segunda-feira, 14 de agosto de 2017

Peregrinos da Era do Fogo

 “Verdadeiro demais, cedo demais” talvez sejam as palavras mais apropriadas ao pequeno grupo de hereges que sobreviveu a oito séculos de cruel perseguição cristã e muçulmana – os Yezidis.
  De sua meca – a tumba de seu primeiro líder, Sheik Adi – localizada no Monte Lalesh próximo da antiga cidade de Nínive, o império Yezidi estendeu-se numa larga faixa invisível de aproximadamente trezentas milhas até a junção mediterrânea da Turquia e Síria numa ponta, e na outra até as montanhas

o Cáucaso na Rússia. Em intervalos ao longo desta faixa haviam sete torres – as Torres de Satã (Ziarahs) –, seis delas em formato trapezoidal, e uma, o “núcleo” do Monte Lalesh, construída de forma pontuda e sulcada. Cada torre possuía no topo um brilhante refletor heliográfico (solar), e funcionava como uma “usina de energia” de onde um mago satânico poderia irradiar sua vontade aos “descendentes de Adão”, e influenciar eventos humanos no mundo externo.
  Como os anjos caídos do Livro de Enoque, os Yezidis alegavam ser descendentes de Azazel. Os Yezidis acreditavam numa duplicata da história de Lúcifer, i.e. a manifestação do orgulho banida. Como as lend  rias tribos perdidas de Israel, os Yezidis romperam com suas origens como resultado de conflitos não resolvidos, e sentiram uma forte justificativa e propósito por causa de sua herança única, que isolou-os teologicamente de todas as outras raças.
  A lenda dos Yezidis a respeito da própria origem não é mais fantástica, para padrões científicos. Ela alude à criação do primeiro macho e fêmea da tribo através dos princípios mais tarde estabelecidos por Paracelso para a criação de um homúnculo; a saber: conservação de esperma em um recipiente onde ele germine e assuma a forma de um embrião humano.
  Os Yezidis fornecem um elo entre o Egito, Europa Oriental e o Tibete. O idioma dos Yezidis era o curdo – semelhante em som ao enoquiano, o idioma supostamente falado pelos anjos.
  Pouco antes de Sheik Adi (nome completo: Saraf ad-Din Abu-l-Fadail, Adi bem Musafir ben Ismael ben Mousa ben Marwan ben Ali-Hassan ben Marwan) morrer em 1163, ele ditou o que viria a ser um dos mais lendários manuscritos de todos os tempos – o Al-Jilwah (revelações). O Al-Jilwah, junto com o Mashaf Rei, que foi compilado no século seguinte, tornou-se conhecido como o Livro Negro – as palavras proferidas por Satã a seu povo. O Livro Negro não só contém o credo Yezidi, como também seus rituais.
  Os Yezidis adentravam seus templos através de pórticos ostentando as imagens de um leão, uma serpente, um machado de dois gumes, um homem, uma crista de galo, tesouras, e um espelho. O leão representava força e domínio; a serpente, procriação; o machado, potencial para o bem ou o mal; o homem, deus; e a crista, tesouras e espelho representavam vaidade. Mas o maior símbolo de vaidade, entretanto, foi a forma tomada por Satã na liturgia Yezidi – o pavão. Como eles não podiam dizer o nome de Satã (Shaitan) por medo de perseguição, o nome Melek Taus (Pavão Rei) foi usado. Tão grande era o risco de perseguição externa, que até palavras vagamente semelhantes a Satã eram proibidas.
  Os vestígios da cultura Yezidi que restaram hoje tem, como era de se esperar, encontrado não só “simpatia” sentimental mas, pior ainda, tentativas de pintar de branco a religião e negar que ela era adoração do demônio. Depois de oito séculos sem machucar ninguém, cuidando do próprio negócio, e mantendo a coragem de suas convicções – apesar dos grandes massacres de seus homens, mulheres, e crianças nas mãos dos bons – os Yezidis finalmente foram presenteados com uma repugnante forma de caridade pelo reconhecimento dos teólogos. Agora é comumente afirmado que os Yezidis foram “na verdade pessoas nobres e de elevada moral”, e portanto não poderiam ter adorado o demônio! It is difficult to asses this as anything other than the most blatant form of selective in-attention!
  Cada vez que um importante ritual Yezidi era realizado, a figura de um pavão de bronze (chamado sanjak) era retirada de um esconderijo secreto por um sacerdote e levada ao templo. Ela era colocada num pedestal em volta do qual havia uma fonte de água corrente que caía numa pequena piscina. Isto servia como o santuário e o ícone para o qual a homenagem era direcionada. A água supostamente vinha de um córrego que circulava por cavernas subterrâneas numa rede de passagens abaixo de cada Torre de Satã. O ponto de origem destes córregos acreditava-se ser a miraculosa nascente do Islam conhecida como Zamzam. As cavernas supostamente terminavam na cidade dos Mestres – Schamballah (Carcosa).
  Para estabelecer uma perspectiva apropriada, além das próprias crenças dos Yezidis a respeito das cavernas e os efeitos das Torres de Satã, as conjecturas dos estrangeiros devem ser mencionadas aqui. Há muito tem sido suposto que as Torres não se limitavam à geografia Yezidi, mas localizavam-se em várias partes do mundo como diversas construções de formato desconhecido – cada uma servindo como uma entrada na superfície para o mundo subterrâneo, alegoricamente ou não. Neste caso, as Torres Yezidis e sua influência satânica seriam o microcosmo de uma rede de controle muito maior.
  Os “clãs” dos Yezidis chamavam-se: Sheikan, no Monte Lalesh; Sinjar (Covil da Águia), no Curdistão; Halitiyeh, na Turquia; Malliyeh, no Mediterrâneo; Sarahdar, na Geórgia (ex-parte da URSS) e sul da Rússia; Lepcho, na Índia e Tibete; e Kotchar, que, assim como os beduínos, vagava sem área permanente.
  A interpretação Yezidi de Deus foi a mais pura tradição satânica. A idéia, tão proeminente na filosogia grega, de que Deus é uma existência absoluta e completa em si mesmo, imutável, fora do tempo e espaço, não existia na teologia Yezidi. Também era rejeitado o teocrático conceito judaico de Jeová, bem como o Deus maometano: o soberano absoluto. O conceito, único aos cristãos, de que Deus é Cristo em pessoa era totalmente inexistente. Se houve qualquer vestígio de uma manifestação pessoal de Deus, foi através de Satã, que instruiu e guiou os Yezidis rumo a uma compreensão dos princípios multifacetados da Criação, como a idéia platônica de que o Absoluto é estático e transcendental. Este conceito de “Deus” é essencialmente a posição tomada pelos satanistas mais expandidos. Orações eram proibidas, na mais severa tradição satânica. Até diárias expressões de fé eram chamadas de “recitais”.
  Poucos estrangeiros penetraram nos santuários dos Yezidis. As exceções quase restrinjem-se ao século passado(XIX) quando, infelizmente, a seita definhava como movimento organizado. E destes, pouquíssimos foram os que vislumbraram os sagrados sanjaks ou contemplaram os manuscritos do Livro Negro, pois ambos eram cuidadosamente guardados dos descendentes de Adão, cuja prole encheu o mundo de barro acéfalo. O Livro Negro foi traduzido para o inglês por Isya Joseph do manuscrito em árabe de Daud as-Saig.
  No início do século XX o escritor William Seabrook aventurou-se no deserto e subiu o Monte Lalesh, registrando sua jornada (Aventuras na Arábia) com uma objetividade que provou ele ser um bravo ainda que misericordioso homem. Numa época em que foi moda literária punir severamente o demônio, independente de seus atributos, a afinidade de Seabrook com Satã era visível em todos os seus escritos como se ele fosse um Bierce, Shaw, Twain, ou Wells. Ele foi um dos poucos estrangeiros que, pela primeira vez na história Yezidi, mostrou simpatia pelo demônio deles.
  Agora os Yezidis foram amplamente absorvidos pelo mundo “daqueles de fora”, mas sua influência teve efeito. Esta influência manifestou-se, em todo o período subterrâneo do Satanismo, nos procedimentos de praticamente toda irmandade secreta desde os Cavaleiros Templários, e em inúmeras obras literárias. Agora, após a frequentemente trágica epopéia dos Yezidis ter virado história, é seguro pronunciar o Nome Terrível.

A DECLARAÇÃO DE SHAITAN E O SILENCIOSO RITO DE DEDICAÇÃO

  O rito começa uma hora após o pôr-do-sol.
  Os congregantes adentram a câmara e sentam-se em travesseiros colocados no chão em semicírculo frente ao santuário de Melek Taus. A água corre sobre as pedras em volta do sanjak e numa piscina à sua base. Incenso é queimado em braseiros de cada lado do santuário. Os kawwals(músicos) ficam na parede traseira do templo, tocando um prelúdio em flautas, tambores e tamborins. (Nota: Como resposta emocional é essencial durante certos trechos do rito, ocidentais talvez necessitem de um tipo diferente de música. Há muito de recomendado nas obras de Borodin, Cut, Rimsky-Korsakoff, Ketelbey, Ippolitov-Ivanov, etc., apesar do désdem dos “puristas”.)
  O sacerdote entra, seguido de seus assistentes, todos vestindo robes negros com fitas vermelhas na cintura. O sacerdote posta-se perante o santuário, seus assistentes nos lados. A cabeça do sacerdote é raspada. A navalha usada para isto foi primeiro lavada nas águas mágicas de Zamzam.
  Toda música cessa, e o gongo é batido uma vez. A flauta volta a tocar, bem devagar e suavemente, e o sacerdote invoca a Terceira Chave Enoquiana. Quando ele tiver terminado, a flauta para, e, após uma pausa, o gongo é tocado de novo.
  A flauta começa a tocar, como antes, e o sacerdote recita o Al-Jilwah, o Livro Negro.

Os Rituais Satânicos

O Satanismo e o Pavão Negro - Louvando Shaitan desde 2.000 a.C.


Muitos grupos satânicos tentam imitar as religiões organizadas e isto é algo que tenho combatido há anos! Não é necessariamente culpa deles, já que a maioria dos satanistas vêm de um background cristão. À medida que o Satanismo Moderno amadurece, isto pode mudar. O "aspecto adversário" do Satanismo surgiu como um resultado do dualismo religioso, a crença de que o universo divide-se em duas forças mutuamente excludentes (bem e mal), opostas uma à outra.

Embora esta idéia possa demonstrar a beleza da tensão entre polaridades e faça parte de várias religiões, ela também pode ser perigosa. Esta idéia pode ser usada para afeta

o cérebro. Ela pode fazer a psique fragmentar-se e dividir-se, convencendo-o de que os inimigos de seu deus devem ser obrigatoriamente malignos e, portanto, destruídos! Isto explica os homens-bomba no Oriente Médio. Da próxima vez que um fanático religioso correr em sua direção com TNT amarrado ao próprio corpo e um detonador na mão, gritando "Allah seja louvado!", você entenderá como ele foi levado a acreditar que essa era a coisa certa a fazer. Tais pessoas acreditam estar fazendo o trabalho de seu deus e ser mártires. Elas não vêem que o ato é maligno na visão de todo mundo.

A crença num modelo absoluto de bem e um modelo absoluto de mal   uma mentira absoluta, e extremamente perigosa, porque a verdade não é totalmente preta nem branca, nem se constitui só de preto e branco. O papel do satanista consiste em utilizar este pensamento para quebrar as barreiras que os fundamentalistas tentam construir. Quando o satanista faz o papel de advogado do Diabo, ele recoloca o equilíbrio na balança. Nós damos voz ao ponto de vista oposto – isto diminui o poder de ditadores e extremistas religiosos definirem o que é "o mal" para nós. Considere as implicações disto. O Satanismo tem tudo para ser o movimento mais importante do séc. XXI!
Os cristãos tentarão negar a importância do Satanismo dizendo "essa é uma religião organizada que não existiria se não fosse pela Bíblia Sagrada". Além disso, muitos contam histórias exageradas de cultos e adoradores do Diabo. Os cristãos parecem esquecer que historicamente isto foi feito com os judeus. De fato, os primeiros cristãos foram acusados pelos romanos de adorar malignas forças das trevas, e por isso serviram de alimento para leões!

Nosso fundador (First Church of Satan), John Allee, frequentemente explica suas raízes religiosas da seguinte maneira:

Uma das religiões mais antigas do mundo têm sido falsamente acusada de adoração ao demônio. Acredita-se que os Yezidis remontem até 2.000 a.C. (quatro mil anos atrás).

Comparemos os princípios básicos dos Yezidis com as minhas crenças:

a) O pavão era tido como um símbolo do sol porque sua plumagem forma um círculo de raios, e um símbolo do demônio devido ao seu orgulho. Os Yezidis o chamavam de Ta’usi-Melek (pavão negro) ou Shaitan (Satã em árabe). Os Yezidis viam Ta’usi-Melek como uma chama com duas facetas básicas; iluminar, mas também queimar. (Allee: O Diabo está por trás de todo o mal no mundo? Sim, e de todo o bem também.)

b) Os Yezidis acreditavam que o bem e o mal são uma coisa só. (Allee: Cristãos e fundamentalistas islâmicos definem-se como monoteístas, mas praticam o dualismo; eles imaginam um demônio oposto ao Criador, mas a criação não pode ser dividida contra si mesma. Se o Diabo existe, então Deus existe. Se Deus criou Satã, então Deus é Satã. Você não pode criar algo sem que isto seja uma manifestação da sua própria vontade; ou seja, uma extensão de si mesmo.)

c) Os Yezidis afirmam que o próprio ser humano é uma mistura de duas forças: bem e mal. (Allee: Os deuses de diferentes culturas são semelhantes porque compartilham de nossas próprias características humanas e são projeções de nossa própria divindade. É como se você estivesse numa sala escura com uma auréola brilhando atrás de sua cabeça – você aponta para a sombra lançada à sua frente e exclama: "Eu vejo São Pedro... ou Satã!")

d) Todo Yezidi tem uma parte de Ta’usi-Melek em si mesmo. (Allee: Nós temos um conceito de divindade também; muitos satanistas não vêem um abismo que separa o criador da criatura. Deus não só está na minha vida como Deus é a minha vida. Colocando de forma simples, Deus É... ponto final! Todo homem e toda mulher é uma estrela – uma manifestação viva e física daquilo que é divino. O mesmo valor que você dá a Cristo, o satanista dá à toda humanidade. Portanto, o homem é Deus! Hail Thyself!)

Sobre o comentário "o Satanismo é uma religião organizada que não existiria se não fosse pela Bíblia Sagrada":

A primeira Bíblia de Gutenberg foi impressa em 1456 A.D.. Eu acho que é correto dizer que os princípios de minhas crenças – as raízes do Satanismo – podem ser vistos mesmo 4.000 anos atrás aproximadamente, muito antes do nascimento do Cristianismo. Satã foi visto no fértil crescente e na religião judaica e egípcia muito antes do advento do Cristianismo.

Os livros sagrados dos Yezidis


Os Yezidis constituem um povo do nordeste do Iraque. Embora falem o idioma curdo, seus costumes e crenças são bastante diferentes dos povos curdos em geral, e são amplamente perseguidos por isso.

São tido popularmente por adoradores do demônio, pela identificação de sua divindade principal (este apontamento é controverso) MALAK TAUS com AZAZ-IL (Azazel, Samiaza) que recebe os hepitetos adicionais de SHAYTAN (Satã) e IBLIS (como é chamado o demônio no Qorão).

Como bem apontou a tradutora do texto árabe, os deuses de um povo são convertidos em demônios pelos vizinhos, e assim, a fama de adoradores de um demônio ou espírito cognato específico cai por terra diante da realidade: os Yezidis adoram anjos, e simplesmente isso.
Especificamente quanto a religião, os Yezidis detêm um conjunto de crenças misticas por onde transitam sem qualquer estranhamento os ensinamentos gnósticos, islâmicos, cristãos e judeus.

COSMOGENESE

Os yezidis acreditam em um deus criador, tão alto e inacessível que acaba tornando-se uma figura desconhecida, a qual não exige nenhuma forma de adoração ou sacrifício. Foi esta divindade distante que criou o universo e a terra de uma pérola.

Após o que entregou este mundo sob os auspícios dos anjos, e deles emanaram os planetas, a abobada celeste e outros elementos cósmicos. Tal crença corresonde à cosmogênese gnóstica do Éons, na qual do Pleroma (o espaço celeste) emanaram as demais manifestações visíveis da natureza corpórea e incorpórea.

OS SETE ANJOS

Tal como algumas crenças orientais, de fundo semita e também grego, o demiurgo criou sete anjos ou espíritos, ou ainda, deuses menores. Todos estão identificados e tem atributos familiares a qualquer estudante de ocultismo.

Deles são os sete dias da semana e pode-se atribuir aos mesmos as características das mônadas qabalísticas (as sete sephirot do núcleo da arvore da vida) ou dos sete gênios qabalísticos, com algumas divergências.

Estes anjos, portanto desempenham funções especificas como se vislumbra; JIBRA-IL (Gabriel) atua como principal mensageiro do demiurgo. AZAZ-IL (Azazel) chamado também MALAK TAUS, é o intermediário entre a divindade criadora e o mundo inferior, identificado com a monada do sol, ou a sephirot Thiferet onde reside o Lógos.

Isto pode nos levar a conclusão mais do que óbvia de que a religião dos Yezidis é de orientação solar, e daí decorrem vários elementos relacionados, como por exemplo o patriarcado e uma marcante supremacia do homem sobre a mulher, ainda que, é verdade, nem toda religião de cunho solar apresente tais características, como por exemplo o conjunto de crenças thelêmicas.


A QUEDA, A REDENÇÃO E OS PAPEIS DUPLOS

Apesar de que os anjos designados no Mashef Resh (ou Kithab Resh) guardem semelhanças com aqueles encontrados no Livro de Enoch, o enredo difere em muitos pontos.

Naquele livro os anjos experimentaram a queda na hierarquia espiritual em virtude da paixão que sentiram pelas filhas dos homens. Azazel, na versão apócrifa de Enoch, era o chefe dos anjos rebeldes, e foi condenado a escuridão pelo deus hebreu.

No Mashef Resh, Azazel chefia a hierarquia dos anjos, mas não experimenta uma queda. Antes é ele quem tenta o homem, para posteriormente adjudicar-lhe a salvação. Conforme já escrevi em outros textos, o anjo Azazel, ou MALAK TAUS, faz um jogo duplo. No primeiro ato aparece como tentador, porque se não houver a queda, não haverá, por decorrência lógica, a possibilidade de salvação.

Tais crenças, são notavelmente idênticas aquelas tidas entre os ofitas, um grupo gnóstico proto-cristão, de quem provavelmente herdamos o famigerado evangelho de Judas Iscariotes. Eram tidos como “satanistas” porque rendiam culto a serpente do Éden, identificando-a com o redentor, e apoiavam suas crenças com algumas passagens bíblicas (entre elas a mais importante era o ídolo serpentino que Moises erigiu no deserto durante o Êxodo), bem como tinham a convicção de que o Cristo era a serpente que havia tentado Adão no paraíso, e que houve um conluio entre Judas e Jesus, para que a crucificação culminasse na realização das profecias; deste modo, tinham que Judas era um portador da gnosis, isto é, ele conhecia a verdade de forma direta, a despeito de todos os outros apóstolos. Malak Taus faz um papel semelhante no relato do paraíso, na concepção Yezidi.


A ORIGEM DOS YEZIDIS

Existem duas versões da origem dos Yezidis que são dispares. A primeira remonta a Adão, onde num certo relato, durante uma disputa entre ele e sua esposa, houve a geração, em uma ânfora, de duas crianças, macho e fêmea. Destas duas crianças nasceram os Yezidis, portanto filhos diretos de Adão, sem a intervenção de Eva.

Posteriormente Adão “conheceu” Eva, e daí foram gerados os demais povos (cristãos, muçulmanos, judeus, persas entre outros). Aqui também, diga-se existe uma divergência quanto aos textos bíblicos e muçulmanos, e mesmo entre os livros apócrifos. Saliente-se também que esta versão aponta como patriarcas os nomes de Enoch, Noé e Seth. Não há nenhuma referencia a Caim, como nos textos dos ofitas gnósticos, citados acima.

A outra versão foi a do nascimento do “bárbaro” Yezid, nascido de um escravo “pecador” de Mohammed (Maomé) com uma mulher de oitenta anos, que por um milagre, rejuvenesce do dia para a noite se tornando uma fértil donzela de vinte e cinco anos.


ORGANIZAÇÃO SOCIAL

Os Yezidis possuem um forte senso ético e um conjunto de estatutos bastante rígidos. É comum a divisão em castas. Em qualquer delas, a mulher possui papel subalterno, devendo total submissão ao homem o que de fato não corresponde a uma particularidade dos Yezidis, mas de todas as religiões de berço semita como o judaísmo, islamismo e cristianismo.

Encabeçando a hierarquia Yezidi encontramos os Sheiks, que desempenham papel de juizes, descendentes da linhagem do fundador da tribo, Yezid. Seu sinal distintivo é uma rede de couro com que enlaçam os braços, a semelhança do uso da tephila judaica (uma correia de couro que os judeus usam durante as orações). Os Sheiks podem “vender” áreas de terra no paraíso, a quem se dispuser a pagar. Além disso sua principal incumbência é a guarda da tumba de Skeik Adin, um dos mestres ou gurus dos Yezidis.

Em seguida estão os Emires, que também descendem de Yezid, o fundador da tribo e tem uma arvore genealógica própria. São tidos como mestres em assuntos cotidianos e pode dar ordens e proibir condutas como os Sheiks.

Depois vem os Kawwâls, que são músicos nas festividades.

Seguem-nos na hierarquia os Pir´s, que são responsáveis pelas observações dos jejuns e obrigações religiosas. São eles que usam o turbante negro, que identifica os Yezidis na região curda.

A seguir estão os Koshaks, ou como são designados em português, os kossakos, incumbidos de vários deveres religiosos como a instrução nos mistérios Yezidis, a interpretação dos sonhos e a profecia.

Após estão os Fakires, que instruem os jovens nos deveres religiosos e servem, como os Sheiks, a tumba de Skeik Adin.

Por fim estão os Mullas, ou educadores, que guardam os escritos sagrados, os interpretam e são atentos aos negócios da tribo.

Entre os Yezidis, é vedado sumariamente o casamento entre pessoas de castas diferentes, exceto aos Sheiks, que detêm o privilégio de escolher suas esposas dentre as diversas castas existentes. O casamento de Yezidis com outras tribos é vedado em todas as hipóteses. As mulheres não têm qualquer autonomia para escolher seus maridos, mas podem negar-se a um casamento, o que acarreta ao pai da noiva o pagamento de um tributo correspondente a um salário (não há especificação de valor) pelos seus serviços.


LIVROS SAGRADOS

As opiniões pronunciadas neste tópico são particulares, e não as elevo ao patamar de verdades. O que direi a seguir são conclusões que tive ao executar a tradução do texto que estou introduzindo.

Os Yezidis possuem vários livros sagrados, dentre os quais os principais são o Meshaf Resh e o Kithab Jiwa, que formam os pilares da literatura sagrada da tribo, ambos traduzidos abaixo. Tive a idéia de traduzi-los porque fiquei intrigado com um hipertexto que tive acesso (esta na web a disposição de qualquer pessoa) e que estava cheio de interpolações e versões diferentes, além do que, a mutilação textual evidenciava uma flagrante e deliberada idéia centrada no fato do provar o pretenso “satanismo” imputado aos Yezidis.

Quando traduzi o Kithab Jiwa, não se evidenciou qualquer elemento que pudesse respaldar o fato de que o culto Yezidi fosse integrado ao conjunto de crenças e práticas tidas entre alguns ocultistas como o “caminho da mão esquerda”. Eu admito que esperava por isso, por motivos pessoais, evidentemente, vez que me interesso particularmente pelo assunto.

Havia alguns escritos de Aleister Crowley onde ele pretende ser o reavivador das tradições “draconianas”, ou seja lá como se queira chamá-las, e as religiões mais chegadas ao lado “sombrio”, e o culto a divindade Yezidi identificada como Shaytan (i.e. MALAK TAUS) esta entre elas. As idéias que hoje se tem acerca do satanismo moderno foram, ao menos no ocidente, formuladas pela figura controversa deste ocultista inglês. Posteriormente vieram os escritos de LaVey, que tem uma abordagem toda própria, ainda que, superficialmente, pareça uma fraternidade ateística de fundo hedonista. A ONA (Order of Nine Angels) representa uma vertente teista, ou melhor, politeísta.

Os Yezidis, pelo menos para mim, antes de uma aproximação mais cuidadosa, soavam como uma forma de “satanismo” sarraceno, árabe ou islâmico. Vim a saber posteriormente, por fontes fidedignas, que os Yezidis constituíam um culto sufi, onde de fato se adorava um ídolo chamado MALAK TAUS, ou anjo pavão real, cujo nome também era SHAYTAN (Satã). Além desta figura emblemática, havia o culto da serpente negra (HAYYATH), que não é mencionada nos textos presentes, e que constitui um ídolo que igualmente incita e fascina a mente ocidental como todos os demais mitos ofídicos, associados a seres e complexos ctônicos, que após o advento do cristianismo, foram qualificados como "forças do mal".

Pois bem, ao iniciar a tradução do Meshaf Resh por vários momentos a verdade se revelou um tanto divergente da expectativa que eu por tanto tempo alimentei. De fato, os Yezidis muito pouco tem em comum com qualquer coisa que aqui no ocidente chamamos de “caminho da mão esquerda” ou mesmo “satanismo”; mas por outro lado, pela peculiaridade de suas crenças e práticas, pode-se classificá-los como pagãos (designação que desprezo por me parecer demasiado cristã), ou idólatras (porque de fato adoram e reverenciam ídolos, mas da mesma forma, a idolatria é um termo pejorativo entre alguns ocultistas “cultivados”).

Os próprios Yezidis tem para si que estes termos são inadequados, e estão certos nisto, uma vez que esta terminologia só é possível quando se parte de um ponto de vista eurocêntrico, cristão, mosaico ou islâmico (o que vem a ser pior ainda). Pois bem, como classifica-los então? Simples, partindo da pressuposição de que os que seguem cristo são cristãos, os que seguem o judaísmo são judeus e assim por diante, aqueles que seguem ou adoram MALAK TAUS são... Yezidis, pura e simplesmente.


CONCLUSÃO

Tirar conclusões acerca dos Yezidis é uma tarefa delicada. O que eu disse acima foi baseado nos textos que li e traduzi. Para quem entende inglês eu recomendaria a leitura do livro “Devil Worship - The Sacred Books and Traditions of the Yezidiz”, escrito por Isya Joseph, traduzido de um texto árabe do século XIX. Foi este o texto base para a presente tradução. O livro teve sua primeira edição em 1919, quando provavelmente Crowley deve ter tomado conhecimento dele. Pode-se encontrá-lo na íntegra no portal www.sacred-texts.com.

Preciso esclarecer que os textos não estão divididos em versículos, que tomei a liberdade de inserir para facilitar as citações que porventura possam surgir em outros trabalhos futuros e eventuais.

Por fim, convido o leitor a desprender-se antes da leitura de suas crenças pré-constituídas, uma vez que qualquer expectativa criada por informações de segunda mão redundará em um possível desapontamento.

Por vezes o texto é um tanto delirante, como os demais das literaturas “sagradas”, e apresenta uma série de absurdos que hoje facilmente descartaríamos. Por outro lado, há a questão da abordagem eurocêntrica. Alguns sabem exatamente o que estou referindo. Todas estas posturas seriam desastrosas.

Para os outros, isto é, aqueles que buscam o conhecimento e acreditam que podem alargá-lo com a leitura destes textos, a oportunidade é impar.

Espero que apreciem o trabalho.

IAIDA BAPHOMETO
Janeiro de 2009