de consciência.

Conjunto de processos e/ou fatos que atuam na conduta do indivíduo ou construindo a mesma, mas escapam ao âmbito da ferramenta de leitura e interpretação e não podem, por esta área, ser trazidos a custo de nenhum esforço que possa fazer um agente cujo sistema mental não possui o treinamento adequado. Essas atividades, entretanto, costumam aflorar em sonhos, em atos involuntários (sejam eles corretos e inteligentes ou falhos e inconsistentes) e nos estados alterados de consciência.


Definições concorrentes

Visão determinista: alguns entendem o inconsciente como ações inconscientes baseadas em informações do passado, experienciadas ou noticiadas.

Visão reducionista: o inconsciente é entendido como um neologismo científico reducionista para não explicar ou negar os estados alterados da consciência.

Alterações da consciência

Alterações Normais: sono (é um comportamento e uma fase normal e necessária. Tem duas fases distintas, que são: Sono REM -Rapid Eye Movement- e o sono NÃO REM) e sonho (vivências predominantemente visuais classificadas por Freud como um fenômeno psicológico "rico e revelador de desejos e temores")

Alterações patológicas: qualitativas e quantitativas.

Quantitativas:

- Rebaixamento do nível de consciência: compreendido por graus, está dividido em 3 grupos principais: obnubilação da consciência(grau leve a moderado - compreensão dificultada), sopor(incapacidade de ação espontânea) e coma(grau profundo - impossível qualquer atividade voluntária consciente e ausência de qualquer indício de consciência).


- Síndromes psicopatológicas associadas ao rebaixamento do nível de consciência:


Delirium (diferente do "delírio", é uma desorientação tempo espacial com surtos de ansiedade, além de ilusões e/ou alucinações visuais)

Estado onírico (o indivíduo entra em um estado semelhante a um sonho muito vívido; estado decorrente de psicoses tóxicas, síndromes de abstinência a drogas e quadros febris tóxico-infecciosos)

Amência (excitação psicomotora, incoerência do pensamento, perplexidade e sintomas alucinatórios oniroides)

Síndrome do cativeiro (a destruição da base da ponte promove uma paralisia total dos nervos cranianos baixos e dos membros)

Qualitativas:

Estados crepusculares (surge e desaparece de forma abrupta e tem duração variável - de poucas horas a algumas semanas)

Dissociação da consciência (perda da unidade psíquica comum do ser humano, na qual o indivíduo "desliga" da realidade para parar de sofrer)

Transe: (espécie de sonho acordado com a presença de atividade motora automática e estereotipada acompanhada de suspensão parcial dos movimentos voluntários)

Estado hipnótico (técnica refinada de concentração da atenção e de alteração induzida do estado da consciência).

Neuropsicanálise

Neuropsicanálise é um movimento dentro da neurociência e da psicanálise para combinar os conhecimentos de ambas as disciplinas para uma melhor compreensão da mente e do cérebro, considerando sem dúvida, a revisão de um dos principais e relegados trabalhos do jovem neurologista Sigmund Freud (1856 — 1939) o seu Projeto de uma psicologia para neurologistas (Entwurf einer Psychologie), de 1895, somente publicado 12 anos após a sua morte. Supõe-se que rejeitado pelo próprio Freud que de fato não o publicou e avançou progressivamente em conceitos desconhecidos em sua época para a psicologia, sem os requisitos da ciência neurológica, que temos hoje, para os aferir.

Um dos motivos dessa revisão é obviamente o grande avanço da neurociência nesses últimos tempos. A relevância que assumiu a psicofarmacologia, estratégia abandonada por ele desde seus experimentos com a cocaína publicados em 1884, e especialmente as conquistas que o método anatomo-clínico, de ampla difusão na neurologia de sua época, obteve com a tecnologia da bioimagem.

Para alguns autores a importância do Entwurf einer Psychologie (Projeto de uma psicologia para neurologistas) são as suas inter-relações com outros textos de Freud como justificou na sua publicação no volume I de suas Obras Completas, o seu editor inglês James Strachey. Gabbi Jr, que retoma essa ideia destacando a presença de suas proposições nos escritos de Freud sobre sonhos (capítulos VII de A Interpretação dos Sonhos) e escritos sobre afasia (Sobre a concepção das afasias de 1891) entre outros voltados à metapsicologia, diferenciando ainda estas proposições, de outras concepções psicológicas encontradas na filosofia, por sua originalidade e associação a um efeito clínico (remissão de sintomas) e regulação dos processos de prazer e dor (concepção utilitarista).

Observe-se, porém, como ressaltado por muitos autores, que se trata de uma via de mão dupla, há tanto interesse dos psicólogos e especialistas em ciências humanas nos processos neurológicos como dos neuropsiquiatras e psicofarmacologistas nos processos simbólicos e que, sem dúvida, é essencialmente significativo, aos que lidam com processos reconhecidamente orgânicos tipo demências, deficiência mental de causa conhecida, afasias, etc., o valor dos processos simbólicos e afetivos para explicação dos sintomas e recuperação dos pacientes e manutenção da saúde mental de seus cuidadores e familiares de quem dependem.

A neurologia do sono, deve a Freud as explicações do trabalho onírico de simbolização dos sonhos, o esquecimento seletivo (amnésia especial), as suas fontes de estímulos e recuperação mnemônica, os processos de excitação, inibição motora que se dão em relação à associações específicas (catexia/recalque) como bem demonstrado por Freud. Um trabalho de investigação (a interpretação dos sonhos) que exigiu considerações especiais sobre as palavras e símbolos praticamente como uma nova teoria sobre a organização da linguagem no cérebro paralela e/ou complementar às proposições de Carl Wernicke (1848 – 1905) e Paul Broca (1824 - 1880).

Eric R. Kandel, da Universidade Columbia, o Prêmio Nobel de 2000 em fisiologia ou medicina e muitos outros neurocientistas referem-se à psicanálise como "ainda a visão da mente mais intelectualmente satisfatória e coerente". Um de seus méritos, sem dúvida é estender-se da patologia, emoções aos processos cognitivos em um modelo integrado ou relacional.

Observe-se também a importância dada à psicanálise por muitos neurologistas de nossos dias, levando a psicanálise um pouco mais a sério do que, digamos, psicólogos experimentais fazem. Como resultado, o grupo de neuro-psicanálise tem sido capaz de desenhar ideias úteis a partir de um número distinto de neurocientistas, a exemplo de António Damásio (1944) , Eric Kandel (1929), Joseph LeDoux (1949), Helen S. Mayberg (1956), Jaak Panksepp (1943), Vilanayur S. Ramachandran (1951), Oliver Sacks (1933), e muitos outros. (ver: editorial board of the Journal Neuro-Psychoanalysis). 

Não se pode descartar a hipótese porém de que esse interesse seja porque o próprio Freud começou sua carreira como neurologista. Os neurocientistas Pribram e Gill assinalam que muitos dos conceitos do que ficou conhecido como metapsicologia na teoria psicanalítica foram definidos com excepcional clareza nesse manuscrito de 1895 e se constituem como uma teoria biológica do controle cognitivo. Apontam para uma possível revisão da psicanálise como uma disciplina puramente psicológica, usando observações comportamentais e a análise de relatos verbais como suas técnicas inclusive porque há evidências de que Freud se baseava em pressupostos neurológicos e biológicos, apesar de explicitamente não reconhecer ou negar esse fato. Nessa perspectiva muitos dos estudos voltados à dimensão orgânica como os Escritos sobre Cocaína (Uber Coca), dependência química ("fuga da realidade") e sobre os mecanismos neurais da Hipnose também voltam a ter novas possibilidades de leitura e interpretação.

Michael Harvey da Sociedade internacional de Psicanálise refere-se a neuropsicanálise como um campo emergente de estudos que neste momento está envolvida na exploração interdisciplinar da associação entre a neurologia, neuropsicologia, neuroanatomia, psicanálise tendo como proposição o método clínico-anatômico observacional utilizada por Freud quando trabalhava como neurologista (ver: Bibliografia e sinopses dos escritos científicos do Dr. Sigm. Freud 1877-1897 (1897) [11]) e a neuropsicologia dinâmica notabilizada por Alexander Luria (1902 — 1977) por volta de 1939 cujos princípios se aproximam aos da psicanálise por aceitar que as funções da fisiologia cerebral ocorrem na interação dinâmica de diversas áreas espalhadas pelo cérebro, e não resultante de uma localização num centro.

Pelo fato de Freud ter iniciado sua carreira como neurologista, muitos neurologistas contemporâneos proeminentes tem significativa consideração pela psicanálise quando comparados a outros campos da psicologia, como a Psicologia experimental. Como resultado, o grupo neuropsicanalítico tem sido capaz de obter informações úteis de um número de neurocientistas distintos, tais quais: António Damásio, Oliver Sacks, Eric Kandel, Vilayanur S. Ramachandran, entre outros.


Questões de método

Assim como na própria biologia é um desafio comparar distintos planos de análise tipo o molecular e histológico ou dos órgãos e sistemas com o das populações e ecossistemas, mais desafiador ainda é a comparação entre a análise neurobiológica e a mente ou instâncias psíquicas tal como vistas e estudadas na psicanálise. O que é reforçado pela retórica das oposições “humanismo versus cientificismo”, ou então “especulações teóricas versus conhecimento científico”. 

Segundo Mantilla, 2017 (acima citado) são contrapostos diferentes modelos de compreensão do sofrimento mental (biológico ou subjetivo) e diferentes conceitualizações sobre a doença mental (relacionada a condições físicas ou a condições do espírito) e sobre a sua terapêutica (a escuta analítica versus a intervenção psiquiátrica baseada em evidência científica).

Esta controvérsia, de certo modo, se insere nas perspectivas de estudo da relação mente – corpo desenvolvida pela medicina psicossomática e mais recentemente pela psicologia da saúde ou medicina comportamental e mesmo pelos estudos iniciais da psicologia da consciência de Wilhelm Wundt (1832-1920) e William James (1842–1910) sobre o fluxo do pensamento e percepção fundamentados na introspecção. O mérito de Sigmund Freud, nessa mesma época, foi a proposição de estudo do inconsciente e da relação mente – corpo, descrita por ele como estabelecida pela relação entre o aparelho psíquico (ego, superego e id) e o sistema nervoso, de certo modo opondo-se às definições da psicologia como estudo da consciência e percepção por Wundt e James.

De acordo com Medeiros Freud nunca deixou de considerar a intervenção de variáveis biológicas e identificou na sua primeira concepção do aparelho uma psíquico 3 instâncias que o constituem: a topográfica (quanto a localização dos eventos psíquicos (Pcpt - Cs/ Id); a dinâmica (de transformação dos mesmos); e a econômica (de intensidade ou força dos eventos psíquicos), inclusive nesse último aspecto utiliza termos neurológicos "descarga neuronal" e "catexe" ou "energia associada" a um determinado símbolo ou "representação", atualmente entendido mais como metáfora ou modelo analógico do que como um mecanismo fisiológico de um circuito neuronal . Para Medeiros a neurociência e psicanálise não se opõem e não se conflitam, elas apenas divergem na escolha de seus objetos de estudo, as subestruturas do tecido nervoso e seus centros, para a primeira, e o sentido particular do simbólico para o sujeito, sua apreensão da realidade e história afetiva, para a segunda.

Para Graef  apesar da diferença de métodos que exploram a subjetividade, no caso da psicanálise e observação sistemática e teste de hipóteses via experimentação (neurociência), alguns conceitos e construtos teóricos comuns podem e estão sendo examinados, a exemplo dos estudos psicanalíticos da ansiedade que distinguem ansiedade neurótica (crônica) do ataque de ansiedade, validados farmacologicamente por Donald Klein, 1960 e atualmente denominados "transtornos de ansiedade generalizada" e "ataques de pânico". Por outro lado, no seu ponto de vista a teoria da “canalização” da libido (pulsão sexual) não tem tido ressonância na análise neurobiológica.

Um pesquisador que não pode ser esquecido nessa tentativa de aproximar a psicanálise da metodologia experimental é John Bowlby (1907-1990) na sua tentativa de aproximação da teoria dos instintos de sistema motivacionais, investigando também: a relação entre períodos críticos do desenvolvimento e estrutura da personalidade (trauma); a teoria da estampagem (imprinting), e especialmente, a relação de perda do objeto amado e a depressão e tristeza, hipótese esboça da no texto de Freud “Luto e melancolia”, 1917, abordada na perspectiva da etologia, teoria do controle (reconhecidamente influenciado pela re-leitura do "Projeto" de Freud por Priban & Gil) e modelos estatísticos de análise.

Ainda sobre o método vale lembrar o pioneirismo de Freud na história da psicofarmacologia, considerada por alguns autores como tendo início no registro da efetiva ação de alguns fármacos sobre transtornos psiquiátricos na década de 1950 principalmente o Lítio, 1949; clorpromazina, 1952; meprobamato, 1954; iproniazida, 1957 e clordiazepóxido 1960. Segundo Robert Byck que reuniu e re-editou os escritos de Freud sobre cocaína (1884-1885 - setenta anos antes), a ideia de que uma substancia sedativa pudesse ser útil no tratamento da doença mental é bastante antiga, a revisão feita por Freud incluía diversos trabalhos anteriores ao seu tais como os de Morselli e Buccola com uso da cocaína no emprego da melancolia além de uma descrição "etnográfica" sobre a planta e sua utilização na América do Sul e a história de sua difusão na Europa ocidental.

Sua maior contribuição nessa área segundo Byck (o.c.) foi o método de registro sistemático de suas experiências em si mesmo, com os mais sofisticados instrumento de medição, de sua época, correlacionado com as alterações cuidadosamente descritas de humor e percepção ocorridas durante a ação da droga no tempo - uma relação crucial para experimentação em populações humanas, assinala. Observa ainda que o ensaio de Freud praticamente estabeleceu uma tradição para descrição de substancia com propriedades psicoativas, incluindo as realizadas com LSD, mescalina e outros compostos psicodélicos citando como exemplo as publicações de Albert Hofmann (1906-2008), em 1943 sobre os efeitos da dietilamida do ácido lisérgico, ao qual nós podemos acrescentar o clássico estudo de Aldous Huxley (1894-1963) sobre a mescalina "As Portas da Percepção" publicado em 1954.


Psicologia analítica

É sabido que divergências entre as proposições da teoria psicanalítica freudianas conduziram Carl Gustav Jung (1875-1961) às novas proposições do que se denomina atualmente como psicologia analítica contudo não se pode desconhecer a íntima relação desta com a psicanálise dita "freudiana", inclusive é descrito pelo próprio Jung a importância das contribuições de Freud para suas pesquisas e atividade psiquiátrica, onde destacou os estudos sobre histeria, hipnose e sonho.

Apesar do relativo consenso de que Jung abandonou as pesquisas e método da abordagem experimental em psiquiatria, iniciada na clínica psiquiátrica de Burghölzli (1904-1909) em especial suas pesquisas sobre associação de palavras, utilizando simultaneamente medidas das vivências emocionais mesurando-se o reflexo psicogalvânico. Experiências estas que lhe renderam o título de doutor honoris causa juntamente com S. Freud na Clark University em 1909. 

Atualmente o teste de associação de palavras é pouco utilizado, embora seja ensinado em alguns programas de treinamento junguianos e alguns analistas o utilizam como uma técnica para melhorar o processo terapêutico. Sendo também relevante sua contribuição à concepção do polígrafo (detector de mentiras) ainda hoje utilizado em processos judiciais alguns estados dos EUA e outros países. 

Além das contribuições da psicologia analítica à psicopatologia e psicoterapia, que não necessariamente nos remetem ás pesquisas e proposições da neuropsicanálise, não podemos dizer o mesmo das contribuições de Jung ao fenômeno do déjà vu ou criptomnésia e especialmente ao destaque dado às proposições do controvertido psiquiatra Otto Gross (1877 - 1919). Na clássica obra "Tipos Psicológicos" Jung, além do “problema dos tipos em psicopatologia", analisa e concilia teoria de Gross como expresso no Die Sekundärfunktion zerebrale (1902) e Über psychopathische Minderwertigkeit (1903) numa possível relação entre insanidade maníaca com uma “consciência” similar a extroversão, e as manifestações paranoicas possuindo uma identidade com a introversão.

Jung também lhe atribui o crédito por ser o primeiro a criar uma hipótese simples para a "função secundária" enquanto um processo de padrões de atividade das células cerebrais que tem início assim que ocorre a "função primária". Segundo ele a “função secundária” corresponderia ao verdadeiro trabalho da célula, ou seja, à produção de uma atividade psíquica positiva, de uma representação, por exemplo. A função secundária seria uma restituição ou reconstituição - um estado de alteração - comparado com o estado anterior. A ação equivaleria portanto a um processo energético oposto - o desfecho de uma tensão química, ou seja, uma desintegração química. Observe-se que tal concepção é notavelmente semelhante às modernas concepções de comunicação sináptica através da liberação e “destruição” de neurotransmissores e/ou da consciência enquanto atividade de módulos ou grupos neuronais organizados na denominada "rede do modo padrão" (DMN, sigla da expressão em inglês default mode net­work) de atividade cerebral. 

O interesse de neurocientistas, especialmente psicofarmacologistas, tem se voltado para as concepções de Jung sobre os sonhos, e sua proposta de interpretação terapêutica da imaginação mitopoética na avaliação de experiências psicodélicas induzidas por psilocibina, mescalina e outras substancias psicodislépticas, apesar de se constar que, possivelmente, houve declarações de Jung questionando o valor dos psicodélicos para o crescimento pessoal, e oposição à sua aplicação terapêutica. Stanislav Grof, (1931) um dos mais antigos e proeminentes pesquisadores da aplicação terapêutica de tais substâncias já havia sinalizado tal aplicação da concepção de aparelho psíquico junguiano na pesquisa com psicodélicos e mais recentemente (2013) o psicólogo Scott J. Hill , Ph.D. publicou o livro "Confronto com o Inconsciente: Psicologia Junguiana profunda e experiência psicodélica" onde resgata os depoimentos de C. G Jung sobre psicodélicos e discute os diversos modelos (psicolíticos e psicodélicos) das diversas escolas de psicoterapia psicodélica, seu valor terapêutico e comparando-os aos conceitos e princípios junguianos básicos. 

Neurociência Computacional

A neurociência computacional (ou neurociência teórica) é a área da neurociência que tem por objetivo o estudo teórico do sistema nervoso e das funções cerebrais usando modelos matemáticos e computacionais. A palavra "computacional" no nome da área tem dois sentidos: um é para indicar que o computador é utilizado como ferramenta para a construção de modelos; o outro é para indicar que ela procura entender e modelar as "computações" feitas pelo cérebro, isto é, como o cérebro representa e processa informação. Por sua própria natureza, a neurociência computacional é uma ciência interdisciplinar que combina diferentes campos do saber, como a neurobiologia, a matemática, a ciência da computação, a física, a engenharia elétrica, a ciência cognitiva, a psicologia e a filosofia.

A neurociência computacional é distinta do conexionismo e de disciplinas como aprendizado de máquina, redes neurais artificiais e teoria da aprendizagem computacional, na medida em que enfatiza descrições funcionais e biologicamente plausíveis de neurônios e sistemas neurais, sua fisiologia e dinâmica de aprendizagem. Para atingir seus objetivos, a neurociência computacional utiliza modelos matemáticos e computacionais de células, circuitos e redes neurais, procurando integrar dados experimentais obtidos com as mais diferentes técnicas – desde o nível microscópico, acessível por estudos moleculares e celulares, até o nível sistêmico, acessível por estudos comportamentais – para construir um arcabouço teórico coerente e quantitativo da estrutura e da função do sistema nervoso, tanto em condições normais como patológicas.


História

O termo "neurociência computacional" foi introduzido por Eric L. Schwartz, que organizou uma conferência com esse título em 1985 em Carmel, Califórnia, a pedido da Fundação de Desenvolvimento de Sistemas, para fornecer um resumo do estado atual de um campo que até aquele momento era referido por uma variedade de nomes, tais como biofísica matemática, cibernética, teoria do cérebro e redes neurais. Os resultados dessa reunião definidora foram publicados em 1990 como o livro Neurociência Computacional. O primeiro encontro internacional aberto de pesquisadores voltado para a Neurociência Computacional foi organizado por James M. Bower e John Miller em São Francisco, Califórnia, em 1989, e tem continuado a cada ano desde então como a reunião anual "Computational Neuroscience Meeting" organizada pela Organização para Neurociência Computacional. O primeiro programa de pós-graduação em neurociência computacional foi o programa de Doutorado em Sistemas Neurais e Computacionais do Instituto de Tecnologia da Califórnia (CALTECH) em 1985. A partir de então, a área se expandiu rapidamente e atualmente há vários eventos regionais e internacionais voltados para ela, como encontros, congressos e cursos de curta duração, assim como dezenas de programas de pós-graduação espalhados pelo mundo com interface com a neurociência computacional. Listas não-exaustivas de eventos, pesquisadores e recursos disponíveis na Web relacionados à neurociência computacional podem ser encontrados em páginas mantidas por indivíduos ou instituições. Exemplos são a página mantida por Jim Perlewitz, Computational Neuroscience on the Web, a a página de eventos em neurociência computacional do grupo de mídia Frontiers: 


A neurociência computacional tem suas raízes históricas ligadas aos trabalhos de pessoas como Louis Lapicque, Warren McCulloch, Walter Pitts, Donald Hebb, Alan Hodgkin, Andrew Huxley, David Hubel, Torsten Wiesel, Wilfrid Rall, Richard FitzHugh e David Marr, para citar alguns.

Lapicque propôs, em um artigo de 1907, a primeira versão do atualmente chamado modelo integra-e-dispara de neurônio (o nome foi dado por Bruce Knight na década de 1960). Devido à sua simplicidade e facilidade de implementação, o modelo integra-e-dispara é um dos modelos de neurônio mais populares da neurociência computacional, sendo amplamente utilizado para a simulação e o estudo matemático de redes com muito neurônios.

McCulloch e Pitts propuseram, em um artigo publicado em 1943, o primeiro modelo de redes de neurônios da neurociência computacional. A importância histórica do modelo de McCulloch-Pitts é que ele mostrou, pela primeira vez, que redes compostas por unidades simples de tipo "tudo-ou-nada", inspiradas nos neurônios biológicos, interconectadas entre si por sinapses excitatórias e inibitórias são capaz de efetuar computações complexas.

Hebb, em seu livro de 1949, The Organization of Behavior, formulou um mecanismo hipotético para explicar como as memórias se formam e são mantidas por longos períodos de tempo. A ideia central desse mecanismo é que as memórias são armazenadas nas sinapses entre os neurônios, ao invés de nas suas atividades elétricas, e que o aprendizado consistiria de modificações nas eficiências das sinapses. Segundo esse mecanismo, conhecido atualmente como regra de plasticidade sináptica hebbiana, quando dois neurônios que estão conectados por uma sinapse ficam ativos, isto é, emitem disparos de potenciais de ação, conjuntamente por um certo tempo, a eficiência da sinapse entre eles aumenta. A regra de plasticidade hebbiana é a base de praticamente todas as teorias da neurociência computacional para aprendizado e memória e há evidências experimentais que dão suporte a ela.

Hodgkin e Huxley elucidaram os mecanismos iônicos responsáveis pela geração do potencial de ação em um neurônio e desenvolveram um modelo matemático que descreve a evolução temporal do potencial de ação e sua propagação pelo axônio em concordância com dados experimentais. Os estudos de Hodgkin e Huxley foram iniciados em 1939, interrompidos durante a Segunda Guerra Mundial e terminados com a publicação de uma série de cinco artigos em 1952. Eles receberam o Prêmio Nobel de Medicina e Fisiologia em 1963 por esse trabalho. O modelo de Hodgkin-Huxley descreve um potencial de ação em termos de variáveis matemáticas que representam explicitamente as condutâncias iônicas da membrana do neurônio. Por isso, o formalismo matemático introduzido por Hodgkin e Huxley é chamado de "baseado em condutância". Esse formalismo é a base muitos dos modelos biofísicos de neurônios utilizados atualmente em neurociência computacional.

Hubel e Wiesel, em trabalhos publicados em 1959 e 1962, descobriram que os neurônios no córtex visual primário, a primeira área cortical que processa sinais vindos da retina, respondem de maneira seletiva a variações na orientação de estímulos luminosos com a forma de uma linha projetados nos campos receptivos dos neurônios. Essa descoberta lhes valeu o o Prêmio Nobel de Medicina e Fisiologia em 1981. A descoberta de que os neurônios do córtex visual primário possuem campos receptivos orientados, ao contrário das células ganglionares da retina, cujos campos receptivos são circulares, mostrou que estímulos sensoriais são transformados pelo cérebro à medida que passam de um estágio de processamento de informação para outro. Ela foi a primeira evidência experimental a sugerir mecanismos neuronais responsáveis pela formação de percepções, estimulando o desenvolvimento de modelos teóricos para explicar como esse processamento poderia ser feito em termos computacionais.

Wilfrid Rall iniciou a modelagem computacional biofisicamente realista de neurônios e dendritos, usando a teoria do cabo para construir o primeiro modelo multicompartimental de um dendrito. Donald Hebb foi um dos pioneiros na tentativa de se encontrar um substrato biológico para os fenômenos mentais, propondo mecanismos sinápticos e neurais capazes de levar grupos (cell assemblies) de células dispersas pelo cérebro a atuar brevemente como sistemas únicos. O trabalho de David Marr centrou-se nas interações entre neurônios, sugerindo abordagens computacionais ao estudo de como os grupos funcionais de neurônios no hipocampo e neocórtex interagem, armazenam, processam e transmitem informação.

A neurociência computacional se diferencia da área da psicologia conhecida como conexionismo e das teorias sobre aprendizagem de disciplinas como aprendizado de máquina, redes neurais e teoria estatística de aprendizado, pois ela enfatiza descrições funcionais ou biologicamente realistas de neurônios e sua fisiologia e dinâmica. Os modelos da neurociência computacional buscam capturar as características essenciais do sistema biológico em escalas de tempo múltiplas, desde correntes de membrana e oscilações químicas até aprendizado e memória. Esses modelos computacionais são usados para testar hipóteses que possam ser verificadas diretamente por experimentos biológicos atuais ou futuros.


Atualidade

No momento o campo está passando por uma rápida expansão, provocado pelo acúmulo de dados experimentais e pelo aparecimento de pacotes de programas computacionais para a execução de simulações biologicamente detalhadas de neurônios individuais e redes de neurônios, como o NEURON e o GENESIS, que permitem a construção rápida e sistemática de modelos neurais em larga escala para estudos in silico.


Principais tópicos

As pesquisas de neurociência computacional podem ser classificadas de modo geral em várias linhas de investigação. A maioria dos neurocientistas computacionais colabora estreitamente com os experimentalistas para analisar novos dados e sintetizar novos modelos de fenômenos biológicos.


Modelagem de neurônio único

Mesmo neurônios individuais têm características biofísicas complexas e podem executar cálculos. O modelo original de Hodgkin e Huxley somente emprega duas correntes sensíveis à voltagem (canais iônicos sensíveis à voltagem são moléculas de glicoproteína que se estendem através da dupla capa lipídica, permitindo que os íons atravessem sob certas condições através do axolema), a de ação rápida de sódio e a para dentro de potássio. Embora bem-sucedido em prever as características qualitativas e temporais do potencial de ação, no entanto, não consegue prever uma série de características importantes, como a adaptação e desvio. Os cientistas agora acreditam que há uma grande variedade de correntes sensíveis à voltagem e as implicações das dinâmicas, modulações e sensibilidades diferentes destas correntes é um tópico importante da neurociência computacional.

As funções computacionais de dendritos complexos também estão sob intensa investigação. Há uma vasta literatura a respeito de como diferentes correntes interagem com as propriedades geométricas dos neurônios.

Alguns modelos também estão rastreando caminhos bioquímicos em escalas muito pequenas, tais como espinhos ou fendas sinápticas.

Há muitos pacotes de software, tais como GENESIS e NEURON, que permitem uma modelagem rápida e sistemática de neurônios realistas. Blue Brain, um projeto fundado por Henry Markram da École Polytechnique Fédérale de Lausanne, visa construir uma simulação biofisicamente detalhada de uma coluna cortical no supercomputador Blue Gene.

Um problema no campo é que as descrições detalhadas de neurônios são caras e isso pode prejudicar as investigações de redes realistas, onde muitos neurônios precisam ser simulados. Assim, os pesquisadores que estudam grandes circuitos neurais normalmente representam cada neurônio e sinapse simplesmente, ignorando muito do detalhe biológico. Isso é problemático, pois há evidências de que a riqueza das propriedades biofísicas na escala de neurônio único pode fornecer mecanismos que servem como blocos de construção para a dinâmica da rede. Por isso, há um incentivo para produzir modelos de neurônios simplificados que podem reter a fidelidade biológica significativa a uma baixa sobrecarga computacional. Algoritmos foram desenvolvidos para produzir modelos de neurônios de execução fiel, mais rápida e simplificada como substitutos para modelos de neurônios detalhados computacionalmente caros.


Desenvolvimento, padronização axonal, e orientação

Como os axônios e dendritos se formam durante o desenvolvimento? Como os neurônios migrar para a posição correta nos sistemas central e periférico? Como as sinapses se formam? Sabe-se a partir da biologia molecular que partes distintas do sistema nervoso liberam sinais químicos distintos, de fatores de crescimento a hormônios que modulam e influenciam o crescimento e desenvolvimento de ligações funcionais entre os neurônios.

Investigações teóricas sobre a formação e padronização de conexão sináptica e morfologia são ainda incipientes. Uma hipótese que tem atraído recentemente alguma atenção é a hipótese da fiação mínima, a qual postula que a formação de axônios e dendritos minimiza efetivamente a alocação de recursos, mantendo o máximo armazenamento de informação.


Processamento sensorial

Os primeiros modelos de processamento sensorial dentro de um quadro teórico são creditados Horace Barlow. Um tanto semelhante à hipótese de fiação mínima descrito na secção anterior, Barlow compreendia o processamento dos sistemas sensoriais iniciais como sendo uma forma de codificação eficiente, onde os neurônios codificavam informação o que minimizava o número de spikes. O trabalho experimental e computacional, desde então, apoiaram esta hipótese, de uma forma ou de outra.

A pesquisa atual no processamento sensorial é dividida entre uma modelagem biofísico de diferentes subsistemas e uma modelagem mais teórica da percepção. Os modelos atuais de percepção sugerem que o cérebro executa alguma forma de inferência Bayesiana e integração das diferentes informações sensoriais na geração de nossa percepção do mundo físico.


Memória e plasticidade sináptica

Modelos mais antigos de memória são principalmente baseados nos postulados da aprendizagem Hebbiana. Modelos biologicamente relevantes, tais como a rede de Hopfield foram desenvolvidos para lidar com as propriedades associativas, ao invés de conteúdo endereçável, estilo de memória que ocorrem em sistemas biológicos. Estas tentativas focam principalmente na formação da memória a médio e longo prazo, localizada no hipocampo. Todos os modelos de memória de trabalho, contando com teorias de oscilações de rede e atividade persistente, foram construídos para capturar algumas características do córtex pré-frontal da memória relacionada ao contexto.

Um dos principais problemas na memória neurofisiológica é como ela é mantida e mudada através de múltiplas escalas de tempo. Sinapses instáveis são fáceis de sequenciar, mas também propensas a perturbação estocástica. Sinapses estáveis não esquecem tão facilmente, mas elas também são mais difíceis de se consolidar. Uma hipótese computacional recente envolve cascatas de plasticidade que permitem às sinapses funcionarem em múltiplas escalas de tempo. Modelos estereoquimicamente detalhados da sinapse à base de receptor de acetilcolina com o método Monte Carlo, trabalhando em uma escala de tempo de microssegundos, foram construídos. É provável que nas próximas décadas as ferramentas computacionais contribuirão muito para a compreensão de como as sinapses funcionam e mudam em relação ao estímulo externo.


Comportamentos de redes

Neurônios biológicos são ligados uns aos outros de uma forma complexa e recorrente. Essas conexões são, ao contrário da maioria das redes neurais artificiais, esparsas e geralmente específicas. Não se sabe como a informação é transmitida através de tais redes esparsamente conectadas.

As interações dos neurônios em uma pequena rede podem ser muitas vezes reduzidas a modelos simples como o modelo de Ising. A mecânica estatística de tais sistemas simples é bem caracterizada teoricamente. Existem evidências recentes que sugerem que a dinâmica de redes neuronais arbitrárias pode ser reduzida para as interações de pares. Não se sabe, contudo, se tal dinâmica descritiva transmite qualquer função computacional importante. Com o surgimento da microscopia de dois fótons e da imagem de cálcio, agora tem-se métodos experimentais poderosos com os quais testar as novas teorias sobre redes neuronais.

Em alguns casos, as interações complexas entre os neurônios inibitórios e excitatórios podem ser simplificadas utilizando a teoria de campo médio, o que dá origem ao modelo de população de redes neurais. Enquanto muitos neurocientistas preferem modelos com reduzida complexidade, outros argumentam que descobrir relações funcionais estruturais depende de incluir o quanto for possível da estrutura neuronal e da rede. Modelos deste tipo são normalmente construídos em grandes plataformas de simulação como GENESIS ou NEURON. Houve algumas tentativas de fornecer métodos unificados que conectassem e integrassem estes níveis de complexidade.


Cognição, discriminação e aprendizagem

A modelagem computacional de funções cognitivas superiores só começou recentemente. Dados experimentais vem principalmente de gravação com primatas. O lobo frontal e lobo parietal funcionam como integradores de informações de várias modalidades sensoriais. Há algumas ideias preliminares sobre como circuitos funcionais mutuamente inibitórios nessas áreas podem realizar computação biologicamente relevante.

O cérebro parece ser capaz de discriminar e se adaptar particularmente bem em certos contextos. Por exemplo, os seres humanos parecem ter uma enorme capacidade para memorizar e reconhecer rostos. Um dos objetivos fundamentais da neurociência computacional é dissecar como os sistemas biológicos realizam estas computações complexas de forma eficiente e potencialmente replicar esses processos na construção de máquinas inteligentes.

Os princípios organizacionais de grande escala do cérebro são iluminados por muitos campos, incluindo biologia, psicologia e prática clínica. A neurociência integrativa tenta consolidar estas observações através de modelos e bancos de dados de medidas comportamentais e gravações. Estas são as bases para algumas das modelagens quantitativas da atividade cerebral em grande escala.

O Computational Representational Understanding of Mind (CRUM) é mais uma tentativa de modelar a cognição humana através de processos simulados como sistemas baseados em regras adquiridas e a manipulação de representações visuais na tomada de decisão.


Consciência

Um dos objetivos finais da psicologia/neurociência é ser capaz de explicar a experiência cotidiana da vida consciente. Francis Crick e Christof Koch fizeram algumas tentativas na formulação de um quadro coerente para o trabalho futuro em correlatos neurais da consciência (NCC), embora muito do trabalho neste campo permanece especulativo.


Neurociência clínica computacional

É um campo que reúne especialistas em neurociência, neurologia, psiquiatria, ciências da decisão e modelagem computacional para definir quantitativamente e investigar problemas em doenças neurológicas e psiquiátricas, e treinar cientistas e médicos que desejam aplicar esses modelos para diagnóstico e tratamento.

Neurociência Cognitiva

A neurociência cognitiva é uma área acadêmica que se ocupa do estudo científico dos mecanismos biológicos subjacentes à cognição, com foco específico nos substratos neurais dos processos mentais e suas manifestações comportamentais. Se questionam sobre como as funções psicológicas e cognitivas são produzidas no sistema nervoso central. A neurociência cognitiva é um ramo tanto da psicologia quanto da neurociência, unificando e interconectando-se com várias outras subdisciplinas, tais como a psicologia cognitiva, psicobiologia, neuropsicologia e neurobiologia. Antes do desenvolvimento de tecnologias como a ressonância magnética funcional, essa área da ciência era chamada de psicobiologia cognitiva. Os cientistas que se dedicam a essa área normalmente possuem estudos baseados na psicologia experimental ou neurobiologia, porém podem vir de várias disciplinas, tais como a psiquiatria, neurologia, física, engenharia, matemática, linguística e filosofia.

Os métodos empregados na neurociência cognitiva incluem paradigmas experimentais de psicofísica e da psicologia cognitiva, neuroimagem funcional, genômica cognitiva, genética comportamental, assim também como estudos eletrofisiológicos de sistemas neurais. Estudos clínicos de psicopatologia em pacientes com déficit cognitivo, constitui um aspecto importante da neurociência cognitiva.


Raízes científicas

Frenologia


As primeiras raízes da neurociência cognitiva estão na frenologia, a qual é uma teoria pseudocientífica que sustenta que a conduta pode estar determinada pela forma do couro cabeludo. Em meados do século XIX, Franz Joseph Gall e J. G. Spurzheim seguraram que o cérebro humano estava secionado em aproximadamente 35 diferentes regiões. Em seu livro, “A Anatomia e la Fisiologia do Sistema Nervoso em Geral, e do Cérebro em Particular”, Gall postulou que um bulbo maior em uma dessas áreas significava que essa parte do cérebro estava sendo usado mais frequentemente por essa pessoa. Essa teoria ganhou atenção pública significativa, levando a publicação de diários de frenologia e a criação de frenômeros, instrumentos que medem os solavancos das cabeças das pessoas. Ele propôs a teoria de que o cérebro é um campo agregado, o que significa que diferentes áreas do cérebro participam do comportamento.


Campo agregado

Pierre Flourens, um psicólogo experimental francês foi um dos muitos cientistas que desafiou a opinião do frenologistas. Através de seu estudo de coelhos e de pombas, descobriu que lesões em áreas específicas do cérebro não produziam mudanças visíveis no comportamento. Ele sugeriu que o cérebro é um campo agregado, o que significa que diferentes áreas cerebrais participam de tal comportamento.


Locacionalistas tardios

Estudos realizados por cientistas europeus, como John Hughlings Jackson, afirmaram que a visão locacionalista ou seccionalista do cérebro ressurgia como a principal maneira de entender o comportamento. Jackson estudou pacientes com danos cerebrais, particularmente epilepsia e descobriu que pacientes epiléticos faziam os mesmos movimentos clônicos e tônicos de músculos durante seus ataques. Isso fez com que Jackson criasse um mapa topográfico do cérebro, o qual foi essencial para o entendimento futuro do lóbulo cerebral.

Conexionismo

Conexionismo é um conjunto de técnicas de diferentes campos, como inteligência artificial, psicologia cognitiva, ciências cognitivas, neurociência e filosofia da mente, que modelam fenômenos mentais e de comportamento.Existem várias formas de conexionismo, sendo as mais comuns as que utilizam modelos de redes neurais.


Princípios básicos

O princípio fundamental do conexionismo é que fenômenos mentais podem ser descritos como a interconexão de redes que possuam unidades uniformes e simples. A forma de conexão e as unidades variam de modelo para modelo. Por exemplo, as unidades podem ser representada como neurônios e as conexões como sendo sinapses, como no cérebro humano.


Ativação

A ativação é usada em muitos modelos conexionistas, e pode ser descrita como um valor numérico que representa algum aspecto de uma unidade. Por exemplo, se a unidade no modelo utilizado for o neurônio, a ativação pode representar a probabilidade deste neurônio gerar um potencial de ação.


Redes neurais

É o método conexionista mais utilizado atualmente. Apesar de existirem muitas variedades de redes neurais, dois princípios são largamente utilizados:


Qualquer estado mental pode ser descrito como um vetor de dimensão N de ativações numéricas sobre unidades neurais em uma rede

A memória é criada pela modificação da força entre unidades neurais.

Realidade biológica

Modelos conexionistas não precisam necessariamente ser biologicamente reais, mas alguns pesquisadores tentam modelar os aspectos biológicos de redes neurais naturais.


Aprendizado

As interconexões recebem um valor ("peso") ajustado com base em teorias de aprendizado ou algoritmos de aprendizado.